Trinta anos depois, Guerra das Malvinas não acabou

Memorial das vítimas argentinas na cidade de Ushuaia | Foto: Miguel A. Monjas

Memorial das vítimas argentinas na cidade de Ushuaia | Foto: Miguel A. Monjas

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Militarização do arquipélago pela Inglaterra e reivindicações da Argentina nos fóruns internacionais marcam aniversário do conflito, iniciado num 2 de abril

No Sul21

No dia 2 de abril de 1982 a Argentina invadiu as Ilhas Malvinas e deu início a 74 dias de guerra com a Inglaterra, que ocupava desde 1833 o que os britânicos chamam de Falklands. A guerra deixou 649 argentinos mortos e vitimou 255 ingleses, além de três habitantes das ilhas.

A derrota da Argentina contribuiu para a queda da ditadura militar, que viria a ruir de vez em 1983, mesmo ano em que a primeira-ministra britânica, Margaret Thatcher, conseguiu se reeleger, embalada na popularidade que a vitória sobre o país sul-americano lhe garantiu. Hoje, há exatos 30 anos do conflito, a Argentina ainda reivindica a soberania sobre o território que fica a apenas 550 quilômetros do seu litoral e a 12.800 quilômetros da costa inglesa. A própria história das Malvinas é recheada de disputas sobre sua posse. As ilhas já passaram por mãos francesas e espanholas até chegarem aos argentinos e ingleses.

Enquanto a Argentina alega que as Malvinas foram descobertas por uma expedição de Fernão de Magalhães, em 1520, a pedido da Espanha, a Inglaterra sustenta que quem chegou primeiro foi o capitão britânico John Strong, em 1690. Ambos reconhecem que a primeira colônia que se estabeleceu nas ilhas foi francesa, em 1764. O povoado acabou passando ao controle espanhol em 1767.

Com as revoltas nas colônias espanholas no início do século 19 e a independência da Argentina em 1816, a Espanha abandonou as Malvinas e os argentinos entenderam que eram os herdeiros daquelas terras – que ficavam próximas do seu território e estavam sob controle da antiga metrópole. Então, a Argentina enviou mercenários para o reconhecimento do território e, em 1829, nomeou um governador para comandar as ilhas.

Mas Luis Maria Vernet ficou apenas cinco anos no poder, já que em 1833 uma fragata britânica atracou na ilha, reivindicando o controle do território. Como praticamente não havia efetivo militar argentino no local, o governador acabou se retirando pacificamente junto com os outros moradores.

O pós-guerra e a militarização do Atlântico Sul

Margaret Thatcher salvou sua carreira política com vitória sobre a Argentina | Foto: Divulgação/White House Photo Office

Apesar de a guerra ter marcado um novo momento na reivindicação argentina da soberania das Malvinas, o pleito vem sendo defendido por sucessivos governos há pelo menos 179 anos. Em 1982 o conflito serviu para reavivar os brios nacionalistas dos argentinos e mascarar o fracasso econômico, político e social da ditadura. Mas a derrota acabou escancarando ainda mais a incompetência do regime e contribuiu para sua queda no ano seguinte.

Desde a redemocratização, diversos presidentes argentinos continuaram a reclamar a soberania das Malvinas. A reivindicação chegou a ser engavetada durante a gestão de Carlos Menem (1989-1999), que retomou o diálogo com os britânicos sem questionar a posse das ilhas. Mas o tema voltou com força à pauta nacional e internacional com a chegada de Néstor Kirchner ao poder (2003-2007) e com a eleição de sua mulher, Cristina Kirchner, à presidência.

Os Kirchner adotam um discurso nacionalista para reivindicar a posse das Malvinas. Além de Néstor ter nascido na capital da província de Santa Cruz, na região da Patagônia, próximo do arquipélago, a reconquista tratar-se de uma questão de orgulho para os argentinos. O conflito adquiriu, na última década, contornos econômicos, com a descoberta de reservas de petróleo e gás em seu território. E o consequente reforço militar fornecido pelos britânicos às ilhas só reforça o clima de tensão permanente na região.

Nas próximas semanas, a Inglaterra enviará o navio destróier HMS Dauntless, um dos mais modernos de sua frota. E há especulações não confirmadas de que um submarino nuclear já patrulha as Malvinas.

É nesse contexto que Cristina Kirchner denuncia nos fóruns internacionais a militarização do Atlântico Sul e a manutenção de um estado colonial em relação à Argentina.

A derrubada do cruzador General Belgrano foi uma das principais baixas para os argentinos | Foto: Released Press Association

O último censo realizado nas Malvinas, em 2006, aponta que as ilhas possuem 2.748 habitantes, além de um efetivo de 1.700 militares, sendo que a capital, Port Stanley, concentra 2.115 moradores.

Politicamente, o território é comandado por um governador nomeado diretamente pela rainha Elizabeth II. Ele desempenha as funções equivalentes a um chefe de Estado, enquanto uma espécie de “primeiro-ministro” fica na chefia do governo. No âmbito legislativo, uma assembleia composta por oito integrantes eleitos a cada quatro anos chancela as leis do território.

Os habitantes das Malvinas são conhecidos como os kelpers e se consideram britânicos. Nesta segunda-feira (2), quando a guerra com a Argentina completa 30 anos, eles realizaram um ato para lembrar os mortos no conflito e voltaram a rechaçar qualquer domínio do país sul-americano sobre o território.

Na solenidade, o comandante que cuida da defesa das ilhas, Peter Biggs, disse que “a Argentina é um vizinho grande que está perto, mas no qual só vemos hostilidade”.  O governador Nigel Haywood disse, numa entrevista à agência de notícias AFP, que a soberania das Malvinas não está sob negociação, e chegou a cogitar fazer um referendo para consultar a população. “Já sabemos qual seria o resultado. Não somos parte da Argentina”, declarou.

Jornal Página 12 traz depoimentos de veteranos da Guerra das Malvinas | Foto: Reprodução

Os 30 anos da Guerra das Malvinas repercutiram intensamente na imprensa argentina. Os três maiores jornais do país deram muito destaque ao tema, cada um sob um olhar diferente. O diário La Nación relatou, de forma quase oficialesca, a cerimônia de lembrança dos mortos ingleses realizada na capital das ilhas, Port Stanley.

Já o jornal Clarín descreveu com detalhes como é a vida dos habitantes das Malvinas, relatando o cotidiano do diminuto espaço urbano nas ilhas. O texto destaca que “todos possuem casa e pelo menos um emprego, o Estado fornece educação e saúde, não há cinemas ou teatros e as festas de casamento ocorrem no salão da Assembleia Legislativa”. A matéria também comenta que “à noite, os moradores costumam deixar as portas de suas casas destrancadas”.

O jornal Página 12 reuniu o depoimento de quatro veteranos da guerra, que contam o horror que passaram nas mãos de seus próprios compatriotas. Os desabafos são carregados de emoção e apontam graves violações de direitos humanos que os soldados sofriam de seus próprios comandados – seguindo a própria lógica interna da ditadura militar argenitna.

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2 comentários para "Trinta anos depois, Guerra das Malvinas não acabou"

  1. Roldão Lima Junior disse:

    A população das ilhas Falklands ou Malvinas, como queiram, segue a modorrenta rotina de súdita da rainha Elizabete da United Kingdom – UK: Mão inglesa, moeda forte, forças armadas profissionais, idioma universalizado, sistema de saúde confiável, transporte público eficiente e outras “mazelas” do primeiro mundo britânico – sem refugiados – que não são comuns na nossa pobre América Latrina. Se a Argentina tivesse “ganhado a guerra”… a situação seria outra. No mínimo, a população das Malvinas estaria nas ruas – hoje – sob temperaturas congelantes, suplicando para o Messi não abandonar a seleção de futebol argentina. “Don’t cry for me Argentina…”

  2. Hanns Miller disse:

    informaçao bacana

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