Europa: cresce o tráfico de mulheres

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Estudo sugere que prostituição forçada avançou 50% em cinco anos, envolve práticas de cárcere privado e tem como alvo destacado as brasileiras

Por Anelise Infante, BBC Brasil

De acordo com um relatório compilado pela ONG espanhola Red española contra la trata de personas, a partir dos dados de 26 organizações internacionais, a revenda de mulheres, muitas delas menores de idade, aumentou em 50% nos últimos cinco anos e movimenta cerca de US$ 7 bilhões por ano (R$ 12 bilhões).

O relatório revelou que anualmente cerca de 1 milhão de pessoas que chegam à Europa acabam sendo forçadas à prostiuição. Deste total, 90% passam por bordéis na Espanha, Itália, Grécia, Alemanha, Bélgica, Holanda, Suíça e Portugal, revendidas por quadrilhas de traficantes.

Na Espanha, maior consumidor europeu de serviços sexuais e onde atuam as principais redes de contrabando, segundo as autoridades, uma mulher é vendida entre R$ 2 mil e R$ 7,5 mil, de acordo com idade, características físicas e experiência. Quanto mais jovem, mais cara.

O sistema é parecido ao de uma atividade comercial convencional. Os donos dos prostíbulos atendem à demanda dos clientes, que pedem perfis físicos específicos de prostitutas. Quando querem um tipo ou se cansam de outro, a mercadoria é renovada. Assim, uma mulher é revendida a outra rede, circulando por quase todo o continente.

Renovação do “catálogo”

Segundo a pesquisa, o tempo médio de uma prostituta em um bordel é de 28 dias. Quando alcança este período, ela é revendida para que os clientes tenham novidades, como num catálogo de mercadorias.

”Sai barato explorar uma mulher. As leis são benevolentes e a sociedade ignora o assunto. Os traficantes estão percebendo que correm menos riscos vendendo mulheres do que vendendo entorpecentes”, comparou a psicóloga Iana Matei.

Capa de livro 'En Venta', sobre tráfico sexualLivro narra episódios reais sobre tráfico sexual

Em entrevista à BBC Brasil, Matei, especialista no assunto e autora do livro: En Venta: Mariana, 15 años (À venda: Mariana, 15 anos, em tradução literal), disse que cada vez há mais menores aliciadas pelas redes, muitas vendidas pelas próprias famílias e namorados.

”Muitas meninas são reticentes em denunciar seus exploradores porque os identificam como amantes e lhes custa aceitar que sejam presos como marginais.”

Para a escritora, a revenda de mulheres é um delito “relativamente fácil de se cometer” pela falta de controle judicial sobre o que ocorre nos bordéis, “muitas vezes com a cumplicidade de autoridades, porque também há muita corrupção neste tema”.

O aumento do comércio, segundo ela, vem acontecendo pela relação cada vez maior de máfias de tráfico de entorpecentes no setor da prostituição com experiências e redes estabelecidas para movimentação de ”mercadorias”.

“Vendida pela avó”

No livro, que relata episódios reais, ela conta a história da protagonista. Uma menina de 15 anos vendida pela avó a uma rede de traficantes.

A psicóloga descobriu o caso, resgatou a jovem, foi perseguida e ameaçada e acabou criando um albergue para mulheres que conseguem escapar das redes de prostituição.

Fugir dos exploradores é difícil, segundo as ONGs. Os sistemas de controle em cárcere privado envolve violência, sequestro e ameaças.

”O último caso que atendemos foi de uma menor de 17 anos obrigada pelo namorado a se prostituir. Ela se recusou e ele a manteve três dias em cárcere privado, alimentando-a só com água salgada, até ela aceitar”, contou à BBC Brasil, Rocio Nieto, presidente da Apramp, Associação para a Prevenção e Reinserção da Mulher Prostituída.

Segundo Nieto, 89% das estrangeiras que se prostituem na Espanha são “vítimas de máfias”.

Brasileiras revendidas

Para a Apramp, que trabalha há 26 anos na reintegração de mulheres, o Brasil é um caso especial por ser o principal abastecedor do mercado de prostituição na Europa.

A ONG fez até um relatório sobre a situação das brasileiras, detectando que são as prostitutas com mais circulação nos prostíbulos europeus. São revendidas em média a cada 21 dias e quase sempre dentro do mesmo país.

Brasileiras atuando como prostitutas na Espanha (Ministério do Exterior da Espanha)Brasileiras abastem mercado de prostituição europeu

Segundo a pesquisa, as brasileiras exploradas por máfias têm entre 20 e 45 anos, nível sócio-econômico baixo e filhos deixados no Brasil. Geralmente, entram com vistos de turistas através de Portugal, Espanha, França, Suíça e Holanda. São cooptadas nas cidades de origem por conhecidos, sendo Goiânia o maior foco de aliciamento.

Na Espanha, organizações oferecem a vítimas casa, tratamento médico e psicológico, apoio jurídico, formação profissional e ajuda para encontrar trabalho.

A legislação espanhola sobre tráfico de seres humanos prevê pena de dois a 10 anos de cadeia. As vítimas têm direito à proteção em caso de denunciar os exploradores. Se não quiserem, normalmente, são deportadas por infringir a lei de imigração.

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5 comentários para "Europa: cresce o tráfico de mulheres"

  1. Concordo plenamente com os comentários que lí, no entanto, é muito complicado acabar com esse crime, dado que envolve muito dinheiro e muitas pessoas importantes de um certo nível, que são bastante influentes, como diz o ditado: "uma mão lava a outra e as duas lavam a cara".

  2. O trafico de mulheres deveria ser investigado com mais antesedencia porque moitas familhas estão sofrendo porai en cuanto muitos estão abusando da filha de muitasfamilhas mas os pais tambem devem estar sempre atentos no que estão fasendo os nossos filhos não tenhão vegonha de ser careta o importante é ver nossos filhos bem

  3. Normando Rabelo disse:

    Temos que parar já com essa desgraça social.

  4. Alexandre de Oliveira Kappaun disse:

    O tráfico de mulheres é realmente um dos mais graves atentados aos direitos humanos que enfrentamos atualmente. Parabéns a Anelise Infante e a BBC Brasil por colocar esse problema em evidência. Não é correto, contudo, restringir essa discussão ao caso das brasileiras traficadas e os países da Europa ocidental para onde elas se vêem levadas. Como pesquisador sobre a questão, gostaria de ampliar essa discussão a partir de uma passagem de um dos capítulos da dissertação de mestrado que ora escrevo:
    “O jornalista canadense, Victor Malarek, ao narrar a história recente do tráfico, divide o mesmo em grandes “ondas”. A primeira onda teria acontecido, segundo ele, durante a década de 1970, quando mulheres asiáticas, sobretudo filipinas e tailandesas, eram “exportadas” para os países industrializados ricos. A segunda onda teria começado no início dos anos 1980, quando mulheres africanas, sobretudo ganenses e nigerianas, passaram a ser o “produto” exportado. A terceira onda, já a partir de meados dos anos 1980, teria como ponto de partida a América Latina e as mulheres “exportadas” provinham, em sua grande maioria, da Colômbia, Brasil e República Dominicana (MALAREK, 2004, p. 6). Haveria, ainda, uma quarta onda, proveniente dos países do leste europeu e da antiga União Soviética, que teria se iniciado com o fim do socialismo real na Europa centro-oriental e o colapso da União Soviética, a partir do final dos anos 1980.
    É importante ressaltar que essas ondas se sobrepõem e que o início de uma nova onda não representa o fim das anteriores. Hoje, por exemplo, juntamente com as mulheres que são traficadas, a partir do antigo mundo comunista, filipinas e tailandesas continuam a ser traficadas para o Japão e os Estados Unidos; ganenses e nigerianas, para a Europa ocidental, sobretudo a Itália; e brasileiras, colombianas e dominicanas, para os Estados Unidos e países da Europa ocidental, como a Espanha.
    Além dessas grandes rotas internacionais, têm-se, ainda, as domésticas e as regionais. Basta acompanhar atentamente a imprensa diária internacional, para verificar que notícias sobre o tráfico de mulheres e suas principais rotas aparecem frequentemente (às vezes, quase que diariamente) nas páginas dos jornais ou nos sites da internet. Chega-se, portanto, à infeliz conclusão de que o negócio do tráfico humano, incluindo aí o tráfico de mulheres, floresce como nunca antes na história.”
    É fundamental, portanto, que comecemos a examinar a fundo a questão do tráfico de mulheres para fins de exploração sexual, pois só a partir do conhecimento, poderemos, efetivamente, combater esta degradante prática criminosa, lutando em prol da emancipação das mulheres traficadas.

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