Eleições expõem força da plutocracia brasileira

Em 15% das cidades, prefeitos têm, sozinhos, patrimônio superior a 1% do PIB municipal. Dados revelam política local controlada pelas elites

Por Marcelo Brandão, na Agência Brasil

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Luiz Carlos Castelo, o prefeito de São José do Xingu tem patrimônio equivalente a 36,9% do PIB do município que assumirá em 2017

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Em 15% das cidades, prefeitos recém-eleitos têm, sozinhos, patrimônio superior a 1% do PIB municipal. Para pesquisadora, dados revelam política local controlada pelas elites

Por Marcelo Brandão, na Agência Brasil

Diversos municípios brasileiros elegeram, no pleito deste ano, prefeitos com renda expressiva em relação aos próprios produtos internos brutos (PIBs). O PIB de um município é formado pela soma das riquezas produzidas na localidade. Uma pesquisa feita pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) revelou que 15,2% (782) dos prefeitos eleitos declararam patrimônio maior que 1% do PIB do município pelo qual se elegeram. Em 32 municípios – a maior parte nas regiões Centro-Oeste e Nordeste –, os prefeitos eleitos declararam um patrimônio equivalente a 10% do PIB municipal.

Um dos maiores expoentes dessa estatística está em Mato Grosso. O prefeito de São José do Xingu, Luiz Carlos Castelo, tem um patrimônio equivalente a 36,9% do PIB do município que assumirá em 2017. A maior parte do seu patrimônio declarado de R$ 51,7 milhões se refere a cabeças de gado, equipamentos agrícolas e imóveis. O PIB de São José do Xingu é R$ 140 milhões.

O novo prefeito de Santo Expedito, em São Paulo, também tem patrimônio superior ao da cidade

O novo prefeito de Santo Expedito, em São Paulo, tem patrimônio equivalente a um quarto da renda da cidade

Imóveis e gado

Já Jonas Muniz, novo prefeito de Cruz, no Ceará, tem patrimônio de R$ 40,3 milhões, segundo última atualização do site do TSE. O município tem PIB de R$ 124,4 milhões. O patrimônio de imóveis, veículos, dentre outros, representa 32,4% às riquezas de sua cidade.

Em Santo Expedito, município no estado de São Paulo, o prefeito reeleito, Vandi, declarou patrimônio equivalente a 25,2% do PIB da cidade, pouco mais de um quarto da renda local. São R$ 6,9 milhões em imóveis e cabeças de gado, dentre outros, enquanto a cidade gera R$ 27,5 milhões.

Mato Grosso é o dono da maior média de patrimônio entre os prefeitos eleitos. São R$ 2,8 milhões de média, seguido de Mato Grosso do Sul (R$ 1,7 milhões). O estado com menor média é o Amapá, com R$ 364 mil de patrimônio médio.

Patrimônios individuais

Os três prefeitos com maior patrimônio declarado são empresários. O novo prefeito de São Carlos (SP), Airton Garcia, tem renda declarada ao TSE de mais de R$ 439,6 milhões. O italiano naturalizado brasileiro Vittorio Medioli, novo prefeito de Betim (MG), tem patrimônio declarado superior a R$ 352,5 milhões. João Dória, eleito prefeito de São Paulo (SP), declarou patrimônio superior a R$ 179,7 milhões.

Os três declaram, em seu patrimônio, participações em empresas, fundos de investimentos e imóveis. Dória, por sua vez, também declara obras de arte no valor de R$ 33 milhões. Já o prefeito de São Carlos informa ainda ter fazendas em Tocantins e São Paulo.

Brasília - Prefeito eleito de São Paulo, João Doria Jr chega para reunião com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Prefeito eleito de São Paulo, João Doria declarou patrimônio superior a R$ 179,7 milhõesArquivo/Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Para a assessora política do Inesc, Carmela Zigoni, os números mostram que o Brasil ainda vive uma política dominada pelos mais ricos. “No Brasil existe uma desigualdade estruturante. As elites se reproduzem no poder. Não há uma política que gere diversidade. Sabemos que os representantes do povo são homens brancos de alto poder aquisitivo e com mais 40 anos”. De acordo com a pesquisa, 62% dos prefeitos eleitos são homens de cor branca.

Para ela, a mudança desse quadro passa por uma alteração no sistema político do país. “O mais importante é fazer uma discussão ampla sobre a reforma do sistema político. Tanto no sistema eleitoral, que não traz todos os segmentos da sociedade para o Poder Legislativo, quanto para a questão cultural; uma mudança cultural para que as pessoas votem pensando que a diversidade é importante”.

Mulheres e indígenas

A pesquisa do Inesc também mostrou um número de mulheres eleitas muito inferior ao de homens. Foram apenas 11% de mulheres eleitas para prefeituras. Considerando todos os 68.755 prefeitos e vereadores eleitos, as mulheres representam 13,4% (9.226).

Os números vão de encontro à lógica da lei que determina o número mínimo de mulheres candidatas por partido. Carmela avalia que as candidaturas de mulheres são as menos dotadas de investimento dos partidos, que as colocam apenas para cumprir a cota mínima. Apesar do aumento de 10% nas candidaturas de mulheres nos últimos oito anos, o número de eleitas teve um acréscimo bem menor, de 1%.

Além disso, existe a questão racial. Do total de prefeitas eleitas, 457 (71,29%) são brancas, 168 (26,21%) pardas, 10 (1,56%) pretas, 5 (0,78%) amarelas e 1 (0,16%) indígena. Do total de vereadoras eleitas, 4.862 (66,67%) são brancas, 2.536 (32,83%) são pardas, 330 (3,85%) são pretas, 38 (0,52%) são amarelas e 21 (0,23%) são indígenas.

Eentre os indígenas, tanto homens quanto mulheres, a participação política é muito pequena. Foram eleitos apenas seis prefeitos. Desses, dois são de Pernambuco, e na Paraíba, Acre, Amazonas e Pará um prefeito indígena foi eleito. Entre os candidatos indígenas a vereador, 160 foram eleitos. Apenas nos estados do Piauí, Rio de Janeiro e de Sergipe não haverá representantes indígenas nas câmaras de Vereadores pelos próximos quatro anos.

* Matéria atualizada às 17h38 para correção do PIB dos municípios citados na reportagem. O Inesc, que forneceu os dados, havia informado valores mil vezes menores que as cifras oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

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