Caixa: na ameaça de privatização, as digitais de Lira

Crescem sinais de “privatização camuflada” do banco público. Atual administração, indicada pelo deputado, quer separar loterias para em seguida vendê-las. Entrega poderia desviar mais de R$ 9 bi, hoje destinados a políticas sociais

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Por Heloisa Villela, no ICL Notícias

Os funcionários da Caixa Econômica Federal suspeitam que a nova direção do banco já colocou em andamento uma privatização camuflada, passando atividades essenciais para subsidiárias, com o objetivo de vendê-las mais adiante. Uma das iniciativas pode colocar em risco programas sociais do governo. O conselho da CEF está em vias de aprovar a transferência de toda a atividade das lotéricas para uma subsidiária e já examina fazer o mesmo com a operação de cartões de crédito.

“A criação da subsidiária LOTEX, hoje Caixa Loterias, em 2016, no governo Temer, teve o propósito de preparar a privatização das operações, o que só não aconteceu devido à forte pressão que exercemos junto com outras entidades e parlamentares”, disse ao ICL Notícias o presidente da FENAG (Federação Nacional das Associações de Gestores da Caixa), Marconi Apolo. Mas a nova administração retomou, rapidamente, os planos de transferência gestados ainda no governo Temer.

No começo do governo do presidente Lula, em 2023, quando Rita Serrano assumiu a presidência da Caixa, uma das medidas adotadas, que estava em andamento, era justamente encerrar as atividades da Lotex. Processo que agora foi revertido. Funcionários da CEF destacam a importância que as loterias têm no financiamento de programas sociais do governo federal.

No ano passado, por exemplo, as Loterias da Caixa arrecadaram um total de R$ 23,4 bilhões e desse total, R$ 7,9 bilhões foram pagos aos apostadores, na forma de prêmios, enquanto R$ 9,2 bilhões foram destinados a programas sociais do governo federal nas áreas de seguridade social, educação, saúde, cultura, esporte e segurança pública. Ou seja, cerca de 60% dos lucros da operação com as loterias volta, todo ano, para a sociedade, na forma de investimentos sociais. E isso só é possível porque a gestão da Caixa é pública.

Caixa Loterias S. A.

A nova administração já apresentou ao conselho diretor da CEF a proposição Vimar/ Sualo número 258/2024. O objetivo, expresso na ementa da proposição, é transferir a administração das Loterias Federais para a subsidiária Caixa Loterias S. A. Os funcionários da Caixa alertam que essa seria uma maneira de privatizar o negócio da Loteria sem provocar um debate na sociedade já que privatizar a subsidiária não exige uma aprovação no Congresso Nacional. É justamente o que esses funcionários chamam de “privatização camuflada”.

Um processo semelhante já está em andamento para fazer o mesmo com toda a operação de cartões de crédito da CEF. Transferir a operação para uma subsidiária que poderia, mais adiante, ser vendida para uma empresa privada.

As loterias federais são monopólio da Caixa desde 1962 e elas só podem cumprir um papel social porque a administração é centralizada no banco público. Esse volume de recursos, destinado a programas sociais, se tornaria lucro para o futuro dono da operação. Funcionários da Caixa alertaram o ICL Notícias a respeito da rápida retomada do processo de “privatização camuflada”.

Desde que a administração da Caixa foi entregue ao Centrão, atendendo a pedidos do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP–AL), os funcionários da CEF estão vendo se repetir, no governo Lula, o plano adotado nos seis anos de Temer-Bolsonaro, que só não foram levados a cabo por causa da pandemia e da pressão interna na instituição. Mas os planos voltaram à tona agora, com uma velocidade que surpreendeu os funcionários mais experientes da instituição.

A FENAG enviou um ofício para a Caixa pedindo esclarecimentos a respeito do processo de migração do controle das lotéricas para a subsidiária. Resta saber se o conselho de administração vai responder antes do fato consumado.

Influência de Lira

Além de indicar o presidente da Caixa, Carlos Vieira, que substituiu Rita Serrano, Arthur Lira exerce influência direta em segmentos do banco que o interessam diretamente. Foi por isso que venceu a disputa de poder com o governo federal e conseguiu que o Ministério da Fazenda anunciasse a saída do assessor especial José Francisco Manssur. Ele era o responsável pela área de apostas esportivas eletrônicas — as chamadas bets.

De acordo com a jornalista Letícia Casado, do UOL, desde 2023, com o avanço da regulamentação das apostas, o grupo do presidente da Câmara dos Deputados fazia forte pressão sobre o ministro Fernando Haddad.

Para evitar mais desgastes na aprovação de pautas de interesse do governo federal no Congresso, o chefe da Fazenda decidiu ceder ao avanço de Lira e resolveu substituir Manssur.

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