Florianópolis, primeira zona livre de agrotóxicos

Município sanciona lei para banir o uso e armazenamento de qualquer pesticida dentro da ilha. Entidades do agronegócio enfurecidas. Leia também: novo diretor da Anvisa pode emperrar discussão sobre cannabis medicinal

.

Por Maíra Mathias e Raquel Torres

MAIS:
Esta é a edição do dia 15 de outubro da nossa newsletter diária: um resumo interpretado das principais notícias sobre saúde do dia. Para recebê-la toda manhã em seu e-mail, é só clicar aqui. Não custa nada.

LIVRE DE AGROTÓXICOS

Florianópolis está prestes a se tornar o primeiro município brasileiro a banir agrotóxicos. Uma lei já aprovada e sancionada neste mês institui e define como “zona livre de agrotóxicos a produção agrícola, pecuária, extrativista e as práticas de manejo dos recursos naturais no município”. O texto torna crime passível de multa armazenar e aplicar qualquer tipo de pesticida na parte insular da capital catarinense. O plano é que a verba arrecadada seja totalmente revertida para as pastas de Saúde e Meio Ambiente. E, além da medida punitiva, a Prefeitura vai precisar criar um programa de educação sanitária ambiental para falar sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde humana e outro programa, de hortas agroecológicas.

É interessante entender a articulação política por trás do texto, aprovado por unanimidade. Na Agência Pública, o vereador Marcos José de Abreu (PSOL) – autor da proposta – conta que conversou pessoalmente com todos os outros vereadores, tanto da base quanto da oposição. Ele mostrou dados de análises de resíduos em alimentos e evidências da relação entre agrotóxicos e problemas de saúde. E, antes de apresentar o projeto, foi traçado um caminho propositivo: “Aprovamos a Política Municipal de Agroecologia e Produção Orgânica, aprovamos uma diretriz orçamentária para o programa de agroecologia e segurança alimentar. Auxiliamos o município a assinar o decreto do programa municipal de agricultura urbana, além de todo um trabalho dentro da Câmara trazendo nomes estaduais e nacionais que explicassem a importância da agroecologia”, explica ele.

Mas o principal foi tentar não chamar muita atenção para o PL. “Nós sabíamos que se o agronegócio estadual e federal olhassem para cá e vissem o projeto, eles fariam pressão nos vereadores para impedir a aprovação. (…) Agora eles [os vereadores] estão recebendo pressão de fora, de deputados e senadores de seus partidos, porque esse projeto abre um precedente para todo país.” Florianópolis não tem a agricultura como base, de modo que a lei não deve mudar tanta coisa por lá. O seu maior impacto talvez seja mesmo o desse precedente.

ESPERAR PRA VER

A votação da nova regulação da Cannabis medicinal no país está marcada para acontecer hoje, daqui a pouquinho, às 10h, em uma reunião pública da diretoria colegiada da Anvisa. Mas, segundo a Folha, o encontro pode não acontecer. De novo. “Apesar da agência reguladora ser independente, as pressões do governo federal estão pesando sobre a decisão dos diretores”, escreve Valéria França, da coluna Cannabis Inc. Semana passada, diretores do órgão solicitaram o adiamento da votação na última hora. Deram como justificativa mudanças no texto e necessidade de mais análise pelo corpo técnico da agência. Mas, de acordo com Valéria, o adiamento foi estratégico: “Comandada por um colegiado de cinco diretores, três deles tinham se posicionado contra a proposta apresentada.” 

Ainda de acordo com a coluna, a agência pode adiar a votação por tempo indeterminado – “é outro forte rumor dos bastidores” – com a desculpa de que prefere esperar os resultados da votação na comissão especial formada na Câmara dos Deputados na semana passada. Ela está encarregada de avaliar o Projeto de Lei 399/15, que propõe a comercialização da Cannabis medicinal. 

Já segundo O Globo, se um novo pedido de vista for feito por um dos diretores, a votação pode ser adiada por, pelo menos, mais duas sessões do colegiado. A especulação é que o diretor novo da Anvisa, indicado por Jair Bolsonaro, faça isso. A intenção seria empurrar com a barriga a decisão até que expire o mandato dos dois diretores favoráveis à regulamentação. Em entrevista ao jornal, o militar Antônio Barra Torres desconversou: “Nenhuma possibilidade está descartada. E o fato de pedir não significa, contrariando o que vem sendo publicado, que isso é uma técnica para embarreirar (a discussão do tema).” 

Barra Torres também deixou mais evidente seu posicionamento conservador em relação ao uso da Cannabis medicinal, falando até mentiras, como a de que a planta “é proscrita” no mundo todo, justamente num momento em que não só o uso medicinal, como recreativo, vem sendo liberado em vários países. “O que entendo é que um tema dessa complexidade… O que tem de diferente nesse tema em relação ao demais temas de insumo para tratar pessoas que estão doentes? É que a origem desses insumos vem de uma planta que é proscrita no mundo todo. Isso gera complexidade maior, porque é uma planta cujos derivados, se tiverem uso indevido, levam à drogadição. Isso cria uma necessidade de que o tema seja bem discutido e bem estudado, sob pena de que uma decisão tomada amanhã ou depois tenha que ser revista num curto espaço de tempo”, sentenciou.

NA SÍRIA

A OMS declarou que está “gravemente preocupada” com a situação humanitária no nordeste da Síria, onde 200 mil pessoas foram deslocadas desde o último dia 9, com o recuo da tropas dos Estados Unidos – e o avanço das operações militares turcas. A estimativa é que quase 1,5 milhão de pessoas precisem de ajuda médica. Os serviços de saúde na região já estavam enfraquecidos e pioraram: há unidades fechadas ou com serviços limitados, e a escassez de profissionais de saúde é generalizada, pois eles também estão entre os deslocados. A Organização afirma que está disponibilizando e entregando medicamentos e vacinas. 

ENTRE OS PIORES NA AL

O Brasil é um dos países da América Latina que experimentou grande aumento no número de infecções por HIV. A conclusão é da Unaids, programa das Nações Unidas, que divulgou ontem um relatório com números compilados entre 2010 e 2018. No período, houve crescimento de 21% nos casos por aqui. Em comparação, a média no subcontinente foi de apenas 7%. Estamos empatados no terceiro lugar com a Costa Rica, um pouquinho atrás da Bolívia (22%). O país onde o problema é mais grave é o Chile (34%). Aqui na América do Sul, o bom exemplo veio da Colômbia, onde houve redução de 22%. O melhor resultado, contudo, é de El Salvador, que reduziu quase à metade o número de infecções registradas no período. 

Ao todo, a Unaids registrou cerca de cem mil casos de HIV na América Latina em 2018. O grupo mais vulnerável foram homens que fazem sexo com homens (40%). Em segundo lugar, com 35% dos casos, está a população em geral. Na sequência, pessoas que utilizam serviços de trabalhadores sexuais (15%). E há ainda outros grupos vulneráveis nas estatísticas, como mulheres transgênero (4%) e trabalhadores sexuais e usuários de drogas injetáveis (3% cada). 

FALTA OU EXCESSO

Um terço das crianças menores de cinco anos come mal no mundo. O Unicef publicou um relatório global informando que 200 milhões delas sofrem desnutrição crônica ou aguda, enquanto 40 milhões vivem com sobrepeso. Mas, enquanto nos últimos anos o número de desnutridos vem caindo (exceto na África), o de crianças obesas está aumentando no mundo todo, inclusive nos países africanos. E o fato de a fome estar diminuindo não pode ser avaliado como sucesso: “Muito mais crianças e jovens sobrevivem, mas isso não significa que eles prosperam”, diz o documento. A região mais afetada pela fome é o sul da Ásia, onde 34% dos menores de cinco anos sofrem de desnutrição crônica. Já a obesidade afeta especialmente a Europa Oriental e a Ásia Central, com uma taxa de quase 15%.

Em tempo: se comida é remédio, por que não não se ensina isso nas escolas de Medicina? A pergunta norteia a reportagem de Jessica Flu, na New Food Economy. De acordo com ela, em média os estudantes de medicina ao redor do mundo passam apenas 1% da carga horária dos cursos aprendendo sobre nutrição.

MELHOROU, MAS AINDA É GRAVE

Uma boa e uma má notícia chegam da China. Sua capital, Pequim, está prestes a deixar a lista das 200 cidades mais poluídas do mundo. Isso aconteceu em apenas cinco anos, depois de um plano governamental que conseguiu reduzir em 32% a concentração de partículas tóxicas no ar. Mas, por outro lado, a exposição a poluentes continua bem grave na “fábrica do mundo”. Uma pesquisa publicada na Nature Sustainability acompanhou 250 mil gestações em Pequim entre 2009 e 2015. Constatou que a poluição aumentou o risco de aborto espontâneo não percebido, quando o feto morre ou para de crescer, mas isso só é constatado durante exames de ultrassom, às vezes semanas depois. Foram registrados 17.497 desses casos.

PÊNDULO

A relação entre malária e desmatamento foi investigada em um novo estudo, que cruzou dados epidemiológicos com informações sobre a devastação da mata brasileira entre 2003 e 2015. “Nossos resultados sugerem que um aumento de 10% no desmatamento leva a um aumento de 3,3% na incidência de malária”, escreveram os cientistas Andrew McDonald e Erin Mordecai, da Universidade Stanford, nos EUA. Mas, por outro lado, à medida em que os próprios responsáveis pela derrubada de árvores vão ficando doentes, acontece o efeito contrário: em menos de um ano, eles abandonam aquela área. Com isso, para cada ponto percentual de aumento da malária, corresponde 1,4% de redução na taxa de desmatamento. Os autores ressaltam que tudo isso pode variar com mudanças no uso da terra e de acordo com o perfil do município afetado. Por exemplo: quanto mais mata preservada, mais casos da doença o desmatamento provoca. 

SEM TUMORES

O brasileiro que tinha linfoma em estágio terminal e recebeu inovador tratamento genético já está em casa

MAIS:
Esta é a edição do dia 15 de outubro da nossa newsletter diária: um resumo interpretado das principais notícias sobre saúde do dia. Para recebê-la toda manhã em seu e-mail, é só clicar aqui. Não custa nada.

Leia Também: