No câncer da próstata, sinal da Saúde devastada

No “novembro azul”, novos estudos revelam: negligência e negacionismo do governo diante da covid afetou todo o sistema sanitário, fazendo despencar, entre outros procedimentos, os exames que permitem o diagnóstico precoce

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Sem prevenção, não há muita esperança de um tratamento bem sucedido do câncer de próstata. Mas o avanço da doença é uma ameaça concreta: uma consequência grave da pandemia e que terá, segundo os especialistas, efeitos de longo prazo. “O câncer de próstata, não provoca nenhum tipo de sintoma na fase inicial, e por esse motivo os exames periódicos são importantes”, observou o Dr. Alfredo Canalini, secretário-geral da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU). A entidade divulgou dados segundo os quais o número de consultas urológicas de diagnóstico do câncer despencou 33,5% durante a pandemia. Em 2019, o sistema de saúde havia realizado 4,2 milhões de consultas. Em 2020, o número caiu para 2,8 milhões. E o sistema ainda não se livrou do abalo sísmico da covid.

As consultas continuavam baixas até julho, em 2021: 1,8 milhões. Veja no gráfico a involução percentual no número dos exames resultantes das consultas: biópsias, queda de 21%, exames de sangue para verificar o PSA, um marcador molecular do câncer, queda de 27%. Do ponto de vista da campanha de prevenção, a população deve ficar muito atenta a esse déficit no monitoramento, durante o qual os casos da doença não detectados progrediram, reduzindo a possibilidade de cura ou de um tratamento mais suave. É que, resume Canalini, “os hospitais e as clínicas voltaram-se ao atendimento basicamente da covid-19, em detrimento de atendimento de outras doenças”.

Mas os danos ao sistema de saúde não afetaram apenas o tratamento do câncer de próstata. É o que mostra outro estudo, mais amplo, sobre a forte retração do atendimento à população durante a pandemia. Utilizando dados do SIM – Sistema de Informações sobre Mortalidade, base também para as projeções da SBU –, uma equipe coordenada pelo especialista Nivaldo Alonso, do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da USP, em Bauru, debruçou-se sobre a queda no número total de cirurgias. Mais de um milhão delas foram canceladas ou adiadas, em 2020, entre as quais as do câncer de próstata. Os gráficos estão em nosso texto de 3/11 e foram também publicados na revista especializada Lancet.

O objetivo do grupo de Bauru foi justamente ajudar a enfrentar melhor situações extremas como as pandemias. A resposta não é surpresa para os defensores do SUS e sua ampliação: é preciso expandir o sistema. No caso das cirurgias, dar um resposta eficaz às emergências de saúde depende de fortalecer o sistema cirúrgico brasileiro. “Expandir a força de trabalho cirúrgica, não apenas em termos de números absolutos, mas também na distribuição dos cirurgiões pelo país; investir na capacidade hospitalar para garantir a disponibilidade de salas de operações, UTI e leitos”, recomenda o trabalho.

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