Europa deixa vacinas estragarem; África ainda sofre escassez

Covax continua com dificuldade de entregar vacinas às populações mais pobres, enquanto Europa vai deixar vencer 55 milhões de doses. Sustentar patentes é ajudar a manter alta mortandade de africanos

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As declarações da União Europeia a favor da igualdade vacinal soam como falácias após a denúncia feita pela People’s Vaccine Alliance de que 55 milhões de doses devem ir ao lixo no final de fevereiro, por passarem da validade. A entidade, um grupo de quase 100 organizações, incluindo African Alliance, Christian Aid, Oxfam e UNAIDS, levantou-se contra a paralisia da União Europeia em relação ao apartheid vacinal. O número de doses vencidas é quase o dobro do que o continente doou este ano à Covax, iniciativa da OMS que busca distribuir vacinas contra covid para países empobrecidos. Desde o início de janeiro, cerca de 7 mil africanos morreram por dia, devido ao surto da variante ômicron que foi primeiro identificada por cientistas da África do Sul. Em grande parte por falta de imunizantes: no continente africano, menos cidadãos receberam as duas doses da vacina do que o número de europeus que tomaram a dose de reforço.

As farmacêuticas e suas patentes têm um papel importante na perpetuação da desigualdade. Entre as iniciativas apoiadas pela Europa para “ajudar” a África, está a construção de fábricas da BioNTech que produziriam muito menos do que as que já estão em funcionamento na Alemanha. Por outro lado, Moderna e Pfizer não abrem mão de propriedade intelectual de vacinas que já renderam a elas lucros bilionários – e permitiriam à África a autonomia necessária para vencer a escassez. A União Europeia teve papel importante em bloquear a tentativa, encabeçada pela Índia e África do Sul, de quebra de patentes e de transformar os tratamentos contra a covid em bens comuns globais. Mas graças a cientistas sul-africanos, uma vacina de mRNA pôde ser criada por engenharia reversa, favorecendo o continente.

“A Europa deve parar de bloquear as tentativas de produtores africanos de fazer suas próprias doses de vacinas covid. Se realmente houvesse uma agenda comum entre a União Africana e a União Europeia, esta deixaria de colocar os interesses das empresas farmacêuticas, que colheram bilhões com a pandemia, à frente das vidas africanas”, afirmou Anna Marriott, Gerente de Políticas de Saúde da Oxfam. Ainda na denúncia feita pela People’s Vaccine Alliance, está o dado de que a doação financeira de 3 bilhões de euros feita à Covax – mas o recebido por meio de impostos com a venda de vacinas já ultrapassou a mesma quantia apenas na Alemanha.

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