Canabidiol chega ao SUS de São Paulo

• Especial: os avanços da maconha medicinal • Saúde bucal recebe novo aporte do governo • Nova lei garantirá transporte de órgãos mais eficiente •

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“Nosso produto já foi entregue à Secretaria Estadual de Saúde. Imagino que haja um período de treinamento para prescrição e organização da distribuição antes de efetivamente chegar ao público, mas as entregas devem começar nos próximos dias”. Foi esta a novidade contada por Gustavo Palhares, CEO da Ease Labs, a respeito da experiência de sua empresa no processamento e distribuição do CBD que chegará ao SUS paulista. Sua fala fez parte da palestra SUS, a nova fronteira da cannabis?, parte da programação do primeiro dia do 3º Congresso Brasileiro de Cannabis Medicinal. Realizada no Expo Center Norte, em São Paulo, até este sábado, o evento conta com módulos voltados à medicina humana, veterinária, agricultura e negócios.

A Ease Labs venceu licitação do governo do estado, após aprovação da lei 17.618/23 e agora fornece os medicamentos derivados da maconha ao SUS no estado de São Paulo. Como sugere o evento e diversas de suas palestras, o Brasil está praticamente marginalizado do universo que já enxerga a maconha como um ramo que aglutina diversas dimensões da vida social e econômica. Dessa forma, ainda tem muito a avançar em sua indústria nacional, como explicou Palhares. “Falta avançar na produção nacional, mas já há condições de fazer o processo produtivo aqui. Fazemos a importação do insumo bruto, processamos, produzimos e entregamos aqui. De fato, só poderemos ter uma fabricação robusta com produção nacional”, completou.

Deputado quer mais avanços legais

Também presente a esta palestra, o deputado estadual Caio França (PSB) é o autor da lei que introduziu o CBD no tratamento de três doenças neurológicas no SUS: as síndromes de Dravet, Lennox-Gastaut e esclerose tuberosa. No entanto, como deixou claro a própria plateia presente ao auditório, a pressão pela ampliação do escopo de doenças tratáveis com CBD é grande. Mais especificamente, epilepsia e TEA contam com forte apoio social para serem incluídas no rol de tratamentos com CBD garantidos no SUS.

“Temos um case de sucesso, mas ainda precisamos avançar. Foram três anos e meio para avançar com a lei 17.618, foram 25 pedidos de vista. Pedi ajuda a conselhos de medicina, não consegui, mas OAB e outras associações apoiaram”, explicou França, que em sua participação destacou as barreiras colocadas pelo conservadorismo na trajetória de aceitação dos derivados da maconha.

Agora, o deputado tem um projeto de liberação de autocultivo em elaboração, o que certamente mobilizará agendas ideológicas, a exemplo do que se viu em Brasília nesta semana, quando a CCJ da Câmara dos Deputados realizou audiência sobre PEC que visa endurecer a guerra às drogas, enquanto o STF tenta relaxar a repressão a usuários de maconha.

Experiências reais para vencer preconceitos

Conhecido no universo dos médicos que enfrentam o conservadorismo e lutam pela introdução da maconha nos tratamentos de saúde, o neuropediatra Eduardo Faveret foi dos primeiros a usar a maconha medicinal. Radicado em Búzios, o pesquisador da Fiocruz falou da resistência social e cultural, quebrada pelas histórias de melhorias reais na vida de pacientes que sofriam dores e doenças crônicas, a exemplo da epilepsia. “É uma história que tem 10 anos, e contou com a coragem de muitas pessoas desconhecidas que praticaram desobediência civil. Além dos bons resultados, estamos falando de produtos que têm qualidade se produzidos da forma correta. Vivo em cidade com bastante evangélicos, o que sempre levantou resistências. Tenho experiências de pastores evangélicos que sempre fizeram discursos contra a maconha e depois apareceram chorando, dizendo que maconha tinha salvado um filho”, relembrou.

Regulação, controle de qualidade e indústria nacional

Em linhas gerais, tanto os palestrantes como o público que interagiu, em parte formado por mães e familiares de pessoas que lutam pela liberação do uso de derivados da maconha na medicina e no SUS, convergem no apoio à ampliação do escopo de tratamentos e, principalmente, necessidade de o Brasil avançar em sua indústria nacional do ramo.

“Aqui temos problemas em relação a controle de qualidade, o que tínhamos à disposição não passava pela Anvisa e empresas forneciam produtos a preços altíssimos sem controle de qualidade e fiscalização. A Anvisa avançou nisso e agora consegue dar mais segurança aos produtos depois que fez uma regulamentação. A Anvisa e o Brasil mostram preocupação com o acesso, como se vê no modelo regulatório que se quer trabalhar. Além disso, o crescimento da judicialização começou a dar prejuízo aos estados, que perceberam que o custo das ações (impetradas por famílias que queriam acesso a tais tratamentos) não eram razoáveis”, complementou Gustavo Palhares.

R$ 4,3 bilhões para saúde bucal

Na terça, 22, foi realizada a tradicional marcha dos prefeitos em Brasília, evento institucional organizado pela Confederação Nacional dos Municípios. Lula aproveitou a ocasião para anunciar o aporte de R$ 4,3 bilhões na saúde bucal do SUS, cuja política foi reativada em 2023 através da reorganização do programa Brasil Sorridente. Os recursos serão destinados a equipe de saúde bucal (eSB), Unidade Odontológica Móvel (UOM), Centro de Especialidade Odontológica e Laboratório Regional de Prótese Dentária. Na nova versão do programa, há apoio também para municípios com menos de 20 mil habitantes, de maneira que o programa universalize territorialmente o acesso a serviços odontológicos. De acordo com o Ministério da Saúde, o incremento foi necessário para viabilizar na prática a política, uma vez que os valores anteriormente garantidos não efetivaram a contratação de equipes em todas as cidades.

Lula sanciona lei para transporte de órgãos

Proposta em 2015, a lei 2.288 foi promulgada pelo presidente da República na mesma tarde de terça-feira em que se encontrou com os prefeitos brasileiros. A lei regulamenta a obrigatoriedade, tanto para instituições públicas como privadas, em priorizar e garantir espaço para transporte de órgãos destinados a transplante. A norma vale para todos os tipos: terrestres, aéreos e aquáticos. Dessa forma, o Brasil estabelece mais um avanço em seu Sistema Nacional de Transplantes, a fim de incrementar o número de doadores. Em fevereiro, entrou em vigor a lei 14.722/2023, que criou a Política Nacional de Conscientização e Incentivo à Doação e ao Transplante de Órgãos e Tecidos, que visa estimular campanhas educativas e divulgação de informações a respeito da importância e segurança sobre este tipo de ação.

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