Convite a uma crítica anticapitalista mais aguda

Tendências opostas marcam a cena global, diz novo livro. Sistema se recicla: seu fim não é iminente, mas cresce a rejeição a suas lógicas. Proposta para ampliá-la: desaprisionar subjetividades; e explorar brechas para outros mundos possíveis

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Esta é a introdução de Adeus ao capitalismo: autonomia, sociedade do bem viver e multiplicidade dos mundos, de Jérôme Baschet, publicado pela Autonomia Literária, parceira editorial de Outras Palavras. Quem apoia nosso jornalismo de profundidade e sem catracas tem desconto de 25% na loja da editora. Saiba como colaborar

Nós estamos incrustados na realidade. Ela cola na pele, como uma vestimenta impossível de arrancar. Em um mundo que se gaba da flexibilidade e da fluidez, a realidade constituiu-se paradoxalmente como uma matéria cada vez mais densa e pesada; mesmo sua complexidade reticular foi colocada a serviço da onipotência tentacular. Ela multiplica as armadilhas da coerção, da urgência e da inelutável adaptação a processos globalizados sobre os quais ninguém poderia ter controle. A fatalidade sistêmica reina e os movimentos incessantes de um mundo mutável e líquido não são nada mais do que a plena realização dessa fatalidade.

A adesão à realidade pode, claro, tomar formas diversas, nas quais têm um lugar variável o imperativo de sobrevivência, o tremeluzir de modelos de ascensão social, as seduções viciantes do consumo, os pequenos privilégios de uma vida um pouco confortável, as armadilhas de uma lógica concorrencial que nos obriga a crer que não haverá lugar para todo mundo, o medo de perder o pouco que se tem e o sentimento de uma insegurança meticulosamente manutenida. Mesmo uma boa dose de ceticismo, ou até mesmo uma sólida capacidade crítica, não ferem, no mais das vezes, essa adesão a um sistema que renunciou, talvez, a nos convencer das suas virtudes para se contentar em aparecer como a única realidade possível, fora do caos absoluto, como resume a sentença emblemática de François Furet: “Nós estamos condenados a viver no mundo no qual vivemos”. (1) Não há alternativa (2): tal é a convicção que as formas de dominação atuais conseguiram disseminar no corpo social. Para além das opiniões de cada um, essa é a norma de fato, em virtude da qual o agir está em conformidade com uma implacável lógica de adequação à realidade socialmente constituída.

Entretanto, esse belo edifício começou a fissurar. O apogeu disso que, nos anos 1980-1990, chamava-se pensamento único, já ficou para trás. Um pouco de caminho foi percorrido desde o momento em que o recrudescimento do fim da história passava por uma evidência quase incontestada. O ciclo do refluxo da crítica social, preparado por volta de 1972-1974 e lugubremente amplificado nas décadas do triunfo neoliberal, conheceu seus primeiros reveses a partir de meados dos anos 1990 (notadamente o levante zapatista em 1994, as greves de dezembro de 1995 na França e as mobilizações de Seattle em 1999). Iniciou-se então um outro ciclo, marcado pela forte ascensão das críticas ao neoliberalismo e pela emergência de redes altermundialistas cuja aspiração a “um outro mundo possível” constituiu uma arma eficaz contra a suposta inelutabilidade da ordem neoliberal. Emergiram atores até então pouco visíveis (os excluídos, os “sem” [alguma coisa], os migrantes, os povos indígenas…), e também novas formas de organização e maneiras diferentes de conceber as lutas (assumidas em sua pluralidade e complementaridade, sem hegemonismo e com o intuito de defender a integralidade da vida).

Quaisquer que sejam os limites desses movimentos, os anos 2000 foram marcados por uma retomada de criatividade crítica e por uma nova radicalização. Um indício entre outros, mínimo, mas revelador, é a ressurgência do termo “capitalismo”, que o triunfo do pensamento único havia conseguido transformar em um arcaísmo inconveniente, senão francamente obsceno. (3) Ora, esse termo é suscetível de mobilizar um forte potencial crítico, pois ele permite nomear a própria realidade segundo uma lógica distinta daquela pela qual essa mesma realidade tenta se impor a todos. (4) Seus detratores estavam em uma boa posição para denunciar uma terminologia redutora, operando uma abusiva unificação da realidade.

Eles fingem ignorar que uma verdadeira análise das dinâmicas do capitalismo (uma forma de organização social e não somente um sistema econômico) deve fazer com que apareça a sua complexidade, as suas contradições e as suas mutações incessantes. O que não impede que esse termo, associado às análises críticas necessárias, possua a temível eficácia para designar as lógicas dominantes (nem absolutas, nem únicas) que se impõem em todos os campos de nossa realidade presente. Dando um nome comum ao que é rejeitado, o termo pode constituir um terreno de reunião de lutas múltiplas. Além do mais, a noção é implicitamente portadora de seu contrário e o anticapitalismo retornou efetivamente em várias regiões do globo, em meados dos anos 2000, à medida que uma luta atrelada à denúncia das formas neoliberais do capitalismo começava a mostrar seus limites. Falar de anticapitalismo suscita, por vezes, reservas, e algumas pessoas ficam constrangidas pelo caráter negativo do termo. Mas, nesse caso, é se apegar à forma visível da expressão, que contém na realidade, e indissociavelmente, a afirmação de um projeto alternativo, o qual não poderia ser defendido sem rejeitar ao mesmo tempo o que o nega. A negação do mundo da negação é o ponto de ancoragem concreto do impulso emancipador.

Enquanto a partilha das experiências e a malha das lutas se amplia, a crítica anticapitalista tende a ganhar em acuidade. Um passo importante consiste em se situar cada vez mais resolutamente na perspectiva de uma superação do capitalismo, pois dá praticamente na mesma nos acabar de tanto denunciar seus crimes, curvando­-nos finalmente diante da sua aparente invencibilidade, ou adiando sua superação hipotética indefinidamente a pontos tão distantes. A crítica, então, não serve senão para tentar promover acomodações no seio do próprio capitalismo ou, segundo a expressão consagra­da, para limar os ângulos mais agudos do neoliberalismo. É um anticapitalismo inconsequente que qualificaremos de capitulismo (5).

Para combater o capitulismo tão largamente disseminado, não é inútil intensificar a reflexão sobre as alternativas ao capitalismo e as potencialidades que sua superação abriria. Aliás, convocar outros mundos possíveis (não capitalistas) acentua a relativização do estado presente das coisas e libera uma fonte de energia suscetível de abalar sua suposta invencibilidade. Afinar a crítica do existente e dar consistência a universos alternativos são meios complementares de fazer vacilar e de enfraquecer o modo de produção dominante da realidade. Por um caminho ou por outro, trata-se de trabalhar para nos descolarmos da realidade ao redor, tanto interiormente, o que está longe de ser simples, quanto praticamente, na medida do possível. Pela crítica, a lama espessa que cola nos nossos sapatos pode voltar a ser poeira, cair por si mesma e cessar de nos paralisar…

Outros possíveis já começaram a tomar forma e é no solo dessas experiências concretas e de sua criatividade que convém enraizar a reflexão. Assim, nos apoiaremos, no capítulo 2, na análise da construção de uma autonomia rebelde nos territórios zapatistas de Chiapas que proporemos considerar, apesar de sua modéstia aparente, como uma das mais notáveis “utopias reais” implementadas atualmente no mundo. (6) Sem ter de forma alguma vocação para se converter em modelo, essa experiência de autogoverno, amadurecida e aprofundada ao longo de mais de uma década, pode constituir uma fonte de inspiração para pensar uma forma política não estatal, fundada na desespecialização e na reapropriação coletiva da capacidade para participar das tomadas de decisão.

Será preciso, em seguida, no capítulo 3, aventurar-se mais longe e explorar as potencialidades humanas e civilizacionais às quais se abriria uma sociedade liberada da tirania da economia capitalista e de sua engrenagem produtivista-destrutiva: tratar-se-á principalmente de pensar uma organização social capaz de submeter as necessidades produtivas ao princípio do “bem viver” para todos e às decisões coletivamente assumidas que se seguem. Enfim, considerando que não haveria como existir uma via única para sair do capitalismo, será necessário, no capítulo 4, colocar em diálogo os anticapitalistas do Norte e do Sul. (7) Com efeito, muitas críticas conduzidas no Norte permanecem fechadas demais nas categorias ocidentais e na análise das realidades específicas de um universo investido de uma posição nevrálgica, mas que, todavia, é cada vez mais relativo na escala da população mundial. Quanto àquelas que se elaboram no Sul, elas deslizam por vezes da crítica da dominação colonial-capitalista para a denúncia de um Ocidente substancializado. Tais posturas bem poderiam fazer surgir novas falhas no seio das dinâmicas anticapitalistas. É, pois, indispensável criar as condições de uma verdadeira interculturalidade que não repousaria nem sobre as sobras do ocidentocentrismo, nem sobre a (de)negação do Ocidente.

É preciso, entretanto, começar, no primeiro capítulo, pela crítica do existente. Esta pode ser encaminhada sobre diversos registros. (8) Assim, podemos tentar fazer aparecer as contradições internas do capitalismo e mostrar os limites objetivos contra os quais ele tende a colidir. Esse tipo de crítica se beneficiou de um novo ganho de credibilidade por conta da crise econômica e financeira aberta em 2008. É evidente que a crise desvela as graves disfunções de um sistema que se autocompraz habitualmente de sua eficácia. Ao mesmo tempo, a crise ecológica aponta limites geológicos e ambientais inegáveis. Essa forma de crítica geralmente é creditada a uma maior objetividade, na medida em que ela se inscreve na ordem dos fatos mais do que naquela dos julgamentos de valor. Entretanto, o aparente rigor reivindicado por esse tipo de crítica não deixa de ter algumas armadilhas. Ela esteve, no passado, estreitamente associada ao caráter inelutável do desmoronamento do capitalismo, o qual, cada um sabe, cavava por si mesmo sua tumba e armava os braços de seus próprios coveiros… A vocação “suicida” do capitalismo, a demonstração “científica” de seu fim programado, ou mesmo a inscrição desse fim no registro das leis da História viriam assim validar a postura crítica. Contudo, há um século e meio, tais profecias, fundadas na exacerbação das contradições internas do capitalismo, não cessaram de ser desmentidas, pois, ao longo das crises e das guerras que balizaram seu percurso, este conseguiu dar vida a novas configurações nas quais as contradições das formas anteriores podiam ser ultrapassadas, ao menos em parte, sem conduzir à superação do próprio sistema capitalista. Sua temível plasticidade e sua espantosa capacidade para transformar em mercadorias até elementos que o contestam ou o colocam em dificuldade (incluindo os limiares ecológicos) permitem vislumbrar que lhe seja possível contornar os limites que fazem estrebuchar o modo de produção atual. Não há sombra de dúvidas que o custo humano e ambiental deva ser constantemente mais alto, mas isso não é suficiente para recolocar em questão a capacidade de reprodução do capitalismo apesar de tudo. Assim, mesmo que a crítica do capitalismo, fundada na identificação de suas contradições internas, seja completamente necessária, ela pode também revelar-se enganosa quando afirma jogar com um efeito de seriedade e se impor pela sua aparente objetividade. (9)

Em todo caso, essa crítica não pode bastar por si mesma. Mesmo que deva tirar proveito da revelação das disfunções do sistema e das dificuldades crescentes de sua reprodução, a crítica anticapitalista do capitalismo (10) repousa também sobre um julgamento ético. O que a funda é a injustiça de um sistema que reparte os recursos materiais e imateriais de maneira fortemente assimétrica, esforçando-se ao mesmo tempo para ocultar a desigualdade social sob o véu da igualdade formal ou de minorá-la graças ao mito (um pouco desgastado) do elevador social. Mas, se a injustiça é sofrida antes de tudo por aqueles que ocupam as posições menos favorecidas, outros desafios, cada vez mais prementes, concernem uma parte crescente da humanidade. O que aparece então em primeiro plano é o caráter destruidor do capitalismo. A incerteza quanto às condições de sobrevivência da espécie humana, (11) devido aos graus de predação e de degradação ecológica atingidos, está em vias de se tornar um dos recursos mais potentes da crítica anticapitalista, como será sublinhado no capítulo 5. Ela deveria poder mobilizar a seu favor o instinto de sobrevivência da humanidade, com a condição, no entanto, de ser capaz de argumentar que não há saída para essa espiral destrutiva dentro do próprio capitalismo.

Mas o capitalismo não destrói somente a biosfera. Já faz um certo tempo que Félix Guattari identificou os três campos nos quais a intensificação da dominação capitalista produz seus efeitos devastadores: destruição do meio ambiente, destruição dos laços sociais (em benefício de uma atomização individual) e destruição das subjetividades (degradação da experiência, recrudescimento das patologias psíquicas, sentimento de despossessão e sensação de um “imenso vazio na subjetividade”). (12) Ele nos convidou a entender as relações entre três aspectos: devastação da natureza, destruição no âmbito social e colapso no íntimo, no coração do sentimento de si. Por conseguinte, mesmo para além do sobressalto possível de uma humanidade que se recusa a produzir as condições de sua autodestruição, é o próprio sentido do humano que se encontra mobilizado contra a expansão sem limite das relações mercantis e seus efeitos mórbidos, contra a sensação de despossessão que, sob múltiplas formas, se imiscui por toda parte. Da lacuna que se tornou tão óbvia entre o que engendra a lógica da mercadoria e as necessidades humanas elementares nasce igualmente um sentimento de absurdidade, marca de um sistema que produz para a destruição e cujas promessas de crescimento e de bem-estar tendem a um crescimento do mal-estar e na desumanização. É mais do que provável que a generalização do princípio do valor (que faz do dinheiro o equivalente geral e a medida de tudo) e sua extensão ao conjunto dos territórios do humano e da natureza (onde essa medida parece inconveniente, senão insustentável) estejam na base desse sentimento de absurdo.

É preciso continuar a reproduzir uma separação entre a denúncia ética do capitalismo e uma crítica racional, exibindo os sinais de seu rigor e ostentando os indícios de sua competência? Não haveria alguma vantagem em admitir que os dois procedimentos podem se entrelaçar e fruir de sua complementaridade? A dissociação entre a parte racional e a parte emocional da pessoa não funciona mais. No lugar de serem pensadas como exclusivas, elas deveriam se reunir e se nutrir. É por isso que, se as análises propostas aqui se esforçam para ser tão argumentadas quanto possível, admitir-se-á que elas se enraízam na recusa de um sistema de exploração, de opressão, de despossessão e de desumanização. O que dá sentido à crítica, tal como a entendemos neste livro, é antes um grito, como o “¡Ya Basta!” dos insurrectos zapatistas. (13)

Não salvemos o capitalismo, salvemo-nos dele! Na Colômbia, jovens iludidos com a promessa de um trabalho são conduzidos para longe de suas casas e depois abandonados no meio do nada, onde são abatidos como coelhos por militares que, inscrevendo essas mortes no seu ranking, garantem uma boa avaliação e vantagens materiais correspondentes. (14)

Na Itália, os sindicatos obrigam os trabalhadores da indústria automotiva a aceitarem suas demissões para em seguida assinarem novos contratos prevendo salários inferiores e benefícios reduzidos. No Japão, um quarto das secundaristas se prostitui para comprar maquiagem e roupas da moda. Na França, estudantes são agredidos por outros que querem seus MP3 ou seus calçados de marca. No México, mais de um terço das crianças sofrem de obesidade, mas os parlamentares repudiam uma lei visando limitar a publicidade de produtos alimentares industrializados (difundidos nos principais canais em um ritmo frenético de programação infantil). No mundo todo, camponeses, vítimas da propagação de pólen transgênico que contamina suas próprias sementes, são obrigados a pagar multas aos gigantes agroalimentares ou são presos por usarem produtos sob patente quando queriam, na verdade, se proteger deles. Por toda parte, as companhias aéreas calculam a melhor relação entre as despesas de manutenção dos aviões e o custo dos acidentes, sabendo que a baixa dos primeiros aumenta a probabilidade desses últimos, de modo que as vidas humanas se tornam um simples parâmetro econômico.

A amostragem das aberrações que proliferam na geografia do mundo atual poderia continuar quase sem fim. A cada vez, uma mesma lógica: aquela do dinheiro, e o imperativo do lucro que supera as mais elementares exigências de saúde, de vida e de preservação dos equilíbrios ecológicos. Mas, o mais grave é que essas normas se difundem no corpo social indo até as subjetividades individuais. Nós medimos o que somos de acordo com o que temos. Sacrificamo-nos ao culto das aparências e à obsessão da performance. Em toda parte, dos exércitos colombianos às universidades e aos hospitais europeus, devem reinar os mesmos critérios e os mesmos comportamentos que nas empresas e nos supermercados: quantificação, eficácia, rentabilidade, avaliação dos resultados. A lógica mercantil aprofunda a cada dia um pouco mais a amplitude do desastre. E os exemplos mencionados há pouco não são nada comparados com a catástrofe ecológica que o produtivismo capitalista desencadeou e que, prevalecendo a exigência do lucro a curto prazo, ele não terá como impedir.

Como a própria existência da espécie humana está em perigo, o desafio ecológico obriga a reconfigurar todas as nossas análises. Se nós não nos livrarmos do capitalismo, é ele que nos destruirá. É, pois, urgente alargar o “nós” de todos aqueles que estão dispostos a partilhar esse “não” ao capitalismo. Clamar e assumir a recusa de uma sociedade baseada na mercadoria, que rouba nossas vidas e faz de nós despossuídos: despossuídos de nosso trabalho, de nosso tempo, de nossa criatividade, de nossa humanidade, de nossa capacidade de partilhar, de nossa dignidade. Uma sociedade na qual mesmo aqueles que acreditam salvar a própria pele podem perder tudo no jogo louco de roleta em que se multiplicam egocentrismos agressivos, solidões depressivas e falsos desejos viciantes, ausência de comunidade e vacuidade no fundo do ser.

Nós não estamos mais dispostos a sacrificar pela divindade Mercadoria, nem a confiar o controle de nossas existências aos grandes sacerdotes da Lei do dinheiro. Nós não estamos mais dispostos a engolir nossa cólera, a nos submetermos ao inaceitável em nome de um realismo que se tornou criminoso, nem a conjugar lucidez crítica e resignação prática.

Uma cólera digna ruge. Ela diz não ao capitalismo e sim a outros mundos possíveis. Ela sabe que a luta contra o capitalismo é a luta pela humanidade.

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(1) François Furet, Le Passé d’une illusion. Essai sur l’idée communiste au XXe siècle, Robert Lafont – Calmann-Lévy, Paris, 1995, p. 572.

(2) A célebre tina (There is no alternative), de Margaret Thatcher.

(3) Em favor da crise econômica de 2008, a palavra voltou até mesmo no discurso oficial e midiático, o que é talvez uma maneira de tentar desarmar a força crítica que esse termo começava então a encontrar.

(4) É o termo democracia (amplamente esvaziado de seu sentido) que ordena a denominação dominante da realidade. Para esta, “nós vivemos em democracias”, e não em um sistema capitulista.

(5) n.t.: termo que tanto em francês quanto em português provém do verbo “capitular” (capituler), que significa rendição.

(6) Referimo-nos aqui à expressão proposta por Erik Olin Wright, mesmo se não partilhamos do conjunto de suas visões, notadamente a maneira como ele concebe uma organização alternativa (socialista) ou ainda a possibilidade de formas utópicas se desenvolverem no seio do capitalismo e em simbiose com ele (ver, em francês, “En quête d’une boussole pour l’émancipation. Vers une alternative socialiste”, <www.contretemps.eu/interventions/ en-quête-dune-boussole-émancipation-vers-alternative-socialiste-0>, e Vincent Farnea et Laurent Jeanpierre, « Des utopies possibles aux utopies réelles. Entretien avec Erik Olin Wright », Tracés, « Réalité(s) du possible dans les sciences humaines et sociales », n. 24, 2013, p. 231-243).

(7) Admitiremos prontamente que a oposição do Norte e do Sul perdeu sua nitidez e precisa ser repensada.

(8) Sobre os registros da crítica e das diferentes maneiras de afrontar a constituição da realidade, ver Luc Boltanski, De la critique. Précis de sociologie de l’émancipation. Gallimard: Paris, 2009.

(9) Na verdade, a distinção seguinte se impõe: uma coisa é analisar as contradições internas do capitalismo a fim de comprovar a compreensão de suas dinâmicas e estar mais apto a esboçar as condições de sua eventual superação; uma outra é declinar essas contradições em termos de limites absolutos, condenando o capitalismo a um fim inelutável (e anunciado em um prazo mais ou menos breve).

(10) Essa aparente tautologia é de fato necessária para se diferenciar do capitalismo.

(11) Ver, por exemplo, Yves Paccalet, L’Humanité disparaîtra, bon débarras!, Arthaud, Paris, 2006.

(12) Félix Guattari, Les Trois Écologies, Galilée, Paris, 1989, onde – para retornar ao ponto evocado no parágrafo precedente – ele afirma também: “É preciso, uma vez mais, invocar a História? Ao menos para o risco de não haver mais história humana sem uma radical retomada da humanidade por ela mesma” (p. 71). [Em português: As Três Ecologias, Papyrus, 1990].

(13) Nem todos os aspectos que implicam na realização dessa sociedade poderão ser abordados neste livro. Apesar de estritamente essenciais, as questões relativas à abolição das formas de dominação e de divisão ilegal das tarefas entre homens e mulheres e, mais amplamente, ao status da distinção de gênero são deixadas em aberto às reflexões conduzidas por outros autores. Cada um e cada uma pode se referir, dentre os inúmeros autores e as inúmeras autoras, àqueles ou àquelas a quem ele ou ela se sente mais próximo ou próxima.

(14) Como essa prática, dita dos “falsos positivos”, foi revelada publicamente, o presidente Álvaro Uribe foi obrigado a destituir, em 29 de outubro de 2008, três generais e vinte e quatro outros oficiais.

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