Vale: o cassino financeiro derruba barragens

“Acidentes” explodiram quando mercado exigiu aumento da produção de minério de ferro. Mas mortes e destruição ambiental não significaram perdas reais de capital da mineradora. Acordo firmado com MG serviu, sobretudo, ao governo Zema

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Por Pedro Rodero

No dia 4 de fevereiro de 2021 a imprensa brasileira noticiou que a Vale S.A., a segunda maior mineradora do mundo, finalmente assinou um bilionário acordo com o governo do estado de Minas Gerais para reparar os danos socioeconômicos e socioambientais causados pelo rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, acidente ocorrido em 25 de janeiro de 2019. No acordo, a Vale se compromete a transferir R$37,68 bilhões (parte considerável de seu lucro, mas não de seu patrimônio acionário)1 para o Tesouro do Estado de Minas. O acordo também encerra a Ação Civil Pública (ACP), na qual o governo estadual era um dos autores. As negociações começaram em abril de 2019, e o governo estadual exigia uma indenização de R$55 bilhões de reais, preço estimado pela Fundação João Pinheiro, sendo 28 bilhões pelos “danos morais”, e outros 27 bilhões em decorrência dos “danos socioeconômicos” às dezenas de milhares de famílias atingidas.

A Vale não concordou com o valor e conseguiu baixar a indenização para R$37,68 bilhões de reais. Este é o maior acordo judicial como medida de reparação por um crime socioambiental realizado na América Latina.

Ainda que as ações individuais (que buscam novas indenizações e tentam criminalizar a Vale em outras ações) continuem tramitando na justiça de Minas, o acordo praticamente coloca fim à possibilidade de que surjam outras ações coletivas por parte dos grupos atingidos. Agora eles não terão mais o anteparo da ACP, na qual, além do governo de MG, outras Instituições de Justiça figuravam como co-autoras: o Ministério Público de MG (MPMG), o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública de MG.

O Procurador-Geral do MPMG, Jarbas Soares Junior, afirmou que o valor do acordo representa 40 anos do orçamento estadual e o governador, Zema (Novo) comemorou dizendo que “Nunca no Brasil se fez um acordo dessa magnitude. Iniciamos agora um novo desafio de darmos início a essas obras”.

Parte da comemoração por parte do governo se justifica. Apenas 30% do valor será destinado ao município de Brumadinho, enquanto R$4,95 bilhões de reais serão destinados a obras de infraestrutura em outras regiões do estado. A principal delas, um rodoanel na região metropolitana de Belo Horizonte. Outros R$9,17 bilhões serão destinados ao Programa de Transferência de Renda às famílias atingidas que irá substituir o atual Auxílio Emergencial, que a Vale queria há alguns meses extinguir embora o término previsto era fevereiro. Outras fatias destes R$37,68 serão utilizadas para reparação socioambiental (R$6,55 bilhões), segurança hídrica em Belo Horizonte (R$2,05 bilhões), investimentos em hospitais e escolas da região (R$4,37 bilhões), além da obrigatoriedade da Vale em contratar uma auditoria independente que acompanhe as obras durante. O prazo de validade do acordo é de 10 anos.

Porém, além das 270 mortes dos próprios funcionários da Vale que morreram no dia do rompimento, não é possível calcular ainda os danos materiais e morais às mais de 170 mil pessoas que moram (ou moravam) ao longo da calha do Rio Paraopeba, onde desaguaram os rejeitos depois do rompimento da barragem. Calcular os danos aos atingidos/as é um dos trabalhos que vinham sendo realizados pelas três Assessorias Técnicas Independentes (ATIs), no âmbito da Ação Civil e que, agora, tendem a se encerrar.

O acordo e as ações da Vale: uma relação distante

No mesmo momento em que se anunciava a assinatura do acordo as ações da mineradora chegaram a subir 2%, isto levava a crer que uma onda de alta no patrimônio acionário seria impulsionada com a notícia. Parte da imprensa especializada2 já dava conta de outros fatores por trás da volatilidade no preço das ações da Vale. A China, principal importador do minério brasileiro, prevê redução de sua atividade industrial nos próximos meses (somando-se ainda o fato de que nos próximos dias, o gigante asiático terá um prolongado feriado por conta do “Ano Novo Lunar” que se inicia em 12 de fevereiro). Apesar da euforia inicial, as ações da mineradora, contudo, fecharam o pregão do dia 4 com uma queda de 1,26%, com R$89,29/ação.~;] /

9*-O minério de ferro é uma commodity. Nesta condição, seu preço é determinado nas bolsas de valores, não apenas do Brasil. Nas últimas duas décadas o preço médio de muitas commodities atravessou dois cenários opostos. No primeiro, que ficou conhecido como “Boom das Commodities”, cujo início foi 2002 e estendeu-se até 20083, commodities como minério de ferro, ouro, soja, milho, café, trigo e algodão, tiveram um aumento de preço crescente. O minério de ferro chegou a atingir mais 190 dólares a tonelada pouco antes de setembro de 2008.

A partir do final daquele ano inicia-se o movimento contrário: o da queda no preço médio das commodities e que passou a ser chamado de “Pós-Boom”.4 Aquele momento estendeu-se por dez anos, até meados de 2018, quando as commodities passaram por nova alta nos preços. O minério de ferro, inclusive o que a Vale produz, também acompanhou aquela alta, mas não teve a mesma queda em 2008. Seu preço, logo depois da manifestação da crise, voltou a subir, e manteve-se alto até 2011 quando, enfim, inicia-se a fase contrária: de queda no preço. O gráfico abaixo ilustra estes dois períodos, de alta e baixa, além do terceiro, iniciado em 2018: o de retomada da alta dos preços.

Fonte: Banco Mundial. Elaboração própria.

Atualmente (janeiro de 2021), o preço médio da tonelada do minério de ferro está em US$145 dólares. Esta foi uma das determinantes para que as ações da Vale, ao longo de 2020, tivessem o sétimo maior crescimento de patrimônio acionário entre as empresas cotadas na Bolsa de São Paulo (B3): 74%! Não foi o acordo com o governo de Minas que provocou um aumento momentâneo de suas ações: mas sim o preço médio do minério de ferro que ainda está em patamares elevados. Até porque, no mesmo dia do acordo, ela fechou em queda.5

Deste quadro mais geral, pode-se chegar a algumas conclusões imediatas. Em primeiro lugar, a mais óbvia.

O acordo não resolverá o problema dos atingidos e atingidas, mas sim o da Vale com a justiça. Por mais evidente que pareça não custa lembrar que 270 pessoas morreram naquele “acidente”. E, se a Vale foi condenada pela justiça a indenizar as famílias, e se ela assina um acordo em que transfere R$37,68 bilhões de parte do lucro ao Tesouro estadual, reconhecendo, portanto, sua responsabilidade, conclui-se que o rompimento da barragem em Brumadinho não foi um acidente. Foi um crime.

Segunda conclusão: o mercado financeiro não estava preocupado pelo acordo. Os grandes fundos de investimento, as grandes corretoras e mesmo pessoas físicas que ingressaram na Bolsa de Valores (ou seja, o “mercado financeiro”) não aguardava o final do acordo para “apostar” nas ações da Vale. Isso já vinha acontecendo ao longo de 2020, como revela o colossal crescimento do patrimônio acionário da Vale.

Terceira conclusão: o mercado financeiro segue a lógica do capital fictício. O que determina o crescimento do patrimônio acionário da empresa são alguns fatores que, nesta ordem, articulam-se de maneira contraditória. Primeiro fator. O patrimônio acionário de uma empresa é, por definição, capital que opera na forma funcional conhecida como “capital fictício” (ideia inicialmente desenvolvida por Marx, em seu livro 3 de “O Capital”).6 Ou seja quando uma empresa abre seu capital na Bolsa de Valores realizando uma operação chamada de I.P.O. (Initial Public Offering, que na tradução direta significa Oferta Pública Inicial), ela nada mais faz que duplicar seu capital. Cria-se, assim, capital fictício. E faz isso com o aval do Estado, pois é ele quem regulamenta a abertura de capital (pois a empresa reúne, em tese, as qualidades necessárias para ingressar no mercado acionário).

Assim, no caso da Vale, além do “patrimônio real” da empresa (que reúne parcelas do solo e subsolo brasileiro, equipamentos, instalações e força de trabalho), a empresa também contabiliza o patrimônio das suas ações (riqueza duplicada sobre aquele capital real quando ela realizou seu IPO. pouco depois de sua privatização em 1998). A lógica de crescimento ou contração do capital acionário de uma empresa não acompanha, necessariamente, o movimento do capital da empresa em si. Em geral, ambas caminham em ritmos e direções distintas. Assim, no mesmo dia em que a Barragem de Brumadinho rompeu, suas ações despencaram mais de 20%. O rompimento, por sua vez, não significou um prejuízo de um quinto de seu patrimônio real.

Segundo fator. O mercado financeiro7 (e o mercado acionário em seu interior) é, pela sua própria lógica, extremamente volátil. A Vale fechou o pregão do dia 3 de fevereiro com um crescimento de 3,9%. Porém, no dia anterior, teve uma queda de 3,12%. Olhando para os pregões dos últimos dois meses, a Vale chegou a bater pouco mais de R$102,00/ação na primeira semana de janeiro. Desde aquele teto, porém, o preço médio da tonelada estava em queda desde a metade de dezembro. Depois da primeira semana de janeiro de 2021, o preço das ações da Vale entrou em trajetória decrescente, chegando a bater pouco menos de R$88,00/ação, queda de 14% em menos de um mês! Enquanto o preço médio da tonelada subia, as ações caíam. Agora que o preço da tonelada está estacionado, as ações ensaiam uma leve alta. O ritmo de crescimento do patrimônio real interfere no patrimônio acionário. Mas, como vimos, caminham em ritmos bem diferentes. O que ocorreu neste intervalo?

Terceiro fator. A demanda chinesa por minério de ferro brasileiro está caindo. E, como sabemos, quando a demanda por uma mercadoria diminui, seu preço tende a cair (ainda mais quando quem demanda esta mercadoria é seu principal comprador).8 E a demanda chinesa está caindo porque o governo do Partido Comunista Chinês está reduzindo o ritmo do crescimento industrial no país asiático.

Estes fatores, combinados nesta ordem, concorrem para o aumento ou queda no preço médio de uma unidade de medida (saca, quantidade de quilos, tonelada etc.) de determinada commodity. Ocorre que, na fase atual do capitalismo, um ativo real (a commodity), tem a determinação do seu preço nas negociações que ocorrem nas Bolsas de Valores. É o mercado financeiro que determina o ritmo e o sentido da produção de mercadorias. E não o contrário.

Para ficar mais claro, a oferta e demanda por mercadorias como as commodities, determinam o preço, não seu custo de produção, nem mesmo seu valor. Ocorre que esta negociação que produz um “preço médio”, ocorre nas bolsas de valores. Isto faz com que, em outro exemplo, a saca de café, de pequenos produtores rurais da Zona da Mata mineira, em algumas conjunturas, seja vendida abaixo do custo de produção. Porque estes produtores não têm uma influência direta sobre o preço médio da saca de café. Quem determina este preço é a negociação que ocorre entre grandes importadores e exportadores de café, seja na bolsa brasileira ou de outro país.

Adicionalmente, as commodities ainda têm outro mercado, também negociado nas bolsas: o Mercado Futuro. Nele, chega-se ao acordo que vai determinar o preço médio de determinada commoditie que ainda vai ser produzida e entregue, seja em julho, em setembro, em novembro, e assim por diante. O rompimento de uma barragem pode elevar ainda mais o preço médio no Mercado Futuro da tonelada de ferro (em decorrência da paralização parcial das atividades de uma mineradora, e consequentemente, da queda da oferta quando a mineradora tem um peso muito grande sobre a produção nacional).9

Quarta conclusão: a ampliação da dependência social. Com tudo isso, o caso da Vale possibilitaria um “estudo de caso” que revela, por sua vez, a histórica dependência da economia brasileira.

Assim, chegamos ao cenário atual. A economia brasileira ampliou sua dependência em relação ao setor de commodities. Elas cresceram, tanto no PIB10 quanto na pauta de exportações11 (e isso ocorreu mesmo no período do “Pós-Boom”).

No período recente, depois de 2018, quando o preço médio da tonelada do minério de ferro voltou a subir, a Vale e as outras grandes mineradoras que operam no Brasil deram-se ao luxo de voltar a reduzir o ritmo da produção, mesmo assim o faturamento não baixou.

Destaque-se que, enquanto os preços das commodities estiveram em patamares elevados (durante o período do “Boom”), a produção de minério de ferro caiu. Com a queda no preço (no “Pós-Boom”), a produção subiu novamente.12 Foi naquele momento que inúmeras barragens se romperam, em decorrência da intensificação do ritmo de trabalho e da redução das normas regulatórias e da fiscalização na segurança com que as barragens operam (ou operavam, no caso das já desativadas).

E o impacto disso se revela nos inúmeros acidentes e rompimentos de barragens (o Brasil tem um grave acidente em barragens a cada dois anos).13 Existem inúmeros dados gritantes, mas convém mencionar alguns deles. Três quartos das barragens em operação não possuem dados completos para que possam ser monitoradas pela Agência Nacional de Mineração (ANM). Minas Gerais é, justamente, o estado onde ocorre maior divergência de dados federais e estaduais. Em 2019, na Agência Nacional de Águas (ANA), constava o registro de apenas 57 barragens em Minas. No órgão estadual, Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM), constava a existência de 698 barragens! Além do Estado brasileiro não contar com mecanismos e funcionários para fiscalizar a operação, a manutenção e a segurança nas barragens, sequer sabe quantas barragens existem em operação!

Quinta e última: o acordo com o governo resolve apenas os problemas do próprio governo Zema e deixa também um recado para o futuro… Em uma economia de mercado, o que determina o crescimento das grandes transnacionais e do próprio conjunto da economia de um país é a taxa de lucro. É ela quem determina o rimo da produção, e como estas empresas relacionam-se com o Estado.

No caso, a Vale foi o sujeito ativo desta relação. O Brasil tem apenas a quinta maior reserva de ferro do mundo, mas é o segundo maior produtor.14 E a Vale é a maior mineradora do país. Como vimos, a mineração representa 20% do PIB brasileiro!

A Vale gastou uma parte menor de seu orçamento na manutenção da barragem de Brumadinho (que já estava desativada havia 25 anos!), ela impôs os termos do acordo com o governo de Minas. E, desde antes do rompimento de Brumadinho é ela, a empresa, quem busca o Estado para legitimar suas ações, por mais inescrupulosas que sejam. É uma empresa criminosa (e quem afirma isto é a própria justiça brasileira), mas que, pelo tamanho de seu capital, impõe ao Estado as regras de como vai operar. É o Estado capitalista, através de suas instituições e poderes que, apesar de uma condenação jurídica, legitima a busca incessante pelo crescimento de seu patrimônio real.

O capital fictício é a primeira forma de funcionar do capital que é derretida quando uma crise se manifesta. Mas é, também, a primeira forma de capital a se regenerar. A valorização do patrimônio acionário da Vale indica que esta parte de sua riqueza já se recompôs muito antes deste acordo.

No final de tudo, isto ainda abre um importante precedente. É um recado direto ao mercado financeiro. E qual é o recado? A Vale é muito grande para quebrar. A Vale é muito forte para se descapitalizar. Se mais barragens se romperem, em que pese os impactos que isso possa provocar na “opinião pública”, ela resolve do seu jeito seus problemas com o Estado e com a justiça. O acordo não resolveu os problemas da Vale. Ela não tem enfrentado problemas. O acordo resolverá os problemas orçamentários do governo Zema. Nesta disputa, o governo estadual é o único ator a se beneficiar dele.


1 A Vale ainda não apresentou seu resultado anual do ano passado. Mas seu lucro líquido (deduzidos custos de produção, impostos, juros e amortizações) da Vale em 2020 no 1º trimestre (1T20) foi R$1 bilhão de reais. No 2T20 subiu para R$5,3 bilhões. No 3T20 foi de R$15,6 bilhões. Falta ainda apresentar o resultado do 4º trimestre (4T20). Ainda que a pandemia tenha impactado negativamente nas vendas totais de minério da empresa (minérios finos e pelotas), ela não teve o mesmo efeito em sua produção, e praticamente não reduziu seu patrimônio acionário. A Vale é a maior empresa cotada na Bolsa de São Paulo. Seu patrimônio acionário, no final de 2020, chegou a R$471 bilhões de reais.

2 Ver: <https://www.infomoney.com.br/mercados/acoes-do-bradesco-sobem-ate-5-apos-resultado-e-guidance-fortes-vale-avanca-com-minerio-e-com-investidores-a-espera-de-acordo/>. Acesso em 4/fev/ 2020 e

<https://exame.com/invest/vale-o-que-o-acordo-de-r-376-bi-por-tragedia-de-brumadinho-diz-sobre-a-mineradora/>. Acesso em 5/fev/2020.

3 Quando se manifesta a crise econômica mundial no setor de hipotecas imobiliárias dos EUA, os chamados “subprimes”.

4 Tanto a ideia de “Boom das commodities” quanto a de “Pós-Boom” viraram uma espécie de lugar comum para se referir aos dois cenários de preços pelas quais as commodities atravessaram nas duas primeiras décadas do século 21. Uma extensa literatura pode ser encontrada no portal do Grupo de Pesquisa PoEMAS (Grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade) demonstrando as diferenças entre os dois períodos, e o impacto estrutural que eles tiveram para o conjunto das economias que dependem, fundamentalmente, da exportação de commodities. Disponível em: <https://www.ufjf.br/poemas/publicacoes/>. Acesso em: 05/fev/2021.

5 O que não impede que as ações da empresa voltem a apresentar trajetória ascendente. O que ocorreu no dia seguinte ao acordo (5 de fevereiro), quando suas ações subiram 3,8%, fechando em R$92,00/ação. Mas isto não mantém uma relação direta com o acordo. Na realidade o mercado financeiro está desinteressado por este tema.

6 Marx trabalha a ideia de capital fictício ao longo da Seção V do livro III, como um desdobramento do “capital portador de juros” que já não mantém mais relação com a produção e circulação de mercadorias. Quem quiser se aprofundar nesta ideia, a partir de Marx, deve buscar os capítulos 19, 21, 24, 25, 27, 29, 30, 31, 32 (Seção V) e 39 (Seção VI) do livro III. Para uma explicação didática sobre o que é, como se apresenta, e como opera o capital fictício, ver também: MARQUE, Rosa Maria; NAKATANI, Paulo. O que é capital fictício e sua crise. São Paulo: Brasiliense, 2009.

7 Não custa voltar neste ponto. De maneira até um pouco simplista, o mercado financeiro poderia ser sintetizado em um restrito grupo de gigantescos fundos de investimento, grandes, médias e pequenas corretoras e milhares de pessoas físicas que passaram a aplicar suas pequenas reservas na forma do dinheiro em ativos comercializados nas Bolsas de Valores. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia que pertence à estrutura do Ministério da Fazenda e que regulamenta o mercado de capitais no país, calcula um ingresso médio mensal de 270 mil novos CPFs na bolsa brasileira, desde o início da pandemia. É também a CVM que regulamenta a realização de IPOs.

8 Nem cabe aqui retomar quais as determinantes do preço de uma mercadoria. Lembremos apenas que, em uma ótica marxista, o preço é determinado pela combinação dos seguintes elementos: 1) quantidade de valor contida na mercadoria (valor que é produto do trabalho humano, em condições históricas determinadas socialmente); 2) pela oferta e demanda (com a prevalência da oferta sobre a demanda); 3) pela presença abundante ou escassa desta mercadoria na natureza (para o caso de alguns setores, como o caso do petróleo que é escasso e tem oferta limitada, por exemplo, isto possibilita uma manipulação do preço pelos países que tem reservas de petróleo); 4) pelas variações (em geral muito acima do valor) que ocorrem no caso dos “preços de monopólio” (ou seja, quando uma mercadoria é monopolizada por uma única empresa, ou por um conjunto restrito de empresas, no caso, um oligopólio) e, também, 5) pela atuação do Estado, intervindo na redução do custo da força de trabalho (redução do valor para a produção de determinada mercadoria).

9 E o nível de financeirização pela qual a economia mundial passou nas últimas décadas é tão grande, que surgiu outro mercado decorrente do “Mercado Futuro”: que são os derivativos. Mercado de seguros sobre eventuais problemas na produção futura. E deste mercado surgiu ainda outro, que é o mercado de “resseguros”.

10 A mineração corresponde à 20% do PIB brasileiro.

11 As commodities representam 60% de tudo o que o Brasil exportou em 2020.

12 Em 2019 a produção nacional teve uma queda (em função do rompimento da barragem de Brumadinho e da paralização temporária de algumas minas da Vale): de 450 milhões de toneladas, em 2018, para 410 milhões naquele ano. Mesmo assim, o faturamento com a mineração subiu de R$110,2 bilhões, em 2018, para R$153,4 bilhões, em 2019 (aumento de 39,2%). No ano seguinte, 2020, novo aumento no faturamento da mineração: 38%. A produção de minério de ferro da Vale em 2020 (tanto minérios finos, quanto o pelotizado) foi de 300 milhões de toneladas. Isso corresponde a uma pequena queda de 0,5% em relação à 2019.

13 De acordo com a Agência Nacional de Mineração (ANM), órgão vinculado ao ministério de Minas e Energia, o país tem, atualmente, 872 barragens, das quais, 47 encontram-se no nível de “Emergência”, ou seja, necessitam de manutenção, pois apresentam problemas em sua estrutura. Destas, 5 barragens estão prestes a se romper. Duas delas pertencem à Vale.

14 A China é a maior produtora de minério de ferro e também a maior importadora. O minério de ferro ainda é um bem abundante na natureza. Ele pode ser encontrado em mais de 300 substâncias que o têm como elemento essencial. No subsolo brasileiro podem ser encontradas 70 destas substâncias. Normalmente o ferro encontra-se associado em sua forma primária como óxido de ferro, como magnetita (Fe3O4) ou como hematita (Fe3O3).

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2 comentários para "Vale: o cassino financeiro derruba barragens"

  1. hilton dominczak disse:

    Ótimo texto, bem completo. Dá um panorama geral do que aconteceu e seus desdobramentos, sob a ótica da Vale, dos investidores e de quem perdeu familiares e casas.

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