WikiFavelas: Origens e trajetória do MNU

Às vésperas do Dia da Consciência Negra, o Dicionário Marielle Franco mostra a história do Movimento Negro Unificado, surgido durante a ditadura, e o desafio de aquilombar a política. Memória, conhecimento e ação política são chaves da resistência

Primeiros atos do MNU comparavam o Brasil ao apartheid sul-africano. (Foto: Jesus Carlos via Memorial da Democracia)
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HINO AO MNU
Nethio Benguela

A certeza de ser Movimento,
Negro Unificado,
A malícia de ter no pensamento,
Toda luta do passado.
Na praça, palanque,
Ecoa pelos ares,
O grito da negrada,
Zumbi não morreu,
Ora viva Palmares!
Nossa luta unificada.
Há! que sabor deve ter,
Um pedaço, espaço no poder.
E se poder é bom,
Negro também quer o poder,
Cantando em alto tom,
Negro também quer o poder

A resistência preta no Brasil, responsável por produzir consciência racial, está presente durante toda a história do Brasil. Dos primeiros navios negreiros aportados em solo pindorâmico – para evocar a memória e a resistência dos povos originários – até os nossos “quilombos contemporâneos”, como podemos conceber as favelas e periferias brasileiras, temos exemplos de resistência e luta da população preta. E é justamente nesses espaços onde essa resistência é mais expressiva, seja através da inventividade nas formas de auto-organização, com coletivos locais pautando e criando soluções e “gambiarras” para temas que perpassam a vivência favelada, seja através dos gritos de ódio, dor e indignação diante das violências do Estado.

Mas apesar das violências que historicamente atingem a população preta e favelada, é cada vez mais comum termos iniciativas, como o Museu de Favela do Cantagalo-Pavão-Pavãozinho, no Rio de Janeiro, que lutam para valorizar as memórias e identidades locais. Um grande acontecimento veio para reafirmar a memória da população negra quando recebemos pela primeira vez no Brasil, Tchongolola Tchongonga Ekuikui VI, o Rei do maior grupo étnico de Angola.De Angola vieram 60% dos escravizados africanos para o Brasil. Esta visita inédita e histórica representa um reencontro ancestral entre filhos de Angola que foram separados pela escravização”, diz Marcelo Moreira, sócio-diretor da DiversaCom. Em sua rica agenda de visitas pelo Rio de Janeiro, o rei esteve na favela da Maré e participou de um seminário sobre cultura e pluralidade religiosa na UNIperiferias. “A visita do Rei do Bailundo no Brasil representa um elo que nos une, relembrando uma história compartilhada, marcada por nossa herança cultural comum. Esta visita fortalece nossos laços culturais, enriquece nosso patrimônio histórico e constrói pontes que ultrapassam fronteiras, promovendo uma compreensão mais profunda e respeitosa entre nós“, diz a coordenadora de comunicação da UNIperiferias, Mariane Del Rei. A favela da Maré é a região onde se concentra o maior número de migrantes angolanos que vivem no Rio de Janeiro.

Os movimentos culturais das Batalhas de Slam e a Festa Literária das Periferias – FLUP convocam as vozes e as escritas faveladas, destacando a produção cultural e artística do povo preto e fazendo ruir o discurso da “favela como problema”. Iniciativas como essas e outras mostram como as favelas e periferias fazem parte da solução dos problemas sociais, com o conhecimento e expertise acumulados por seus moradores. O povo negro tem tecido teias que estabelecem a presença negra em espaços que foram e, de certa forma ainda são negados aos negros. Espalhados pelos becos, o povo preto quando fala, reforça toda a sua magnitude. Precisamos construir para desconstruir. Afinal, como diz nosso irmão (Emicida): Tudo que “nós tem é nós”! E se tudo que “nós tem é nós”, então tudo que “nós tem”: É TUDO! Que esta força ancestral, que mantém viva a africanidade brasileira, fale em memória daqueles que se foram e apoie aqueles que ainda não conseguem respirar. Isto é consciência negra.

Por uma outra abolição

A história do povo negro, por séculos, foi narrada pelo seu algoz e com isso foi resumida a infeliz trajetória da escravidão. Este viés de narrativa, intenciona manter firmes as correntes que aprisionam as memórias e as lutas do povo negro. As lutas que travamos visam romper com o controle colonial que, infelizmente, permanece vivíssimo na sociedade brasileira. Para isso queremos trazer para o contexto da consciência negra alguns dos grandes atores que formaram e formam a linha de frente desta batalha e juntos com eles, também os seus feitos. Qual história queremos contar?

Comecemos tratando da palavra “epistemologia” que é oriunda do grego: episteme, significando conhecimento, e logos, que significa ciência. Epistemologia é, então, a ciência da aquisição de conhecimento (Kilomba, 2008 p.04). Contra toda a forma de subalternização, é importante que conheçamos nossa história a partir de um outro olhar. No trabalho da autora Grada Kilomba (2019), é abordada a necessidade de termos um percurso sobre consciência coletiva para que novas linguagens sejam criadas. Ao colocar a linguagem na condição de poder e de conhecimento, seus estudos mostram que é nessa reconfiguração de estrutura de poder, que muitas identidades marginalizadas podem também, finalmente, reconfigurar a sua noção de conhecimento. (KILOMBA; 2019; p.13).

No velho conto da “democracia racial brasileira”, há a insistência de querer reafirmar a falácia de que o conhecimento é oferecido de forma igualitária a todos. Nesta hora, um discurso negativo em torno das cotas torna-se um exemplo vivo de negação de conhecimento, onde a cota é então tratada como esmola. Nas obras de figuras intelectuais negras encontramos esforços para combater “verdades” hegemônicas. Para situar o pensamento insurgente, queremos citar um pouco do contrapoder intelectual negro, ao mesmo tempo em que homenageamos nesta data e em qualquer outra, figuras como a de Sueli Carneiro, Lélia Gonzalez, Carolina de Jesus, Neuza Santos, Abdias do Nascimento, Machado de Assis, Milton Santos, Conceição Evaristo e tantos outros(as) que estão longe de caber neste breve relato, dada a sua magnitude. Quando acessamos o conhecimento que nos liberta, a consciência nos atravessa. Quando buscamos alternativas e lutas para sair do lugar de segregação, caminhamos para promover uma outra abolição: a que visa nos libertar dos grilhões que pretendem nos manter no limbo da ignorância.

Foi pensando em consciência negra e em políticas públicas reais, que desde 1987, ativistas, pesquisadores, militantes, intelectuais e artistas negros e antirracistas tratam de mostrar, por meio de diversas linguagens e ações de protesto, a história feita por mãos negras no país, indo contra o dia 13 de maio de 1888, quando nos prometeram abolir a escravatura. Esta data simbólica de certa forma apaga todos os atos de rebeliões e resistência que lhe antecederam. Além disso, vai conferindo os créditos para a Princesa Isabel, ao mesmo tempo em que enfraquece os verdadeiros heróis e heroínas negros que lutaram pela nossa liberdade, como Zumbi dos Palmares. O dia 20 de novembro marca o assassinato de Zumbi, e, como não temos a data de nascimento dele foi escolhida a de sua morte para reforçar sua luta e seus feitos. Estamos todos em consonância para combater o apagamento da nossa história quando trazemos Zumbi caminhando de mãos dadas com Dandara (sua esposa), um dos principais nomes da luta negra no Brasil. “Sua vivência enquanto mulher negra e de luta lhe caracterizou a alcunha de guerreira, visto que, além de dominar técnicas de capoeira, também lutou junto aos cerca de 30 mil aquilombados, comandando o exército Palmarino.”1 Ao tirar esta grande guerreira das sombras de Zumbi, ao mesmo tempo combatemos o patriarcado. É necessário que continuemos a nos aquilombar para que não aceitemos uma liberdade incompleta.

E, no que se refere à gente, à crioulada, a gente saca que a consciência faz tudo prá nossa história ser esquecida, tirada de cena. E apela prá tudo nesse sentido. Só que isso tá aí… e fala. (GONZALEZ, 1984. p. 226).

O trecho da Lélia, citado acima, faz a provocação que precisamos para pensar as noções sobre consciência e memória. Seu trabalho postula a memória enquanto emergência da verdade e consciência enquanto mecanismo que exclui o que a memória inclui, numa dialética que, em dada cultura, oculta-se a memória mediante a imposição da consciência. Contudo, a memória fala quando a consciência falha em seu discurso. Quem está no controle da produção de consciência? Na luta pelo controle da produção desta consciência, temos uma frente governamental formada atualmente por Margareth Menezes (Cultura), Anielle Franco (Relações Raciais), Silvio de Almeida (Direitos Humanos e Cidadania), e muitos outros parlamentares que estão a lutar em torno da proteção dos corpos e da cultura preta. Há um esforço em produzir conhecimento, por meio de ações reais, que objetivem uma consciência que consiga reprimir o doentio estado de racismo estrutural no Brasil.

Convocando a Favela

Fazendo jus a luta pela produção desta consciência que caminha de mãos dadas com o conhecimento, que os pretos e favelados estão se aquilombando no parlamento com a intenção de pensar políticas públicas que alcancem o seu povo. Queremos convocar a favela, não como vítimas, mas como um corpo vitimado que insiste em demonstrar todo o seu poder de resistência. A favela revela sua potência quando reduz o olhar dos colonizadores ao estabelecer e fundar coletivos que atuam, através de movimentos sociais, e servem para dar apoio ao seu povo espalhados pelo Brasil afora. Os favelados seguem ressignificando o sentido pejorativo dado ao seu espaço e vão sentindo orgulho de ser parte da favela. Mais que isso, a favela segue dando outro sentido para a frase: tinha que ser preto (como bem pontuou o cantor Djonga) e vai trabalhando a difícil tarefa de aquilombar a política. Para retratar a luta temos o trabalho feito pelo Movimento Negro Unificado (MNU) que segue há 42 anos na luta contra o racismo. O MNU é uma organização pioneira na luta do Povo Negro no Brasil. Outras várias organizações bebem da mesma fonte de combate ao racismo. Pensando em memória e justiça racial temos um belo trabalho desenvolvido pela: IDMJR (Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial).

Até aqui reforçamos que a consciência negra se dá a partir de blocos de resistência que primam pela memória, que lutam por dignidade, educação e conhecimento. Uma reflexão que chega a partir de cicatrizes, que não são maiores que a vontade de lutar pela proteção das vidas negras que seguem expostas a um regime de apartheid aberto que investe na promoção genocídios físicos e intelectuais de forma recorrente e secular, por meio da sua máquina de moer gente preta.

É neste cenário que a favela se apresenta como uma das protagonistas de atuação em combate e luta na disputa pela narrativa que segue sendo contada não mais apenas pelo opressor (como de costume), mas pelo viés do oprimido que resiste à covarde intenção da privatização dos corpos negros em mercadoria. Contudo, a busca pela descentralização de narrativas sobre o tema da consciência negra, sempre estiveram em um combate desigual de condições. Basta olharmos um cenário que envolve o poderoso braço da imprensa branca a serviço dos interesses do capital, versus uma população vivendo em condições com acesso mínimo as condições de vida e sobrevivência. Ainda assim, enquanto pudermos respirar, que sejamos resistência.

Para a celebração do dia da Consciência Negra, a equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco destaca o verbete sobre a criação e a trajetória do Movimento Negro Unificado (MNU), de autoria de Milton Barbosa, Cofundador e Coordenador Nacional de Honra do Movimento Negro Unificado. (Introdução: Norma Miranda)

Movimento Negro Unificado (MNU)

Autoria: Milton Barbosa[1][2].

Logo do MNU.

Movimento Negro Unificado (MNU) é uma organização pioneira na luta do Povo Negro no Brasil. Fundada no dia 18 de junho de 1978, e lançada publicamente no dia 7 de julho, deste mesmo ano, em evento nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo em pleno regime militar. O ato representou um marco referencial histórico na luta contra a discriminação racial no país.

Surgimento

Em 18 de junho de 1978 representantes de várias grupos se reuniram, em resposta à discriminação racial sofrida por quatro garotos do time infantil de voleibol do Clube de Regatas Tietê e a prisão, tortura e morte de Robison Silveira da Luz, trabalhador, pai de família, acusado de roubar frutas numa feira, sendo torturado no 44 Distrito Policial de Guaianases, vindo a falecer em consequência às torturas.

Representantes de atletas e artistas negros, entidades do movimento negro: Centro de Cultura e Arte Negra – CECAN, Grupo Afro-Latino América, Associação Cultural Brasil Jovem, Instituto Brasileiro de Estudos Africanistas – IBEA e Câmara de Comércio Afro-Brasileiro, representada pelo filho do Deputado Adalberto Camargo, decidiram pela criação de um Movimento Unificado Contra a Discriminação Racial.

O lançamento público aconteceu numa manifestação no dia 7 de julho, do mesmo ano, nas escadarias do Teatro Municipal da Cidade de São Paulo, reunindo duas mil pessoas, segundo o jornal Folha de São Paulo, em plena Ditadura Militar.

Com a criação do Movimento e seu lançamento público, mudamos a forma de enfrentar o racismo e a discriminação racial no país. Já no dia 7 de julho, participaram entidades do estado do Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa das Culturas Negras – IPCN, Centro de Estudos Brasil África – CEBA, Escola de Samba Quilombos, Renascença Clube, Núcleo Negro Socialista, Olorum Baba Min, Sociedade de Intercâmbio Brasil África – SINBA.

Cinco entidades da Bahia nos enviaram moções de apoio à manifestação.

Prisioneiros da Casa de Detenção do Carandiru, enviaram um documento se integrando ao movimento, denunciando as condições desumanas em que viviam os presos e o racismo do sistema judiciário e do sistema prisional – Centro de Luta Netos de Zumbi. Participaram do Ato, também, Lélia Gonzales e o professor Abdias do Nascimento.

Estratégias de luta

Para enfrentar o racismo, a discriminação racial, este movimento que se transformou no Movimento Negro Unificado, mudou a forma da população negra lutar, saindo das salas de debates e conferência, atividades lúdicas e esportivas, para ações de confronto aos atos de racismo e discriminação racial, elaborando panfletos e jornais, realizando atos públicos e criando núcleos organizados em associações recreativas, de moradores, categorias de trabalhadores, nas universidades públicas e privadas.

O movimento tirou proveito das divergências conjunturais, mesmo dos setores da burguesia, como por exemplo, jornais burgueses como Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo. Articulamos, também, com mídia internacional, favoráveis ao fim da Ditadura Militar e outros setores.

Definimos como princípio a aliança com os setores de esquerda no país que lutavam pelo socialismo e comunismo, pois foi o capitalismo que nos colocou nesta condição, nos sequestrando em África, nos vendendo para acumular mais valia, nos escravizando para construir riqueza para os colonizadores, nos explorando, após a escravidão, como trabalhadores menos qualificados e de menor remuneração.

O negro é um pioneiro em civilização, sendo nos países onde viveu ou vive um criador de cidades, núcleos comerciais, artísticos, sendo que no Brasil realizava desde os trabalhos da lavoura, até os mais sofisticados, como cuidar da mecânica do engenho de açúcar e da saúde do senhor de escravo pelo seu conhecimento milenar de ervas medicinais.

Foram os negros escolhidos para serem escravizados, pela diferença física ao europeu e por seus profundos conhecimentos de agricultura e metalurgia (ferro – cobre – prata – ouro – diamantes). Em termos culturais os negros foram pioneiros. No período anterior à abolição da escravatura no Brasil, os negros eram as principais figuras na arte nobre (pintura – escultura – literatura – música – teatro).

Na luta política o negro tem sido pioneiro, na figura do Movimento Negro Unificado. No início da década de oitenta transformamos a ação do Movimento Feminista, introduzindo com Lélia Gonzales, Vera Mara e outras, a questão da mulher negra, que sempre foi trabalhadora neste país.

Anos 1980

No início da década de oitenta, o MNU-SP em aliança com o Jornal Lampião e o Grupo Somos, realizamos ato público e passeata conjunta contra as ações do Delegado Wilson Richetti, que prendia negros, homossexuais e prostitutas de forma humilhante e desrespeitosa na região chamada Boca do Lixo de São Paulo – Zona de Meretrício, e denunciamos o racismo, o machismo, desenvolvendo ações que sem dúvida são a base da política de diversidade hoje debatida em todo o país.

Através dos congressos da SBPC – Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência, o MNU denunciou o racismo na Educação, nos meios de comunicação e, no Congresso da Anistia, introduzimos a discussão de que os presos comuns também são presos políticos, pois são empurrados para o crime pelas circunstâncias sociais, políticas e econômicas e, denunciamos a tortura nas prisões sobre os chamados presos comuns, base para a criação de uma política de direitos humanos contra a tortura no Brasil.

No início de 1980, o MNU- SP garantiu também, pela primeira vez, a fala oficial no Brasil da Organização Para Libertação da Palestina – OLP, através de seu representante Farid Sawan, que atualmente representa os Palestinos no Conselho da SEPPIR – Secretaria Especial de Política da Promoção da Igualdade Racial.

Na década de oitenta, foi o MNU a organização que realizou as maiores e mais importantes manifestações contra o Apartheid na África do Sul, embora não recebêssemos apoio político ou financeiro da Organização das Nações Unidas (ONU). Criamos comitês nos principais estados do país e realizamos manifestações com milhares de pessoas, contribuindo significativamente para a luta dos nossos irmãos da África do Sul e do Zimbabwe.

Em 1986, realizamos a Conferência Nacional do Negro em Brasília – DF, de onde saiu a proposta de criminalização do racismo e a resolução 68 das Disposições Transitórias Constitucionais, sobre a titulação das terras dos remanescentes de quilombos.

No ano de 1988, no VIII Encontro de Negros do Norte – Nordeste, organizado pelo MNU da região, foram definidas questões que balizaram a atual Lei 10.639, que dispõe sobre o ensino da História da África e do negro no Brasil, a orientação educacional que permeou a criação, com certeza, do Centro de Educação Unificada – CEU, escola integral, com cultura, arte, lazer (cinema – teatro – sala de música – quadras esportivas), bibliotecas, material escolar gratuito, alimentação e assistência médica, no governo Marta Suplicy na Cidade de São Paulo.

O Estado, os partidos políticos, movimentos sindical e popular, tentam separar as conquistas da população negra do movimento negro, carro chefe da nossa luta. O estado e os partidos políticos buscam dominar e manipular nossa população. Os movimentos por equívocos e por terem o racismo introjetando em suas mentes, ações e concepções.

Anos 1990

Na revista O Negro, em 1992, Margarida Barbosa – enfermeira do Hospital das Clínicas da Unicamp – Universidade de Campinas, militante do MNU, atualmente diretora do Sindicato dos Trabalhadores da Unicamp, escrevia sobre a anemia falciforme, doença que proporcionalmente atinge mais aos negros, orientando a sociedade e cobrando a quem de direito a exigência de políticas públicas referentes a este tipo de doença , pois além desta anemia, há diabetes, hipertensão e outras doenças que proporcionalmente vitimam mais aos negros.

O MNU, fortalecendo a proposta do início da década de 1970, do Grupo Palmares de Porto Alegre, decidiu na Assembleia Nacional do MNU, em Salvador – BA, no dia 4 de novembro de 1978, transformar o 20 de Novembro, no Dia Nacional da Consciência Negra, data da morte de Zumbi , um dos principais comandantes do Quilombo dos Palmares, um exemplo de luta e dignidade para os negros e todos os brasileiros.

No ano de 1988, realizamos importantes manifestações no mês de maio contra a farsa da Abolição, na cidade do Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e outras. Em 20 de novembro de 1995, realizamos a Marcha do Tricentenário da Imortalidade de Zumbi, a Marcha Zumbi dos Palmares, Contra o Racismo, Pela Igualdade e a Vida, em Brasília – DF, com a participação de mais de 30.000 pessoas.

Em São Paulo, no início de novembro de 1995, realizamos uma grande manifestação com mais de oitocentas pessoas, no consulado americano contra a Pena de Morte e Pela Libertação de Múmia Abu Jamal, antigo dirigente do Partido dos Panteras Negras, preso e condenado à morte injustamente numa farsa reconhecida internacionalmente. Múmia Abu Jamal, como Nelson Mandela, é um exemplo para a humanidade, na luta contra o racismo, pela liberdade e a vida, um campeão de direitos humanos. O MNU tem colaborado com campanhas internacionais pela defesa de sua vida e pela sua libertação.

Os remanescentes de quilombos com a participação do MNU, realizaram o I Encontro Nacional dos Remanescentes de Quilombos, em novembro de 95, fortalecendo a relação do movimento negro urbano com a área rural, dando uma nova qualidade ao movimento negro do Brasil.

Esta intervenção do MNU junto aos remanescentes de quilombos, teve início em 1980 através do MNU-SP no Cafundó, região de Sorocaba, tendo também o MNU atuado a partir de meados de oitenta junto aos Calungas, em Goiás e, o MNU-BA no início da década de noventa na região do Rio das Rãs.

O MNU atua junto a quilombos em Pernambuco, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Maranhão. A partir do final dos anos 1970, desenvolvemos o conceito Raça e Classe, desenvolvendo uma teoria política para garantir as ações práticas. Atualmente, há um leque de propostas que estamos propondo aprofundar num Congresso do Negro Brasileiro em novembro de 2006.

Conclusão

Hoje a direita busca golpear com violência a esquerda no Brasil, se aproveitando de erros de concepção desenvolvido por setores oportunistas e aparelhistas do campo majoritário do Partido dos Trabalhadores, que se aliaram com forças retrógradas da sociedade brasileira para buscar garantir seus projetos imediatistas, tentando aparelhar o Estado brasileiro, como já haviam feito com setores importantes do movimento sindical.

Este mesmo campo político, supostamente de esquerda, tem como prática cooptar quadros dos movimentos, tenta esvaziar os movimentos sociais, isolar setores que lhes são críticos, implantando uma política de subserviência e compadrio.

Estão sendo atacados pelos grandes capitalistas, que são os verdadeiros donos da privatização do Estado, como se o PT estivesse inventando a corrupção na máquina do Estado e no parlamento burguês, majoritariamente composto por verdadeiros bandidos, ladrões inveterados, que usam todos os métodos para garantir a exploração da grande maioria da população.

Não podemos cair no canto da sereia. Temos que novamente cumprir nosso papel de vanguarda da luta da população negra e pobre e desmascarar esta farsa.


Ver também

Notas e Referências

  1.  Cofundador e Coordenador Nacional de Honra do Movimento Negro Unificado.
  2.  Texto originalmente publicado no blog Geledés.

Obras consultadas e citadas:

KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Tradução de Jess Oliveira. Rio de Janeiro: Editora Cobogó, 2019. 244p

GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Revista Ciências Sociais Hoje, Anpocs, 1984. p. 223-244.

1 Fonte: < https://www.sbmfc.org.br/dandara/> Acessado em 06, de novembro de 2023.

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