A pandemia como subterfúgio para ideias anti-Rússia

Polêmica: artigo publicado por Outras Palavras tenta transformar informações dúbias e opiniões em fatos: Suas fontes: apenas oposicionistas e velha mídia. Por trás da análise da covid no país, os interesses ocidentais e a demonização de Putin

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Este texto é uma resposta ao artigo BRICS: covid escancara os abismos regionais da Rússia, de Mischa Gabowitsch, traduzido e publicado por Outras Palavras em 11/09/2020, fruto de uma parceria editorial com a revista indiana The Wire.

Outras Palavras entra em terreno movediço com o artigo do Mischa Gabowitsch.

Ficamos sem saber se o artigo é sobre a covid-19 na Rússia ou sobre o Putin e o governo da Rússia, pois se utiliza de todos os argumentos e técnicas da guerra híbrida do ocidente na “análise” sobre a pandemia no país.

Nada contra a pluralidade de opiniões, mas argumentos similares são divulgados fartamente quando governos com alta popularidade se mantém consistentemente no poder: começam a aparecer artigos de intelectuais e experts falando sobre “corrupção”, “ditadura”, “eleições fraudadas”. Basta acompanharmos nossa vizinhança – para não precisarmos ir até a Ucrânia (com nazifascistas no poder, depois desse tipo de ação), Líbia ou Belarus, onde o processo está em andamento – como Bolívia e Venezuela.

Governos populares costumam ferir interesses da chamada democracia ocidental, isto é, atores como o rentismo, o complexo industrial-militar e outros atuando em conformação com governos conservadores. Que usam, através de seus órgãos de segurança, a mídia e intelectuais com eles alinhados, para produzir matérias e artigos a serviço de destruir nações que não se alinhem com o projeto hegemonista ocidental.

Se Outras Palavras acolhe em sua linha editorial esse tipo de artigo, entendo que é um direito da redação, claro. Mas discursos contra “fraudes eleitorais”, “corrupção”, “ditadura”, demonização de líderes populares, já sabemos onde vai dar. Vivenciamos isso muito bem aqui.

O artigo de Mischa Gabowitsch parece seguir a receita. Utiliza a chamada do título sobre a pandemia da covid na Rússia para, aparentemente, atingir outro objetivo. É sutil, cheio de informações dúbias disfarçadas de fatos.

Para exemplo, vejamos um link que o autor utiliza, o de eleições comprovadamente fraudadas, que remete a um artigo do The Moscow Times, uma publicação em inglês sobre a Rússia:

Começa com:

An unprecedented amount of fraud may have occurred during Russia’s weeklong vote… [Tradução do Autor (TA): Uma quantidade sem precedentes de fraude pode ter ocorrido durante a semana de eleições na Rússia].

A fonte mais crível citada é um (e somente um) físico especialista em estatística:

Prominent physicist Sergei Shpilkin published statistical evidence Thursday of widespread voter fraud at the June 25-July 1 plebiscite. [TA: O proeminente físico Sergei Shpilkin publicou evidências estatísticas na quinta-feira de fraude eleitoral generalizada no plebiscito de 25 de junho a 1 de julho].

Vejamos:

a) Uma fonte somente é insuficiente para afirmar esse tipo de resultado. Outros estatísticos conseguirão resultados diferentes, dependendo do tipo de “amostra estatística” usada.

b) Esse físico é um crítico contumaz e repetitivo, pois desde 2011 vende as mesmas críticas sem ser corroborado por outros especialistas.

c) A declaração desse físico foi feita à revista Forbes Rússia que é uma filial da matriz norte-americana e, portanto, altamente suspeita de ser parcial:

“This suggests that up to 22 million votes may have been cast fraudulently, Shpilkin told Forbes Russia” [TA: “Isso sugere que até 22 milhões de votos podem ter sido lançados de forma fraudulenta’, disse Shpilkin à Forbes Rússia]

d) A citação penúltima refere-se ao opositor russo:

Leading Kremlin critic Alexei Navalny also condemned the poll, tweeting that it set “a record in faking votes” and the result had “nothing in common with people’s views”. [TA: O principal crítico do Kremlin, Alexei Navalny, também condenou a eleição, tuitando que ela estabeleceu “um recorde em falsificar votos”, e o resultado não tinha “nada em comum com as opiniões das pessoas”]

Essa afirmação é imprecisa e diz, nas últimas linhas, que o resultado “nada tem em comum com a opinião (view) das pessoas”.

Ora, isto não é fato, sendo somente uma opinião (ou uma suspeita) sem qualquer fundamentação, em um artigo que pretende ser baseado em fatos. Mais ainda, o opositor está usando a técnica bem conhecida de querer que opiniões tenham mais caráter de verdade do que fatos comprovados.

e) Finalmente, o último parágrafo tenta dar credibilidade às afirmações totais do artigo citando que:

The vote’s result drew criticism in the United States, which raised concerns over efforts to “manipulate” the ballot, while the EU called on Russia to probe reports of voting “irregularities” [TA: O resultado da votação atraiu críticas nos Estados Unidos, o que levantou preocupações sobre esforços para “manipular” as cédulas de votos, enquanto a UE pediu à Rússia que investigasse relatórios de irregularidades na votação].

Meramente a opinião de um país (e seus aliados) declaradamente inimigo da Rússia, tornando a afirmação suspeita e parcial.

No texto, raised concerns quer dizer “expressa preocupação”. Isso é somente uma forma clássica de dizer que tem dúvidas, sem nenhuma comprovação factual.

As palavras finais do artigo mencionam que a União Europeia (EU) pede à Rússia que dê comprovações da lisura das eleições.

Pergunta-se: baseada em que fatos reais a EU faz esse pedido? Resposta: nenhum fato concreto.

Portanto, no artigo do The Moscou Times, há uma sequência de opiniões disfarçadas de fatos.

Ressalto que esse amontoado de argumentos provêm de uma única afirmação (“comprovadamente fraudada”) – que é claramente falsa – existente no artigo publicado em Outras Palavras.

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Um comentario para "A pandemia como subterfúgio para ideias anti-Rússia"

  1. Gostei do assunto de sua publicação, gostaria de ver se é pertinente de divulgar em meu site: link acima.

    Sds.

    Hermes

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