Ensino remoto e a educação fabril que não pode parar

Se a escola, entregue às lógicas do mercado, já impede a emancipação do indivíduo, videoaulas fazem a educação alienante se agravar. Professor não consegue propor debates e reflexões – e estudante é inundado com o “faça o que se pede”

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Por Edergênio Negreiros Vieira

Um dos grandes desafios na atualidade, na minha opinião, tem sido o de fugir do mecanicismo das relações reprodutivas, que se transportaram para as relações sociais. Afinal o modelo de produção e distribuição de mercadorias é antes de tudo um modelo de reprodução social.  

O que marca esse paradigma é sem dúvida nenhuma a alienação. Utilizo aqui Marx para debater o conceito de alienação, em Marx ela é compreendida através da ideia de que o indivíduo se torna alheio (alienado) à sua própria natureza e dos demais seres humanos. O trabalho é uma categoria central no pensamento marxista. É por meio do trabalho que os indivíduos têm a capacidade de intervir e modificar a natureza, segundo as suas necessidades. Porém no modo de produção social capitalista, o trabalhador é destituído do entendimento holístico de como se opera todo o mecanismo produtivo. Em outras palavras o trabalho no atual regime de produção social aliena os trabalhadores, fazendo com que eles se tornem indiferentes a si mesmos, bem como aos outros e a sociedade em geral.

Esse paradigma que começou na transição do trabalho artesanal para o trabalho em larga escala, sobretudo nas fábricas, se espalhou para inúmeras atividades laborais e atingiu em cheio a educação. Os trabalhadores das escolas reproduzem as mesmas lógicas do mundo fabril. Se você pensa que divisão seriada de estudantes, aulas de 40 minutos, conhecimento compartimentado em disciplinas são elementos pedagógicos, você está, assim como o planeta Terra, redondamente enganado. Nada desses elementos têm relações pedagógicas, mas sim fabris. Essa forma de organizar a escola é resultado do processo de alienação que o trabalhador da educação é submetido. Mecanismo esse que faz com que os trabalhadores da educação apenas reproduzam relações sociais dentro da escola, que tem como objetivo principal, não a educação e emancipação social do sujeito, mas sim o assujeitamento do indivíduo perante ao projeto das classes dominantes, que espera receber da escola um tipo específico de sujeito.

Esse processo que já era nefasto antes, recrudesceu com a pandemia e a instituição das aulas remotas. Formatadas sem o mínimo de reflexão sobre a complexidade do período pandêmico, as aulas remotas configuram a transposição da alienação presencial operada nas escolas, para uma alienação virtual. Se antes havia a possibilidade do contato real, agora nem isso. O que se tem é uma enxurrada de “faça o que se pede” para os estudantes, evidenciando ainda mais a natureza fabril da escola. Se na escola real a reflexão já perdera espaço há muito tempo, nas aulas remotas ela inexiste.

Sufocados pelas exigências das secretarias de educação, o professor se vê obrigado a transportar uma matriz curricular pensada para o presencial para o mundo virtual, além disso o trabalhador da educação deve ocupar agora seu tempo não mais com o estudo, e sim com a gravação, edição, e a “subida” do material para as plataformas digitais. Do outro lado está o estudante, que vê seus pais tendo que ainda sair de casa para trabalhar, sendo expostos aos riscos da doença. Estudantes que assim como os trabalhadores da educação estão perdendo pessoas próximas para a covid, e tendo que, mesmo assim, não deixar de postar as atividades, afinal, a educação fabril não pode parar.

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2 comentários para "Ensino remoto e a educação fabril que não pode parar"

  1. juceia disse:

    educação remota nos permite ir além do que é proposto pelo professor
    afinal através das mídias podemos ir a fundo em pesquisas e o conhecimento não depende só do emissor “professor”
    e sim do receptor pois ele tem fácil acesso ao saber.

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