Na “Frente Ampla” da Globo, liberais abraçaram fascistas

Com derrota de Trump, e o possível fiasco de Bolsonaro em 2022, velha mídia tenta emplacar Huck e Moro, apresentando-os falsamente como “Frente Ampla”. Objetivo é continuar agenda de barbáries e contrarreformas

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A eleição até agora inacabada dos EUA parece ter mexido com a cabeça da grande mídia brasileira. A vitória de Biden nas urnas, ainda não concretizada de fato devido aos devaneios golpistas de Trump, logo levaram a uma enxurrada de análises sem sentido e comparações descabidas com o cenário brasileiro por parte de jornalões e especialistas de coisa nenhuma. Na imprensa brasileira, há uma semana já se procura um Biden brasileiro, sabe-se lá o que isso possa querer dizer.

A narrativa, porém, nada mais é do que a agenda liberal tentando se rearrumar para uma nova imposição em 2022 que não precise de uma figura tão esdrúxula como a de Jair Bolsonaro para isso. Uma narrativa que parece viver outra realidade paralela, seja no Brasil, seja nos EUA.

A começar pela ideia de “Frente Ampla” nas eleições norte-americanas que se formou na cabeça dos jornalistas liberais brasileiros. Nesse devaneio midiático, a vitória de Biden teria sido possível apenas pelo fato de a esquerda dos Democratas, talvez os chamados “socialistas democráticos” representados por pessoas como Bernie Sanders e Alexandria Ocasio-Cortez, ter supostamente cedido espaço ao discurso menos radical de partidários mais à direita, como o próprio Biden. Dizem os pseudo-especialistas que o aceno ao “centro” era a única maneira de conter o radicalismo de Trump.

O que os analistas resolveram simplesmente ignorar é o fato de que praticamente todas as pesquisas1 mostravam que, na verdade, Bernie Sanders era justamente o candidato que poderia derrotar Trump com mais facilidade dentre os Democratas. Aliás, situação esta que já tinha sido observada em 2016, na disputa com Hillary.

Outro ponto é que Sanders não abriu espaço em aceno à moderação liberal. Na verdade, Bernie foi mesmo é boicotado pelo próprio partido em primárias recheadas de eventos controversos nas votações decisivas. E, mesmo com seu apoio tardio e praticamente obrigado, não faz lá muito sentido falar em “Frente Ampla” numa disputa intrapartidária em um país de sistema eleitoral e político tão confuso e bipartidário. A correlação com o Brasil neste ponto, aliás, é uma forçação de barra que beira o ridículo.

Mais ridículas ainda foram as buscas dos jornalões pelo paralelo brasileiro a algo que sequer ocorreu de verdade nos EUA. Nas buscas por um “Biden brasileiro”, Huck, Moro, Mandetta e Doria já foram cogitados em algumas matérias da grande mídia. Com estes nomes, ao que tudo indica, a única coisa que a imprensa liberal brasileira não gosta no bolsonarismo é o próprio Bolsonaro.

Chega a ser risível que dois ex-Ministros de Bolsonaro cheguem a ser cogitados como uma 3ª via contra o próprio Presidente. Mandetta, o homem dos planos de saúde que passou mais de um ano à frente do Ministério da Saúde sucateando o SUS? Moro, a face do lavajatismo, o verdadeiro fascismo judicial à brasileira que contribuiu para aumentar o Estado policialesco no Brasil? O que dizer então de Doria, o qual, ele mesmo, criou o apelido BolsoDoria nas eleições de 2018 enquanto prometia que levaria bandidos direto ao cemitério? Huck? Loucura, loucura, loucura…

A piada fica completa quando olhamos para a realidade brasileira e percebemos que uma Frente Ampla já fora construída em nossa política. E vai de vento em popa…

Dos 24 partidos com representantes na Câmara2, 12 deles apresentam um nível de fidelidade ao Governo maior que 87%. Ou seja, estes partidos, em 87% das vezes, votaram seguindo a orientação do líder do Governo Bolsonaro na Casa. São eles, em ordem decrescente: PSL (97%), Patriota (94%), DEM (93%), PSC (93%), NOVO (92%), PSDB (92%), MDB (91%), PP (91%), Republicanos (91%), PL (90%), PSD (90%), PTB (90%), SD (89%) e Cidadania (87%). Fecham a lista de partidos mais fiéis a Bolsonaro o Podemos (77%), o PROS (75%), o Avante (74%) e o PV (68%).

Apenas 6 dos 24 partidos parecem realmente se opor ao bolsonarismo liberal no Congresso, e, ainda assim, com certas polêmicas. PDT (48%) e PSB (46%) são recorrentes alvos de crítica por outros partidos e movimentos de esquerda. Rede (36%), PCdoB (29%), PT (20%) e PSOL (15%) fecham a lista dos oposicionistas, mas, juntos, não conseguem somar uma parte substancial das cadeiras do Congresso.

Olhando dessa forma, fica fácil de entender porque as reformas liberais e conservadoras têm, de mãos dadas, passado de forma tão fácil por cima do povo brasileiro. O “Centrão”, as bancadas “do Boi, da Bala, da Bíblia” e tudo que há de retrocesso no Brasil parece ter achado seu ponto em comum com a agenda econômica liberal tão difundida pela grande mídia brasileira. Não é à toa que, nos últimos anos, vimos passar a Reforma Trabalhista, o Teto de Gastos, a Lei das Terceirizações, a Reforma da Previdência e a MP da Liberdade Econômica.

Aliado ao conservadorismo mais brutal, o liberalismo parece enfim ter reencontrado um Governo para chamar de seu no Brasil. Não é novidade no mundo este fenômeno que já se viu com ditadores como Pinochet ou Stroessner. De fato, já temos, hoje, no Brasil, uma Frente Ampla, e ela é basicamente formada entre liberais e a extrema-direita fascista e militarista brasileira.

Mas o que, então, a grande mídia procura se, em tese, já tem seu desejo atendido? Talvez, quando se refira a um “Biden brasileiro”, a imprensa esteja preocupada com a procura de uma cara mais limpinha para a barbárie que chama de “agenda liberal”. Com Bolsonaro, está pegando um pouco mal. Gente como Monica de Bolle não quer continuar vivendo um “Dilema Moral”, como ela mesma escreveu na Época há cerca de um ano, feliz com os rumos econômicos do bolsonarismo (como se a economia já não vivesse um desastre desde então).

Não há espaço para a esquerda nessa aventura de encontrar o “Biden brasileiro”, e nem deve haver. Neste momento, cabe à esquerda retomar alguns princípios esquecidos e se reorganizar a partir das bases. Nossa “Frente Ampla” deve ser a mobilização popular, e esta sim deve transbordar para as urnas. Deixemos as narrativas sem sentido aos Chacras da vida. Eles já ganham muito bem para isso.

1 https://www.realclearpolitics.com/epolls/2020/president/us/general_election_trump_vs_sanders-6250.html

2 https://congressoemfoco.uol.com.br/governo/exclusivo-os-12-partidos-que-formam-a-base-fiel-do-governo-na-camara/

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