Ucrânia: a guerra mais próxima do fim

Kiev sofre derrota militar estratégica, retira-se em debandada caótica e pode assistir a rápido avanço da Rússia. Ocidente arrisca-se revés geopolítica e simbólico grave

O presidente da Ucrânia Vladimir Zelensky. Foto: Ronaldo Schemidt/AFP
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“A derrota da Ucrânia seria a derrota do Ocidente”, alertou há poucos dias José Durão Barroso, ex-presidente da Comissão Europeia agora à frente (oh, as deliciosas portas giratórias!) do banco norte-americano Gondman Sachs. No último sábado seu pesadelo pode ter começado a se tornar real. Na madrugada, soldados russos tomaram a pequena cidade de Adviivka, na região do Donetsk, que luta para se separar da Ucrânia. Os desdobramentos são potencialmente devastadores, avalia o New York Times. A retirada dos soldados de Kiev foi tardia e descoordenada. Centenas ou milhares podem ter sido feitos prisioneiros. Duas unidades de elite do exército, enviadas de última hora para tentar evitar a queda, também debandaram. Os efeitos morais são ainda mais graves. O governo de Vladimir Zelensky encontra dificuldades crescentes de arrebanhar combatentes, há protestos contra o alistamento forçado e há pouco o presidente defenestrou o chefe do exército, o popular Valery Zaluzhny, por achar que este lhe fazia sombra.

O mesmo New York Times aponta em mapa os cinco pontos principais em que a Rússia está pressionando as linhas de defesa ucranianas, ao longo de uma linha de combates que se estende por 600 km. Caso o desfecho dos combates seja favorável a Moscou, estará aberto caminho para ocupar por completo as províncias separatistas de Luhansk e Donetsk e também de Zaporizhzhia, na costa do Mar Negro.

Depois de ter tragado mais de 130 bilhões de dólares dos contribuintes norte-americanos e europeus, a guerra contra a Rússia cansou as sociedades destes países. Nesta terça, agricultores poloneses fecharam com tratores a fronteira da Ucrânia, de onde chegam alimentos subsidiados, que competem com os que eles produzem. No Congresso dos EUA, segue empacado um novo pacote de ajuda militar, de US$ 60 bilhões a Kiev (mais US$ 15 bilhões para Israel).

Ao detalhar as consequências de uma derrota da Ucrânia, Durão Barroso não escondeu seu temor: “China e Rússia procuram mobilizar o Sul Global contra o Ocidente, nomeadamente EUA e Europa”, disse ele. Por cinco séculos, a periferia do mundo capitalista manteve-se submissa à ordem eurocêntrica. Esta relação estará, também ela, ameaçada?

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