Para entender o Podemos no poder

Seis anos depois de criado, partido-movimento chega ao governo, minoritário em coalizão com o PSOE. Teria se institucionalizado? E as esperança para reverter as políticas de “austeridade” da União Europeia? Ou tudo ao mesmo tempo, agora?

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O Podemos, quem diria, acabou no poder. Há três semana, o partido-movimento dirigido por Pablo Iglesias compõe o primeiro governo de coalizão formado na Espanha desde o fim do franquismo e a redemocrataização do país, em 1974. É sócio minoritário do PSOE, um partido socialista que já aplicou políticas neoliberais, mas que vive um sopro de renovação, sob a liderança do jovem Pedro Sanchéz. Mas que esperar desta chegada tão rápida aos palácios, executada por um partido-movimento criado em 2014 e que, em seus primeiros anos, caracterizava-se por denunciar com insistência a “casta política”?

Dois textos recém-publicados pela revista Jacobin ajudam a sondar a resposta, a partir de pontos de vista em parte contraditórios. No primeiro artigo, Manuel Cervera-Marzal, um sociólogo espanhol hoje na Bélgica, lamenta tanto o fato de o partido ter abandonado sua estrutura rebelde, e se adaptado à organização hierárquica que marca o poder, quanto de ter aberto mão de propostas políticas radicais, como a criação de um banco e uma empresa de energia públicos. O texto, contudo, não se vê como definitivo. Cervera-Marzal paga para ver como o partido-movimento concretizará (ou não) algumas as promessas a que não renunciou, como o desmantelamento do aparato repressivo herdado do franquismo e mantido nos governos do PP.

A perspectiva de Tommy Greene e Eoghan Gilmartan, que assinam o segundo ensaio, é muito mais otimista. Eles reconhecem a institucionalização e o recuo do Podemos em sua radicalidade anterior. Mas atribuem estes movimentos a um compromisso temporário, incontornável diante da correlação de forças na Europa e na maior parte do planeta.

Green e Gilmartan pensam que, apesar de tudo, o núcleo da proposta original do partido-movimento – combater as políticas neoliberais implícitas e programas de “austeridade” da União Europeia – está intacto e será decisivo tanto para dar sentido ao governo Sanchez-Iglesias quanto para mudar os rumos de uma Europa em crise. Num certo sentido, o otimismo dos autores é uma torcida. Ao final, eles lembram: “se esta alternativa fracassar, estará aberto o caminho para um governo espanhol formado pela direita e extrema direita”.

A aventura espanhola precisa ser acompanhada em detalhes, nos próximos meses. Ler os artigos de Jacobin é um ótimo ponto de partida.

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