Como o Grande Terremoto de Lisboa abalou o mundo

Eleito Melhor Ensaio do Ano em Portugal, lançamento da Tinta-da-china Brasil reflete sobre efeitos da catástrofe – e reconstrução – de 1775 para a história portuguesa e mundial. Apoiadores de Outras Palavras concorrem a 1 exemplar

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Outras Palavras e Tinta-da-china Brasil sortearão um exemplar de O pequeno livro do Grande Terremoto, de Rui Tavares, entre os apoiadores do nosso jornalismo. O formulário de participação será enviado por e-mail e as inscrições serão aceitas até a próxima quinta-feira, 03/11, às 14h. Quem é Outros Quinhentos tem 20% de desconto no site da editora.

Velha conhecida dos que vivem de estudar e interpretar a História, a querela sobre a importância específica dos eventos no processo histórico geral por vezes dá as caras no debate público mais amplo. No embalo da nova fase da Tinta-da-china Brasil, agora unida ao pessoal da Quatro Cinco Um, chegou em 2022 ao nosso país uma das melhores intervenções nessa discussão a serem lançadas nos últimos tempos: O pequeno livro do Grande Terremoto, do português Rui Tavares.

A 1º de novembro de 1755, um gigantesco terremoto teria arrasado completamente a cidade de Lisboa, o centro do ainda bastante importante império colonial português. Um tsunami sobre a região portuária e grandes incêndios nos bairros se seguiram ao tremor, piorando seus efeitos e causando prejuízos humanos e materiais incalculáveis.

Ou pelo menos é o que nos dizem os relatos. Já partem daí as reflexões apresentadas por Rui Tavares (historiador mas também um deputado bastante conhecido da esquerda portuguesa) em seu ensaio de 2005. O prisma através do qual as fontes estatais, religiosas, e mesmo de outros atores, reconstituíram os fatos não é fundamental apenas para desvendar a forma como entendemos o Terremoto de 1755 hoje – ele foi crucial para estruturar a resposta ao desastre no momento imediatamente posterior a ele.

Os estudantes das escolas portuguesas seriam os mais indicados para nos contar de cor e salteado essa narrativa sacramentada do reerguimento nacional. Após o Terremoto que pôs a nação abaixo, o ilustrado Marquês de Pombal se pôs mais uma vez à frente do país e comandou um plano de reconstrução inspirado nos ventos renovadores do Iluminismo. A reação governamental teria sido o berço de algumas novidades históricas: listam-se entre elas a resposta organizada às catástrofes naturais, semente de instituições como a defesa civil, e até a própria ciência da sismologia. Com isso, Portugal teria renascido mais forte, unido e em sintonia com o que havia de mais moderno à época.

Uma narrativa, é preciso reconhecer, bem amarrada. Como chama a atenção Rui Tavares, podemos encontrar diversos paralelos com outros eventos que teriam sido um “antes e depois” na história de um país e do mundo: o Onze de Setembro estadunidense, os tsunamis de 2004 no Índico, ou até os incêndios de Roma no tempo de Nero. Que similaridades podemos encontrar entre eles? 

Uma possibilidade é a da importância política que tiveram as interpretações costuradas por seus contemporâneos. Se o Terremoto garantiu o triunfo do ímpeto modernizante pombalino, o nine-eleven instigou os americanos a se unirem no patriotismo guerreiro que marcou a década de 2000, e os incêndios romanos desembocaram na derrubada de Nero. Para os eventos mais recentes, podemos falar do papel das grandes empresas de comunicação na criação dessas ideias, e nos tempos passados podemos falar de outros veículos, a exemplo dos historiadores romanos e cronistas do Império português.

Explorada anteriormente por autores como Walter Benjamin, a ferramenta profundamente humana da narração, da perspectiva, ganha proeminência no texto de Tavares: é ela que faz com que eventos como o Grande Terremoto de Lisboa de 1755 (já no adjetivo “grande” há um mecanismo narrativo de valoração) se tornem “dias que abalaram o mundo”, no dizer de John Reed, alterando percepções e deixando rastros de sua repercussão.

Voltando ao Iluminismo, não é só a ação científica do herói nacional Pombal que o liga ao pensamento renovador setencentista. Figuras célebres como Voltaire e Rousseau teriam se envolvido em debates acalorados sobre a catástrofe portuguesa e suas implicações filósoficas, políticas e mesmo teológicas, chegando a desenvolver novos conceitos a partir de suas reflexões sobre a tragédia. Essa ligação confere ao pequeno Portugal, que em meados do XVIII já não era mais o polo mais dinâmico da Europa, uma peculiar importância na história do século. Quase como se tivesse sido o disparador das mudanças, um “motor da história”.

Tavares põe para jogo uma pergunta mordaz: e se o “Grande”, tão-grande, Terremoto não tivesse acontecido? O mundo seria radicalmente diferente? Portugal não teria se modernizado? Pombal não teria virado o mais importante primeiro-ministro de sua história? A Era das Luzes europeia teria se consagrado com outras ideias? Ou, como sugeriria um historiador menos afeito à importância dos eventos, o mundo seria praticamente o mesmo?

Nesses poucos parágrafos, não abordei nem um quinto das ideias interessantes que Rui Tavares condensou em seu livro de cerca de duzentas páginas. É merecidíssimo o prêmio de Melhor Ensaio do Ano (Público/RTPN) conferido a O pequeno livro do Grande Terremoto quando de sua publicação original. 

Com escrita cativante, Tavares passa de um marco da história nacional portuguesa, abordado até a exaustão pelos acadêmicos do país, às reflexões sobre questões histórico-mundiais que também abarcam campos como o estudo da comunicação e da semiótica. O leitor d’O Pequeno Livro sairá satisfeito e também instigado a pensar sobre algumas problemáticas prementes de nosso tempo.

Nos próximos anos, o Brasil terá cada vez mais pérolas de além-mar em circulação nas suas livrarias. Isso porque, devido à reorganização da editora junto à Quatro Cinco Um, a Tinta-da-china Brasil anuncia a reimpressão de seus ótimos catálogos de história portuguesa e literatura portuguesa, com a futura de adição de novos títulos a ambas as coleções.

Como primeira ação de nossa nova parceria com a Tinta-da-china Brasil, sortearemos um exemplar de O Pequeno Livro do Grande Terremoto, de Rui Tavares, entre os apoiadores do nosso jornalismo. O formulário de participação será enviado por e-mail aos membros da rede Outros Quinhentos, e as inscrições serão aceitas até a próxima quinta-feira, 3/10, às 14h.   

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