Agora, em S.Paulo: Cordéis Antifascistas
Carla Rodrigues, Laymert Garcia dos Santos, Tatiana Roque, Vladimir Safatle, Jeanne Marie Gagnebin, Peter Pál Pelbart, e Giselle Beiguelman expõem e debatem, no Largo do Arouche, sua produção de emergência
Publicado 18/10/2018 às 19:05 - Atualizado 12/12/2018 às 14:52
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LANÇAMENTO:
Quinta, 18/10, até as 22h
Barouche
Largo do Arouche, 103 — Metrô República — São Paulo
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Nada disso aconteceu de repente. Mas foi de repente que nos demos conta, como dizia Kafka, de que as potências diabólicas do futuro já batem à nossa porta.
Como reagir? Assim que saiu o resultado do primeiro turno, decidimos mobilizar nossxs amigxs e publicar com toda urgência textos que não tivessem medo de tocar no nervo do presente.
Eis os cordéis daí resultantes, escritos no calor das últimas semanas, para cujo lançamento convidamos a todxs.
Viva a morte! Laymert Garcia dos Santos
Um dia, essa luta iria ocorrer Vladimir Safatle
Necropolítica tropical Peter Pál Pelbart
Elassim# Jeanne Marie Gagnebin, Tatiana Roque, Carla Rodrigues
Odiolândia Giselle Beiguelman
Direitos humanos, estratégias menores Edson Teles
Novos espartaquismos Jonnefer Barbosa
Nosso propósito é juntar o máximo de gente em plena calçada do centro da cidade. Os cordéis estarão à disposição, e podem ser carimbados na hora por quem desejar. Um microfone estará aberto para intervenções diversas. Fragmentos dos cordéis serão lidos a céu aberto.
Disseminação. Resistência. Pensamento. Alerta. Contágio. Multiplicação.
Abaixo fragmentos de alguns dos cordéis, que estarão disponíveis no evento de hoje, das 17:00 às 22:00, no Barouche, Largo do Arouche 103.
Laymert Garcia dos Santos— Viva a Morte!
O que estamos assistindo aqui é a guerra aberta das elites contra o povo, cuja explicitação começou dois anos antes, na abertura da Copa do Mundo, quando dos camarotes dos banqueiros patrocinadores do evento partiu o grito: “Dilma, vá tomar no cu”, a fim de desqualificar e degradar mundialmente a representante máxima dos brasileiros. Ali estava o prenúncio do processo de destruição do povo e da nação que agora, nas eleições de 2018, adquire uma perversidade muito mais assustadora. Pois estamos na iminência de um segundo turno no qual as “vítimas”, depois de um processo alucinante de ilegalidades jurídicas e eleitorais, somadas a uma violenta manipulação midiática, vão alegremente eleger o seu carrasco e conferir legitimidade à guerra entre os perdedores.
Vladimir Safatle – Um dia, esta luta iria ocorrer
Este texto é para aqueles que choram pelo que virá. Ele foi escrito para aqueles que percebem a noite mais escura chegar com sua violência, seu desprezo e sua sede de vingança. Pois nessas horas só parece haver duas saídas possíveis: a fuga e a melancolia. Nós sabemos dos erros que fizemos, eles não foram poucos. Sabemos dos erros que repetimos, eles também não foram poucos. E ainda sabemos do sistema que montamos para não fazer a auto-crítica implacável dos nossos erros e das repetições dos nossos erros. Que se diga mais uma vez: eles não foram poucos.
Mas nada disto pode justificar o fechamento que virá, o carnaval macabro que se aproxima. O Brasil é agora o laboratório mundial de formas novas de junção entre fascismo e neoliberalismo radical impulsionadas não apenas pela violência de estado, mas também pela violência de grupos e indivíduos movidos por toda forma de ressentimento. Um governo de milícias. Como um laboratório, ele fornecerá o modelo do que pode vir a ser aplicado em outros países, a começar pelos vizinhos latino americanos.
Jeanne Marie Gagnebin
Na mesma aula de “musculação”, na qual luto contra osteoporose e câimbra, não converso com os homens, todos eleitores de Bolsonaro. Sei que nenhum argumento vai convencê-los. Durante muito tempo, acreditamos que argumentos racionais são capazes de convencer. Talvez convençam uns poucos privilegiados que estudaram bastante, como já sabiam tanto Platão quanto Spinoza. E os poucos são pouquíssimos no Brasil, mesmo entre os mais ricos e estudados, a tal da “elite” (essa palavra, para mim, somente poderia designar uma marca de sapatos feitos à mão). Somos movidos por paixões nada nobres, ódio, inveja, ressentimento, às vezes também compaixão, ternura. Por que acreditar que nós, intelectuais de esquerda, que tiveram tempo para viajar, pensar, refletir, aprender outra língua, tomar um bom vinho, portanto, ter uma “consciência crítica”, seremos capazes de convencer aqueles que, muitas vezes, não tiveram tantos privilégios nem tanto tempo, ou, então, têm dinheiro demais?
Peter Pál Pelbart — Necropolítica Tropical
Num momento de perigo iminente, às vésperas do desastre, não temos o direito de não levar a sério o que está sendo enunciado e anunciado aos quatro ventos com clareza cristalina. É nosso dever pesar cada palavra e gesto que parecem ser apenas fanfarronice. Se é um monstro que emerge, é preciso dá-lo a ver.