Zizek vê ideologia como arma crucial do capitalismo
Em “Violência”, filósofo tenta dissecar dispositivos que, em nome da “paz”, levam sociedades à pior brutalidade — que consiste em considerar “normal” o inaceitável
Publicado 07/10/2015 às 19:57
Por Bruno Lorenzatto
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Resenha de:Violência, de Slavoj Zizek
Editora Boitempo, São Paulo, 2014
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Irredutível crítico do capitalismo, a trajetória intelectual do filósofo esloveno Slavoj Zizek é marcada pelo esforço contínuo de problematizar os discursos e práticas que sustentam o poder vertiginoso do mercado sobre o mundo contemporâneo. O pensador – herdeiro de uma linhagem filosófica crítica, que tem como referências Hegel, Marx e Lacan – está menos interessado em responder às questões postas em nossa época do que reformulá-las, uma vez que “não existem apenas soluções certas e erradas para problemas, mas também problemas certos e errados”, afirma Zizek, parafraseando Deleuze.
A base de toda sua argumentação consiste na distinção conceitual entre violência subjetiva e objetiva. A primeira é a que estampa de vermelho as páginas dos jornais – facilmente condenável –, os atos violentos individuais ou coletivos. A segunda é “sutil”, anônima e engendrada pelo próprio sistema das relações vigentes, ou seja, as crises econômicas, a exploração constante, a violência simbólica de classes etc: “a violência subjetiva é experimentada enquanto tal contra o pano de fundo de um grau zero de não violência. É percebida como uma perturbação do estado de coisas ‘normal’ e pacífico. Contudo, a violência objetiva é precisamente aquela inerente a esse estado ‘normal’ de coisas. A violência objetiva é uma violência invisível, uma vez que é precisamente ela que sustenta a normalidade do nível zero contra a qual percebemos algo como subjetivamente violento.”
Para o filósofo, é por causa da ideologia subjacente ao discurso liberal que a violência intrínseca ao sistema capitalista pode ser ocultada e percebida como paz – sendo a própria ideologia um modo de violência: tendo a metafísica do mercado global como lei inquestionável, uma crise que arruína milhares ou milhões de vidas deve ser percebida como não violência, como um mal necessário a ser suportado.
Os belos discursos e atos de caridade e filantropia, sob essa perspectiva, revelam-se uma armadilha ideológica, são “a máscara humanitária que dissimula o rosto da exploração econômica (…) o capitalismo atual não pode se reproduzir por conta própria. A caridade extraeconômica se faz necessária a fim de manter o seu ciclo de reprodução social.”
A questão dos refugiados também é borrada pela ideologia. Embora colocada em termos de aceitação ou proibição da entrada dos imigrantes na Europa, um problema mais importante parece passar despercebido, isto é, precisamente a causa da imigração: o capitalismo global imposto pelo Ocidente*.
Seguindo a lógica da questão de Brecht – “o que é um assalto a banco comparado com a fundação de um banco?” isto é, “o que são os assaltos que violam a lei comparados com os assaltos que têm lugar no quadro da lei?” – Zizek pergunta: “o que é um ato de terrorismo face a um poder de Estado que faz a sua guerra contra o terrorismo?”
Impossível não pensar na criminalização racista da pobreza efetuada pela polícia do Rio de Janeiro (não só lá, aliás) para a manutenção da “paz”. O que é um assalto ou um arrastão face ao programa de extermínio da população negra e pobre das favelas? No entanto, a força da ideologia não cessa de apagar esse contraste. Assim, devemos operar uma significativa inversão: o “problema errado” é pedir paz; questionar a violência imposta pelo capital significa abordar o “problema certo”.
Com esse deslocamento do olhar, a violência cotidiana que mantém o sistema funcionando passa a ser intolerável. Enquanto a violência que pode mudar os paradigmas econômicos e sociais, segundo Zizek, a “violência divina” (ou revolucionária), a violência dos oprimidos é a única possível de ser aceita.
Esse Zuzek critica o capitalismo mas nao tem nada de melhor para propor.
O comunismo e o socialismo ja se mostraram piores ainda…
Sensacional!
Bruno, traduziu o texto por um tradutor automático?
… aqui em Joao Pessoa pra grupo de teatro ir a praça tem que ter autorização.