Para querer bem o Brasil

O trabalho, em suas múltiplas formas. As comunidades tradicionais. Gente sob descaso e abandono: a imagem como forma de recuperar histórias ignoradas pela sociedade. Começa projeto para organizar o acervo de João Roberto Ripper, um dos grandes fotojornalistas brasileiros

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Por Cibelih Hespanhol | Imagens: João Roberto Ripper

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Bem querer Brasil
(Organização, catálogo e doação do acervo de João Roberto Ripper
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Um homem segura sua carteira de trabalho, e sorri para a câmera. Seus dentes são tortos e falhos, suas rugas de expressão se assemelham aos rasgos do chapéu, e sua alegria é simples, como se tivesse entre as mãos um passarinho capturado na infância.

Uma mulher estende um lençol à beira de um rio. Duas crianças estão agachadas aos seus pés junto a um balde cheio de roupas. A luz do dia atravessa a brancura do lençol e desenha os contornos do corpo da mulher.

Em uma carvoaria, um casal tem os pés descalços. O homem segura uma pá, e inclina-se um pouco para receber o beijo da mulher. A pilha de lenha e a fumaça do ambiente indicam a aspereza do trabalho que o espera, e que ele adia por um instante, atento ao gesto de carinho.

Essas são fotografias de João Roberto Ripper – denúncias de uma humanidade desconhecida, teimosa e bela em sua resistência: populações indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais, pessoas em situação de trabalho escravo, ativistas de movimentos sociais. Ignorados pela mídia e pela política, capturados com delicadeza pelo olhar de um João.

Fotojornalista autodidata premiado internacionalmente, Ripper sabe de cor as histórias por trás de cada momento. E após décadas de trabalho, do Mato Grosso do Sul ao Norte de Minas, anima-se agora em um novo projeto: coletar e disponibilizar todas essas histórias feitas imagens.

No último 1º de abril, data do golpe de 1964, foi lançada a campanha de financiamento coletivo Bem Querer o Brasil, que organizará, catalogará e doará todo o acervo digital do fotógrafo para a Fundação Biblioteca Nacional. O objetivo é que o acervo possa ser utilizado para consultas e pesquisas. Além da doação, cópias das fotografias serão distribuídas para as organizações e entidades que atuam na defesa dos direitos humanos e na luta dos povos retratados. A campanha segue até o final do mês de maio, e é parte de uma campanha maior, que visa doar a totalidade do acervo de Ripper em seus quase cinquenta anos de atuação. Em tempos sombrios, um chamado: para que possamos bem querer os Brasis que muitos golpes tentam apagar.

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