Airton Paschoa: Lula & cardume
O mar virando sertão, o abismo ali à frente… Mas ah, nossa eletrônica esquerda! Estará trocando a luta de classes pela luta de genes? Aprendendo bons modos? Ou sendo flagrada fazendo sinal da cruz? No mínimo. E é o máximo
Publicado 01/10/2021 às 19:18 - Atualizado 01/10/2021 às 19:19
fim da história
(crise climáxica)
esquerda subvertida
direita subversiva
refluxo
o sertão não vira mar mas
a esquerda
espuma
Zweigando
Só gente abastada e gente aplastada.
Nem elite, capaz de pensar pr’além da casa-grande, nem povo, capaz de passar pr’além da senzala.
No abismo o país do futuro e a esquerda abismada.
esquerda
tão comportadinha
se abaixa sem
mostrar a calcinha
sinistro
parlamentar
ou
pra lamentar?
pragmática
ou
pra ginástica?
eleitoral
ou
L real?
com voto
ou
convertida?
oficial
ou
orificial?
estratégica
ou
analgésica?
discreta
ou
sem estro?
democrática
ou
medocrática?
moderna
ou
materna?
possível
ou
passiva?
majoritária
ou
maior otária
responsável
ou
fiscal?
conciliadora
ou
conciliada?
[pagando e apagando]
Faço saber, a quantos interessar inda possa outro mundo possível mas improvável, que nossa eletrônica esquerda, fetichizada da mercadoria bienal, adora até a medula genuflexa a deusa Urna, esquecendo que ocorre também ser funerária, a pagã.
paz & amor
(perguntítima)
por que que
estadistas mundiais
líderes consumados
provados & comprovados
a um só e mesmo
tempo & templo
deus & o diabo
dia & noite
abraçados & abraçando
por que que
capazes & capatazes
ao médio oriente
já já já
não disparam
já já já
botando juntos
sentando juntos
deitando juntos
mediando & acordando
por que que
semitas & semitas
infundindo—
—lh—es
por que que
paz & amor
[darwina]
Faço saber, a quem possa interessar, que passei a crer na metempsicose em vida. Não, não, não é mente em psicose, incréu. Há pessoas que expiram e continuam a respirar, mas algumas renascem ou reencarnam no próprio corpo morto-vivo. A experiência esotérica, cumulando-as de pontifícia católica e apostólica sapiência, entusiasma as eleitas a pregar a boa nova. Se no deserto, depende de cada camelo. Vamos à miragem.
Uma grande amiga gaúcha, velha militante política desde os tempos de grêmio e internacional, veio ficando desencantada com a idade. Até aí nada de sobrenatural, quem não ficaria, vivendo no Brasil? Se alma pura e imaculada, então… Natural. Dentro do próprio Partido a que tanto amava, a quantas lutas intestinas, sem torcer muito o nariz, não terá sido obrigada a assistir a nobre alma! Há algum tempo, porém, pareceu recobrar ânimo e vinha visivelmente encantada com a divulgação no País das recentes descobertas pré-históricas da psicologia evolutiva, evolucionista, evolucionária e etctantices afãs. Em síntese precária, que a palafita teórica sobe a alturas cipoais, o homem é um animal cujo comportamento, em sua luta feroz pela sobrevivência, obedece a razões geneticamente determinadas há — sabe Darwin! milhões, milhares, muares de anos. Moral da pré-história: que utopia humana poderia resistir a tal natureza animal? Ou versa-vice: com tal natureza humana, que utopia estúpida…
Confesso que, calando embora, urrava em masmorra meu marxismo vulgar. Quantas vezes não ficamos pasmo ao ouvi-la trocando naturalmente a luta de classes pela luta de genes! Que a direita ulula com tanta ciência, é óbvio. Que isso espumasse contudo da boca de uma ativista autêntica, (em que pese a extinção) causava espécie. Da última vez que nos vimos, fraudadas minhas esperanças no governo Lula & cardume, tive todavia que dar a pata à palmatória:
— Cê tem razão, Davina. O homem é mesmo um animal…
[neoptcostalismo]
Faço saber, a quantos inquietar possa, que os evangélicos grassam e desgraçam por tudo que é canto, incluindo o campo político, de natureza controverso. Quem não reconhece, ao agarrar a palavra, em carne e osso encarniçado — o neoptcostal bíblico, perdão, típico? À menor crítica ao Partido e seu sacro império, reagem quais pastores da fé ultrajada, fuzilando de anátemas os refratários ao culto. Pastores, outrossim, pois, raivosos, periga avançarem os dog… mateiros.
Vez em vez me pergunto que reparo, hipótese remotíssima! ousariam apontar a sua mais ululante voz… O fato talvez de não botar prótese — no mínimo. E é o máximo.
Marinha
In memoriam
O vento, as ondas, o esquife, nada balança.
Só as cabeças, sim, sim, um grande homem…
Ressaca forte, e nada no globo balança, nem o quadro.
Estômago delicado, tapa a boca, os olhos, o nariz.
Foto, flores, jornal, tudo embrulha.
OBS.: A foto que embrulha data de 7 de agosto de 2003 e flagra Lula e Palocci, entre outros devotos, em torno do caixão de Roberto Marinho, fazendo o pelo-sinal, no instante exato e irônico do “em nome do Filho” — momento em que, na expressão escarninha de Paulo Arantes, a esquerda “beijou a cruz”… publicamente, complemento.