Petrobras: a gota d’água que deflagrou a greve

Fechamento de fábrica de fertilizantes no PR foi apenas o estopim. Petroleiros reagem a dezenas de medidas adotadas por Temer e Bolsonaro para inviabilizar a mais importante empresa brasileira. Veja quais são e como ferem a Petrobras

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Por Fernando Siqueiro, na AEPET

Jornalistas têm nos procurado e perguntado as razões da greve, dizendo “só porque fecharam a Fafen do Paraná?”. A Fafen do Paraná é a gota d’água, eu respondo. Desde o governo Temer, a Petrobrás vem sofrendo um processo acelerado de desmonte para fins de sua privatização. Alguns exemplos:

1) Na administração Bendine foram feitas desvalorizações de ativos (“impairments”), sendo R$ 44 bilhões, em 2014; R$ 48 bilhões, em 2015; e R$ 16 bilhões, em 2016, num total de R$ 108 bilhões. Isto levou a grande mídia a dizer que a Petrobrás tinha um grande rombo, portanto era inviável, e precisava ser privatizada. Bendine dava início ao processo de privatização da Petrobrás: “Bendine garante ritmo forte de venda de ativos da Petrobras em 2016” (O Globo, 15/12/2015)

Ainda na gestão Bendine, foram vendidos 49% da Gaspetro para a Mitsui, por um preço muito aquém do valor real. A Mitsui foi citada na Lava-Jato, mas isso não atrapalhou a negociata. 


2) Na gestão Pedro Parente, foi uma festa. Foi vendido o campo de Carcará, um dos melhores campos do pré-sal, por cerca de U$ 1,25 por barril; parte dos campos de Iara e Lapa, já em produção, também por valores aviltados; foi vendida a malha de dutos da NTS (Sudeste), responsável por escoar o gás do pré-sal; vendeu também a Companhia Petroquímica de Pernambuco e Companhia Integrada Têxtil de Pernambuco. Todas as petroleiras têm seu braço petroquímico. A Petrobrás abre mão de um componente econômico importante. Parente, que na Bunge trabalhou pelo desenvolvimento de energias alternativas, na Petrobrás se desfez dos projetos de energia alternativa limpa. As vendas de Parente geraram prejuízo superior a R$ 200 bilhões para a Petrobrás.

3) Na gestão Castello Branco, foram vendidas a BR Distribuidora, a Liquigás e a TAG – malha de gasodutos do Norte e Nordeste. Todas estas tinham uma contribuição imensa na geração operacional de caixa da Companhia. Por exemplo: a dívida de Petrobrás caiu de U$ 130 bilhões para US$ 69 bilhões. 75% dessa queda se deveu à geração de caixa e não à venda de ativos. Se esses ativos não fossem vendidos, a geração de caixa deles contribuiria com os 25% restantes.

4) O governo está entregando os campos do Nordeste nos estados da Bahia, Sergipe, Alagoas, Rio Grande do Norte e Ceará. Com isto, está fechando empregos diretos e indiretos nesses estados, causando um grande impacto social.

Agora Castello Branco está programando a venda de oito refinarias, o que gera um forte enfraquecimento da Petrobrás. Além da gravidade dessas vendas, é um erro estratégico brutal. Hoje a capacidade de refino da Petrobrás é de cerca de 2,3 milhões de barris por dia e a produção se aproxima dos 3 milhões. Em 2026, a produção da Petrobrás será superior a 5 milhões de barris por dia. Ou seja, o correto seria incentivar as empresas a construírem novas refinarias e não vender as da Petrobrás, já amortizadas, a preço de banana.

Há, portanto, uma concreta geração de desemprego e uma ameaça ainda maior com a venda das refinarias. Por exemplo, o fechamento da Fafen, caso concretizado, eliminaria 400 empregos diretos e pelo menos mil empregos indiretos.

Outro ponto que permeia a greve é a discordância dos petroleiros quanto ao PPI, que atrela o preço dos combustíveis no país aos preços internacionais, uma agressão ao sofrido povo brasileiro. Um exemplo disso é o GLP – gás de cozinha: a Petrobrás fica com 40% do preço do botijão para produzir, transportar e refinar o petróleo, enquanto o atravessador fica com 41% só para colocar o gás no botijão e revender. Ou seja, o botijão poderia custar 30% menos.

No caso do diesel, ele custa para a Petrobrás R$ 1 por litro, é vendido por R$ 2,2 e revendido nos postos por mais de R$ 4.

Outro ponto relevante é o leilão da cessão onerosa. A Petrobrás, em consórcio com duas companhias chinesas (5% cada) concorreu sozinha a uma reserva de 17 bilhões de barris de petróleo. Pagou o preço mínimo de 23% do óleo lucro para a União. Por que o cartel não entrou no leilão? Ao nosso ver, a estratégia é: “Petrobrás, você compra pelo preço mínimo depois nós compramos com todas as suas reservas do pré-sal”.

Em reunião com seus assessores, o ministro das privatizações Salim Mattar estabeleceu a seguinte estratégia: “Não falem em privatização de Petrobrás para não despertar reação da população. Vamos privatizá-la de forma gradual e silenciosa. Quando o povo despertar, já era.”

Portanto, a greve dos petroleiros tem o objetivo de levar ao povo brasileiro a grande ameaça da entrega de um dos mais valiosos e estratégicos ativos do seu patrimônio, gerando um desemprego maciço não só na Petrobrás, mas em todo o país. A Petrobrás, com o pré-sal, pode impulsionar fortemente o desenvolvimento do Brasil. O direito de greve é consagrado no Artigo 9º da Constituição e na Lei 7783/2009

Uma prova de que o petróleo pode ser alavanca para o desenvolvimento acelerado é que a Noruega, com o petróleo descoberto na década de 1970, com a criação da estatal Statoil saiu da condição de segundo país mais pobre da Europa para o país mais desenvolvido do mundo (melhor IDH nos últimos seis anos). Em contrapartida, a Nigéria, que descobriu mais petróleo do que a Noruega e entregou para o cartel do petróleo, continua como um país miserável.

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