Living Colour retoma raiz negra do rock

Ícone dos anos 1990, banda virá ao Rock in Rio 2022. O baterista Will Calhoun responde às perguntas feitas pelos mineiros da Black Pantera, também apenas de negros, e desfia referências que vão de Robert Johnson a Led Zeppelin

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Por Silvio Essinger no Geledés

“Devo prestar homenagem a uma das minhas artistas mais queridas de sempre: Elza Soares. Minhas sentidas condolências para sua família e seus amigos”, escreveu o americano Will Calhoun, baterista do Living Colour, o mais célebre entre os grupos de rock do mundo formado apenas por negros. Falecida no último dia 20, a cantora também é referência básica para o Black Pantera, trio de Uberaba, que assim como os colegas americanos faz rock pesado (entre o punk e o metal) e é composto só por negros — e uma das músicas de seu repertório, por sinal, é uma recriação de “A carne”, libelo antirracista que Elza notabilizou nos seus discos e shows dos últimos 20 anos.

Fundado em 2014 e revelado dois anos depois, em Paris, pelo festival Afropunk, o Black Pantera será atração de abertura do palco Sunset do Rock in Rio do dia 2 de setembro, que ainda terá o Living Colour (em dobradinha com o guitarrista Steve Vai), o grupo galês Bullet For My Valentine e o Metal Allegiance, combinado que tem Mike Portnoy (bateria, ex-Dream Theater) e Alex Skolnick (guitarrista do Testament). A convite do jornal O Globo, os mineiros (que lançam em março seu terceiro álbum, “Ascensão”) mandaram perguntas para o LC, respondidas por Will Calhoun.

Além de vocês, dos Bad Brains e do Fishbone, foram muito poucas as bandas negras que se destacaram no mainstream do rock. Por quê?

A razão, bem sabemos. Apesar de ser um estilo criado por negros, o rock’n’roll foi (e ainda é) dominado por brancos, e muitos deles esquecem ou fingem não conhecer a verdadeira origem e a raiz do estilo.

O Living Colour soa para nós como espécie de hard rock/afro metal virtuoso e poderoso, com influências do jazz, punk, blues e outras vertentes. Simplesmente não dá para rotular, é Living Colour. Quais foram suas principais referências?

As referências foram simplesmente nossos pais, amigos, bairros, escolas, igrejas, parques da cidade e praias. Havia muitos lugares em Nova York para se ouvir jazz, rock, funk, blues, disco, hip hop (que começou no meu bairro), reggae, jazz de vanguarda, clássico, salsa, hardcore e diversas formas de música indígena. O rádio naquela época era muito diversificado. Algumas de nossas influências são Robert Johnson, Miles Davis, Fela Kuti, Jimi Hendrix, James Brown, Sly Stone, David Bowie, Mahavishnu Orchestra, John Coltrane, The Chambers Brothers, Beatles, Santana, Richard Pryor, Led Zeppelin… e muitos mais.

A indústria da música ainda está cercada de preconceitos com os negros. Costumamos dizer que temos que ser duas vezes melhores, duas vezes mais rápidos e tocar duas vezes mais alto do que outras bandas. Como foi para vocês no começo da carreira?

Muitas gravadoras vieram nos ver tocar em Nova York, em 1987, mas naquela época elas não acreditavam que o Living Colour fosse viável. Ensaiávamos todos os dias, compúnhamos sem medo de experimentar e tocávamos em todos os lugares. E um desses lugares era o CBGB [templo punk em Nova York], onde testávamos nosso repertório. Uma vez o Mick Jagger foi nos ver lá, ficou impressionado e conversou com nosso empresário sobre a produção de duas das músicas, “Which way to America” e “Glamour boys” [que acabaram em “Vivid”, álbum de estreia do Living Colour].

Quais os artistas com os quais o Living Colour adoraria dividir o palco mas ainda não conseguiu?

Ah, muitos! Buddy Guy, Stevie Wonder, Jay Z, Peter Gabriel, Salif Keita, Caetano Veloso, Jeff Beck, Lenine, Herbie Hancock…

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