Câmara aprova piso nacional para Agentes de Saúde

Emenda à constituição coloca no orçamento federal recursos para pagar profissionais da linha de frente do SUS. Maria Helena Machado, da Fiocruz, frisa a importância da conquista. Mas cobra: precisa ser estendida a todos os trabalhadores da saúde

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Foi ao Senado, ontem, uma proposta de emenda à Constituição, aprovada em dois turnos na Câmara, no dia 23/3, que pode representar uma conquista muito expressiva para a saúde pública brasileira. Após 11 anos de espera, a emenda institui o pagamento de um piso salarial de dois salários-mínimos para os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias (ACSs e ACEs), profissionais que trabalham na base do Sistema Único de Saúde (SUS). Eles são essenciais para o funcionamento correto do sistema mas usualmente enfrentam condições adversas, mais do que inadequadas, ao exercício das suas funções – e o mesmo pode-se dizer dos seus salários vergonhosos.

A nova redação constitucional afirma que o piso salarial nacional é atribuição da União e terá dotação orçamentária própria, devendo ser repassado pela União, para efeito de pagamento, aos estados e municípios. O texto também garante adicional de insalubridade e aposentadoria especial por risco inerente à profissão. Estados e municípios, além disso, deverão, conforme o texto, estabelecer outras vantagens, incentivos, auxílios, gratificações e indenizações, visando à necessária valorização da categoria. A emenda exclui salários e outros pagamentos aos agentes do limite de despesa com pessoal dos estados e municípios.

Ainda é preciso esperar para saber como a medida ficará após passar pelo Senado e pela sanção presidencial. Mas a sinalização dada pela Câmara em dois turnos – com aprovação de 438 a 9 votos e 450 a 12 – é muito auspiciosa. “É um ganho muito, muito importante”, assinala a Maria Helena Machado, socióloga e pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Ensp/Fiocruz). “Eu diria que é exemplar, porque a situação dos trabalhadores da saúde é muito grave”, frisa ela, lembrando que é necessário estender a conquista dos ACSs e ACEs a todos os trabalhadores da saúde.

Maria Helena fala com conhecimento de causa porque trabalhou na ampla pesquisa da Fiocruz, Condições de Trabalho dos Profissionais de Saúde no Contexto da Covid-19. Também fala com a convicção do conhecimento que tem. “É fato incontestável que o SUS […] é sustentado e movido por um enorme contingente de trabalhadores”, escreveu em um artigo recente (Os Profissionais de saúde em tempos de COVID19 – a realidade brasileira). “É fato também que estes trabalhadores são considerados essenciais ao sistema de saúde e imprescindíveis ao processo civilizatório de nosso país.”

Existe a possibilidade de o Congresso aprovar um piso nacional para outras categorias da saúde: está em debate na Câmara, especialmente, uma proposta que define pagamento mínimo nacional de R$ 4.750 para enfermeiros, e também pisos proporcionais para técnicos, auxiliares e parteiras. Essas movimentações políticas de algum modo concordam com a avaliação de Maria Helena, no parágrafo anterior, e buscam estabelecer condições minimamente decentes de pagamento para os profissionais de saúde. No caso dos ACSs e ACEs – que são cerca de 400.000 em todo o país –, já se havia elevado o salário-base de R$ 1.550, em 2021, para R$ 1.750 no orçamento deste ano.

Mas não há ainda, de acordo com o site G1, estimativas oficiais para o impacto do novo valor do piso, de R$ 2.424 – que valerá para este ano, caso aprovado. Técnicos do Congresso falam em R$ 2,8 bilhões para o restante de 2022 e R$ 3,7 bilhões nos próximos anos. O deputado Valtenir Pereira (MDB-MT), que encaminhou a emenda, não acha que o valor seja relevante, no caso. “Essa [emenda] valoriza esses agentes, profissionais que estão no dia a dia da população, orientando o povo, orientando os moradores sobre como se prevenirem contra doenças e terem qualidade de vida”. Ele considera “extremamente necessária a garantia de que os agentes sejam mantidos em seus postos de trabalho e que recebam remuneração justa e condigna com a importância de suas tarefas”.

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