Escravidão: novos dados, chaga antiga
Novo relatório calcula que exitem mais de 40 milhões de pessoas trabalhando em regime análogo à escravidão no mundo
Publicado 23/07/2018 às 07:26
20 de julho de 2018
ESCRAVIDÃO
Um relatório lançado ontem calcula que 40,3 milhões de pessoas vivem em condições análogas à escravidão no mundo. A maior parte delas (71%) é mulher – e a segunda causa mais importante, segundo o estudo, é o casamento forçado (há 15,4 milhões nessa situação). A forma mais comum de trabalho escravo contemporâneo é o trabalho forçado (24,9 milhões) e o problema da escravidão é maior na Ásia. Os países do G-20 se beneficiam disso, importante bens mais baratos. O relatório estima que US$ 354 bilhões se produtos importados estejam sob suspeita, e há até uma lista de quais são eles: notebooks, computadores e celulares estão no topo, seguidos de roupas, pescados, cacau e cana de açúcar.
Neste mapa interativo, dá para clicar em cada país e saber as estatísticas. Eis as brasileiras: 369 mil escravos, o que dá quase duas pessoas submetidas a essas condições inumanas num grupo de mil habitantes. A vulnerabilidade a essa situação é 36,38 numa escala de cem. E a resposta do governo está bem no meio (é classificada como “BB” numa escala de dez que vai de AAA até D). O Global Slave Index é publicado pela ONG australiana Walk Free Foundation.
LONGO CAMINHO
A Organização Mundial da Saúde divulgou na quarta (18) uma base de dadossobre resistência a bactérias. Feita em parceria com a FAO e com o organismo que cuida da saúde animal (OIE), a ferramenta compila respostas de 154 países sobre como lidam com o problema, que virou preocupação global por conta do surgimento de superbactérias. Alguns, como os da Europa, têm um histórico de controle de mais de quatro décadas, enquanto outros começaram a abordar o assunto há pouquíssimo tempo. As agências analisaram quatro fatores: vigilância em saúde, educação, monitoramento e regulação do consumo e uso de antibióticos nos humanos, para criação de animais e também na agricultura. O plano global para combater a resistência a superbactérias é de 2015, mas ainda há muito a ser feito, na medida em que em diversos lugares ainda é extremamente fácil obter um antibiótico sem prescrição médica ou as informações sobre o uso dos remédios em animais sequer é transparente.
FARMACÊUTICAS
A suíça Novartis anunciou o novo CEO no Brasil. O escolhido é Alexandre Gibim. Na matéria do Saúde Business, ficamos sabendo alguns números da atuação da multinacional por aqui: nos próximos cinco anos, mais de 50 produtos devem ser lançados no mercado brasileiro. E a empresa afirma ter investido mais de R$ 22 milhões em estudos clínicos, realizados em mais de 30 mil pacientes em parceria com mais de 300 centros de pesquisa no país.
Nos Estados Unidos, a empresa anunciou que vai dar um tempo no aumento dos preços dos medicamentos. A trégua vai durar 2018 e acontece depois que a concorrente, Pfizer, disse que iria voltar atrás nos aumentos que começaram a valer em julho. Não caiu do céu: Donald Trump – que quando não está dando entrevistas coletivas, está usando o Twitter – postou que as empresas deveriam “se sentir envergonhadas por tirar vantagens dos pobres e outros incapazes de defender a si próprios, quando, ao mesmo tempo, negociam barganhas com países europeus e no resto do mundo”. As empresas dizem aguardar o plano do governo Trump para o assunto. O assunto parece ganhar tração por lá. A Califórnia, informa o New York Times, tem uma nova lei para dar transparência aos preços dos medicamentos.
AUSTERIDADE MATA (DE MUITAS FORMAS)
Mortes causadas por cirrose aumentaram 65% nos Estados Unidos, e os óbitos por câncer de fígado dobraram no período que vai entre 1999 e 2016. Mas o estudo, que acaba de sair British Journal of Medicine olhou essa curva e descobriu que o salto aconteceu a partir de 2009. E a causa mais provável é a crise econômica de 2008, cujo epicentro foi justamente lá. Os mais afetados foram os estados do Sul do país (3,5% de aumento por ano), Meio Oeste (3,1%) e Oeste (3%), enquanto os estados do Norte viram a taxa crescer 1,6%. Os grupos mais afetados foram os indígenas (4%) e negros (1,7%). E a faixa etária entre 25 e 34 anos. “Esses são os fatos: as pessoas começaram a morrer depois de 2008”, disse o coordenador do estudo, Elliot B. Tapper, continuando: “Jovens são mais propensos a morrer de cirrose alcoólica, e nós sabemos que homens jovens desempregados são mais propensos a abusar do consumo de álcool.”
PRESO E CASSADO
Denis Cesar Barros Furtado, o agora mundialmente conhecido Dr. Bumbum, foi preso ontem na Barra da Tijuca. Os policiais receberam uma denúncia anônima que levou ao paradeiro do médico e da sua mãe, Maria de Fátima, que fugiram depois que a paciente Lilian Calixto morreu. Ela foi submetida à aplicação de uma substância conhecida como PMNA num apartamento. A testemunha-chave do caso é o taxista que, mesmo depois de ter recebido R$ 300 do médico para ir embora do condomínio, continuou esperando e viu quando Furtado saiu de SUV em direção ao hospital, onde Lilian chegou com falta de ar, taquicardia e pele azulada. A notícia correu o mundo e é destaque em jornais como o Guardian e Le Parisien (em francês, o médico ficou conhecido como Dr. Popotin). O registro de Furtado foi cassado ontem pelo Conselho Regional de Medicina.
SINTOMA DOS TEMPOS?
A Sociedade Brasileira de Pediatria se posicionou segunda (16) contra a animação brasileira SuperDrags, feita em parceria com a Netflix. O desenho é voltado para adultos. Mesmo assim, a entidade disse ver “com preocupação” a estreia da animação no segundo semestre, pois a “trama gira ao redor de jovens que se transformam em drag queens super-heroínas”. Ao mesmo tempo em que diz respeitar a “diversidade”, a SBP associa o desenho a conteúdos negativos. Vários desenhos voltados para adultos existem e estão disponíveis em plataformas de streaming, mas só o que trata desse universo (e viralizou em correntes conservadoras de WhatsApp) mereceu atenção da Sociedade.
PARA LÁ DE CEM
O Nexo fala sobre as fronteiras do envelhecimento, a partir de pesquisas sobre o tema. Até hoje, a idade mais avançada a que chegamos (pelo menos nos registros oficiais) é 122 anos (foi uma mulher francesa). Hoje, o ser humano mais velho do mundo está com 117 (é mulher, e japonesa). Um estudo publicado na Nature em 2016, com dados de 40 países, concluiu que nosso limite seja 115 anos e que não há chances de vivermos décadas além dessa barreira biológica. Outro, recém-lançado, olhou para quase quatro mil italianos com mais de 105 anos e chegou à outra conclusão: na medida em que as pessoas ficam mais velhas, caem as chances de morte. Estima-se que meio milhão de pessoas tenham mais de cem anos.
Recomendamos demais uma reportagem da revista New Yorker do ano passado que mostra, dos bastidores, a obsessão dos bilionários da indústria da tecnologia por viver para sempre. Eles financiam pesquisas que possam prolongar tanto a saúde física, quanto a consciência (querem, por exemplo, transferi-la para outros corpos na velhice). É muito dinheiro envolvido.
QUASE TODO MUNDO
O número é acachapante: 96% dos usuários de planos de saúde que recorreram ao serviço nos últimos dois anos tiveram problemas, segundo pesquisa Datafolha encomendada pela Associação Paulista de Medicina. O nó (nada simples) começa pelas consultas (94%), vai para os exames (88%), chega no pronto-atendimento (71%) e diminui quando o assunto são internações (22%) e cirurgias (21%). As principais reclamações no pronto-atendimento são: sala de espera lotada (76%), demora pra ser atendido (59%), negativa da empresa ou demora para autorizar a realização de exames e procedimentos (34%) e internação hospitalar (12%). Também com 12% está a reclamação de negativa de atendimento. Em relação a consultas, as queixas são: demora na marcação (60%), seguida por uma muito conhecida: o médico saiu do plano (37%), e falta de médicos nas especialidades que os consumidores precisam (23%). Em suma, a saúde privada não parece ser modelo para nada e 66% dos beneficiários são certeiros numa coisa: as empresas dificultam (e ameaçam) suas vidas porque não querem arcar com procedimentos de maior custo.
MAIS (SOBRE) REGULAÇÃO
O Ministério Público do Rio quer que Marcelo Crivella se comprometa a aumentar a transparência do Sisreg e encaminhou ao prefeito na quarta (18) uma carta de compromisso. A ideia central do documento é a criação de uma site para que os usuários possam saber que posição ocupam na fila do atendimento, qual sua classificação de risco, a data inicial do registro do pedido, se este foi negado, devolvido, está pendente ou concluído, e por aí vai.
E o sistema de regulação de vagas e procedimentos no SUS é o assunto da matéria do jornal O Globo, que explica que, no Rio, a regulação é dividida nas esferas estadual e municipal, com os casos mais simples, como as cirurgias de catarata, na segunda (Sisreg) e os mais complexos, como transplantes, na primeira (SER, ou sistema estadual de regulação). Em ambos os casos, a espera para alguns procedimentos é grande, e pode exceder cem dias. Uma vez atendido, o usuário é encaminhado para uma unidade pública ou conveniada ao SUS. E depois do procedimento ou consulta realizado, ele é inscrito em uma nova fila de acompanhamento do problema de saúde para obter uma vaga de retorno.
VAI PIORAR
O ex-ministro da Saúde Arthur Chioro fala sobre os péssimos números de mortalidade infantil à Carta Capital. Ele, que participou da segunda gestão de Dilma Rousseff e é professor do Departamento de Medicina Preventiva da Unifesp, discorda do argumento apresentado pelo governo Michel Temer de que a mortalidade infantil no Brasil aumentou em 2016 por conta do surto de zika. Não houve aumento da mortalidade pelo vírus, diz. E tampouco pensar que menos gente nasceu, e o índice aumentou porque as mortes ficaram estáveis (pois as mulheres não ficaram grávidas por medo da contaminação) sustentaria a argumentação. “Se diminuiu o número de nascidos vivos, o número de óbitos de crianças reduziria na mesma proporção. Não faz sentido do ponto de vista estatístico”. O não dito, garante, é que os cortes na rede de proteção social promovidos por medidas como a EC 95, do Teto de Gastos, tem resultados rápidos. E vai piorar:
“Nos últimos anos, houve não apenas a desestruturação do sistema de saúde, mas também das condições de vida. Arrebentaram com o Bolsa Família, o desemprego segue elevadíssimo, diminuíram o poder de compra. Nos próximos anos, com a vigência da Emenda 95, que congela os gastos públicos por 20 anos, o problema tende a se agravar. Teremos um impacto muito forte sobre mortes e internações evitáveis de crianças e idosos. Não tenho dúvida alguma ao apontar essa correlação.”
QUE VIAGEM…
E deputados do PT entraram ontem com uma representação na Procuradoria-Geral da República para que uma viagem de servidores do Ministério da Agricultura, Ibama e Anvisa aos Estados Unidos seja investigada. É que todos viajaram por conta de uma consultoria que presta serviços para empresas agroquímicas (mas as passagens foram pagas pela Viúva). Por lá, visitaram diversas multinacionais do ramo: Bayer, Syngenta, Basf, Nufarm… E todas têm negócios no Brasil, é claro. O furo foi dado pela reportagem do The Intercept.
SEM ESPERANÇA
Boa Esperança é um município capixaba que aprovou uma lei proibindo a pulverização aérea de agrotóxicos. E o agronegócio, é claro, não gostou. O Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola quer reverter a decisão no Supremo Tribunal Federal. O argumento é que as cidades não têm competência para decidir sobre o assunto.
* A equipe do Outra Saúde está em trânsito e, por esse motivo, não percebemos que houve erro no envio da news. Pedimos desculpas.
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