Investigação sobre o Chile, a meses da Constituinte

No pós-Pinochet, parte da esquerda capitulou ao projeto neoliberal, mas rebeliões estudantis agitaram a sociedade. Surgiu a Frente Ampla, que pode sacudir o sistema, porém vive crises internas. Radiografia da luta popular, num país em ebulição

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Este texto é parte do livro América Latina na encruzilhada: lawfare, golpes e luta de classes, organizadores por Roberto Santana Santos, Maria Villarreal e João Claudio Pitillo, e publicado pela Autonomia Literária. Você pode comprá-lo aqui. Que colabora com o jornalismo de profundidade de Outras Palavras tem desconto de até 25%. Se você ainda não colabora, conheça o Outros Quinhentos, nosso programa de financiamento coletivo

Introdução

Quando a ex-presidenta do Chile Michelle Bachelet afirmava a Juan Manuel Astorga – jornalista e apresentador do programa de televisão El Informante – que a nova coalização política nascida em princípios do ano 2017, batizada como Frente Ampla, (381) e sua militância não eram mais que “os filhos e filhas da Concertação”, não poderia estar mais equivocada, (382) e não só pelo fato de que o apelo estava orientado por um interesse político que buscava vincular uma abandonada vontade com aqueles (não tão) novos referentes políticos que estavam trazendo novamente “o social” para “a política”. Seu argumento também carecia de peso, pois desconhecia a profundidade do fenômeno político que acontecia e acontece atualmente no país, obviando, nesse sentido, sua recente, porém densa, historicidade e coisificando, nessa operação, a emergência dessa nova coalização política a um plano estritamente institucional. Nesse movimento, Bachelet conecta a presença desse movimento – em uma clara ignorância da realidade material e social de seu nascimento – unicamente às estruturas diretivas e cupulares do conglomerado, negligenciando a espessura social e os novos enfoques sobre a política subjacentes a emergência dessa nova referência e minimizando, com isso, sua atual potencialidade.

Partimos desta provocação, pois nos parece útil para recorrer ao desafio que se propõe este volume: um convite para pensar historicamente os diversos pulsos das lutas políticas na atualidade chilena, a partir de uma tribuna política comprometida com a democracia e a mudança social, que nos força a abordar a conjuntura do ponto de vista de uma prática historiográfica comprometida com o presente. Nesse plano, a reflexão sobre os aspectos conjunturais do nosso tempo, tal como sintetizado na história recente, (383) obriga-nos a entender o presente como um constante processo de construção apontado para o desenho do passado vivo de uma sociedade, aquele que Reinhart Koselleck denomina “futuro-passado”, (384) com o objetivo de pensarmos como sociedade. Pensar a história recente do Chile e pensar as lembranças sociais que irrompem periodicamente na atualidade e que, por sua vez, ativam nosso presente. (385) De tal modo que, quando nos preocupamos acerca do argumento sobre a gênese da Frente Ampla, não o fazemos de forma aleatória. Consideramos que esta conjuntura nos obriga a perguntarmos por nossa história recente e, mais especificamente, acerca dos elementos sociopolíticos que inauguram o Chile de hoje. O triunfo de Sebastian Pinera nas eleições presidenciais de 2017 não só da conta da ativa reacomodação da direita em nível latino-americano, mas também de uma evidente solidificação do neoliberalismo. Uma leitura ao arrepio de seu triunfo nos sugere também uma transformação importante na esquerda chilena nos últimos anos, já que a nova expressão político-institucional chamada Frente Ampla e sua candidata presidencial, Beatriz Sanchez, em menos de um ano, obtiveram o terceiro lugar no primeiro turno das eleições de 2017, conseguindo 20% dos eleitores, ficando somente dois pontos abaixo de Alejandro Guillier (então candidato da situação e opositor de Pinera) e alcançando um número não menos representativo no Congresso Nacional (vinte deputados e um senador).

O que poderia explicar aquele cenário? Indubitavelmente, uma resposta a partir da história deve considerar uma visão ampla, que mergulha sua análise na explicação desta conjuntura (aberta e em processo), observando quais foram os principais eixos que articularam a irrupção de um novo referencial político que emergiu e questionou, como veremos, um sistema neoliberal, politicamente excludente e deslegitimado pela sociedade civil, que por sua vez foi eco de um processo mais amplo, como a emergência de movimentos sociais e as renovadas lutas contra o neoliberalismo chileno. Desse modo, a partir de uma revisão bibliográfica e da própria experiência como sujeitos políticos e observadores, apontamos nas páginas seguintes algumas pistas para compreender o atual cenário político chileno.

Propõe-se a hipótese de que o neoliberalismo e a emergência paulatina de movimentos sociais geraram um espaço em que se foi desenhando um novo esboço para a esquerda chilena após a Ditadura Militar. Nesse plano, a Frente Ampla se entende como uma nova referência histórico-social para a esquerda chilena, em constante mutação e que convoca a revinculação entre o social e o político, apontando, assim, um evento inaugural, e por sua vez sintético, de uma “nova esquerda chilena”, de frente para o século XXI. Isso não significa uma simples “novidade”, senão um ponto de chegada de um processo de maior fôlego, nascido fundamentalmente a partir das mobilizações sociais contra a administração neoliberal da Ditadura e da Concertação, e a partir da crítica de setores não tradicionais do campo da esquerda política contra a “velha ordem”.

Chile pré-90: ditadura, neoliberalismo e o recuo das esquerdas

A história recente do Chile se abre com o Golpe Militar de 11 de setembro de 1973 e a concomitante ditadura dirigida pelo general Augusto Pinochet. A memória do trauma e da dor, mas também de uma resistência confinada a uma esquerda sempre pujante, assim como as diversas clivagens econômico-institucionais respaldadas a sangue e fogo pelos militares, economistas e tecnocratas de Chicago, são parte vital do Chile atual, constituindo, nesse plano, a seiva vital que marcou as diversas tonalidades do cenário político e da sociedade chilena atual.

De fato, a irrupção cívico-militar desmantelou o Estado de Compromisso conquistado desde os finais dos anos 1930 e fruto de um pacto social mais amplo. Este Estado havia sintonizado maiorias extensas da sociedade com os partidos políticos e as instituições, abrindo-os para uma responsabilidade social importante para com os setores mais despossuídos da sociedade. Em 3 de novembro de 1970, esse processo se potencializou graças a aventura socialista empreendida pela Unidade Popular encabeçada pelo médico Salvador Allende. Contra esse plano,os militares recompuseram uma “visão de mundo” associada aos interesses das classes dominantes. Nas palavras de Juan Carlos Gomez Leyton:

O novo bloco de poder que expressa a aliança entre as classes capitalistas proprietárias e os setores médios impulsiona, especialmente, os primeiros, a desmontar todo o construído pelo poder social popular nos três anos de governo socialista. Isto lhe possibilitou tanto a recuperação como a recomposição de um novo e renovado poder infraestrutural que, ao fi m de uma década e meia (1975-1990), permitira as classes proprietárias constituir-se em dominantes e instalar sua nova weltanshaung como hegemônica no país: a neoliberal. (386)

Nesse sentido, segundo Garreton, (387) o golpe de estado utilizou suas ações reativas (a eliminação e desarticulação da mobilização e da organização social premeditada pelo golpe mediante a repressão a indivíduos e organizações) e fundacionais (o intento de recomposição e reinserção capitalista com um aspecto de mudança estrutural) em uma verdadeira revolução desde cima. Dirá Tomas Moulian, (388) que ele triangulou o direito, o terror e o saber, destruindo o esquema político, econômico, cultural e social do Chile reformista e revolucionário, instalando a lógica de mercado em uma plêiade de espaços e amadurecendo o regime em poucos anos.

Nessa conjuntura, e no fim do decênio dos 1970, que alguns autores denominaram “neoliberalismo radical” ou “neoliberalismo global”, pontuam Gabriel Salazar e Julio Pinto, “buscou-se estender a lógica privatizadora e liberalizante a outras esferas do que o fazer social, como as relações de trabalho, a previdência, a educação e a saúde”. (389) Dessa forma, o antigo pacto nacional-popular, baseado no modelo de substituição de importações, era aplastado junto as instituições que os respaldavam, sob a tríade refundacional e a mão de um conglomerado de tecnocratas neoliberais, em sua maioria pertencentes a Universidade Católica e denominados chicago boys, devido ao lugar onde realizaram suas pós-graduações em economia nos anos 1960 e que, instalada a Ditadura, vão orientar as políticas econômicas do regime. (390)

Nesse contexto, socialmente falando, o Chile neoliberal que começa a se configurar e um onde os sujeitos não chegam a ser consumidores de direito, como haviam sido em sociedades anteriores, senão, “de bens, ou seja, de patrimônios concretos: casas, carros, eletrodomésticos, dinheiro, joias, um diploma profissional (educação). Todos eles constituem mercadorias que se obtêm e são providas pelo mercado”. (391)

Por sua parte, na vereda política, o terror e as restrições a liberdade começaram desde o primeiro dia, eliminando fisicamente grande parte dos lideres de organizações de esquerda e seus militantes, desaparecendo ou exilando forçadamente muitos outros, e, em definitivo, exercendo a violência sobre os corpos e mentes daqueles setores sociais que, ate ha pouco tempo, haviam apoiado o governo de Allende. Assim, sua derrota significou também a derrota de um mundo social “mais amplo, que incluiu mulheres, mapuches, colonos e camponeses, setores que a modernidade neoliberal submeteu a profundas frustrações e lágrimas, mas também a desafios”. (392) Quer dizer, o freio aos diversos nichos de potencialidade do movimento social e político das classes subalternas do povo chileno e que se viram representadas em um projeto político institucional.

Nesse contexto, as esquerdas e seus militantes recuaram em vários setores e em diversos formatos, não sem ter como objetivo óbvio comum o retorno da democracia. Como sugere o sociólogo chileno Freddy Urbano, no Chile posterior ao golpe militar existiu uma esquerda “mais centrista [que] buscava acordos sobre a base da população que se manifestava pacificamente [e] uma esquerda não centrista [que] orientava seu trabalho para a insurgência e o avanço dos movimentos sociais no espaço publico como pressão política”. (393) Assim, a primeira expressão, de caráter centrista, caracterizou-se por conter em seu seio fundacional atores, como a Democracia Crista, que, na opinião de Moulian, (394) haviam mal interpretado o golpe, pensando em uma pronta restauração democrática que nunca chegou. De igual forma, este bloco iniciou o dialogo com nascentes grupos renovados dentro do esquema político da esquerda, assinalando que “somente poderia se entender a fundo com uma esquerda distinta a histórica [que] já não aspirasse em realizar o socialismo de imediato, nem pensá-lo como ‘ditadura do proletariado’”.

Dentro dessa conjuntura de transformações, ambos os grupos haviam abandonado as pretensões revolucionarias de uma esquerda allendista, como também as utopias de reformas e bem-estar social do mundo político social-cristão, representados no governo de Eduardo Frei (1964-1970) e que em algum momento os fez olhar mais à esquerda.

Naquele plano, fundava-se, em 1983, a Aliança Democrática, que unia partidos vinculados a democracia-cristã, com os radicais e algumas correntes de um socialismo menos radicalizado, que exigiam a renúncia de Augusto Pinochet, a derrogação de alguns aspectos da Constituição de 1980 e o retorno da democracia. Esta coalizão política chegaria a seu fim em 1987, passando a ser parte da coalização fundada em janeiro de 1988 e rotulada como Comando Nacional pelo Não. Depois de um mês, o Comando fundaria a Concertação de Partidos pelo Não, a qual organizou a famosa campanha no plebiscito de outubro de 1988, na qual se definiria se o Ditador continuaria ou não no poder até 1997. Na sua criação, esteve a grande maioria da esquerda chilena, a exceção de grupos de caráter mais crítico e que desejavam a ruptura, como o Partido Comunista do Chile. Esses grupos, em algum momento, radicalizaram suas formas históricas de ação, chegando inclusive a legitimar uma rebelião popular por meio de luta armada; o próprio MIR, passando a clandestinidade e/ou ao exílio, organizava-se para tentar dar golpes armados a alvos da Ditadura como forma de resistência. Contudo, será esta coalização a que posteriormente se rotularia como Concertação de Partidos pela Democracia e governaria durante anos o país. (395)

Por sua parte, uma esquerda não centrista se posicionou ao lado do movimento popular que, ainda que tenha tomado tempo para se rearticular, logrou posicionar-se como um ator social importante. Como afirma Mario Garcés, (396) entre as comunidades populares e entre os setores médios “se foram abrindo novos movimentos e novas praticas associativas” que contaram com o apoio daqueles partidos de esquerda que não pretendiam a pactuação, assim como uma parte da Igreja católica com opção pelos pobres, pelos direitos humanos e pelo acompanhamento de diversas Organizações Não Governamentais que trabalharam a partir da educação popular ou da investigação ou ação participativa em temas como solidariedade, consciência de classe, feminismo ou juventude popular. Nesse plano e que se deu uma série de iniciativas inovadoras, em um tenso cenário, que fizeram comungar novas praticas políticas, em uma colagem heterogênea entre uma esquerda não centrista e os movimentos de base que problematizavam seu presente. Como adverte Garcés em uma entrevista no ano de 2010:

Uma aprendizagem muito relevante dos anos de ditadura tem a ver com o desenvolvimento das organizações territoriais. Primeiro, foram os comitês sem-teto, ou as juntas de vizinhos e os centros de mães; em outra etapa, foram os refeitórios populares, cooperativas de consumo, grupos culturais etc. São experiências de organização e democracia potentíssimas, que tendem a ajudar a pensar formas de democracia local, de democracia territorial. (397)

Ainda que os grupos subalternos e da esquerda política mais radical tivessem pouca chance para resistir às reformas neoliberais, isto não obstaculizou a luta política. Além disso, logo após a crise econômica de 1982 – na qual o modelo neoliberal tem seu primeiro conflito paralisante, que aumentou o desemprego, provocou a depressão dos salários que asfixiou as famílias mais vulneráveis, causou a baixa das exportações e importações e fez com que a inflação oscilasse, em um ano, de 9,5% para 20,7% – (398), o fenômeno de “protestos populares” significou um fluxo político-social importante em relação as novas mobilizações de esquerda do país, como também um exemplo das primeiras expressões de ação coletiva depois de dez anos de intensa ditadura e repressão.

De fato, tratou-se de um amplo repertório de quinze jornadas de protesto nacional, sucedidas entre 1983 e 1986, das quais duas tiveram o caráter de greve geral. Sua massividade foi gradual, atingindo o auge em datas marcantes, como o 8 de marco e o 1º de maio. A riqueza dessas mobilizações se radica em diversos aspectos, entre eles o papel importante do movimento sindical, que fez a função de convocador, colocando temas de discussão macropolíticos e macrossociais, como também articulando-se como um espaço de politização das bases, exatamente onde os partidos políticos tinham sido golpeados. (399) Como assinala o historiador Gabriel Salazar, (400) novos sujeitos também foram se posicionando no cenário de luta contra a ditadura, como os pobladores [equivalente aos favelados no Brasil, moradores de periferias urbanas], que se converteram na expressão mais antagônica a ditadura, inaugurando novas formas de sociabilidade a partir da luta cotidiana, confeccionando parâmetros distintos para compreender a política, muito mais relacionados com a horizontalidade e a democracia direta, e sobrepassando a “simples” demanda de retorno da democracia que propunham os partidos centristas. Em uma linha semelhante à dos pobladores, também encontramos o movimento universitário, germe de novos espaços de democracia e de demanda de direitos.

Contudo, como adverte Mario Garces (2012, p. 80), (401) “a maior dificuldade destas diversas dinâmicas de movimentos e que não lograram projetar politicamente suas demandas e seus projetos de mudança social”, impondo-se a “transição pactuada” a seus interesses reivindicativos.

Chile pós-90: transição, a traição de uma esquerda e os anos de pacto neoliberalismo-concertação

Parece-nos sumamente pertinente a reflexão que estabelece Gomez Leyton (402) acerca da weltanshaung neoliberal que será instalada com a irrupção militar e cuja hegemonia passara a ser assumida pela Concertação de Partidos pela Democracia a partir de 1990 ate o ano 2010. Isso injetara no modelo neoliberal ditatorial, segundo sugere Boccara e Gaudichaud (2015, p. 26), “um pouco de social com o objetivo de contrapor os efeitos nefastos do capitalismo selvagem e assegurar a governabilidade [tomando] o social e o cultural como espaço de difusão da nova doxa neoliberal”. Nesse plano, impõe-se uma nova forma de pensar a política e a economia a partir da nova coalizão governante, sob um selo de “embaçamento ideológico”, produzido sobretudo na relação interpessoal das elites da Concertação e os antigos técnicos da ordem ditatorial.

Um exemplo disso se viu nos centros de estudos privados, onde se limaram antagonismos políticos “por meio da cientifização da política, a partir da qual as distintas posições puderam se encontrar no dialogo técnico da economia liberal de mercado”. (403)

Tratou-se de uma “democracia de acordos”, que olhava para as décadas antigas de conflito com cansaço e que tinha como objetivo “comum” básico o fortalecimento da democracia, mas reduzindo-se “o espaço atribuído a possibilidade de transformação estrutural socioeconômica, limitando-se, no melhor dos casos, a sustentar os equilíbrios macroeconômicos, a obter taxas de crescimento razoáveis e reduzir a pobreza no campo social”. (404)

Pode-se afirmar que os anos de governo da Concertação representam “antes de tudo, um momento-chave da legitimação e consolidação do capitalismo neoliberal no Chile”. (405) Este, entre uma variedade de fatores, fortaleceu-se graças ao que Garreton (406) denominou “enclaves autoritários”, ou seja, nichos socioeconômicos (o modelo de mercado, o papel subsidiário do Estado e a profunda desigualdade estrutural) e político-constitucionais, “expressado[s] principalmente, ainda que não exclusivamente, na Constituição de 1980, cuja razão última era impedir mudanças significativas no modelo socioeconômico”. Estas foram as amarras que a Ditadura, em sua “vontade dialogante”, confeccionou e que limitaram a política, afetando a ação de um setor importante da Concertação – desorientada de seu antigo papel social e transformador que fundara em seus militantes anos antes. Nesse sentido, e negligenciando os massivos “protestos populares” que mostraram a radicalidade das exigências de vastas porcões do mundo popular que a administração ditatorial não logrou dominar, a Concertação rearticulou a hegemonia da classe dominante em um novo pacto neoliberal com administração democrática. Nas palavras de Sergio Villalobos-Ruminott:

No entanto, além desse problema, poderíamos pensar analogicamente o “potencial critico” das manifestações no Chile dos anos 1980 não como uma reivindicação populista as supostas reservas democráticas do movimento popular chileno, mas sim como um sintoma de esgotamento do modelo de dominação da ditadura militar, questão que a obrigou a repensar seu formato, dando lugar a tão elogiada transição para a democracia.

Nesse sentido, a onda festiva que ocupou as ruas do país às portas do plebiscito de 1988, mais que uma recuperação do horizonte radical da (imaginada) democracia nacional, funcionou como um compromisso anacrônico da política de massas, extemporânea aos tempos neoliberais contemporâneos e, por sua vez, à transição para a democracia que se seguiu, mais do que o resultado das conquistas do movimento popular ou da chamada sociedade civil, foi o processo mediante o qual a dominação se rearticulou hegemonicamente, passando de sua administração militar para a sua atual condição civil, sempre no mesmo marco constitucional. (407)

A Concertação foi desestimando, desde o começo, fundamentos e correções ao modelo neoliberal, negando-se a terminar com os princípios da Ditadura. Assim foi feito com o Plano de Trabalho (o qual gerou os pilares da desorganização dos trabalhadores e sindicatos, fracionando as negociações), (408) com a Constituição ditatorial de 1980, ainda válida, e com a continuação das políticas privatizantes de direitos sociais iniciadas pelos Chicago Boys. Nas áreas de educação e dos serviços públicos, sobretudo, solidificou a dependência, com planos de concessões dos recursos naturais do país, como madeira, pesca ou exportação agrícola.

Esta última, a partir da lógica das commodities, gerou lucros apenas para uma porcão reduzida da elite chilena, fazendo com que uma grande gama de ocupações fossem precarizadas, como o caso das trabalhadoras temporárias do packing (409) nos grandes complexos agroindustriais da zona centro-sul do país.

Assim, como coloca Freddy Urbano, (410) o militante concertacionista dos anos 1990 “trabalha socialmente sobre um horizonte utópico político estreito e funcional as necessidades dos partidos que administram o Estado nacional”. O processo herdeiro de uma “renovação socialista” da esquerda chilena, responsável por parir uma subjetividade militante que passou por uma mutação quando do entusiasmo politico próprio das tradições reformistas e revolucionarias do ciclo 1964-1973, foi questionado em seu papel de transformação radical, uma vez que passou a situar as utopias como um passado imprudente, de loucuras juvenis e que havia levado a destruição da democracia republicana, tão característica a sociedade chilena. (411)

O pensamento da centro-esquerda, outrora “centrista”, constrói uma militância política e, portanto, uma prática político-social vazias de conteúdo e de ideias transformadoras do padrão de acumulação. Sua ação passa, assim, de uma “exigência imperativa a uma exigência instrumental” que perturba as estruturas do próprio partido. O resultado dessa transformação e que a militância passa a ser apenas instrumento social (ou seja, formula-se projetos ditados de cima para baixo pelo Estado) e que os vínculos são agora transpassados por interesses eleitorais e assistencialistas. Não se trata mais de uma construção política real, ou seja, a partir da emergência desde a base, que permitisse apresentar a real vontade das maiorias; trata-se, pelo contrário, de fomentar uma subjetividade “acrítica e funcional” ao neoliberalismo. (412)

O que houve com os movimentos sociais neste novo pacto Concertação-neoliberalismo? Certamente, a tarefa da transição política foi a de levar a cabo um caminho que assegurasse a harmonia social sob uma constituição cívico-militar. Para tanto, apelou-se para a concepção de políticas sociais que, encorajando a participação cidadã, freassem a organização de movimentos sociais de caráter mais reivindicativo. O objetivo maior era fazer com que “os caminhos da transição não se encontrassem, em cada esquina, com incomodas barricadas ocupando o espaço público”, (413) ou seja, não se impregnasse de anomia e violência a restauração democrática. A partir disso, supera-se a necessidade de desarticulação do tecido social que fora construído pelas mobilizações contra o ditador nos anos 1980 e que haviam construído um vínculo estreito entre “o social” e “o político”, baseado em compromissos político-militantes e ações sociais comunitárias de base. Nesse contexto, a esquerda que se encontrava fora da “orbita concertacionista” passou a se dispersar, enclausurando-se na vida privada, em centros de pensamento social ou, lentamente, a ser seduzida pelas novas formas institucionais de participação social. (414)

O interessante de tudo isso – em vista da próxima seção – e que as relações entre o mundo social e as militâncias vividas nesses espaços inauguram novas formas de ação no repertório das esquerdas. Segundo Urbano, (415) enquanto, na militância da Concertação, o trabalho político com a sociedade se “torna assistencial, subsidiando a comunidade sem a pretensão de recriar novas formas organizativas”, uma esquerda não centrista – agora marginal – internalizava-se, refletindo, a partir de uma posição de espectadora, em formas de buscar respostas aos desastres acontecidos. E preciso assinalar que essa esquerda, herdeira das lutas dos 1980, adota uma postura de rechaço total as políticas do modelo neoliberal, bom como também se opõe as várias formas orgânicas da esquerda revolucionaria tradicional.

Nesse plano, encontraremos movimentos que, no presente, tem exercido forca importante no devir da esquerda chilena atual. Um deles e o “movimento” SurDA, espaço onde se manifesta o “autonomismo”, corrente que formula uma critica as esquerdas tradicionais próprias dos anos 1960 e ao fracasso dos “socialismos reais” e que agrupa em seu seio fundacional diversas forcas políticas revolucionarias forjadas em lutas anteriores. Seus seguidores propuseram iniciar uma discussão livre dos velhos credos e slogans, inaugurando formas de lutas distintas que sintonizam as novas condições que impõe o neoliberalismo e impulsionando formas de democracia participativa, críticas ao vanguardismo, a verticalidade e a relação entre os “partidos” e os movimentos sociais.

Palavras finais: Chile frente ao século XXI, o despertar dos movimentos sociais e das trabalhadoras e trabalhadores

Possibilidades de uma ruptura democrática e revinculações com o mundo popular

Desde meados dos anos 2000, a sociedade chilena começou a convulsionar-se lentamente, mas com potencialidades claras. De tal modo que, se a despolitização fora um elemento central da hegemonia neoliberal e da dominação até o fim dos 1990, as rachaduras do neoliberalismo somado a participação cada vez mais majoritária da sociedade na demanda por direitos sociais inauguraram um novo ciclo de lutas para o país.

Estas rachas, lembra-nos o prêmio nacional de Historia Gabriel Salazar, (416) começam a ser percebidas no Informe de Desenvolvimento Humano do PNUD de 1998, em que, depois de avaliar positivamente os oito anos de governo da Concertação, tanto em matéria de consolidação democrática – nas margens impostas pela Ditadura – e de uma tímida revisão a violação dos direitos humanos, se começava a perceber – já no ponto 8 – “os paradoxos de modernização”, aqueles que tinham a ver com a percepção sobre o modelo econômico pelo próprio povo chileno e que se resumiam em um mal-estar intimo e subjetivo contra o sistema, refletido na maioria das pesquisas. Para Salazar, os dados empiricamente recompilados para este informe descreveram, “com claridade

e precisão, os diversos componentes do ‘mal-estar interior’ que então afetava os chilenos e, portanto, seu potencial histórico de corrosão do sistema neoliberal”. Isto é, a crise de um sujeito desprovido de direitos sociais e transformado em consumidor, construído sob os parâmetros do neoliberalismo ditatorial e conduzido pelos governos da Concertação, e que demonstrava seus desconfortos.

Com efeito, parece ser um acordo entre historiadores e cientistas sociais críticos que, em meados dos anos 1990 e com mais forca nos primeiros anos do século XXI, evidenciam-se as fissuras do modelo. (417)

Assim, um dos pontos inaugurais dos “paradoxos da modernização” foi a rebeldia de rua protagonizada pelos jovens secundaristas no ano de 2001, no primeiro movimento estudantil desse contexto, rotulado como o mochillazo (418) e que congregou quase 15 mil estudantes na capital Santiago que demandavam descontos e normalizações nos custos e burocracias associadas ao passe estudantil. O movimento também cimentou as bases e potencialidades dos novos referentes sociais e das novas formas de ação e organização política, visibilizando, nesse exercício, os conflitos com a “democrática” administração de turno.

O curioso, na opinião de Salazar, (419) é que o movimento, convocado em um primeiro momento pelo “Parlamento Juvenil” – instância de governo estudantil criada pela Concertação com uma forte identidade de pactuação –, excedeu a própria convocatória para o dia 4 de abril de 2001 realizada desde o “Parlamento”. Isso se deu quando uma, até o momento, desconhecida Aces (Assembleia Coordenadora de Estudantes Secundaristas) convocou 25 mil estudantes a uma paralisação indefinida e a mobilizações de rua para os dias 8, 9 e 10 de abril, representando aproximadamente 80% dos estabelecimentos educacionais da região metropolitana e tendo um grande e surpreendente apoio da cidadania refletido em parte importante das pesquisas de opinião nacional.

Como mencionávamos, um aspecto central da conjuntura surgida no ano 2001 e que, a partir dela, inauguram-se formas de fazer política distintas as que estavam confeccionadas “desde cima” – desde os partidos da Concertação – e que se diferenciavam de várias lógicas da esquerda política tradicional. Nesse plano, a Aces estava associada a organizações que se caracterizavam por “reger-se sempre, a todo momento, por suas assembleias de base”, desfazendo mapas orgânicos prévios, tais como “as rígidas organizações estatutárias” ou “as lógicas de vanguarda dos anos 1960”. (420) Estas novas formas de se entender com a política foram incubadas no seio de pequenos coletivos (421) que viram seus espaços territoriais (a escola, o bairro etc.) como o cenário real das contradições do modelo econômico vigente. Nesse sentido, como afirma a socióloga Katia Valenzuela, (422) a emergência desses coletivos foi “uma alternativa crítica das formas representativas de organização estudantil que estariam replicando a lógica burguesa de classe política”. Isto é, uma reatualização das formas de fazer política, centrada mais nas bases e na democracia direta e participativa.

Este ciclo não acabou ali. Já no ano 2005, depois de incubar-se o movimento estudantil no seio dos estabelecimentos educacionais e da nula resposta que obtiveram, as novas petições passaram a exceder o “educativo”, problematizando desde a raiz as bases neoliberais da educação chilena e promovendo, nesse sentido, a abolição da Lei Orgânica Constitucional de Ensino (LOCE) – emanada do poder ditatorial e que reduzia a educação a uma lógica de mercado. O movimento exigiu a nova mandatária da Concertação, Michelle Bachelet, que uma nova lei fosse criada, dessa vez emanada de uma Assembleia Constituinte.

A raiva e a indignação estouraram novamente nas ruas, no movimento histórico conhecido como o pinguinazo, (423) no qual, como afirma o estudo de Rodrigo Cornejo e colaboradores, (424) “se experimentou uma notável transmissão de experiência acumulada […] desde o ano 2001, [quando] a maioria desses estudantes [de 2006] nem sequer havia começado a cursar o Ensino Médio […]. Tratou-se de um processo de transmissão oral e informal”.

Ainda que as reformas não tenham mudado substancialmente o problema de fundo da educação, o movimento pinguim foi imensamente massivo, convocando mais de 1 milhão de estudantes secundaristas (de um total de 1,2 milhão no país), convocatória que não fora vista desde o triunfo do “NÃO” e a mudança de regime e a qual reuniu uma pluralidade de atores que davam conta das rachaduras sentidas do neoliberalismo em amplos setores da população. De tal forma que o apoio aos estudantes mobilizados por parte de um amplo espectro de atores situados as margens da demanda educativa (compreendendo o Sindicato de Professores, as associações de pais e responsáveis, ou as Federações de estudantes de diversas universidades) foram respaldadas por uma aprovação de 84% dos cidadãos chilenos. O fenômeno configurou-se, nas palavras de Cornejo et al., (425) em um “novo espaço público (de interesse comum) que representa o ‘sofrimento coletivo’ e o desamparo social que experimentam vastos setores da população chilena no atual modelo de desenvolvimento neoliberal”. Estava-se frente a uma arma carregada de futuro. Com efeito, a potencialidade histórica de outros dois movimentos estudantis se veria refletida nas mobilizações do ano 2011, quando os estudantes universitários convocaram uma série de marchas, paralisações e ocupações dos recintos educacionais, criticando duramente o lucro e a mercantilização dos direitos sociais, chamando a uma participação não só das três categorias – professores, estudantes e funcionários – como atores das universidades, mas também a uma massiva incorporação das famílias dos estudantes e da cidadania em geral em uma “causa comum”.

Todos unidos fizeram grandes panelaços e encenaram demandas com “curiosas” performances artísticas ou desportivas (como coreografias ou maratonas ao redor da sede do governo), propondo novas formas de participação e de escuta. Essa cidadania indignada com uma educação de mercado mobilizou para intervir na opinião pública e popularizar a necessidade de mudança estrutural.

No entanto, como Franck Gaudichaud (426) e outros afirmam, estas mobilizações foram parte de um sentir muito mais profundo que não se deu unicamente nos espaços estudantis, nem emanou exclusivamente deste nicho da sociedade. O “mal-estar social” se havia configurado previamente, como todo processo histórico, e nesse plano tinha antecedentes materiais em outros espaços sociais. Assim como o desgosto social, é possível encontrá-lo fortemente entre as classes trabalhadoras do Chile neoliberal e na escalada de conflitos laborais e mobilizações de diversos trabalhadores precarizados desde o mesmo ano de 2006.

Entre essas mobilizações, encontramos o exemplo daquela dos trabalhadores terceirizados do cobre, os quais puseram em xeque a Codelco (Corporacao de Desenvolvimento do Cobre), paralisando 25 mil trabalhadores e combinando diversas formas de luta que permitiram importantes benefícios para os trabalhadores terceirizados e mineiros. (427) Da mesma forma, o movimento dos trabalhadores portuários, como novo agente de pressão dos governos de turno, lograram lidar com esquemas distintos dos do sindicalismo clássico, unindo a “transitoriedade” de seus trabalhos e as ações coletivas, a propósito dos diversos aspectos das lutas laborais desse setor, assentando as bases de negociação com o empresariado mais potente do país. Importante de assinalar, e seguindo Daniel Nunez Arancibia, (428) que este ciclo de novas manifestações de trabalhadores pode ser lido como um “renascer da greve operaria”, que, tomando outros mecanismos de luta – a exemplo de greves extralegais ou convocação de atores trabalhadores não tradicionais, como os terceirizados e subcontratados –, colocava em evidencia o fato de a crise do modelo e seu impacto na vida das pessoas ser muito mais transversal que a sentida demanda pela educação e contra o lucro, e de que os trabalhadores seguiam presentes, intervindo nos assuntos políticos da cidade.

Nesse cenário, abrem-se novos contextos de luta para a esquerda política. De fato, se bem o avance do movimento estudantil e foi potente desde seus primórdios, a verdade e que ainda apresenta rachas importantes, não obstante a nova lei de gratuidade – duramente criticada –, tal qual a precarização laboral de amplas camadas medias e pobres da população chilena. Acreditamos serem estes os fenômenos que levam parte de uma esquerda não centrista a considerar estratégias institucionais capazes de abrir espaços de disputa no fissurado, porém vivo, neoliberalismo chileno. Nesse plano se situa a Frente Ampla, cuja gênese podemos encontrar, evidentemente, no movimento estudantil e cujos lideres políticos do ano de 2011 se encontram em postos de poder governamental e municipal (no caso de quatro dirigentes estudantis que chegaram ao cargo de deputados e vereadores. Mesmo dentro de cargos institucionais, o respaldo social desses representantes, bem como algumas das estratégias políticas de seus polos de rompimento, edifica diálogos em uma relação mais íntima, real, porém, precoce, com extensas camadas de trabalhadores, pobladores e movimentos sociais amplos, que questionam a ordem neoliberal e patriarcal no país há décadas.

Ainda que a Frente Ampla seja uma heterogeneidade de vozes que vão desde as correntes da esquerda revolucionaria a organizações social-democratas e liberais não direitistas, e certo que seu nascimento se deve a realidade que plasmou as rotas de mobilização dos movimentos sociais e dos trabalhadores antes descritos, uma vez que questionaram o sentido da política transpassada pela ordem neoliberal, lograram posicionar-se do lado dos movimentos sociais, e sua pressão se concentrou a partir de coletivos de base e de partidos políticos não tradicionais que emergiram das entranhas do pacto neoliberal. A frase que representa esses atores e que foi recordada por Nicole Schwabe (429) e esclarecedora do ethos deste grupo: “não somos filhos da democracia, mas sim netos da ditadura”.

As organizações fundamentais para a formação da Frente Ampla, tais como os partidos (inscritos e não inscritos no registro oficial de partidos políticos chilenos) herdeiros de movimentos políticos dos 1990 e universitários dos 2000 (como o Movimento Autonomista, Esquerda Libertária, Esquerda Autônoma, Nova Democracia e Revolução Democrática) (430) vão significar um nicho de experiências que, ainda que distintos em suas militâncias, formações e berços políticos, encontrar-se-ão tanto nas bases como em suas direções, dando resposta a questões-chave que nos permite compreender a emergência de um novo esquema para as esquerdas: como não seguir sendo derrotados como em ciclos anteriores? Como superar relatos testemunhais de uma esquerda fora do duopólio Concertação-Direita (431)? Como articular uma nova esquerda no século XXI?

E que as experiências de organização por fora do duopólio, (432) democratizantes dos exercícios políticos de base e que as lutas estudantis acumularam fizeram com que os coletivos se nucleassem em partidos políticos novos que lograram encarnar as necessidades da população chilena. Os novos atores fizeram do repertório de demandas sociais seus repertórios políticos, com o objetivo de incidir paulatinamente na transformação do sistema com ferramentas discursivas claras cujo objetivo comum e posicionar uma alternativa real para os vastos setores desgostosos com os políticos tradicionais. Estas necessidades, pois, já não podiam somente ser lidas como a necessária interrogação sobre o formato da educação, nem de suas formas de funcionamento, mas devem ser cruzadas com outras demandas sentidas pela população. O próprio movimento estudantil tinha outras pautas, mas também o mundo do trabalho (dai, por exemplo, a insistência de alguns desses grupos na negociação por categoria, verdadeira ferramenta da luta sindical em um cenário de fragmentação dos sindicatos chilenos), a luta pelo direto a soberania dos recursos naturais ou as demandas por igualdade de gênero e aborto livre emanadas pelo feminismo e tao presentes atualmente na agenda frenteamplista.

Com efeito, o “fator” Frente Ampla e um elemento importante para compreender os giros, reviravoltas e reflexões envolvidos no debate sobre a esquerda política no Chile. Ainda que um pequeno espectro de organizações com caráter de ruptura se coloque fora dessa nova institucionalidade, (433) o certo é que o frenteamplismo é um terreno que, hoje, em primeiro lugar, sintetiza sentidos próprios contra o neoliberalismo e, nesse plano, condensa, experiencialmente, as diversas lutas da cidadania contra as políticas neoliberais que deram vida ao pacto Concertação-neoliberalismo. Em segundo lugar, o frenteamplismo abre uma possibilidade latente entre algumas camadas da esquerda desesperançadas de seus antigos espaços de militância política – tradicionais/ concertacionistas ou não – que veem no conglomerado um lugar possível para reanimar sua memória de luta e ação social. Em terceiro lugar, ele se configura como um espaço de confluências e diálogos entre as forcas políticas que disputam, como em todo campo, a hegemonia do espaço, intentando permear e representar, nos lugares de decisões governamentais, as políticas tão desejadas pelos setores populares.

Acreditamos que ali reside o potencial atual do conglomerado.

O primeiro aspecto que resgatamos, já o enfatizamos bastante: a Frente Ampla se instala dentro do curso de uma esquerda que se funda em um questionamento a sociedade de mercado em todos os seus sentidos; e sua visão, no dizer do sociólogo Miguel Urrutia e da deputada frenteamplista Gael Yeomans, penetra “profundamente no sentido comum das maiorias populares no Chile”. (434) Essa crítica ao mercado, compartilhada por grandes camadas da sociedade, pode ser sintetizada nos seguintes eixos: a educação e a saúde como bens de consumo; uma vida humana “tratada patriarcalmente como mera energia biológica individual” que nega as mulheres a possibilidade de decidir sobre seus corpos; uma matriz produtiva baseada no livre cambismo e na exportação de commodities, o que provoca “deterioração socioambiental ao mesmo tempo que aparta os territórios explorados dos benefícios obtidos no processo produtivo territorializado”; uma rede de politicas sociais subsidiadas pelo Estado no mercado; um sistema de pensões e seguridade social “presa a um férreo modelo de poupança individual obrigatório com fundos administrados por capitais privados que, por sua vez, abastecem com importantes investimentos o sistema privado de capitais”. (435) Trata-se de um “sentido comum” antineoliberal que estaria se instalando lentamente na sociedade chilena a que os grupos da Frente Ampla souberam recorrer, bem como foram capazes de sistematizar e socializar.

Talvez um dos indicadores disso possa ser a própria confecção do programa da Frente Ampla, que foi criado em assembleias e, desde as bases, conseguiu nutrir, ainda que medianamente, a rota de mobilização das ideias gerais da candidatura de Beatriz Sanchez ao “La Moneda”. (436)

Nesse contexto, e talvez negligenciando uma análise das potencialidades da Frente Ampla, e importante recordar a confecção dos principais eixos do que resultou no Programa de Muitxs [El Programa de Muchxs]: uma diretriz de quase quatrocentas páginas que se posicionava nos principais eixos de ação da coalizão com uma clara orientação antineoliberal e cuja confecção se deve a síntese da discussão de mais de 12 mil pessoas que participaram em todo o Chile em “encontros comunais”, abertos a cidadania em geral. De fato, em volta do dialogo, as metodologias de educação popular, a participação cidadã e a democracia direta, diversos atores, intergeracionalmente, reuniram-se em encontros setoriais e territoriais nos quais se foram desenhando e sistematizando os vários sentidos em torno do estado atual das coisas no Chile neoliberal e uma clara separação com os governos que haviam administrado um modelo de uma minoria. (437) Não por acaso o programa se rotulava “de muitos e muitas”, materializando um dos elementos cardinais do mal-estar social: a deslegitimidade da classe política tradicional – os poucos.

De igual forma, a própria observação do panorama político em alguns territórios nos dá certas impressões que estão longe de estabelecer panoramas desoladores para a esquerda da Frente Ampla em termos de suas composições – algumas dessas impressões, elaboradas a partir dos marcos teóricos de uma realidade em movimento (como e o caso da reflexão de Daniel Manzano publicado na revista Divergencia). (438)

Nesse sentido, acreditamos que, desde janeiro de 2017 ate o momento, com o impulso efetivo que alcançou a alta aprovação de Beatriz Sanchez – posicionando a Frente Ampla como terceira forca e como uma “nova esquerda” no imaginário social dominado por uma centro-esquerda claudicante em sua transformação da sociedade – e com a aproximação horizontal dos setores e organizações territoriais de novos e desconhecidos jovens dirigentes vitoriosos nas eleições do ano 2017 – agora deputadas e deputados da República –, pode-se notar uma mudança de perspectiva da esquerda mais radicalizada em relação a Frente Ampla. Tal e o caso de antigos grupos políticos, como socialistas allendistas (atribuídos a correntes criticas a renovação socialista) ou organizações comunitárias ligadas a cultura do MIR (como o movimento comunitário Ukamau), que se encontram nesta franja com as forcas de esquerda e territoriais da Frente Ampla (e não somente nas suas direções), demonstrando capacidade de dialogo em torno do “institucionalizar” desde as bases. Antigos dirigentes sociais desesperançados veem em algumas direções da Frente Ampla lideranças não somente “mesocraticas” e que chegaram para reproduzir as antigas tradições do Parlamento, mas sim companheiros representantes de apostas em mudanças estruturais e que também são parte real do sentir dos cidadãos empobrecidos, pois eles mesmos encarnam esses problemas. (439)

Acreditamos que esse processo pode (e deve) ser potencializado pelas organizações de esquerda da Frente nas eleições municipais do ano 2020. Toda vez que as diversas militâncias de esquerda continuam seus trabalhos nos territórios, acabam por incrementar os diálogos com os diversos lideres locais e territoriais (alçando-os como apostas eleitorais), assumindo parte de suas demandas, bem como se tornam capazes de se comunicar a partir das matrizes políticas de cada agrupamento com os saberes sociais emanados desde as bases, estudando e prefigurando práticas de gestão comunitária-participativa, de poder local e popular, “desparlamentarizando” a politica territorial. E por isso que se pode separar a Frente Ampla daquela lógica caracterizada pelo vazio de um componente popular em sua política, pelo abandono das classes subalternas (440) e pela transferência de demandas sociais reais a um poder parlamentário “burocratizado” e de organismos que se “elitizaram” e que, nas atuais condições, em que pese seu avanço, não representam um peso político real nem uma alternativa para as classes populares. (441)

E possível observar que várias organizações da Frente Ampla apresentam, hoje, fortes discussões para a convergência, focadas na construção de um suporte partidário mais homogêneo dentro da esquerda do próprio conglomerado e com o objetivo de se contrapor ao peso de uma social-democracia antineoliberal (fundamentalmente representada pela Revolução Democrática), com matrizes, militantes e sentidos políticos provenientes do marxismo, do socialismo e do comunismo libertário, como também de tradições organizativas ligadas ao novo sindicalismo (“o renascer da greve operaria”) e aos movimentos feministas mais críticos e classistas.

De fato, estas discussões estão sendo levadas a cabo, hoje, com resoluções concretas, que dão início a um impulso criativo por parte de importantes organizações reivindicadoras da Frente Ampla no ano de 2017. Esses esforços se traduzem no início da fusão (442) de quatro organizações no interior do amplo conglomerado, e no começo de um processo de confecção de um único partido político de esquerda revolucionaria, socialista e feminista que enfrente vitoriosamente as eleições municipais do ano 2020. O objetivo, no médio prazo, é conseguir transformar a plataforma no referencial da “nova esquerda” chilena, logrando unir e sintetizar a extraviada conexão entre “o social” e “o político”, inerente aos projetos históricos de transformação estrutural e libertação. Nesse plano, no dia 10 de novembro de 2018, com um massivo ato no centro da cidade de Santiago, deu-se início ao Congresso das Forcas Convergentes, um espaço inaugural de vontade política para desenhar um marco comum entre a chamada “esquerda” da Frente Ampla, (443) cujo teor, na voz de seus dirigentes e representantes políticos, foi a recomposição da esquerda socialista, e a continuidade do esquecido projeto revolucionário chileno.

Esses diálogos dão conta dos próprios pulsos internos das organizações políticas e de reflexões sobre seus papéis na condução das transformações políticas que o Chile necessita. Fazendo isso, não só derrotando as teses históricas de “vanguardas únicas” – tão características do século XX – e propondo modelos de vanguardas compartilhadas, em uma vontade por democratizar a condução dos processos, mas também obrigando seus intelectuais a pensarem um cenário futuro e desenhando utopias reais a partir do presente em direção a uma transição pós-neoliberal. Melhor dizendo: imaginar-fazer agora o mundo que se quer para amanhã, rompendo os cercos de uma transição possível e pactuada.

Hoje, podemos afirmar que a esquerda chilena se encontra em um momento importante, que pode dar novas luzes de crescimento em relação a suas lutas. Desse modo, o caminhar para um amadurecimento da esquerda da Frente Ampla convoca a desenvolver a forca imaginativa que a projetou para o cenário político (ou seja, todo o repertório de lutas que encontrou após sua emergência). Portanto, se a Frente Ampla disputou parte do sentido comum da política nacional após o forte impacto que teve no neutro e característico cenário pós-ditatorial, esta não deve esquecer de sua própria formação histórica e, nesse sentido, propor níveis de luta que sobressaem o devir institucional a que hoje está sujeito.

Em tais circunstanciais, o desafio dos blocos de esquerda do conglomerado, como do restante dos sentidos antineoliberais, e pensar o atual momento como um contexto que exige a criatividade, pois, de outro modo, seus espaços serão cooptados pela política “burguesa” e pela pouca representação popular. (444) De tal forma que, entre a militância desses organismos, deve-se materializar os velhos projetos esquecidos pela transição para a democracia. Não se trataria de um plano de reprodução descontextualizada, senão de uma revitalização da memória das lutas sociais da esquerda histórica, todas as vezes quanto possível. Como dizem os chilenos Urrutia e Seguel, (445) “desmontar o fundamento histórico do mito ‘transitológico’ e tomar aquilo que precisamente se buscou sepultar como um ponto de partida para a reflexão: a experiência de politização subalterna e as praticas de poder popular”.

Nesse plano, e como sugere Pablo Seguel (2015), os conglomerados mais críticos devem se aproximar e construir práticas de poder popular nos territórios onde se dão suas diversas lutas. Esta deve ser a estratégia prefigurativa de socialismo, de soberanias populares e de democracias radicais usada para impugnar as fontes de legitimidade de uma sociedade neoliberal – os enclaves autoritários – e imaginar novas formas de governo e de protagonismo social, gerando projetos de contra cultural e acelerando as linhas que podem continuar rompendo no tempo transicional com ações realmente transformadoras. A atual conjuntura, com um vazio do centro político, com uma “Nova Maioria” (ex-Concertação) empobrecida e uma direita robustecida em nível latino-americano, (446) convida a atacar aqueles enclaves a partir dos espaços institucionais em que se tenha presença e, fundamentalmente, encontrar, nos diversos níveis de articulação política setorial e territorial e na organização democrática de base (construída a partir da deliberação coletiva), as letras para uma basicação da política da Frente Ampla.

Parece que uma das chaves do movimento das esquerdas está em não esquecer a recente historicidade que inaugura o Chile atual, pois e a partir desta recuperação que se pode refundar uma tradição de luta e emancipação, que o terror ditatorial tentou apagar. Sendo assim, e parafraseando heterodoxamente a Gabriel Salazar em um texto escrito em 1999, (447) resulta necessário mergulhar nos diferentes nichos mnemônicos que inauguram a história recente, tanto aquela vinculada ao “legalismo político” próprio das acões institucionais ate 1973, como as memórias da “ação direta da massa social” fundada nas lutas contra a Ditadura Militar e na administração concertacionista. Ou seja, fundar uma “nova’ tradição ancorada nas novas referências da esquerda, já que qualquer processo de conformação de tradições, lembrando os marxistas britânicos Eric Hobsbawm e Terence Ranger, (448) necessariamente convoca a leitura de tradições antigas, em um dialogo incessante entre continuidade e invenção que implica a persistência de memórias subterrâneas que conectam o passado e o presente.

A vontade de forjar uma alternativa revolucionaria para o Chile, que ponha em prática um novo sentido de política e ação social, não deve induzir ao erro o sentido original do projeto histórico da esquerda chilena. E necessário apostar numa ruptura democrática (assegurar e formular processos em que “o institucional” seja entendido como uma ferramenta para acelerar mudanças sociais de longo alcance) com a velha ordem e com os pilares do modelo neoliberal, disputando o senso comum sobre a institucionalidade, priorizando reformas que facilitem a participação popular na administração do poder, não como um fim em si mesmo, mas como o início da ressignificação da política e do Estado, já que esses espaços expressam tensões sociais, política, econômicas e culturais entre o modelo neoliberal e a soberania popular.

Nesse plano, a luta passaria por continuar desatando os nós cognitivos que supõem ambas as “teses”, ou seja, a autonomia do movimento popular versus as mediações institucionais do Estado. (449) Como coloca Valdes a partir dos argumentos de Emir Sader, (450) ambas as articulações são necessárias sempre que o “autonomismo” não se transforme em “axioma político”, do qual “pode derivar soberba e isolamento frente as realidades políticas em curso, por mais louváveis que sejam as razões esgrimidas na teoria e na radicalidade do discurso anticapitalista”. Portanto, “a autonomia que tem sentido na luta emancipatória e aquela que se opõe a subordinação dos interesses populares e não a que se opõe a hegemonia que articula obrigatoriamente as esferas econômica, social e ideológica no plano político”, sendo ambos “nichos mnemônicos” necessários a condição – agregaria Houtart – “[para] que a referência a utopia não se transforme em um cultivo de ilusões e na institucionalização de sistemas piramidais que terminam como fins em si mesmo, contradizendo os objetivos” (451).

O caminho, portanto, deve ser pavimentado fundamentalmente tendo em conta a superação da “falsa alternativa entre reformismo e radicalismo centrada na forma de tomar o poder do Estado”, já que esse exercício, “e uma instância tática de constituição e fortalecimento de poder popular e não uma finalidade em si mesma […], ou seja, a subordinação da administração do Estado a uma refundação da prática política baseada na participação cidadã direta e permanente, uma instância subordinada aos imperativos do poder constituinte”. (452) Para nossa esquerda radical e libertaria, o imperativo não deixa de ser o mesmo de sempre: o problema da organização dos subalternos em torno do poder popular e da confecção de mecanismos de ação heterogêneos por parte das classes populares na conquista de seus direitos sociais, econômicos e reprodutivos.

Postscriptum: não é por trinta pesos, é por trinta anos

As reflexões anteriormente esboçadas foram elaboradas no calor da formação de novas referências, ao final do ano de 2018. Hoje, no início do ano 2020, a situação política e social no Chile tem uma nova cara, articulada a partir das mobilizações sociais abertas em outubro de 2019 e que inauguraram uma nova conjuntura, mudando profundamente o cenário das esquerdas, os movimentos sociais e as lutas reivindicativas do povo em geral. A “explosão social[estallido social], como foi rotulado o fenômeno datado de 18 de outubro, mudou a fisionomia politico-social do Chile neoliberal. Dai em diante, nada será como antes na história chilena.

Trata-se da eclosão de um movimento social crítico aos pilares ditatoriais e a administração política e econômica neoliberal, articulado, em primeira instância – e como tem sido a tônica constante na primeira parte do século XXI chileno –, pelo protesto juvenil e estudantil. De fato, a meados de outubro do ano de 2019, as e os estudantes secundários encabeçaram um movimento contra o encarecimento do transporte publico (que tiveram um aumento de CLP$ 30, algo entorno de US$ 0,042), organizando evasões massivas ao uso do transporte publico e, particularmente, centradas no não pagamento do uso do serviço do metro de Santiago. Com o lema “Evadir, não pagar, outra forma de lutar!”, o movimento captou a atenção da imprensa, do governo e da cidadania.

Esta última, aderiu com forca ao “movimento evasivo” e o legitimou.

Dias depois dessas mobilizações contra o encarecimento do transporte, acoplaram-se outras reivindicações as iniciais, com chamados massivos a panelaços e concentrações no centro das principais cidades, assim como marchas aos diferentes espaços de representação cidadã institucional. Em última instância, acreditamos que o forte apoio social que as mobilizações começaram a ter não se devia ao encarecimento do transporte, mas sim a um “despertar” das sensações de vulnerabilidade econômica e social do povo chileno e ao rechaço a uma classe política que e articuladora daquela vulnerabilidade. Em outras palavras, uma contradição fundamental dada entre uma lógica consumista que atua como fachada de êxito e posiciona o país como uma ilha de progresso, mas que ao mesmo tempo não alcança condições mínimas de vida, enquanto a desigualdade aumenta e a sociedade inteira vai sendo apartada das decisões sobre a polis.

A imprensa, e mesmo parte do movimento social, propôs como lema “Chile despertou”. Ainda que entendível, e bom compreender a “explosão social” menos como uma panela de pressão de sensibilidades adormecidas, e mais como o encadeamento de demandas históricas que já haviam despertado lentamente. Estas demandas históricas, comentadas anteriormente neste artigo, deram conta da crise experimentada desde os 1990 em termos de representação política institucional, como também da expropriação dos direitos sociais básicos dos cidadãos por parte do neoliberalismo chileno. Nesse plano, o protesto contra o encarecimento do transporte somente gerou uma engrenagem para mobilizar um amplo setor da sociedade com diversas exigências em torno a uma critica comum.

Desde 18 de outubro, os protestos começaram a massificar-se. A cada dia, podia-se ver mais e mais chilenas e chilenos nas ruas, exigindo mudança dos lideres políticos e portando lemas clássicos como “No + AFP” (453) e “Educação gratuita e de qualidade”, mas também socializando um dos pilares fundamentais da demanda cidadã de hoje em dia: uma nova constituição, distinta da gerada pelos tecnocratas de Pinochet e administrada pela centro-esquerda chilena por tantos anos. A violência de rua, por sua parte, começou a ser uma das mais chamativas formas de ação – para a imprensa desinformativa e o governo – tanto no enfrentamento direto contra a polícia chilena, como também em diferentes saques e incêndios a supermercados do país.

Diante destas mobilizações, pacificas e violentas, o governo de Sebastian Pinera foi implacável: em um discurso em cadeia nacional, o mandatário disse ao povo chileno “estamos em guerra contra um inimigo poderoso”. A partir dali, renascia, novamente, como expõe Rodrigo Karmy, (454) a lógica do inimigo interno, tão característica da história nacional e latino-americana. Nessa guerra, sem nenhum sujeito específico nem rosto conhecido, posteriormente, abriu-se o Estado de exceção constitucional, dando a possibilidade de os militares saírem as ruas a resguardar a ordem democrática “em perigo”, algo não visto desde os protestos populares dos anos 1980 e que permitiram a queda do governo ditatorial (ainda que a história oficial tenha dado mais legitimidade ao lápis e ao papel do que a organização de base contra a tirania). Esta decisão provocou uma onda de violência repressiva sem paradigma nos últimos anos, com vários mortos, milhares de feridos e centenas de cidadãos com perda da visão por disparo desproporcional de balas de borracha diretamente no rosto, que se transformaram no centro de mira de organizações de direitos humanos nacionais e internacionais.

Em que pese a presença militar nas ruas, o movimento social não se calou nem diminuiu. Milhares de barricadas em todo o país e mobilizações nas principais avenidas da capital Santiago e de regiões começaram a despontar com forca, servindo como um espaço que reatualiza a luta e o debate das pessoas nas ruas. Já não havia medo, diziam muitas faixas. Uma nova geração estava na vanguarda, e ela conseguiu superar velhos vícios ditatoriais. O povo, para além de uma definição política e ideológica, reflexiva ou partidária, continuou na rua exigindo direitos básicos. Para além de exigir um registro institucional de mudanças, o que chama a atenção e a própria potência subterrânea de solidariedade e imaginação que começou a se expressar desde 18 de outubro nas ruas.

Mesmo com o toque de recolher, iniciado dias depois do começo da explosão social, os cidadãos seguiram nas ruas e, sobretudo, deliberando em cabildos [assembleias] autoconvocados em parques, assembleias comunitárias, universidades ou sindicatos, com o objetivo de imaginar, a partir do dialogo, um novo Chile e uma nova institucionalidade.

Trata-se, como descreve Karmy, (455) de um “momento destituinte”, que exige uma mudança de administração, dada a forca com que o antigo Estado, lentamente, começa a rachar ante a potência da rua. Tanto manifestações “pacificas” como encapuzadas se armaram a partir de sua própria subjetividade com o objetivo de derrubar um sistema de injustiça. Uma “rajada imaginaria que desata os corpos do medo que os havia sido incrustado e possibilita uma dança insuspeita de novos ritmos que começam a encher as praças. Destituição do medo, dos militares, dos policiais, das AFPs, dos toques de recolher: todo o regime foi pelos ares”. (456)

Estas mobilizações também geraram uma crise no novo sistema de partidos. Enquanto a direita gerava diversas estratégias para reprimir o povo na rua (materializadas na violência sobre os corpos dos manifestantes), os partidos de centro-esquerda e a Frente Ampla refletiam no que fazer em termos institucionais. Uma Nova Constituição, clamavam os mais “radicais”. A direita, por sua parte, e mediada pelo medo da insubordinação generalizada do povo, já não podia desconhecer essa necessidade e respaldou a ideia de legislar por uma nova carta magna.

Sem embargo, e outra vez, o dialogo e o consenso foram a tônica.

Depois de 29 dias de protesto sem respiro, a classe política conseguiu encontrar uma saída. O “Acordo pela paz social e pela Nova Constituição” contemplou um plebiscito para abril do ano 2020 [em 25/1021, os chilenos foram às urnas para darem seu apoio massivo a uma nova Constituição. A Assembleia Constituinte será formada em um novo pleito em abril de 2021], no qual a cidadania devera estabelecer se quer ou não uma Nova Constituição e mediante qual mecanismo. Nesse plano, duas serão as opções para este plebiscito: uma convenção constitucional composta 100% por cidadãos eleitos para esse trabalho ou uma convenção mista, de 50% de parlamentares e 50% de membros eleitos para essa função. Com qualquer das opções, a instância necessitara do apoio de 2/3 de seus membros para qualquer aprovação, o que em última instância reforçaria o mesmo sistema de participação da maioria do Parlamento de direita e social-liberal que bloqueia transformações profundas e radicais.

Contudo, o “Acordo” não passou indiferente para o movimento social.

Apesar de alguns manifestantes terem ficado satisfeitos, um grosso importante do movimento ainda continua nas ruas manifestando e contestando o fato de que, novamente, as soluções dos problemas sociais do Chile foram resolvidas entre “quatro paredes” e com “os mesmos de sempre”, a classe politica da velha ordem. São estes cidadãos mobilizados em seus territórios e que encheram as ruas do país, os que estão exigindo uma via 100% democrática, pela qual seja o povo que decida junto a suas organizações setoriais.

Para os partidos políticos de centro e centro-esquerda, os acordos foram de tom positivo. Para outros, mais criticos e fora da estrutura 100% institucional, as decisões governamentais de saída da crise social, ao não demonstrarem uma consideração da vontade popular, geraram posicionamentos e repercussões. E dentro deste contexto, por exemplo, que, várias coalizações da Frente Ampla decidiram não participar do “Acordo pela paz”, entre elas o Partido Igualdade [Partido Igualdad] e o Partido Humanista. Um caso emblemático e o que se deu com o novo partido Convergência Social (fruto da junção de forcas autonomistas, ex-comunistas e libertarias, como já discutido neste artigo), que sofreu vários tropeços em sua caminhada, quando, sem responder a vontade da maioria de seus militantes, o deputado Gabriel Boric assinou o Acordo, apesar de suas direções e bases militantes territoriais terem estabelecido a posição de não respaldá-lo, o que ocasionou a saída de centenas de militantes em todo o país. Outros partidos, da Frente Ampla e/ou da esquerda territorial, mantiveram-se discordantes destes pactos embaralhados nos frios e desconectados corredores governamentais, entre alguns poucos senhores de terno e gravata, respaldando atualmente uma via constituinte distinta da desenhada pelo pacto entre a direita e a grande maioria dos partidos políticos chilenos.

Começaram a se produzir outras pugnas entre o poder institucional, seus partidos representantes e o movimento social. Ao que parece, uma das principais contradições se desata entre “o social” e “o político” versus “a política”. Segundo Chantal Mouff e, (457) uma vez que ha na rua uma determinação para que as mudanças se radicalizem, a nova constituição deve contemplar a cidadania e construir soberanamente os novos marcos regulatórios. Diante deste cenário reivindicatório, a alta aprovação por parte da câmara de deputados (127 votos a favor, sete contra e treze abstenções) da “Lei antissaques e antibarricadas” (458) e sua recente reaprovação pelo Senado são um grande exemplo do “mal-estar da sociedade” e do temor da classe política em relação ao povo organizado, o que resultou na sua criminalização. O povo de pé, os comuns, continuam nas ruas e as classes dirigentes têm medo.

Qual será o novo pacto de governabilidade? Prolongar-se-ão a violência policial e a tortura no país? Qual será o futuro da nação chilena e de seu povo? Será esse o último soberano a decidir as regras constitucionais que nos permitam ser realmente livres do domínio incessante dos fluxos do capital transnacional? São estas perguntas que ainda não estão resolvidas e que devem ser decididas nos próximos meses. O que, sim, temos claro, são algumas realidades que podem (ou não) disparar novos fluxos de mudanças, ou seja, sua potencialidade histórica em vias de transformações radicalmente democráticas.

Por um lado, se num passado recente, “reclamar” era algo mal-visto por parte de alguns setores sociais, devido aos golpes memoriais do próprio Golpe de Estado de 1973, de outro, hoje – mais ainda depois da explosão social e das massivas manifestações nas principais avenidas das cidades chilenas –, a critica e o dialogo cidadão se transformaram na norma. “O político” (também sob a chave de Mouffe) voltou a ser a tônica, e isso pode nos levar a imaginar novos futuros desejados e a nos mantermos na rua e na crítica a ordem de uns poucos. A deliberação coletiva em diferentes territórios, a autoconvocação de cabildos onde se discute o futuro da Constituição, as instâncias pedagógicas realizadas por universidades abertas ao publico comum são instâncias que nos fazem perceber a elevada conscientização que tem demonstrado o povo chileno.

Também e necessário compreender o fenômeno atual, situado em uma conjuntura específica, profundamente presente e nebulosa para as gerações jovens, como um assunto fruto de um processo de larga duração.

Todos esses movimentos, parafraseando a Fernand Braudel, não só nos permitem falar de um “despertar da sociedade”, mas possibilitam ainda mais debater a crise de um sistema de dominação articulado a partir da violência estatal sobre o povo organizado, dentro de marcos jurídicos do capitalismo e de sua fase neoliberal. O que testemunhamos e a crise do sistema de dominação, em cujo seio se articularam – historicamente – várias formas de luta que, desde o início do Chile republicano, foram silenciadas manu militari. Assim, a partir de uma visão sócio-histórica, o que se coloca em manifestação nesse período nos permite arguir que a “explosão social” e uma crise do regime de acumulação capitalista, de raízes presidencialistas, com um forte centralismo político e que, economicamente, manifesta-se no livre mercado oligárquico, que tem seus respaldos nos “enclaves autoritários” já discutidos neste artigo e na forca militar.

Presenciamos, assim, a abertura de um questionamento generalizado do caráter do Estado que desata um momento de ingovernabilidade política e de crise da hegemonia neoliberal, expressada na incapacidade da classe dominante em manter a ordem social e política existente e cujo máximo exemplo e a utilização de mecanismos de exceção constitucional como o Estado de emergência.

De igual forma, a atual conjuntura aberta em 18 de outubro de 2019 da conta da agudização da luta de classes e das pugnas entre diferentes setores sociais com interesses antagônicos. As lutas do povo demonstram uma incipiente radicalização democrática em torno da soberania popular, nos permitindo observar o contexto como uma rearticulação política e orgânica que pode chegar a gerar organização concreta para exercer o poder. Para isso, e necessária uma articulação abrangente, de setores sociais presentes na luta, no marco de alianças amplas com setores de trabalhadores organizados. A plataforma orgânica Unidade Social [Unidad Social] (459) parece ser uma alternativa para uma organização política liderada por trabalhadores e trabalhadoras e atores sociais organizados desde as bases que consigam convocar outros partidos na busca da superação do “Acordo pela Paz” e de outras engrenagens institucionais criadas para conter a mobilização social.

O que pretendemos mostrar com este apanhado e a crise das coalizações que prometiam uma representação das maiorias, mas que caíram em concepções ideológicas social-liberais dentro do campo da esquerda – como a crise interna da Frente Ampla que dá lugar a automarginalizacao de militantes e coletividades fundadoras – e acabaram por dar lugar a medidas que bloqueiam as mobilizações do campo popular. Também e importante assinalar que a própria experiência de mobilizações trouxe novas características da luta de classes no Chile, com processos de construção social muito politizados, portadores de uma consciência de classe, mas que se situam as margens do sistema de partidos. Isso não significa que se tenha que prescindir de novas alianças, mas sim que estas tenham como eixo articulador a experiência popular associativa e o mundo dos trabalhadores organizados. Assim, a criação de um Grande Polo Político e Social Constituinte deve gerar o caminho para que a correlação de forcas mude e o descontentamento da rua se converta em uma proposta política constituinte contundente dirigida pelos comuns de sempre, o povo trabalhador.

Barrio Matta Sur, janeiro de 2020.

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Notas:

(381) No original “Frente Amplio”. A Frente Ampla, ainda que detalharemos sua recente historicidade mais adiante, e um conglomerado politico nascido no ano de 2017 e que agrupa diversas forcas politicas que estiveram ate pouco tempo fora do marco da politica institucional. Em seu seio se agrupam diversas forcas, entre elas social-democratas, grupos com tradições marxistas e libertarias, assim como dissidentes de partidos políticos tradicionais, como o Partido Comunista do Chile e forcas sociais sem claras posições fixas nem identidades politicas reconhecíveis, mas com um claro horizonte antineoliberal.

(382) Michelle Bachelet.: ““Los jovenes del Frente Amplio son hijos de militantes de partidos tradicionales”. Disponivel emEn: Emol.com <http://www.emol.com/noticias/Nacional/2017/06/15/862780/Michelle-Bachelet-En-general-los-

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(383) Marina Franco; Florencia Levin (comp.). Historia reciente. Perspectivas y desafíos para un campo en construcción (Buenos Aires: Paidos, 2007).

(384) Reinhart Koselleck. Futuro pasado (Madrid, Espana: Paidos, 1993).

(385) Anne Perotin-Dumon. Liminar. Verdad y memoria: escribir la historia de nuestro tiempo. In: Historizar el pasado vivo en América Latina, p. 3. Disponivel em:<http://www.historizarelpasadovivo.cl/>. Acesso em: 10 jul. 2018.

(386) Juan Carlos Gomez Leyton. “Estado, dominacion, hegemonia y crisis politica en la sociedad neoliberal, Chile 1973-2012”. In: Mabel Th waites Rey (ed). El Estado en América Latina: continuidades y rupturas, p. 200-1 (Santiago, Chile: Arcis/Clacso, 2012).

(387) Manuel Antonio Garreton. “Las ciencias sociales en Chile. Institucionalizacion, ruptura y renacimiento”. In: Helgio Trindade (coord..). Las ciencias sociales en América Latina en perspectiva comparada, p. 11 (Buenos Aires: Siglo XXI, 2007).

(388) Tomas Moulian. Chile actual. Anatomía de un mito (Santiago, Chile: LOM Ediciones, 1997).

(389) Gabriel Salazar; Julio Pinto. Historia contemporánea de Chile. T. III: La economía: mercado, empresarios y trabajadores, p. 49 (Santiago, Chile: LOM, 2002).

(390) Sofia CORREA. “Algunos antecedentes historicos del proyecto neoliberal en Chile

(391) Juan Carlos Gomez Leyton. “Estado, dominacion, hegemonia y crisis politica en la sociedad neoliberal, Chile 1973-2012”, p. 204.

(392) Gabriel Salazar; Julio Pinto. Historia contemporánea de Chile. t. II: Actores, identidad y movimiento, p. 123 (Santiago, Chile: LOM, 1999).

(393) Freddy Urbano. El puño fragmentado: la subjetividad militante de la izquierda del Chile post-dictatorial, p. 54-5 (Santiago, Chile: Escaparate, 2012).

(394) Tomas Moulian. Chile actual. Anatomía de un mito, p. 255.

(395) Como coloca Manuel Antonio Garreton (Neoliberalismo corregido y progresismo limitado: los gobiernos de la Concertación en Chile 1990-2010, p. 79 [Santiago, Chile: Editorial Arcis/Clacso, 2012]), esta coalizão foi realizada pelos seguintes atores “Partido Democrata Cristão (PDC ou DC), que governou com Eduardo Frei Montalva entre 1964 e 1970; o Partido Socialista (PS), que foi junto com o Partido Comunista (PC) o eixo do governo de Salvador Allende e da Unidade Popular, experimentou diversas divisões e reunificações no período da ditadura, além de um processo ideológico conhecido como ‘renovação socialista’; o Partido pela Democracia (PPD), o qual veio do PS como ‘partido instrumental’ para enfrentar o plebiscito de 1988 em que Pinochet foi derrotado; e o Partido Radical Social Democrata (PRSD), menor e herdeiro do clássico Partido Radical, depois de algumas divisões e fusões”.

(396) Mario Garces. “Los movimientos sociales populares en el siglo XX. Balance y perspectivas”. Política, n. 43, 2004, p. 28.

(397) Idem, “Las derrotas de 1973 y 1986”. Revista Punto Final, n. 710, 2010. Disponivel em: <http://www.puntofi nal.cl/710/derrotas.php>. Acesso em: 1o jul. 2018.

(398) Tomas Moulian. Chile actual. Anatomía de un mito, p. 280.

(399) Rodrigo Bano. Lo social y lo político, un dilema clave del movimiento popular, p. 70 (Santiago, Chile: Flacso, 1985).

(400) Gabriel Salazar. La violencia política popular en las “Grandes Alamedas”, p. 295 (Santiago: LOM, 2006).

(401) Mario Garces. El despertar de la sociedad. Los movimientos sociales en América Latina y Chile, p. 80 (Santiago: LOM, 2012).

(402) Juan Carlos Gomez Leyton. “Estado, dominacion, hegemonia y crisis politica en la sociedad neoliberal, Chile 1973-2012”, p. 205.

(403) Manuel Antonio Garreton. Neoliberalismo corregido y progresismo limitado: los gobiernos de la Concertación en Chile 1990-2010, p. 82 (Santiago, Chile: Editorial Arcis/

(404) Loc. cit.

(405) Franck Gaudichaud. Las suras del neoliberalismo maduro chileno, p. 20 (Buenos Aires: Clacso, 2015).

(406) Manuel Antonio Garreton. Neoliberalismo corregido y progresismo limitado, p. 182.

(407) Sergio Villalobos-Ruminott. Soberanías en suspenso. Imaginación y violencia em América Latina, p. 86 (Lanus, Argentina: La Cebra, 2013).

(408) Frank Gaudichaud (Las suras del neoliberalismo maduro chileno, p. 43-4) chama a atenção em seu estudo a estes planos e como os partidos da Concertacao nao transformaram a realidade, em que pese seus anos de governo.

(409) Trabalho de colocar produtos em conteineres para exportacao.

(410) Freddy Urbano. El puño fragmentado, p. 72.

(411) Miguel Urrutia; Pablo Seguel. “El aporte de las ciencias humanas a las pervivencias del golpe de estado. Cuarenta y mas anos para una ruptura democratica en Chile”. Sociedad Hoy, n. 25, jul.-dic. 2013, p. 97-143.

(412) Freddy Urbano. El puño fragmentado, p. 73.

(413) Ibidem, p. 122.

(414) Estudo com base em fontes orais em ibidem.

(415) Ibidem, p. 138.

(416) Gabriel Salazar. La enervante levedad histórica de la clase política civil (Chile, 1900-1973), p. 109 (Santiago: Debate, 2015).

(417) Franck Gaudichaud. Las suras del neoliberalismo maduro chileno.

(418) O termo mochillazo alude a característica bolsa estudantil conhecida popularmente como “mochila”.

(419) Gabriel Salazar. La enervante levedad histórica de la clase política civil (Chile, 1900-

1973), p. 129-31.

(420) Ibidem, p. 134.

(421) Gabriel Salazar (ibidem, p. 136) nos brinda com uma leitura “a la chilena” e uma critica importante sobre os coletivos: “os coletivos eram, originalmente, pequenos grupos de refugio e proteção, mas que cresceram em identidade e dialogo para desenvolver depois sua criatividade, sua capacidade de ação e, em definitivo, sua cota local de soberania. Eram pequenos átomos sociais de rotação livre e movimento de gravitação critico. E apesar de constituir uma forma associativa essencialmente flexível, eram, ao mesmo tempo, células locais de acoes múltiplas. Dadas essas características, o coletivo se ajustava bem, sem lugar para duvidas, aos desconfiáveis novos tempos (terrorismo militar e democracia pactuada), e ademais reconfortava com sua fraternidade molecular, ‘repeava’ criativamente a nova identidade, e fazia pesar sobre o sistema armas politicas (cidadãs) inéditas no pais: a simultaneidade, a ubiquidade, coincidência e massividade culturais dos novos cidadãos e suas novas praticas politicas”.

(422) Katia Valenzuela. “La primera de Chile: autonomia y antagonismo en el movimiento estudiantil”. In: Massimo Modonesi (coord.). Movimientos subalternos, antagonistas y autónomos en México y América Latina, p. 186 (Mexico D.F, Mexico: Unam, 2015).

423 Se denominou movimento “pinguim” devido o tradicional uniforme dos/das estudantes chilenos, que combinam as cores cinza/preto/azul com o branco das camisas, assemelhando-se, de longe, com a ave.

(424) Rodrigo Cornejo; Juan Gonzalez; Rodrigo Sanchez et al. Las luchas del movimiento por la educación… y la reacción neoliberal. Equipo Observatorio Chileno de Politicas Educativas, Universidad de Chile, 2009, p. 3. Disponivel em: <http://www.opech.cl/inv/analisi/luchas_movimiento_educacional.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2018.

(425) Ibidem, p. 4.

(426) Franck Gaudichaud. Las suras del neoliberalismo maduro chileno.

(427) Ibidem, p. 48.

(428) Daniel Nunez Arancibia. “Apuntes sobre el renacer de la huelga obrera en Chile”.

Revista Colombiana de Sociología, v. 35, n. 1, 2012, p. 41-58.

(429) Nicole Schwabe. “No somos hijos de la democracia sino nietos de la dictadura. El movimiento estudiantil chileno en 2011 y despues”. Nueva Sociedad¸ n. 273, 2018.

(430) Os primeiros partidos, a exceção da Revolução Democrática, vem de correntes próximas ao (ou diretamente são) marxistas e vinculadas as tradições da esquerda revolucionaria. Esquerda Autônoma e Movimento Autonomista, que já foram um só grupo, são herdeiros das matrizes politicas do movimento SurDA, dos anos 1990. Esquerda Libertaria provem de um cruzamento entre correntes marxistas e anarquistas e do encontro de organizações como, a Frente de Estudantes Libertários (de tradição universitária) e a Organização Comunista Libertaria (OCL), entre outras. Nova Democracia, por sua vez, revive tradições de sujeitos emigrados do Partido Comunista e de outras forcas progressistas do campo identitario do comunismo chileno, como, a sua maneira, e a sintese partidaria do grupo estudantil Uniao Nacional Estudantil (UNE). Revolucao Democratica, fundada a partir da sintese partidaria de jovens pertencentes a Nova Acao Estudantil da Universidade Catolica do Chile, provem, fundamentalmente, de correntes social-democratas.

(431) Passada a se denominar Nova Maioria apos a indicacao de Michelle Bachelet como candidata presidencial nas eleicoes do ano 2013 e que prometia ser uma referencia mais ampla da esquerda. Na realidade, porem, resultou ser uma continuidade dos governos anteriores, mas com tons mais progressistas e sociais que, todavia, nao transformaram radicalmente os bastioes neoliberais.

(432) Como ficou conhecido popularmente o sistema politico chileno ate antes da reestruturacao do sistema binominal, o qual, na pratica, nao plasmava a decisao das maiorias, gerando dois blocos antagonistas e pouca representacao no Congresso Nacional, devido a sua logica de atropelar e marginalizar as minorias partidarias com representacao popular. Foi transformado no ano 2018 por um sistema mais proporcional e que assegura a representatividade feminina, diminui as barreiras para candidatos independentes, entre outros. Mais informacao na Biblioteca do Congresso Nacional do Chile: <https://www.bcn.cl>.

(433) Trata-se de uma franja de setores de esquerda que nao se vinculam com linhas institucionais da luta politica, abrigando-se em tradicoes politicas como o marxismo-leninismo mais ortodoxo ou vertentes guevaristas de luta politica.

(434) Miguel Urrutia; Gael YEOMANS. “Siete instalaciones politicamente limitadas em el sentido comun”. Galde, 2018. Disponivel em: <http://www.galde.eu/es/revista/galde–n20/>. Acesso em: 20 jun. 2018.

(435) Ibidem.

(436) Alberto Mayol. Frente Amplio en el momento cero. Desde el acontecimiento de 2011 hasta su irrupción electoral en 2017 (Santiago, Chile: Latinoamericana, 2018).

(437) Ver o “Programa de Muitos”, disponivel em: <https://www.frente-amplio.cl/sites/default/fi les/documentos/programa-beatriz_sanchez.pdf>. Acesso em: 7 jun. 2020.

(438) Daniel Manzano. “El Frente Amplio chileno: .una interpretacion posmarxista?”. Divergencia, ano 6, n. 9, jul.-dic. 2017.

(439) Um caso exemplar e o de quatro deputadas frenteamplistas, Gael Yeomans (Esquerda Libertaria), Catalina Perez (Revolucao Democratica), Camila Rojas (Esquerda Autonoma) e Natalia Castillo (Revolucao Democratica), cujas dividas de emprestimos para estudar na educacao superior publica chegam a montantes milionario, como para a grande maioria dos jovens precarizados chilenos. Ver nota jornalistica “Diputadas y endeudadas: Los pasivos por creditos universitarios que afectan a cuatro parlamentarias del FA”, disponível em: <http://www.eldesconcierto.cl/2018/02/07/diputadas-y-endeudadas-los-pasivos-por-creditos-universitarios-que-afectan-a-cuatro-parlamentarias-del-fa/>. Acesso em: 21 maio 2018.

(440) Luis Th ielemann. “.Un parto en una funerario? La formacion del Frente Amplio”. Viento SUR, n. 156, 2018, p. 13.

(441) Octavio Avendano. A propósito de las elecciones primarias del 2 de julio. Nota de prensa de la Universidad de Chile, 2017. Disponivel em: <http://www.uchile.cl/noticias/134701/columna-a-proposito-de-las-elecciones-primarias-del-2-de-julio>. Acesso em: 7 jul. 2020.

(442) Escolhemos o termo fusão ao inves de fundação para marcar o sentido da uniao, em que, como no caso de muitos partidos historicos (caso do Partido Socialista chileno), varias “almas” conviverao em uma mesma organizacao.

(443) Trata-se das organizacoes Esquerda Libertaria, Nova Democracia, Socialismo e Liberdade e Movimento Autonomista. Esta iniciativa e similar as que tempos atras tambem realizaram duas forcas da Frente Ampla (Esquerda Autonoma e Partido Poder), quando se aventuraram a confeccao de uma ferramenta eleitoral que lhes permitissem participar das eleicoes municipais. O interessante desse ultimo “encontro”, sua diferença da “convergencia” das contraforcas anteriormente comentadas, e que o Partido Poder (de posicao mais centrista e sem claros delineamentos ideologicos), estaria dando um giro a esquerda na sua politica, encontrando-se com a Esquerda Autonoma (herdeira da corrente autonomista chilena e situada em um foco marxista) em um espaco ainda sem linhas politicas claras, diferente de outros setores cuja formacao emerge de sentidos e praticas comuns, todas elas circunscritas a uma “tradicao revolucionaria” e ao campo popular. Ver: Catalina Aninat; Juan Pablo Figueroa. “El Frente Amplio que surge tras las fusiones”. La Tercera, 10 nov. 2018. Disponivel em: <https://www.latercera.com/politica/noticia/frente-amplio-surge-tras-las-fusiones/396585/>. Acesso em: 7 jul. 2020; e “Movimientos del Frente Amplio inician la conformacion de nuevo partido politico”. El Dínamo, 11 nov. 2018. Disponivel em: <https://www.eldinamo.cl/nacional/2018/11/11/movimientos-del-frente-amplio-anuncian-conformacion-de-nuevo-partido-politico/>.Acesso em: 7 jul. 2018.

(444) Luis Th ielemann. “.Un parto en una funerario? La formacion del Frente Amplio”

(445) Apud Miguel Mazzeo. Introducción al poder popular. “El sueño de una cosa”, p. 19 (Santiago: Tiempo Robado Editoras, 2014).

(446) O triunfo de Jair Bolsonaro e o ascenso das direitas fascistas na America Latina poe em tensao o atual cenario local, ja que no Chile, a cada par de anos, surge uma nova direita conservadora e autoritaria, muito em sintonia com as concepcoes politico-morais de Bolsonaro (homofobia, racismo, machismo, militarismo etc.). Sao exemplos desse fenomeno a Acao Republicana e a presenca ativa de atores politicos como Jose Antonio Kast, que marcam cada vez mais sua presenca na cultura politica nacional, tendo um apoio menor, mas progressivo, entre a populacao e obrigando a esquerda a reforcar sua conexao com o campo popular que apoia esses setores.

(447) Gabriel Salazar. La historia desde abajo y desde adentro, p. 207 (Santiago, Chile: Taurus, 2017).

(448) Eric Hobsbawm; Terence Ranger. La invención de la tradición (Barcelona: Critica, 2002).

(449) Gabriel Salazar. La historia desde abajo y desde adentro.

(450) Gilberto Valdes. “La hegemonia como desafio. Los nuevos gobiernos y el movimiento social popular en America Latina”. In: Miriela Fernandez; Llanisca Lugo (comp.). Reencauzar la utopía. Movimientos sociales y cambio político en América Latina, p. 17 (La Habana, Cuba: Caminos, 2012).

(451) Emir Sader apud Gilberto Valdes. “La hegemonia como desafio”, p. 17. 452 Villalobos-Ruminott apud John Berverley. Políticas de la teoría. Ensayos sobre subalternidad y hegemonía, p. 21 (Caracas: Nuestra America, 2011).

(453) Movimento contra as Associacoes de Fundo de Pensoes (AFP), entidades privadas que gerem a poupanca dos cidadaos para aposentadorias, coracao do sistema privado de previdencia no Chile e tido pelos seus criticos como um dos principais responsaveis da desigualdade social no pais [nota dos organizadores].

(454) Rodrigo Karmy. “Estado en quiebra”. El Desconcierto, 23 nov. 2019. Disponivel em: <https://www.eldesconcierto.cl/2019/10/23/estado-en-quiebra>. Acesso em: 12 jan.2020.

455 Rodrigo Karmy. “Momento destituyente”. El Desconcierto, 26 nov. 2019. Disponivel em: <https://www.eldesconcierto.cl/2019/10/26/momento-destituyente/>. Acesso em: 12 jan. 2020.

(456) Ibidem.

(457) Para a fi losofa e cientista politica Chantal Mouff e (Em torno a lo político [Buenos Aires: Fondo de Cultura Economica, 2007]), “o politico” corresponde ao terreno do antagonismo constitutivo das sociedades humanas, isto e, “o proprio modo em que se institui a sociedade” (p.16), guiado por principios de confl ito entre os seres humanos. “A politica”, por sua parte, se referiria ao “conjunto de praticas e instituicoes atraves das quais se cria uma determinada ordem, organizando a coexistencia humana no contexto da confl itividade derivada do politico.

(458) O projeto condena os saques e a interrupcao completa da livre circulacao, e determinou que quem interrompa o transito “mediante violencia ou intimidacao das pessoas” pode ser condenadas de 61 a 541 dias de prisao (Veronica Marin. “Senado aprueba ley antisaqueos y antibarricadas: Ahora el proyecto vuelve a la Camara”. Emol.com, 13 ene. 2020. Disponivel em: <https://www.emol.com/noticias/Nacional/2020/01/13/973355/Senado-aprueba-ley-antisaqueos-antibarricadas.html>. Acesso em: 14 jan. 2020).

(459) Conglomerado que agrupa diversas organizacoes representantes do mundo do trabalho, feminismos e organizacoes sociais amplas com vistas a um trabalho coletivo por uma nova Constituicao. Mais informacao em: <https://unidadsocial.cl/manifi esto-unidad-social-2/>.

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