Quando até as nuvens são privatizadas

Sol, água e vento já são “campos de exploração” para o capitalismo. Agora empresários querem fazer fortunas com um delírio real: engarrafar os rios voadores da Amazônia, antes que precipitem na terra. Uma garrafa sai por R$ 323

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Tempos atrás, quando andei no Chile, numa das casas de Neruda, comprei uma de suas antologias poéticas. Lendo aqueles poemas, de repente fiquei surpreso: já na década de 40 do século passado ele pedia que o ar permanecesse livre. Tentei reencontrar a passagem na antologia e não consegui.

Hoje o Nordeste é tomado por torres eólicas e empresas privadas ganham fortuna com a privatização do vento. O mesmo acontece com o sol, quando setores desse governo e empresas privadas querem restringir a geração de energia solar como se o sol fosse sua propriedade privada.

Mas, o inimaginável, o avesso do avesso do avesso, acaba de acontecer. Uma empresa – Ô Amazon Air Water -, decidiu engarrafar água dos rios voadores da Amazônia para vender como uma das águas potáveis mais caras do mundo, cerca de R$ 323,00 a garrafa. Foram buscar o H2O em estado perfeito, após a evaporação dos oceanos e a transpiração das árvores, antes que caia no chão, para evitar contaminação e criar um fabuloso nicho de mercado de água engarrafada, com o selo de qualidade amazônica. É o hidronegócio das nuvens. Nem Neruda, em toda sua vastidão e profundidade poética, conseguiria imaginar essa possibilidade.

Nós, aqui no Nordeste, desenvolvemos a captação da água de chuva em cisternas, mas depois dela cair sobre os telhados das casas. Também tem finalidade de saciar a sede dos que precisam de água, ou como água de produção, não como produto mercantil. Portanto, uma dimensão socioambiental e não como produto de mercado. Funciona.

A água de chuva, muito ao contrário do que muitos imaginam, se vier de uma atmosfera limpa, é a água mais descontaminada do mundo. Alguém percebeu isso e foi criar esse nicho de mercado na Amazônia, onde a atmosfera ainda é limpa, se não acabar toda contaminada por queimadas.

Pessoalmente, tiro o chapéu para a ganância capitalista. Sabem ver mercado onde nem um delirante poeta imaginaria, nem mesmo Pablo Neruda.

Viva a terra, o ar, o sol e as águas livres!

OBS: No Brasil celebramos a Semana Mundial da Água de 15 a 22 de Março. O dia mundial da água, firmado pela ONU, é 22 de Março.

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Um comentario para "Quando até as nuvens são privatizadas"

  1. josé mário ferraz disse:

    Interessante a matéria, apesar de expressar o óbvio porque a cultura capitalista deve ter sido inspirada por um Midas moderno uma vez que tem por único objetivo transformar tudo em dinheiro. Até bundas e peitos recheados de silicone, habilidade em praticar esporte, vulgaridade e putaria são transformados em dinheiro. A vida assumiu caráter irreal de forma tão espetacular que embora na velhice assuntos sérios ocupam as atenções, na juventude as brincadeiras é que são importantes. Disto resulta que ao passar a fase de jovem o que se vê são corredores de hospitais abarrotados de chorões ao lado de monumentais templos para oração e esportes. Embora para a massa bruta de povo um sujeito chamado Carl Marx é o capeta em pessoa, por em prática a necessidade de modificar o mundo por ele defendia é a solução para tantos desatinos.

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