O recado de Michigan a Joe Biden

Votos de protestos chamam a atenção para a insatisfação de eleitores democratas com a ajuda incondicional dos EUA a Israel. Massacre em Gaza pode ser decisivo para uma derrota do atual presidente

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As primárias democratas do estado de Michigan, realizadas nesta terça-feira (27) deram ao atual presidente Joe Biden uma vitória por ampla margem. Ele alcançou 81% contra 2,7% do congressista Dean Philips, que ficou atrás de Marianne Williamson, que ainda teve o nome impresso na cédula mesmo após ter desistido da campanha em fevereiro.

Mas o que chamou a atenção foi a opção “uncommitted” (sem compromisso ou descomprometido, em português) ter superado a marca de 13%, ultrapassando a barreira dos 100 mil votos. Esta opção, que consta em algumas primárias de estados, se destina a eleger delegados que não têm vínculo com nenhum dos candidatos. No caso de Michigan, contudo, ela teve outro significado.

O voto em uncommitted foi estimulado em especial pela campanha Listen to Michigan (Ouça Michigan), que pretendia enviar um recado a Biden em função de seu apoio e financiamento dos ataques de Israel a Gaza. O objetivo inicial era superar os 10 mil votos, diferença próxima àquela que teve Donald Trump em seu triunfo no estado contra Hillary Clinton em 2016. O resultado foi dez vezes melhor que o esperado e, cumprindo o mínimo de 15% em um dos distritos, é provável que ao menos um delegado seja eleito.

Em Dearborn, cidade de pouco mais de cem mil habitantes que concentra expressivas comunidades árabe-americanas e muçulmanas, o uncommitted derrotou Joe Biden por 57% a 40%, de acordo com contagem ainda não-oficial publicada no site da prefeitura local. Ali, o democrata derrotou Donal Trump nas eleições de 2020.

“Tenho me organizado pela paz há 40 anos e raramente vi um movimento tão orgânico e autêntico se reunir em apenas três semanas”, disse o ex-congressista estadunidense Andy Levin, de Michigan, em entrevista ao Democracy Now. “A mensagem que enviamos ontem ao presidente foi: você deve mudar o rumo. Você deve mudar o rumo em prol de sua reeleição e por que é a coisa certa a fazer sob todos os pontos de vista, incluindo os interesses da segurança nacional dos Estados Unidos.”

O perfil oficial da campanha no ex-Twitter também celebrou. “Nosso movimento saiu vitorioso esta noite e superou enormemente nossas expectativas. Dezenas de milhares de democratas do Michigan, muitos dos quais votaram em Biden em 2020, não estão comprometidos com a sua reeleição devido à guerra em Gaza”, pontuou. “O presidente Biden financiou as bombas que caíram sobre familiares de pessoas que moram aqui mesmo em Michigan. Pessoas que votaram nele, que agora se sentem completamente traídas.”

A ideia do movimento não é incentivar o apoio ao provável principal adversário de Biden, o republicano Donald Trump, mas sim pressionar o atual presidente a atuar decisivamente por um cessar-fogo permanente e que seja interrompido o financiamento incondicional de armas e recursos bélicos para Israel.

Biden tem motivos para se preocupar, e o sinal de alerta vem soando há alguns meses. Em 2020, ele superou Trump em Michigan por 154 mil votos e a comunidade árabe do estado hoje cresceu para cerca de 300 mil, sendo 200 mil registrados como eleitores. E todas as pesquisas publicadas neste ano mostram o republicano com vantagem no estado, com percentuais que variam entre 2 e 8 pontos de vantagem.

Insatisfação

Os sinais de alerta em relação à insatisfação com que boa parte dos eleitores democratas tem encarado o apoio irrestrito do governo dos EUA aos ataques de Israel em Gaza já vem de longe. E o descontentamento atinge fortemente os jovens. Uma pesquisa NPR/PBS NewsHour/Marist divulgada em 13 de outubro apontava que 78% das pessoas com 45 anos ou mais acreditavam que o governo deveriam assumir uma posição publicamente pró-Israel, mas somente 48% das pessoas com menos de 45 anos concordaram, evidenciando uma clivagem geracional importante.

Uma pesquisa New York Times/Siena College com eleitores registrados divulgada em dezembro mostra Joe Biden com 43% entre eleitores na faixa entre 18 e 29 anos, contra 49% de Trump. O democrata vence entre aqueles da faixa etária de 30 a 44 anos por 49% a 44%. Trata-se de uma diferença grande quando se compara com os resultados da pesquisa boca de urna da NBC, realizada com eleitores que haviam saído dos locais de votação em 2020. O democrata havia vencido na ocasião por 60% a 36% no segmento dos 18 aos 29 e também no de 30 a 44, por 52% a 46%.

Os organizadores do Listen to Michigan disseram estar em contato com apoiadores em Minnesota, que realiza primárias na semana que vem, e Washington, que faz sua votação em 12 de março.

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