Petrobras: a venda das refinarias e a volta ao passado

Governo promove liquidação de unidades modernas, eficientes e cruciais à soberania energética do país. Finge ignorar que petroleiras não sobrevivem apenas da extração. O pretexto é uma ficção: suposto “endividamento” da empresa

.

A História mostra que a maioria dos países industrializados promoveu o seu desenvolvimento sem dispor de reservas de petróleo em seu território. Japão, Coreia do Sul, Taiwan, Alemanha, França, Itália, Suécia e outros países europeus estão nessa condição, enquanto Estados Unidos e China, embora detentores de reservas importantes, sempre foram grandes importadores líquidos de petróleo. A maior geração de riqueza não está, portanto, na produção da matéria prima, mas, sim, na incorporação de tecnologias que permitam agregar valor ao óleo e ao gás natural, transformando-os em combustíveis, eletricidade, petroquímicos, fertilizantes, fármacos e outros produtos derivados.

O Brasil seguiu o caminho desses países, contrariando nossa vocação secular de produzir e exportar “commodities” e manufaturas com reduzido valor agregado. Quando a Petrobras foi criada, o País produzia 2.700 bpd [barris por dia], enquanto o consumo nacional de derivados atingia 137.000 bpd, condição que mantinha o Brasil em uma desconfortável dependência da importação de produtos refinados. A missão da Petrobras sempre esteve referida à busca da autossuficiência em petróleo e à garantia de abastecimento do nosso mercado interno. A produção de óleo, no início, ficou limitada pela insuficiência das reservas exploradas em campos terrestres, mas, as descobertas em águas profundas e no Pré-Sal viabilizaram a produção atual da Petrobras, de 2,8 milhões de boe [barris de óleo equivalente] por dia.

A opção pela implantação de um parque de refino no País foi modelada para atender o nosso mercado interno pelo menor custo total e para reduzir a remessa de divisas para o exterior. A partir dos processos convencionais de destilação, as instalações de refino incorporaram, ao longo do tempo, unidades cada vez mais complexas, como FCC, HDT, HCC, TC, além da produção de lubrificantes, petroquímicos e fertilizantes. As características da demanda brasileira, a necessidade de processar petróleos de diversas origens e a introdução de biocombustíveis e gás natural no mercado exigiram a implantação de novas unidades industriais com tecnologia avançada, capazes de especificar combustíveis atendendo requisitos ambientais e dotadas de elevados índices de agregação de valor. Na esteira da construção do parque de refino brasileiro, floresceu uma indústria nacional que, em apenas duas décadas, tornou-se capaz de fornecer 80% dos bens e serviços requeridos pelos investimentos da Petrobras no “downstream”.

Este breve histórico tem o objetivo de resgatar dois fatos muito importantes. O primeiro deles é que o parque de refino brasileiro é constituído por instalações modernas, atualizadas tecnologicamente, complexas e flexíveis, comparáveis, em seu conjunto, ao que há de melhor em todo o mundo. Podendo processar 2,4 milhões de bpd, está preparado para atender o sétimo maior mercado consumidor do planeta. O segundo fato relevante é que a Petrobras, desde a sua criação, orientou o seu crescimento de forma integrada – do poço ao posto, como era costume dizer – e buscou adicionar valor ao petróleo mediante a produção de derivados, lubrificantes, petroquímicos e fertilizantes. Nos últimos 20 anos, investiu fortemente nos setores de gás natural e biocombustíveis e promoveu a diversificação de seus negócios no setor de energia, com usinas termétricas, eólicas e PCH. Alcançou, já em 2015, um posicionamento estratégico de causar inveja às suas congêneres multinacionais, então abaladas pela queda dos preços do petróleo.

Sabemos, hoje, que a crise iniciada em 2014 teve origem na disputa por “market-share” entre os países da OPEP, liderados pela Arábia Saudita, e os produtores de óleo de xisto norte-americanos. Muitos analistas acreditavam que essa disputa permaneceria no curto e médio prazos, o que vem, de fato,  acontecendo, inibindo uma recuperação mais consistente e sustentada dos preços do petróleo. No futuro mais distante, o crescimento da demanda mundial será limitada por pressões ambientais, pela competição com energias limpas e gás natural e pela introdução do veículo elétrico no mercado. Neste cenário, caracterizado por preços mais baixos, as grandes petroleiras terão que se posicionar em modelos de negócios que permitam integrar as suas operações, agregar maior valor ao petróleo e ao gás, defender o seu “market-share” e diversificar as suas atividades. No nível estratégico, as palavras de ordem serão “integração” e “diversificação”.

O posicionamento estratégico da Petrobras conferiu a ela uma importante vantagem comparativa com relação às petroleiras internacionais. De acordo com uma análise feita pelo economista Claudio da Costa Oliveira, a Petrobras supera amplamente as duas maiores empresas de petróleo norte-americanas, ExxonMobil e Chevron, nos indicadores de geração operacional de caixa, liquidez corrente e saldo de caixa ao final do exercício.  A Petrobras sofreu menos com a queda do preço do petróleo, uma vez que as suas receitas, em sua maioria provenientes do refino, não estavam vinculadas a preços internacionais. Manteve, desde 2012, uma geração de caixa da ordem de US$26 bilhões, enquanto Exxon e Chevron caíram, em 2016, para US$22 e US$13 bilhões, respectivamente.

A liquidez corrente, que significa a capacidade das empresas de cumprirem os seus compromissos financeiros de curto prazo (um ano), mostra, desde 2012, uma situação muito mais confortável para a Petrobras. Em 2016, a estatal dispunha de US$ 1,8 para cada US$1 que  tinha a pagar no curto prazo, enquanto suas congêneres norte-americanas dispunham de apenas US$0,9.

A direção da Petrobras não valorizou este posicionamento favorável da companhia no mercado. Desde 2016, os gestores da empresa vêm se empenhando na venda dos ativos estruturantes das principais fontes de receita da empresa, como se fosse a única solução para a administração da dívida. Sem deficiência de caixa, como foi visto, nada justifica a alienação de unidades lucrativas. Foram vendidos ativos que rendem mais de 12% ao ano – NTS, Liquigás, BR, Gaspetro – para pagar parcelas de uma dívida cujo custo de alongamento tem se mantido entre 5 e 7%. A alienação de metade do parque de refino brasileiro, prevista no programa de desinvestimento da Petrobras e ora em andamento acelerado, afetará a integração das atividades da empresa e resultará em perda de “market-share” e diminuição de receita.

O desmantelamento do “downstream” da nossa indústria de petróleo está ocorrendo de forma precipitada, a toque de caixa, sem um planejamento que considere os interesses do Brasil e dos brasileiros. Afastados do mercado, os grandes grupos empresariais nacionais estão impedidos de participar dos processos de venda de ativos promovidos pelo governo. As oportunidades de negócios estão restritas a uma Babel de interesses de grupos estrangeiros, oriundos de todo o planeta, sem a obrigação de manter um mínimo de compromisso com o desenvolvimento nacional. No futuro, como de praxe, devolverão aos seus países de origem, no menor prazo possível, os investimentos aqui feitos. Trata-se, portanto, de um processo de desnacionalização da indústria brasileira de petróleo e gás, sob o pretexto de supostas e não comprovadas dificuldades financeiras da nossa maior empresa.

O programa de desinvestimento promete transformar a Petrobras em uma empresa sem significado. Se nada for feito para impedir esse desastre, o Brasil iniciará, sob aplausos do mercado especulativo, a sua marcha batida rumo ao passado.

Leia Também:

17 comentários para "Petrobras: a venda das refinarias e a volta ao passado"

  1. Acredito que o governo atual brasileiro está tentando ajudar o Brasil em todos os sentidos e uma forma estratégica e inteligente será a privatização parcial de algumas estatais … assim não podemos pensar de forma parcial pelas metas traçadas e sim tentarmos compreender as estratégias como um todo! Não sou nem direita e nem de esquerda …. sou pró Brasil e concordo com as estratégias do senhor Paulo Guedes … bem como também o mais importante neste momento é pensarmos de forma ampla e não especifica … um feliz ano novo a todos. O Brasil está no caminho certo!

  2. marcelo GONCLAVES DE OLIVEIRA disse:

    acredito que monopolio, nao e uma opcao.
    vender algumas refinarias promovendo concorrencia e trazendo investimento em algumas regioes do Brasil
    pode ser bom e desejo que seja.

  3. Joel disse:

    Onde estava os sindicatos quando o PT roubava o Petrobras?

  4. Albert Lamb disse:

    Óbvio o viés comunista, socialista, dessa reportagem da Petrobrás…. em nenhum momento se referiu o custo de sustentar, só para dar um exemplo…. o Bandido do Collor…. quantos anos roubando a distribuidora…. não precisa vender…. só repassem os penduricalhos….

  5. Um texto completamente sectário e que esconde uma verdade insofismável: a Petrobrás é uma empresa com um enorme custo pago pelo povo, que fornece produtos péssimos e caríssimos, assim sendo sustentada pelo povo, que arca com os altíssimos salários de seus funcionários, além de servir de caixinha para sindicatos e políticos esquerdistas.

  6. O comunista. disse:

    Múúúúú. Incrível como tem gado em todo lado, ruminando suas abobrinhas.
    Toca o berrante!!!!!

  7. Luan disse:

    Quanta falta de lucidez, no mundo de mudança de fonte energética, vender algumas unidades de refino é o fim da estabilidade energética e gastar recursos públicos para se ter várias empresas para fazer o que qualquer empresa privada poderia fazer sem as amarás das regulações idiotas que se tem nos mais diversas áreas da economia.

  8. Humberto disse:

    Seria bom que essas pessoas que falam que o PT roubou tudo e blá, blá, sabemos que a corrupção no Brasil é ad eterno, mas cinceramente, esse pessoal q defende a liquidação do patrimônio público, mostre apenas uma uma grande empresa pública que os neoliberais deles criaram, apenas uma. Nunca criaram nada, são bons em vender

  9. EXPEDITO ITALIANO PEREIRA disse:

    Para os alienados do atual governo o Lula ainda estar governando, toda tramóia do atual governo é atribuído ao passado. Acorda pra a realidade bando de energúmenos analfabetos fanáticos.!!!

  10. Mario tavares disse:

    Fui funcionário da Petrobrás por 25 anos. Me aposentei há bastante tempo, mas sei o que ela fez e faz pelo país. Isto que estão fazendo é um retrocesso tão grande que não haverá conserto num futuro próximo. As guerras pelo mundo são por causa do petróleo, a ganância americana em cima da Venezuela e devido a maior reserva de petróleo do mundo e golpe institucional ocorrido em 2015 foi por causa do petróleo brasileiro. Acorda povo!!!!

  11. Uriel Cabral disse:

    O PT acelerou a privatização da Petrobrás e outras ! Quebrou o país !

  12. JESSE disse:

    Infelizmente estão entregando nossas riquezas numa rapidez tão grande que quando o povo acordar para a realidade já não nos restará mais nada, apenas um pires pra pedir esmolas. Viva o brazil (com b minúsculo e z, pois é mais fácil entregar para os gringos) do bozo e seus políticos corruptos!!!

  13. Maurício João da Silva disse:

    Parabéns ao conteúdo das matérias esclarecedoras, com percepção inteligente, honesta e ímpar na mídia.
    Agradecimentos a ” OUTRAS PALAVRAS”, por nós trazer informações, formação, e nos enriquecer como cidadão informado.
    Sucesso a equipe.

  14. Francisco disse:

    Esse jornal que faz esse materia, é comuniata, de eaquerda.
    A gente nao acredita mais nesssas mentiras.

  15. João disse:

    O pretexto é uma ficção: suposto “endividamento” da empresa

    Cara, não sei se você ficou sabendo, mas o PT roubou a Petrobrás durante 12 anos deixando um rombo gigantesco e insustentável.

  16. Carlos Alberto dos santos disse:

    É nítido e notório para qualquer idiota,que todas estas reportagens mostradas aquí, tem viés políticos.Todas tentam disfarçadamente,criticar e desfazer do governo do nosso presidente e também da nossa gloriosa polícia . Sejam mais profissionais,se é que conseguem!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *