Venezuela: vitória apertada e futuro a definir

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Ao conferir às eleições municipais caráter plebiscitário, oposição deu tiro no pé. Mas chavismo tem enormes desafios à frente

Por Vinicius Gomes

Quinze anos após a ascensão de Hugo Chávez, a oposição conservadora venezuelana viu, nas eleições municipais do último fim de semana, a chance de ouro para iniciar uma volta ao poder. A economia enfrenta problemas graves: inflação superior a 50% ao ano, produção estagnada e falta de gêneros básicos nos supermercados. Por isso, Henrique Capriles, governador do estado de Miranda e principal referência no combate ao “chavismo”, previu um “nocaute” contra os apoiadores do atual presidente, Nicolas Maduro.

Foi traído pelas palavras. Abertas as urnas, três grandes evidências tornaram-se nítidas. A mais incômoda, para a oposição é: a maioria conquistada por Maduro e seus seguidores ampliou-se ligeiramente, em relação ao pleito presidencial realizado há oito meses. Em abril, poucas semanas após a morte de Chávez, o atual presidente chegou ao governo com magros 235 mil votos (1,59%) de vantagem sobre Capriles, então seu oponente. Ao contrário do que esperava a oposição, a distância, agora alargou-se para mais 6,5 pontos percentuais. O Partido Sociallista Unificado da Venezuela (PSUV), no governo, conqusitou 49,24% dos votos contra 42,72% da Mesa de Unidade Democrática (MUD) da oposição. O resultado fortalece a figura de Maduro, desmentindo os que o viam como mera sombra de Chávez.

O segundo fato relevante favorece a oposição. Comparados com os da última eleição municipal (em 2008), os números revelam que os grupos hoje dirigidos por Capriles avançaram. Há cinco anos, PSUV havia conquistado 267 prefeituras, cerca de 84% das existentes no país, com 53,45% dos votos contra 41,65% da oposição. Agora, além de maior percentual de votos, a oposição pode ampliar o número de governos municipais. E – aqui está o terceiro dado destacado – venceu em três dos quatro maiores colégios eleitorais: Caracas, Maracaibo, Barquecimento e Barinas. Também ganhou em Barinas, terra natal do antigo comandante.

O chavismo tem, agora, um período de relativa tranquilidade pela frente. As próximas eleições nacionais (para o Legislativo) ocorrerão apenas no final de 2015. Será uma chance para corrigir problemas graves. Apesar de possuir as maiores reservas de petróleo do mundo, e de figurar entre os grandes exportadores do combustível, a Venezuela continua enfrentando dificuldades cambiais. As vendas externas estão quase restritas (93%) ao “ouro negro”, enquanto a produção industrial e agrícola patina. Burocracia, dirigismo exagerado, falta de quadros capazes no governo conspiram para impedir que a riqueza petroleira converta-se em impulso ao desenvolvimento.

Ao tentar explorar as vulnerabilidades do país frente ao exterior, a oposição conservadora errou na dose e revelou seu viés antipopular. Nos últimos meses, multiplicaram-se os sinais de que as grandes cadeias varejistas passaram a inflacionar artificialmente os preços dos produtos – tanto para elevar lucros, quanto para gerar instabilidade. A reação de Maduro começou quando pegou tal movimento no contrapé.

A partir de setembro, a presidência da República passou a enfrentar o desabastecimento e a inflação com medidas duras – como tabelamento dos preços dos produtos. Houve baixas consideráveis e longas filas diante das lojas para aproveitá-las. A atitude firme recoesionou a base chavista, constituída principalmente nas camadas menos favorecidas economicamente – e, portanto, mais vulneráveis à alta dos preços.

A ofensiva chavista evidenciou um aspecto muitas vezes minimizado nas análises convencionais: as grandes vitórias sociais dos últimos dez anos. A desigualdade e a pobreza recuaram mais que em qualquer outro país da América Latina. O número de pessoas vivendo abaixo da chamada “linha da pobreza” caiu 20%, apenas no ano passado. Um vasto conjunto de programas sociais grante melhoras na Saúde, Educação e outros serviços públicos.

Amparado nestes dados favoráveis, e na vitória eleitoral por estreita margem, Maduro e a “Revolução Bolivariana” conseguirão reverter as dificudades? É um dos assuntos centrais, na América Latina, a acompanhar nos próximos dois anos.

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