Quem são os houthis, heróis dos palestinos

Descobriram que o poder imperial dos EUA tem brechas. Colocaram em curto-circuito uma rota marítima essencial. Paralisam a produção de automóveis na Europa. Mas como surgiram e por quê tem tanto apoio popular no Yêmen?

Manifestação gigante em Sanaa, capital do Yêmen, um dia depois de os EUA bombardearem os houthis. Dispostos a lutar pela Palestina, combatentes atraem simpatias em todo o Oriente Médio
.

É possível, encontrando as brechas precisas, encarar a maior potência militar do planeta? Nesta segunda-feira (15/1), os houthis – um grupo militante islâmico-xiita presente no Yêmen – voltou a agir no Mar Vermelho. Um míssil atingiu o Gilbratar Eagle, navio cargueiro norte-americano que rumava para Israel. Foi a resposta desafiante do grupo aos Estados Unidos e à Grã-Bretanha, que o haviam atingido, na semana anterior, com 150 mísseis de alta precisão.

Num mundo que assiste cúmplice ou impotente ao genocídio praticado por Israel em Gaza, os houthis ergueram-se em defesa dos palestinos. Localizados no Yêmen, estão muito próximo do estreito de Bab al-Mandeb, no Mar Vermelho, por onde passa cerca de 30% do tráfego de contâiners do mundo. Quando o massacre de Gaza começou, passaram a atacar, em resposta, navios que passam pelo ponto estratégico. Deu certo. Segundo o New York Times, em dezembro o tráfego de cargas pelo Canal de Suez caiu pela metade, em relação ao mesmo mês de 2023. Diversas fábricas de automóveis na Europa interromperam a produção ou estão prestes a fazê-lo, por falta de componentes.

Agindo ao arrepio do Conselho de Segurança da ONU (como notou o Global Times chinês), Washington e Londres iniciaram os bombardeios. Mas parece improvável que alcancem resultados, reconhece The Economist. O houthis são osso muito duro de roer. Para conhecer um pouco mais sobre o grupo, vale ler artigo do jornalista Abbas Juma. Os militantes chamam-se Defensores de Alá (“Ansar Allah”). O nome pelo qual tornaram-se conhecidos no ocidente deriva de seu fundador, o iman xiita Hussein Badreddin al-Houti, assassinado em 2004.

Houti liderou uma rebelião da maoria xiita contra a minoria sunita-wahhabista, vista pelos primeiros como opressora. Ela intensificou-se a partir de 2011, como eco da Primavera Árabe. Em 2014, uma insurreição armada do Ansar Allah assumiu o poder em duas províncias do norte e rumou para a capital, Sanna. Então, a Arábia Saudita interviu, contra o grupo e os xiitas.

Bem armados – e apoiados por Washington –, os sauditas bloquearam totalmente os houthis e a maioria xiita. Sobreveio o que a ONU chama de “a maior crise humanitária do século XXI”. Estima-se que 223 mil pessoas tenham morrido por fome ou falta de medicamentos. Ainda hoje, 80% da população vive na pobreza. Mas foi esta sociedade castigada e resistente que reagiu em apoio aos houthis, na sequência aos bombardeios norte-americanos e britânicos, com uma manifestação popular gigante – possivelmente milhões de pessoas – na capital.

Fornecidos possivelmente pelo Irã, os mísseis usados pelos houthis para atingir navios no Mar Vermelho são pequenos e portáteis. Podem ter sido transportados para locais remotos e pouco detectáveis. A pressão econômica e geopolítica que os ataques exercem, num cenário em que Israel e EUA estão perigosamente isolados, não pode ser desprezada. Há espaço para o combate digno, em tempos difíceis.

Leia Também: