De Paris a Fortaleza: um olhar sobre o clima “para francês ver”

Imprensa cearense deu destaque à COP 21, mas ignorou mobilização de mais de 2.000 pessoas em Fortaleza; organizadores reclamam da invisibilidade

Por Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)

Foi capa de jornal em O Povo, na segunda-feira (30): “Nunca esteve tão quente em Fortaleza”. Com direito a quatro páginas nesse que é um dos principais jornais cearenses. Estaria a imprensa brasileira, então, de fato interessada em mudanças estruturais na nossa relação com o ambiente e padrão de consumo? Não exatamente. Uma mobilização com 2.000 pessoas em Fortaleza, no dia anterior, parte da Mobilização Mundial pelo Clima, simplesmente não motivou nenhuma linha em nenhum jornal.

Dela participaram cinco etnias indígenas e mais de vinte coletivos e movimentos socioambientais, de 15 municípios cearenses, da Praça do Centro Cultural Dragão do Mar até a Praia do Náutico. Entre os temas, a luta contra a exploração da mina de urânio em Santa Quitéria, o fim da devastação dos ecossistemas costeiros, “água para as pessoas e não para o agronegócio e as termelétricas”, punição para os crimes da Samarco.

Nenhum jornal, rádio ou televisão enviou um repórter. A cobertura do evento, organizado pelo Fórum Ceará no Clima, ficou restrita à mídia alternativa.

“Causa estranhamento o fato de que a mesma imprensa que publica qualquer ato modista com meia dúzia de pessoas se omita em cobrir uma mobilização histórica no Ceará”, dizem dois dos organizadores, a geógrafa Janete Melo e o sociólogo Rodrigo Santaella. “É possível que a relação entre as questões mais gerais do clima com elementos muito concretos como a seca no Ceará e os impactos socioambientais da Termelétrica do Pecém, que consome 800 litros d’água por segundo, tenha incomodado determinados setores privilegiados da sociedade cearense”.

Um release divulgado para a imprensa antes do ato dizia que os governos não têm tomado as medidas necessárias para conter o processo de mudanças climáticas, “preferindo não mexer nos interesses poderosos da indústria do petróleo, das empresas de energia, do agronegócio e das mineradoras”. E completava: sem pressão popular, isso não vai mudar.

Outro release, após a mobilização, informava que dela participaram representantes dos povos indígenas Jenipapo-Kanindé, Tapeba, Anacé, Pitaguary e Potiguara; e movimentos socioambientais dos municípios de Aracati, Barro, Crateús, Fortaleza, Itapipoca, Maracanaú, Paracuru, Quixeramobim, Santa Quitéria, Senador Pompeu, Tamboril e Monsenhor Tabosa.

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Fortaleza, 29 de novembro de 2015 (Foto: Janete Melo)

“IGNORANTES ABSOLUTOS”

No editorial de O Povo, uma postura bastante diferente: “É hora de tomar uma atitude em relação ao clima“. “Só ignorantes absolutos, que enfiam a cabeça na areia para não ver absolutamente nenhum perigo, ainda negam que o futuro de todos nós está ameaçado pelos efeitos das mudanças climáticas”, dizia o jornal.

Título do Diário do Nordeste dizia: “Todos os olhares voltados a Paris”.

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