Ana Paula do BBB, a cotovelada no gremista e a aceitação do vale-tudo

bolaños

Jogador do Grêmio teve a mandíbula dividida; caso nos convida a refletir sobre a aceitação conveniente das violências e desvios que venham dos nossos aliados

Por Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)

Não estou entre aqueles que simplesmente decidem ignorar o Big Brother Brasil como fenômeno cultural. Sempre achei relevante. Em outros anos tivemos a vitória de participantes truculentos e machistas, como Diego Alemão e Marcelo Dourado. Neste ano a participante mais popular, Ana Paula Renault, era também a mais descontrolada. Só não vencerá o reality show porque deu dois tapas em outro concorrente e foi expulsa. Mas a massa de fãs se sente órfã – porque precisa de protagonistas que consideram “fortes”: com carisma, voluntariosos e… autoritários.

E é por isso que o programa traduz certo momento da sociedade brasileira, como já alertara o crítico de TV do UOL, Maurício Stycer. Por essa projeção e pela tolerância ao vale-tudo, que podemos observar também em outras arenas. O grande assunto na semana no Rio Grande do Sul foi a cotovelada recebida pelo equatoriano Bolaños, do Grêmio. Ele terá de usar placas e parafusos para reconstruir o rosto. Mesmo assim, há quem minimize a agressão. Principalmente entre torcedores do Inter. Seriam “coisas do jogo”. E, afinal, tal jogador do Grêmio deu também tal entrada violenta e..

E de minimização em minimização maximizamos a barbárie. Os torcedores de Ana Paula e os telespectadores do Grenal fazem parte do mesmo espetáculo de conveniências, desse exercício que fazemos para justificar seja lá o que for que o nosso aliado faça. Raciocínios elaborados a posteriori, e não conforme alguma cartela de princípios. Ou seja, o cinismo não é propriedade apenas de figuras encasteladas no poder; pelo contrário, os poderosos se alimentam dessa capacidade (não apenas irracional) de assimilarmos e apoiarmos o que convém.

Qualquer semelhança com o mundo político não será mera coincidência. Não necessariamente todo mundo promove a violência, mas certamente mais gente faz vistas grossas a ela – seja a violência policial, a de milícias, jagunços ou a de pessoas comuns. Muitos dos que deploravam a participante do BBB que batia panelas para incomodar os demais passam a aceitar essa linguagem quando se trata de demonizar os próprios adversários. E assim por diante. Quebrar vidraças é ruim; mas se for uma vidraça de um diretório do PT muda-se rapidamente de ideia. Da mesma forma há militantes de esquerda que se revelam misóginos quando identificam uma inimiga política.

Não é apenas a mandíbula de Bolaños que está dividida. Nossa sociedade está fraturada – e sem placas e pinos à vista. Muito além dos colorados complacentes e dos fanáticos por Ana Paula. São muitos os responsáveis por essa tensão inescrupulosa no ar, por essa sensação (pensemos que um ministro do STF teme uma morte nos próximos confrontos de rua) de que pode acontecer algo muito grave no país. Há algum tempo aplaudem-se cotoveladas. E não há sinais de que a ética esteja sendo colocada em pauta, da mídia aos bancos escolares. Vivemos uma amnésia histórica, e a esta altura não dá para saber se ela sucede ou antecede a próxima paulada.

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