Trabalhadores Sem Direito: surge novo movimento social

São domésticas, entregadores, manicures, camelôs, pedreiros e tantos outros “informais”. Buscam se organizar em nova frente, lançada ontem em SP. Sugerem: mundo do trabalho mudou — e é preciso saídas à precarização da vida

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Ontem (4/5), na escadaria do Theatro Municipal de São Paulo, foi fundado o movimento nacional dos Trabalhadores Sem Direitos, que nasceu da necessidade de lutar por direitos básicos, pelo direito ao trabalho, contra a discriminação que a informalidade sofre diariamente e contra a invisibilidade das trabalhadoras e trabalhadores informais. Já são quatro os estados participantes da nova luta: Rio de Janeiro, São Paulo, Minhas Gerais e Pernambuco. A intenção do movimento é somar o maior número de estados possível e fortalecer o debate sobre a explosão de trabalhadores precarizados e informais no Brasil.

Cerca de 100 pessoas se reuniram para presenciar o lançamento. Entre os presentes, haviam representantes dos camelôs, diaristas, motoristas e entregadores de aplicativos, catadores de recicláveis entre outras categorias de trabalhadores da informalidade.

“Nossa pauta específica é a precarização e a informalidade”, afirma Gilvania Gonçalves, coordenadora do novo movimento. Ambulante desde 2019, vendendo tapioca no Metrô Carrão, região Leste de São Paulo, ela aponta: “diante desse contexto da política econômica, a gente que vive na informalidade vem sofrendo muito com a inflação, com a invisibilidade e com a discriminação. E, pensando nisso, foi lançada essa frente, na qual vamos reivindicar direitos que não temos enquanto informais. Queremos direitos assegurados – e para todas as categorias. Hoje estamos numa planejamento para discutir pautas, para discutir o que a gente tem de ferramenta para cobrar do poder público”.

Movimentos sociais importantes e participantes dos estados onde o Trabalhadores Sem Direitos já está atuando falaram um pouco de sua luta diária por direitos. Em seu discurso, Gilvania abordou a necessidade de dar voz aos que não têm representatividade.

“Ontem mesmo eu tive acesso a uma pesquisa do IBGE que relata que a taxa de informalidade no mercado de trabalho subiu para 40%, no Brasil. O nosso movimento foi criado para que possamos ir às ruas e cobrar do poder público as nossas reivindicações; para mostrar que não somos invisíveis. Não estaremos de braços cruzados diante de tanto desemprego. A tendência é que a informalidade cresça cada vez mais, seja por crise econômica ou pelo desemprego trazido com o avanço tecnológico. Nesse contexto é que foi lançado esse movimento em nível nacional. Para que a gente se reúna em uma só voz, numa só força e lute por direitos”, afirmou.

Também marcaram presença Guilherme Boulos, coordenador do MTST e candidato a deputado federal em SP (pelo PSOL); a coordenadora do Movimento Unido dos Camelôs (MUCA), Maria dos Camelôs, representando o Rio de Janeiro; Ivonaldo Belloto, membro do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Comércio Informal do Recife; a codeputada das Juntas do estado de Pernambuco e camelô, Jô Cavalcanti; Ediane Maria, Josué Rocha e Severino Souto Alves, coordenadores do MTST; Juliano Medeiros, presidente Nacional do PSOL; Thaís e Junior (catador), representantes das Brigadas Populares de Minas Gerais e São Paulo; Tia Vera, coordenadora da Carolina Maria de Jesus e catadora de recicláveis; Igor, motorista de aplicativo; Edson Carneiro Índio, Secretário Geral da Intersindical; Aleni Souza, que fez uma apresentação mística e com poesia; além do encerramento com o rapper Edson Luiz.

Entre hoje e amanha, os Trabalhadores Sem Direitos estarão reunidos para debater pautas do mundo do trabalho informal, planejar o movimento Sem Direitos e os próximos passos a serem dados após a fundação. Confira abaixo o manifesto do movimento [Rôney Rodrigues, com informações da assessoria do movimento]

Carta às trabalhadoras e aos trabalhadores do Brasil

Nós queremos direitos! Queremos respeito! A maior parte do nosso povo dorme pouco, acorda ainda de noite, sai de casa, se espreme no transporte, trabalha mais do que o corpo aguenta, ganha menos do que precisa, não consegue cobrir as necessidades da família. Quando come, come mal. A maioria já teve que escolher entre comprar comida ou pagar o aluguel. É viver pra trabalhar, sem ter certeza do dia de amanhã.

Nossas mãos giram a economia do país. É por causa do suor do povo trabalhador que tudo funciona, que tudo existe – independente de ter um contrato de trabalho, ou o chamado “emprego na economia formal”. Quem vive e sobrevive do próprio suor e trabalho, não é parceiro, colaborador ou empreendedor. Isso é uma mentira que serve para mascarar as tentativas incansáveis do andar de cima da sociedade para assegurar seu lucro e suas riquezas às custas do povo pobre.

Antigamente, era trabalhador só quem estava na fábrica, na loja, na escola. Hoje isso não importa mais. A fábrica se transformou em uma moto, uma bicicleta, uma faxina, um carrinho de tapioca, uma barraca, um carro… Estamos aqui hoje, camelôs, ambulantes, costureiras, diaristas, entregadores e motoristas de aplicativos, manicures, cozinheiras, catadores de recicláveis, pedreiros, enfim, todas as trabalhadoras e trabalhadores informais que passam a vida inteira na correria para garantir formas de sobrevivência para suas famílias. Para nós, trabalhadoras e trabalhadores, é inegociável ter o direito à vida e à dignidade.

A nossa Constituição, em seu artigo 7º, assegura uma série de direitos ao trabalhador brasileiro. Independente de como se organiza o mundo do trabalho hoje em dia, a proteção das trabalhadoras e trabalhadores deve ser respeitada e mecanismos devem ser construídos para que isso seja possível. A responsabilidade do nosso sofrimento é dos governos que, a mando dos poderosos, não criam essas ferramentas para garantir os direitos.

No Brasil, cidadania e dignidade sempre foram possíveis apenas através do emprego formal. A luta das trabalhadoras e trabalhadores era para que se criassem empregos registrados, com direitos como férias, 13º, seguro-desemprego, aposentadoria para cada vez mais gente.

Porém, a política econômica dos governos e as reformas que impedem a ação do Estado deixam o povo “ao Deus dará”. Cada vez menos gente tem emprego fichado, é tudo temporário, por conta própria, precarizado, sem proteção social, sem respeito à saúde e à vida do trabalhador. Os Governos e as empresas se desresponsabilizaram de nós. O mundo do trabalho é selva e cada um está por cada si. Pior, tentam nos enganar, e muita gente acreditou que melhorou, por não ter mais que bater cartão.

A história mostra que a conquista de direitos e da dignidade só foi possível porque a força de trabalho tomou consciência, juntou os braços e formou força coletiva. Porque o povo trabalhador se lembrou que é a maioria, que é formigueiro, e foi pra cima sem medo!

Agora é a nossa vez de fazer o mesmo. Hoje, 04 de maio de 2022, nasce hoje, o SEM DIREITOS, para fazer ecoar o nosso grito por união e força coletiva para lutar e dizer “basta!”. Basta de violação da dignidade humana. Basta de exploração e indiferença com a vida do povo. Não somos invisíveis e não aceitamos ser escravizados! Gritamos para que os governos criem políticas públicas que assegurem direitos essenciais; para que as empresas não continuem brincando com nossas vidas.

Se não querem nos garantir trabalho, renda, comida e moradia, então conquistaremos na marra. Vamos à luta trabalhadoras e trabalhadores SEM DIREITOS.

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6 comentários para "Trabalhadores Sem Direito: surge novo movimento social"

  1. Vilma Santana disse:

    São também trabalhadores informais os que usam o espaço da residência para prestar serviços, produzir alimentos, peças de vestuário etc. Seja para cadeias de produção ou venda direta ao cliente consumidor. Utilizam suas casas como ambientes de trabalho, pagam energia elétrica dentre outros insumos que não são contabilizados nos custos. Parabéns pela iniciativa. Contem com meu apoio.

  2. José Mario Ferraz disse:

    Mas, doutora redação, ao trabalhador nunca faltou o direito de ter o rabo esfolado para que magnatas comam caviar Beluga acompanhado de Romanée Conti em iates dos mais luxuosos. Se eles festejam sua situação, por que a senhora há de se dar ao incômodo?

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