Virando o modernismo do avesso

O modernismo, a modernidade e a modernização sempre foram múltiplos no Brasil, argumenta Francisco Foot Hardman, em novo livro. Ver na Semana de 1922 o paradigma único do moderno nacional é míope – e atende a interesses hegemônicos paulistas

Em outubro do ano passado, escrevemos aqui no Outros Quinhentos: “[é] especialmente aguda a crítica que assinala o problema do paulistocentrismo de uma leitura histórica que diz que o convescote da oligarquia cafeeira foi o alfa e o ômega da cultura brasileira, suprimindo a multiplicidade de forças sociais e visões de mundo que compuseram o grande momento vivido pela arte nacional no século XX”. Desafinando o coro dos contentes no ano do centenário do evento, quisemos dizer que a Semana de Arte Moderna de 1922 não pode ser absolutizada como paradigma criador do que é moderno no Brasil, nem gérmen de toda arte avançada que se produziu no país.

Franscisco Foot Hardman, em seu A ideologia paulista e seus eternos modernistas, lançado há pouco pela Editora UNESP, caminha nesse mesmo sentido. Com muito mais profundidade no argumento, é claro. O professor da Unicamp, se dedica a tirar cada tijolinho do edifício dessa hegemonia cultural que há cem anos se impôs sobre o Brasil tendo como quartel-general as mansões (e cafezais) da elite de São Paulo. Ao mesmo tempo, desbrava as expressões artísticas do moderno no país, descrevendo suas manifestações por toda parte desde, pelo menos, meados do século XIX.

A obra reúne 14 artigos, ensaios e palestras de temas bastantes diversos, mas que foram surgindo há três décadas com um sentido em comum – ampliar o escopo de quando e onde a arte brasileira se engajou na tarefa da “descoberta da nação” (isto é, se aproximar das formas de expressão do povo, traçar relações com nossa história e deixar de meramente copiar o estrangeiro) e identificou problemas como a contradição entre o avanço da urbanidade e do progresso industrial com a manutenção de uma estrutura social oligárquica e atrasada.

Por vezes, o conhecido evento de três dias no Theatro Municipal de São Paulo e a publicação dos manifestos Antropofágico e Pau-Brasil foram considerados os marcos fundantes desse tipo de preocupação nestas paragens. Nada mais ideológico, aponta o autor. Ideológico porque esta não é apenas uma concepção equivocada, mas sim um logro que dá sustentação a uma hegemonia político-cultural, reproduzido acriticamente desde a sala de aula do ensino básico.

Outras Palavras e Editora UNESP sortearão um exemplar de A ideologia paulista e os eternos modernistas, de Francisco Foot Hardman, entre os apoiadores do nosso jornalismo. O formulário de participação será enviado por e-mail e as inscrições serão aceitas até a próxima quinta-feira, 16/2, às 14h. Quem é Outros Quinhentos tem 40% de desconto no site da editora.

O leque de artistas que, de algum modo, demonstram a existência prévia (e bem disseminada geograficamente, em vez de concentrada) desse fenômeno modernizante na sociedade e na arte é amplo, como os capítulos sucessivamente demonstram. Nele, cabem nomes mais conhecidos como Augusto dos Anjos, Sousândrade, Silva Jardim, Euclides da Cunha e Raul Pompeia, e outros mais obscuros, como o maranhense José Maria Correia Frias e o baiano Manoel Raymundo Querino. O autor enquadra até o que chama de “estranhos no ninho” do modernismo paulista: Paulo Emílio, Patrícia Galvão, Flávio de Carvalho e Mário Pedrosa, que aponta terem orientações e interesses mais dissonantes do núcleo duro do grupo de 1922 do que muitas vezes se faz parecer.

“Adeus, Macunaíma!”, diz o sugestivo título do último capítulo. Daqui para frente, vamos deixar o herói sem nenhum caráter (para Hardman, uma estereotipada, pouco criativa e neorromântica representação dos indígenas) descansando em sua rede e buscar outras figuras e ideias para ilustrar a longa investigação pelo moderno no Brasil.


Sortearemos um exemplar de A ideologia paulista e seus eternos modernistas, de Francisco Foot Hardman, entre os apoiadores do jornalismo de Outras Palavras. O sorteio é realizado em parceria com a Editora UNESP, que publicou o livro no fim do ano passado.

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