SP: os “apagões” e o desastre da privatização elétrica

Chuvas de verão, sempre houve. Mas a venda da Eletropaulo gerou fome de lucro máximo, descaso com a manutenção e quedas constantes (e cada vez mais longas) da rede.Faremos o mesmo com a Eletrobras?

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Por André Araujo, no GGN

Na semana anterior ao Carnaval São Paulo teve fortes chuvas, árvores caíram. Não é um fenômeno novo ou imprevisível, acontece há séculos naquilo que é o conglomerado urbano de São Paulo.

Bairros e quarteirões do centro e periferia de  São Paulo ficaram sem energia elétrica por dias, minha casa ficou 55 horas sem energia, a 700 metros da Avenida Paulista, outro bairros continuaram sem energia.  

No dia 22 de janeiro de 2015, na página A3 do jornal O Estado de São Paulo, extensa matéria com declarações do então Governador Alckmin sobre o mesmo tema, criticas extensas à Eletropaulo inclusive com reforço do Ministério Público. Serão apenas fenômenos da natureza?

A Eletropaulo estatal também enfrentou tempestades, mas o retorno da energia era rápido, porque?

A resposta está em “cortes de custos”. As privatizadas, como primeira ação após a compra da empresa, tratam de reduzir custos para aumentar a lucratividade, é da essência do negócio. É a mesma cultura empresarial que montou o cenário trágico da tragédia de Brumadinho, cortar custos como obsessão, fanatismo, religião.

É da natureza do escorpião, onde haviam 800 equipes de reparação de linhas da Eletropaulo, cortou-se para 200, através de terceirizações pelo fornecedor de menor custo. Antes da privatização a Eletropaulo tinha 27.500 funcionários, hoje tem menos de 4.000, terceirizou-se tudo e tenta-se terceirizar mais ainda. Como consequência perdeu-se o “espírito de corpo”, o orgulho de ser funcionário de uma grande empresa, o terceirizado não joga no time da empresa, mal treinado e mal pago, o preço real quem paga é o consumidor por maus serviços, uma novidade na longa história dessa empresa centenária, que sempre teve, antes da privatização de 1996, tradição de excelência.

O objetivo é gerar caixa para pagar dividendos e bônus para os executivos, na Vale ou na Eletropaulo, não há como escapar dessa lógica.

Enquanto nada a opor em empresa do mercado competitivo, porque o próprio mercado policia os limites do corte de custos, mas em serviços públicos concessionados em regime de monopólio essa política pode levar ao desastre, assim como em ramos concessionados como mineração.

A cultura do “financismo” é hoje dominante na administração de empresas, difundida pelos cursos de MBA e pela ideologia neoliberal. Essa cultura privilegia o curto prazo, o balanço trimestral, o bônus do fim do ano, sacrificando o futuro da própria empresa, como no caso da Vale.

No caso específico da Eletropaulo, o acionista controlador era a AES, uma empresa financeira, criada por dois corretores da Bolsa de Nova York. Toda a lógica da empresa é financeira e seu último CEO no Brasil era o anterior diretor financeiro, que reforçou essa cultura de corte de custos a qualquer custo, não importa as consequências a longo prazo.

Não havia na AES a lógica do serviço e sim a dos números. Convivi entre 2003 e 2010 com essa empresa americana como seu consultor no Brasil, nada contra seus gestores que se tornaram meus amigos em três diferentes grupos que administraram a AES mundial no período, não é uma culpa de pessoas e sim do sistema.

Na prometida privatização da Eletrobras estão circulando em cima da empresa, como corvos, grupos financeiros mais radicais que a AES.

A 3G Radar, do brasileiro Jorge Lehman, tem fanatismo pelo corte de custos, o que já levou mega crises a suas empresas como a Heinz Kraft nos EUA.

Fico imaginando o que ele fará na Eletrobras como corte de custos, colocando em risco o sistema elétrico brasileiro que tem como seu coração a Eletrobras e suas 147 usinas geradoras e 58.000 quilômetro de linhas, mais de 200 subsidiárias.

Trata-se um grupo nascido no mercado financeiro e que opera exclusivamente com sua lógica e cultura.

Outros interessados na Eletrobras são na maioria do mesmo naipe de financistas de tacadas, o Brasil vai entregar seus interesses estratégicos a esse tipo de gestor, de visão curta no prazo e no macro.

Nada a estranhar considerando que a economia brasileira está hoje sendo administrada por operadores do mercado financeiro, sem nenhuma ligação, interesse ou afinidade com a economia real, um monumental erro estratégico porque essas mentes se referenciam em mercado financeiro, bolsa, derivativos, com lastro fora do País, comandado por fundos de investimentos, sem sentido mais amplo da politica econômica de um grande País, que não lhes interessa.

Nesse quadro privatizações não tem nenhuma provisão de defesa do interesse do consumidor, especialmente porque as agencias reguladoras não tem a amplitude da cultura de defesa do consumidor, são apenas burocracias de papel. Em São Paulo a ANEEL sequer existe, delegou suas funções a uma agência estadual que não funciona.

Como contraponto, a SABESP estatal funciona em boa parte do Estado de São Paulo com excelência de serviços, desmentindo o coro dos privatizantes.

Ao contrário, não há comparação entre a atenção que a Sabesp dá ao seu consumidor e a péssima atenção com que a Eletropaulo atende seu cliente. Fechou a maioria das lojas de atendimento que hoje se amontoam em poucas e apertadas salas, seu auto atendimento por internet é péssimo, na falta de luz a resposta é gravada padrão é “estamos providenciando” depois de muito tempo de espera, sem dar previsão de tempo, o que é contra a lei (cadê a ANEEL?).

A privatização da Eletropaulo é um hino contra a privatização, basta fazer uma pesquisa em São Paulo.

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