SP: A Vai-Vai desfila com a resistência negra

Dos bailes na várzea do Vale do Saracura à chegada de prédios, depoimentos de personagens que testemunharam o nascimento da agremiação do Bixiga. Eles narram as histórias de resistência negra, tradição e afetos que permeiam seus sambas-enredo

Mestre Tadeu, apito oficial da bateria da Saracura. Filho de sambistas, começou sua história no carnaval paulistano na Lavapés, uma das escolas mais antigas de São Paulo. Ele entrou como ritmista na Vai-Vai quando tinha 18 anos e, apenas três anos depois, já assumiu a bateria. Reprodução/Facebook
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Por Daniel Costa, no GGN

Lá… Vem ela charmosa e faceira
Lá… Vem ela sorridente e altaneira
Lá… Vem ela a majestade Porta Bandeira
A conduzir meu pavilhão (Ôôô)
Que representa uma nação
Seu Mestre Sala, faças como o beija-flor, beijando a flor
A conduza com carinho, com galhardia e muito amor.
Lá vem ela (Fernando Penteado)

Quando pensamos na ocupação das regiões de várzea na capital paulista, é fundamental considerar a região do Vale do Saracura. No final do século XIX e início do século XX, com a ocupação da região da Avenida Paulista e Consolação pela elite cafeeira, os funcionários dessas famílias, geralmente mulheres negras que trabalhavam como cozinheiras e lavadeiras, e imigrantes que realizavam trabalhos domésticos, passaram a ocupar a região com suas famílias.

Nessa época, um dos principais meios de sociabilidade e diversão dessa população eram os campos de várzea. Não era difícil ver times mistos jogando nos campos da região. Um desses times, o Cai-Cai, originou em 1930 o surgimento do cordão Vai-Vai, que mais tarde se tornaria uma escola de samba de enorme tradição e a maior campeã do carnaval paulistano. Pouco tempo após sua fundação, o Vai-Vai já se destacava como um dos principais cordões da cidade, rivalizando com o Grupo Barra Funda pelo protagonismo do carnaval. Segundo depoimentos da época, não era raro ver brigas entre os integrantes dos dois grupos.

Ainda sobre a ocupação do Bixiga pela população negra, Olga von Simson esclarece que as ruas Rocha e Marques Leão concentravam a maioria da população negra da região. Foi da casa de Benedito Sardinha (rua Rocha, 547), um motorneiro da Light, que partiu em 1930 o primeiro desfile do Vai-Vai. Em depoimento à autora, Seu Livinho, fundador do então cordão, relatou que, quando criança e adolescente, vivia em uma casa localizada na confluência das ruas Marques Leão e Santo Antônio.

Outra atividade importante para o Vai-Vai no período foram os bailes, definidos por von Simson como “atividades aglutinadoras dessa turma do Bixiga, mais precisamente das encostas do Vale do Saracura”. Inicialmente, os bailes ocorriam na casa de Seu Sardinha, mas o espaço ficou pequeno e o Vai-Vai passou a alugar o salão do Lusitânia, clube de futebol de várzea localizado também na rua Rocha.

Com a consolidação dos bailes, outros espaços no bairro também foram utilizados, como salões localizados nas ruas Manoel Dutra e Frei Caneca, próximo à Igreja do Divino Espírito Santo.

No entanto, até a década de 1960, apenas a comunidade negra desfilava no Vai-Vai. Estudiosos do carnaval e do samba paulista apontam que essa característica pode ter sido fator crucial para a consolidação da Vai-Vai como ponto de referência e resistência do samba paulistano.

Em depoimento prestado a Olga von Simson, Pé-Rachado, uma das vigas mestras da agremiação do Bixiga, afirmou: “Naquele tempo, a Bela Vista ainda não tinha essa infinidade de apartamentos, não tinha essa transformação. Então, o pessoal era Vai-Vai mesmo; gostava”. Dona Conceição, que nunca desfilou no cordão e conheceu o Vai-Vai desde sua segunda década, confirmou à autora da pesquisa essa aceitação: “Ninguém ficava em casa quando o Vai-Vai saía. Saía todo mundo pra rua”.

Os moradores ajudavam como podiam na preparação do desfile: a vizinhança abastada oferecia polpudas doações, como seu Américo, que residia na rua dos Franceses. “Ele ajudava muito. Aliás, ele era presidente-mor do Vai-Vai. Foi uma das pessoas que mais ajudou o cordão”, segundo Pé-Rachado. Já os menos abastados socorriam a agremiação com doações menores, por exemplo, “com linha e agulha”. O importante para todos era colocar o cordão na rua de forma que fizesse frente a outras agremiações da cidade.

Passado quase um século da consolidação do processo de ocupação dessas regiões pela população negra e as posteriores tentativas de apagamento por parte das elites, os pesquisadores Vitor Silveira e Leonardo Antan afirmam que, “em uma visão atravessada pelo pensamento afro-religioso, é possível dizer: Exu cobrou”.

Sobre a religiosidade na escola, trago o depoimento de dois baluartes prestados à jornalista Cláudia Alexandre. Fernando Penteado, diretor de harmonia e bisneto de um dos fundadores do então cordão, conta que: “Minha tia Antonieta, que era mãe de santo, foi a primeira porta-estandarte; Tia Ana desfilava de Carmen Miranda, foi a primeira baiana da escola; Tia Dirce segurava o canto da escola, fazendo coro nos desfiles. Minha família é enraizada aqui na escola, temos vinte e oito pessoas entre baianas, ala das crianças e apoio de ala. Minha irmã, Cleuzi, foi chefe da ala das crianças desde 1968. Minha filha Laura foi rainha mirim quando tinha sete anos, rainha da bateria aos dez anos e hoje é destaque da escola; minha outra filha Paula foi porta-bandeira por vinte e cinco anos. Ela carregou o primeiro pavilhão da escola desenhado pelo meu bisavô, Frederico Penteado”.

Para Fernando Penteado, todo gestual da agremiação representa o orixá. “Nossa divindade começa pelo som do bumbo; o surdo representa o rum – o atabaque maior que toca para os orixás nos terreiros”.

Em sua pesquisa, Cláudia Alexandre ouviu ainda personagens que representam a geração que testemunhou o nascimento da tradição religiosa da escola. Entre eles, Paulo Valentim, o jornalista e integrante da velha guarda da escola, contou que chegou no Vai-Vai ainda menino. Nascido no bairro do Bixiga, Valentim conviveu com personagens como Pato N’Água, com o compositor Geraldo Filme e com ritmistas símbolos da escola como Caveirinha, Teleco e Flavinho.

Em depoimento à jornalista e pesquisadora, Valentim reforça as ligações da escola com o candomblé: “Eu também era levado a Pirapora pela minha avó, Dona Joana Zimbres. Tinha uns doze ou treze anos de idade. Mas posso confirmar que ali a festa era séria. Iam sambistas de todos os lugares, mas chegando lá, a gente formava um bloco só. Tinha gente do Vai-Vai, Geraldo Filme; Seu Carlão do Peruche; Xangô da Vila Maria. Eles já tinham uma formação e uma ligação com o Candomblé, tinham seus misticismos. Chegávamos lá, tinham os batuques, sambas, as rezas, cantavam os pontos de orixá, tinham as cantigas. Mas o forte eram os refrãos e os versos. Um puxava e o outro já respondia. A coisa era séria. Ficávamos todos no barracão. Os padres não gostavam muito, achavam que ali era a festa para os negros. Mas, no final, era mesmo. A grande festa de Pirapora acontecia no barracão (…) No Vai-Vai, somos a maioria a pisar no terreiro e fazer nossas obrigações. Há um respeito muito grande, faz parte da nossa escola, do Vai-Vai. Ali, as crianças já vêm de casa sabendo. A educação é do berço, tudo é passado. As crianças sabem bem como bater-cabeça”.

Lutar pela preservação da memória da população negra do Bixiga, daqueles que viveram no Quilombo Saracura e nos cortiços da região – que podem ser considerados quilombos dos séculos XX e XXI – e garantir a permanência do Vai-Vai no bairro é mais do que firmar um compromisso e legado.

Como afirma a jornalista Cláudia Alexandre em seu trabalho fundamental para compreender a presença das religiões afro na agremiação: “No Vai-Vai, a religiosidade reforça a identidade étnico-cultural da comunidade, constitui um elo com a tradição ancestral e uma forma de resistência política contra a estrutura racista. Além disso, marca como se deram as negociações e os embates com as demais tradições culturais do bairro, oriundas de imigrantes italianos e migrantes nordestinos”.

Em uma escola de samba, o amálgama entre as tradições presentes, o elo de pertencimento e a ideia de comunidade é forjado em torno do samba-enredo que a escola apresenta a cada carnaval. Além do hino da agremiação e dos sambas de exaltação (uma tradição cada vez mais rara), o samba-enredo é o elemento que une a escola, tanto entre os foliões que desfilam quanto aqueles que contemplam o cortejo.

Ao fim e ao cabo, o samba-enredo define o destino da escola a cada carnaval. Um bom samba não apenas reforça essas ligações com o público, mas também facilita o desenvolvimento da evolução e harmonia, graças a uma boa letra e melodia. Além disso, o entrosamento da bateria, o bailado do casal de mestre-sala e porta-bandeira são potencializados. Por outro lado, uma escolha infeliz pode comprometer todo o trabalho de um ano.

O historiador e pesquisador Luiz Antônio Simas, em colaboração com o compositor Nei Lopes, define o samba-enredo como “uma modalidade de samba que consiste em letra e melodia criadas a partir do resumo do tema escolhido como enredo de uma escola de samba”. Além disso, a dupla ressalta que os primeiros sambas cantados pelas escolas em suas apresentações carnavalescas eram de livre criação, abordando o ambiente do próprio samba e a realidade dos sambistas. Já o escritor e jornalista Alberto Mussa oferece uma perspectiva mais ampla, definindo o samba-enredo como “o único gênero musical épico, não lírico, genuinamente brasileiro, nascido e desenvolvido sem influência de qualquer outra modalidade épica, literária ou musical.”

Em uma agremiação como o Vai-Vai, possuir uma ala de compositores intimamente ligada ao cotidiano da escola foi fundamental para a construção de sambas antológicos, seja para a escola ou para o carnaval paulistano. Em depoimento prestado ao historiador Bruno Baronetti, o músico e compositor Osvaldinho da Cuíca relata como ocorreu a fundação da ala de compositores. Vejamos:

“Eu trabalhei como nunca na minha vida dentro do Vai-Vai . Comecei ensaiando no Jaçanã. Lá tinha a maior ala do Vai-Vai, a ala da Dona Paula, uma mãe de Santo, uma negra que fazia um serviço social de maior relevância dentro do samba. Ela tinha um terreiro muito grande na casa dela. Ela pegava os meninos de rua e abrigava, dava comida, colocava na escola e realmente os educava. Aí eu comecei a ensaiar com aqueles garotos e fiz uma primeira ala de frigideira, com dezessete frigideiras na bateria do Vai-Vai. Já existiam frigideiras individuais. Eu toquei frigideira no Tucuruvi, mas individual. Não existia uma ala de frigideiras fazendo às vezes do tamborim. Organizei os cuiqueiros, já existiam cuiqueiros muito muitos bons como o Caveira, o Maninho e outros velhos no Vai-Vai.

Introduzi também instrumentos de harmonia. Eu fiz o regulamento da ala de compositores, como Penteado era um dos mais antigos ele ficou como meu vice,  o Lírio que não tinha experiência em escolas de samba mas era um bom técnico, o Galo virou secretário, pessoas que tinham vocação para a função como bons compositores. No regulamento dizia que quem tocasse instrumento de harmonia não precisava fazer estágio. Quem não tocasse fazia um estágio de dois anos na ala para provar que tinha amor pela entidade, pelo pavilhão e também pra gente avaliar a conduta da pessoa e seu trabalho como compositor. E fizemos um trabalho maravilhoso. Trabalhamos muito. Foi a primeira ala batizada com cerimônia em São Paulo. Quem conduziu foi Evaristo de Carvalho, ela foi criada por Jota Muniz de Souza.

E a partir daí ela ganhou um grande status. Em 1978 quebramos uma sequência de quatro títulos do Camisa Verde e Branco. Como conseguimos ganhar esse título com a minha influência, e o enredo era fantástico Noel Rosa. E eu ganhei o samba-enredo. Disputei com os maiores compositores de São Paulo. Lá tinha Geraldo Filme, Edson e  Aloísio, que eu levei para o Vai-Vai. O Talismã disputou comigo, o Zé Di, grande campeão com Salgueiro, tinha a dupla Osvaldo Arouche e Walter Pinho.

 Antes de Noel eu fiz um samba com o Papete, José Ribamar, grande percussionista maranhense. Levei ele para ala de compositores do Vai-Vai em 1974. O primeiro samba que eu ganhei no Vai-Vai foi em 1975, parceria minha com o Papete, o carnaval era na São João ainda”.

O depoimento de Osvaldinho mostra além da importância, a efervescência de uma ala de compositores viva, que atua em sintonia com o conjunto da agremiação. Passamos agora a relembrar enredos memoraveis da alvinegra do Bixiga. Em 1971, o Vai-Vai foi para a rua cantando “Independência ou morte”, samba composto apenas por Zé Di, no ano seguinte o compositor emplacaria no ano do sesquicentenário da independência “Passando pelo Brasil o samba mostra o que é seu”.

Para os carnavais de 1975 e 1976  a escola sairia com sambas do já citado Osvaldinho da Cuica, “O Guarani”, em parceria com o maranhense Papeti foi defendido pelo próprio Osvaldinho. Já no ano seguinte agora sem parceiro, Osvaldinho emplacaria “Solano Trindade, o menino do Recife”, defendido por Geraldo Filme, na época pertencente a agremiação.

Seguindo com homenagens a grandes figuras negras do país, o ano de 1977 seria lembrado pela citação ao  padre José Maurício com “José Maurício, músico do Brasil colonial”, samba composto por Odair Fala Macio e que marcaria a estréia de um dos vultos da escola no carro de som, o grande Sol do Vai-Vai.

O carnaval de 1978 ficaria marcado por mais uma vitória de Osvaldinho da Cuíca e um novo título para a alvinegra do Bixiga com “Na arca de Noel quem entrou não saiu mais”, samba defendido por Carlão da Vila. O título indicava novos tempos para a comunidade bixiguenta, com a chegada do salgueirense Almir Guineto, que ao lado de Luverci Hernesto venceria as disputas de 1979 e 1980 com “Festa de um povo em sonho e fantasia” e “Orgulho da Saracura”, samba em homenagem aos cinquenta anos da escola.

Para o carnaval de 1982 a novidade seria a presença do ator e cantor Aldo Bueno como intérprete oficial as escola,  defendendo o samba de Osvaldinho da Cuíca e Serginho, “Orum Aiyê. O eterno amanhecer”. Em sintonia com as transformações do carnaval carioca, especialmente o carnaval feito por figuras como Rosa Magalhães e Fernando Pinto, a escola apresenta em 1984 o “Ao sol da onça Caetana ou miragens do sertão”, o samba assinado pelo quinteto formado por Tadeu da Mazzei, Jacó da Carolina, Mário Sérgio, Penteado e Elisbão do Cavaco foi interpretado por Chuveiro, responsável pelo carro de som também no carnaval do ano anterior.

Voltando a temáticas menos abstratas, o Vai-Vai apresenta em 1986 o clássico “Água de cheiro” (Xererê), da dupla formada por Nadão e Turquinho, o samba seria defendido novamente pelo carismático Sol do Vai-Vai, que voltaria a ser o intérprete da escola naquele carnaval. O ano seguinte marcaria a estréia de Thobias da Vai-Vai como intérprete oficial. Thobias seria um dos principais personagens da escola, chegando inclusive a ocupar a presidência da agremiação entre 2008 e 2012. A estreia seria com o clássico “Do jeito que a gente gosta”, do trio Walter Babu, Alemão e Chuveiro. No ano seguinte seria a vez de um novo trio emplacar seu samba, Nadão, Ademir e Marino firmam seus nomes com “A volta ao mundo em oitenta minutos”. Para o carnaval de 1988, Osvaldinho da Cuíca ao lado de Macalé do Cavaco e Namur empalcaria “Amado Jorge, a História de uma raça brasileira”.

A década de 1990 seria marcada por clássicos como “O negro em forma de arte”, do quarteto formado por Mariano, Showxão, Afonsinho e Sorriso para o carnaval de 1991; em 1993 a crítica política daria o tom através de “Nem tudo que reluz é ouro”, asssinado por Zeca do Cavaco, Nayo Denay, Marquito e Afonsinho. Com Agnaldo Amaral substituindo Thobias, o carnaval de 1994 marcaria o retorno da dupla formada por Tadeu da Mazzei e Jacó da Carolina, agora em parceria com André apresentando “Inã-Guê: pegando fogo”.

Em 1995 com Thobias reassumindo seu posto, a escola apresenta o enredo “Deu poesia na terra da garoa” do trio formado por Wagner Santos, Edson Silva e Amauri; no ano seguinte Wagner Santos empalcaria novo samba, agora ao lado de Borrão, “A rainha, a noite tudo se transforma”. O carnaval de 1998 marcaria o encontro da tradição afro italiana do Bixiga com a comunidade oriental paulistana, “Banzai! Vai-Vai”, assinada por Zé Carlinhos, Afonsinho e Zeca do Cavaco, o desfile daria para a agremiação da Bela Vista seu nono título no carnaval paulistano. Cabe destacar que no ano anterior a escola saira com “Liberdade ainda que Vai-Vai” assinado por Vilma Corrêa e Washington da Mangueira, o samba seria a única parceria vencedora assinado por uma mulher.

Com a vitória do ano anterior a escola preparou para o carnaval de 1999 ul desfile grandioso com grandes carros e belas fantasias. No setor musical, o carro de som contaria com Thobias que tinha seu nome já consolidado no carnaval paulistano, além da volta de Agnaldo Amaral e a participação de Wantuir. A cargo do trio estava a hercúlea tarefa de defender o samba composto também por um trio, Zeca do Cavaco, Zé Carlinhos e Afonsinho, porém “Nostradamus” não repetira o sucesso do carnaval anterior.

Em 2004 comemorando os 450 anos da cidade de São Paulo, a escola apresentou o inspirado  “Quer conhecer São Paulo? Vem pro Bixiga pra ver…”, do trio formado por Zeca do Cavaco, Nayo Denay e Zé Carlinhos, o samba foi defendido por Agnaldo Amaral. Destacamos ainda o samba de 2010 responsável por recordar os oitenta anos da agremiação, o tema vencedor foi composto pelo quarteto formado por Zeca do Cavaco, Afonsinho, Fábio Henrique e Ronaldinho FDQ com “Oitenta anos de arte e euforia, é bom no samba, é bom no couro. Salve o duplo jubileu de carvalho”, o samba foi defendido na passarela Grande Otelo pelo carioca Gilsinho.

Para o Carnaval de 2015 a homenageada seria a cantora Elis Regina com “Simplesmente Elis – A fábula de uma voz na transversal do tempo”; samba composto por Zeca do Cavaco, Zé Carlinhos e Ronaldinho FDQ. Mais uma vez defendido por Gilsinho, com a homenagem a cantora gaúcha, a alvinegra do Bixiga conquistaria seu último título no grupo especial até o momento. O carnaval de 2017 ficaria  marcado pelo samba, “No xirê do Anhembi, a Oxum mais bonita surgiu… Menininha, mãe da Bahia – Ialorixá do Brasil”, o samba composto por Edegar Cirillo, Marcelo Casa Nossa, André Ricardo, Dema, Leonardo Rocha e Rodolfo Minueto fora defendido na avenida por Wander Pires.

Após a segunda queda para o grupo de acesso, a escola optou por reeditar o samba “Eu também sou imortal”, apresentado pela primeira vez em 2005. O desfile culminaria na volta da agremiação para o grupo especial, para a elite do carnaval paulistano, lugar de onde nunca deveria ter saído. Para o Carnaval de 2025, a escola promete apresentar uma bela homenagem ao dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, criador do grupo Oficina, e assim como a própria escola, um símbolo do bairro. O samba escolhido foi resultado da parceria entre duas gerações de compositores da agremiação: Nayo Denay e Francis Gabriel.

Apesar de tantas informações, o que foi apresentado até aqui é apenas uma parcela ínfima da trajetória dessa escola única. Reviver a trajetória do Vai-Vai é reverenciar personagens como Seu Chiclé, Seu Livinho, Henricão, Benedito Sardinha, Frederico Penteado, Geraldo Filme, Pato N’ Água, Dona Olímpia, Dona China, Tia Cleuzi, Solon Tadeu, Aldo Bueno, Sol do Vai-Vai, Thobias do Vai-Vai, Elizeth Rosa, Chuveiro, Sahra Brandão, Chicão, Ademir, Nadão, Zé Carlinhos, Osvaldinho da Cuíca, Carlinhos Duvai e tantas outras figuras que passaram e passam por esse território, construindo sua memória e forjando sua identidade. Como cantou Geraldo Filme:

Quem nunca viu o samba amanhecer
Vai no Bixiga pra ver
Vai no Bixiga pra ver

O samba não levanta mais poeira
Asfalto hoje cobriu o nosso chão
Lembranças eu tenho da Saracura
Saudades tenho do nosso cordão
Bixiga hoje é só aranha-céu
E não se vê mais a luz da Lua
Mas o Vai-Vai
Está firme no pedaço
É tradição e o samba continua

Tradição (Geraldo Filme)

Para saber mais:

Bruno Sanches Baronetti. Transformações na Avenida. História das escolas de samba na cidade de São Paulo (1968-1996).

Claudia Alexandre. Orixás no terreiro sagrado do samba. Exu & Ogum no candomblé do Vai-Vai.

Olga Rodrigues de Moraes von Simson. Carnaval em Branco e Negro. Carnaval popular paulistano 1914-1988.

Daniel Costa é historiador, pesquisador, jornalista e compositor.

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