Os erros da esquerda que permitem a ofensiva conservadora na saúde global

• A crise de legitimação que faz crescer o negacionismo • O papel da Estratégia de Saúde da Família para o SUS • Consequências a longo prazo de bombardeios • E MAIS: autoexclusão de bets; testosterona; químicos em alimentos; segurança das vacinas •

Imagem: Arquivo pessoal Sophie Harman
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Em entrevista à Médico Internacional, organização alemã de direitos humanos e saúde global, a professora de política internacional na Queen Mary University of London e autora do livro Sick of It: The Global Fight for Women’s Health, Sophie Harman, explica a crise de legitimação que permite a ofensiva da extrema-direita sobre a saúde global. Para ela, essa ofensiva encontra sua vitória, também, nos erros dos movimentos progressistas. 

A entrevista aborda uma contradição na relação dos setores fascistas com o neoliberalismo, uma vez que parte de seus ataques é direcionado ao setor da burguesia que comanda a Big Pharma. A docente, então, aponta que apesar disso o cerne deste movimento é pautado na ideologia do individualismo. “Tudo gira em torno de assumir a responsabilidade individual e buscar a otimização de seus corpos para se manterem saudáveis. Esse tipo de conservadorismo é o que estabelece alianças com o neoliberalismo tradicional contra a regulação estatal: de sua perspectiva, o atendimento médico em mãos públicas não é uma solução, porque é perseguido por uma elite que dita o que temos que fazer”, ela explica.

Harman aborda, também, como a direita é capaz de captar a indignação das pessoas com o seu próprio sistema, e os movimentos progressistas de saúde deixam a desejar nesse tipo de comunicação. Ela exemplifica como comunidades marginalizadas, principalmente aquelas afetadas pela colonização, são convencidas de ideias antiaborto pelo histórico de esterelização de mulheres vindo do passado colonial.

Medicina da família reduz internações evitáveis no SUS

Estudo publicado no periódico The British Medical Journal evidencia o impacto positivo dos médicos de família na atenção primária. A pesquisa aponta a relação inversamente proporcional entre a carga horária de profissionais com residência em medicina da família e os índices de internações por condições sensíveis à atenção primária. É apontada também uma economia de aproximadamente R$30 milhões ao SUS no período analisado. Os dados mostram, por exemplo, uma queda de 32,8% nas internações por diabetes, e 19,4% em doenças respiratórias.

No entanto, em entrevista à Folha, Gregório Rodrigues, um dos autores do estudo, critica a alta rotatividade dos profissionais nas unidades de saúde: “A longitudinalidade importa. Quanto mais tempo o médico permanece, mais efeito ele produz. A lógica imediatista do gestor, que acha que economiza contratando qualquer profissional, é um tiro no pé”. A popularização dos regimes de trabalho terceirizados, de contratação por OSs, leva à precarização desses profissionais, e o não incentivo à sua permanência. 

Como a guerra deixa marcas nos corpos atingidos

Em reportagem, a revista Jacobin explica como crimes de guerra há décadas comprometem a saúde de gerações de civis em territórios invadidos pelos Estados Unidos. A principal história abordada é de Faluja, cidade histórica religiosa e culturalmente no Iraque, que sofreu fortes bombardeios com armas biológicas e químicas em 2004. Elementos como o fósforo branco e urânio seguem comprometendo a fertilidade e formação fetal das crianças nascidas na cidade, 20 anos após o confronto.

Um estudo sobre as consequências da guerra na saúde da população duas décadas depois encontrou urânio nos ossos de 29% dos participantes, e chumbo em 100%. As taxas são até 60% mais altas do que as encontradas em cidadãos da mesma idade nos EUA.

Na atualidade, a história se repete e se potencializa em Gaza. A estimativa aponta que Israel, com apoio dos Estados Unidos, já utilizou 200 mil toneladas de bombas em Gaza, uma área de alta densidade populacional. As armas em questão contém os mesmos elementos tóxicos, repetindo os crimes de guerra já vistos e contaminando o território palestino por séculos. 

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Autoexclusão em sites de apostas 

A Plataforma Centralizada de Autoexclusão, ferramenta que permite ao cidadão bloquear simultaneamente todas as contas em sites de apostas autorizados pela Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda (SPA/MF), foi lançada pelo governo federal. Saiba como utilizar

Testosterona em mulheres

Entidades médicas alertam para os riscos de uso de  testosterona por mulheres sem um diagnóstico de deficiência do hormônio que justifique a sua reposição. A preocupação se origina da popularização do uso do hormônio para fins estéticos. Entenda os riscos.

“Químicos eternos”

Pesquisas encontraram produto químico tóxico resistente à degradação em alimentos da Europa e dos EUA. O ácido trifluoroacético (TFA) está presente em alimentos à base de trigo, frutas e amêndoas. Característica de panelas de pressão, a substância foi popularizada também em cosméticos no século 20. Saiba mais.

Vacinas e autismo

A OMS lançou um parecer que conclui a ausência de relação entre vacinas e autismo, contrariando teorias difundidas pela principal agência sanitária dos Estados Unidos. O estudo retratou, principalmente, a eficiência dos conservantes à base de alumínio, composto especialmente atacado pela ultradireita norte-americana. Confira a declaração.

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