Irã-Israel: Breve radiografia do conflito

Teerã mostrou sua capacidade de reação e tem trunfo: pressionar os preços do petróleo, caso bloqueie o Estreito de Ormuz. Netanyahu foi ousado, mas temerário: se frustrada a escalada, evidenciará um Ocidente em crise que tenta manter sua supremacia por meios brutais

Retaliação iraniana em Tel Aviv. Foto: Poder 360
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Ao entrar no quarto dia, a guerra parece ter assumido um novo contorno. A superioridade militar de Israel já não é tão clara. Crescem, no Ocidente, as preocupações com uma arma que o Irã ainda não utilizou — a pressão sobre os preços do petróleo. E surgem sinais de que, se o conflito se prolongar, podem se tornar mais intensas as pressões para que Trump imponha a Netanyahu um cessar-fogo, que poderia significar uma derrota política grave.

No domingo, Israel anunciou ter assassinado o comandante dos serviços de inteligência do Irã e seu segundo na linha de comando. Na manhã desta segunda, também alardeou ter atingido o quartel-general das Brigadas Al-Quds, uma tropa iraniana de elite (o New York Times não confirmou este segundo “fato”). Os ataques de Israel são mais precisos e potencialmente devastadores. Mas, sempre segundo os analistas ocidentais, não têm, até agora, a capacidade de alcançar o principal objetivo de Netanyahu: destruir as instalações de enriquecimento de urânio do Irã na montanha de Fordow, que estariam a quase um quilômetro de profundidade.

Enquanto isso, o Irã demonstrou que a decapitação de seus principais comandantes militares não foi capaz de bloquear sua capacidade de ação. Novas ondas de mísseis foram disparadas, e muitos deles venceram as barreiras antimísseis que Israel opera como colaboração direta dos Estados Unidos. Segundo algumas narrativas, inclusive ocidentais, foram atingidas uma grande instalação militar e o porto de Haifa, além de diversas áreas habitadas. Além do dano material, há o impacto político. Netanyahu está sob pressão permanente em Israel. Seu trunfo para safar-se (inclusive de processos que podem levá-lo à prisão) é aparecer como representante insubstituível da força militar do país. Se esta imagem trincar, as consequências são imprevisíveis.

Os preços internacionais do petróleo voltaram a subir hoje. Já estão em U$ 75 o barril, 11% mais que antes dos ataques de Israel. Mas podem subir muito mais, caso o Irã atinja navios petroleiros no Golfo Pérsico ou, ainda mais, consiga bloquear o Estreito de Ormuz, que liga as principais regiões produtoras do Oriente Médio ao resto do mundo. Uma disparada dos preços poderia atingir fortemente as economias do Ocidente, que já enfrentam estagnação e riscos de inflação. Por que o Irã ainda não lançou mão desta arma? Por temer que os ataques a seu território recrudesçam? Para manter este trunfo e, possivelmente, usá-lo em momento mais decisivo?

Por falar em Ocidente, uma nova reunião do G7 começou neste domingo em Alberta, no Canadá. As atenções estão voltadas para Trump, que já mudou de posição duas vezes desde o início da guerra. Primeiro, procurou manter-se distante do ataque de Israel. Quando pareceu que ele seria rápido e bem-sucedido, declarou conhecê-lo desde o início (o que foi confirmado por Netanyahu e é real, segundo a The Economist). Mas nas últimas horas, surgiram sinais de que parte de sua base política — os defensores mais intransigentes do MAGA e do afastamento da condição de “polícia do mundo” — está pressionando para distanciar-se de Tel Aviv.

Trump conseguiu até agora manter-se em ambiguidade. Os navios norte-americanos no Oriente Médio participam da defesa de Israel contra os mísseis iranianos. Mas não há envolvimento direto na guerra e ele pode ser necessário para atacar mais decisivamente as instalações nucleares do Irã em Fordow. Antes de Israel atacar, Teerã e Washington negociavam a retomada do acordo nuclear firmado por Obama e rompido por Trump em seu primeiro governo. Estes canais de negociação terão sido rompidos ou continuarão ativos?

O lance de Netanyahu, ao começar uma guerra, foi ousado, porém temerário (além de criminoso, é claro). Se o Irã for capaz de resistir à capacidade militar superior de Israel, poderá criar condições políticas para uma vitória — que viria na forma da interrupção dos ataques israelenses sem que tenham alcançado sucesso. Caso isso ocorra, equivalerá à frustração de mais uma tentativa feita por um Ocidente, em crise, para manter sua supremacia por meios brutais — os únicos que parecem lhe restar agora.

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