Biden e Trump: o primeiro confronto em 2024

Nesta quinta, candidatos à Casa Branca realizam o primeiro debate. Tentam conquistar parte do eleitorado que rejeita ambos. A aptidão mental será central. Ex-presidente, no entanto, tem como trunfo usar a discussão para inflamar suas redes sociais…

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Os dois principais candidatos à Presidência dos Estados Unidos fazem o primeiro debate das eleições de 2024. Joe Biden e Donald Trump vão até Atlanta (Georgia), na quinta-feira (27), para realizar o encontro que será transmitido pela CNN.

Em relação ao momento das campanhas, é o debate que será realizado mais longe da data da eleição desde 1960. Os dois candidatos já concordaram para a realização de um segundo encontro em setembro.

Geralmente, esse tipo de encontro é realizado em um espaço para eventos em um campus universitário, coordenado pela Comissão bipartidária de Debates Presidenciais. Mas desta vez será diferente. Ambos os candidatos já disseram que não vão participar dos encontros previamente agendados pelo CPD. E, segundo acordo estabelecido pelas duas campanhas, não haverá público e os microfones estarão desligados quando o debatedor não estiver com a palavra.

Mas o que se pode esperar deste debate? Fórum conversou com o professor de Jornalismo na Universidade de Indiana, em Indianápolis, Chris Lamb. Ele também é o autor de The Art of the Political Putdown: The Greatest Comebacks, Ripostes, and Retorts in History (em tradução livre: A arte da repressão política: as maiores reviravoltas, respostas e réplicas da história).

Biden x Trump: uma revanche impopular

“Todos os debates televisivos são importantes. Mas este debate em particular é provavelmente menos importante que outros. Já sabemos muito sobre os dois candidatos. Eles são como personagens de um programa de televisão de longa duração que se tornou previsível e obsoleto”, aponta Lamb, a respeito das expectativas sobre o encontro. “A maior parte do país não quer que nenhum dos dois concorra à presidência novamente”, destaca, lembrando que debates não se vencem. Mas se perdem.

Quando Lamb faz referência à rejeição dos estadunidenses por ambos os candidatos, trata-se de um fato que as pesquisas vêm demonstrando desde antes de as escolhas se efetivarem. Segundo uma média de sondagens feita pelo projeto Fivethirtyeigh até 1º de abril, apenas 43% têm uma opinião favorável em relação a Trump, enquanto 53% têm uma opinião desfavorável. Biden é visto de forma favorável por 40%, com 55% apresentando uma opinião desfavorável.

Desde 1980, é a segunda vez em que ambos os postulantes têm uma avaliação mais negativa do que positiva, a outra ocasião em que isso aconteceu foi em 2016, quando Trump enfrentou Hillary Clinton. Mesmo com um déficit de popularidade neste sentido maior que o de Trump, isso não significa que o atual presidente sai em tanta desvantagem, já que o republicano venceu Clinton em 2016 mesmo com um desempenho pior que o da adversária nesse quesito.

“Isso [a média destas pesquisas] significa que prever o vencedor da eleição não é tão simples quanto escolher o candidato menos impopular. É verdade que é matematicamente mais fácil para esse candidato obter um número de votos que assegure a vitória, já que tem menos haters para converter. Mas ainda tem que converter alguns, e isso significa forçá-los a fazer uma escolha sobre quem eles odeiam menos. Essa é uma questão diferente de qual candidato tem um número menor de haters, e é algo que uma classificação de favorabilidade não pode nos dizer por si só”, aponta neste artigo o jornalista Nathaniel Rakich.

A aptidão mental em debate

Nesta revanche que poucos nos Estados Unidos gostariam de ver, como se comportarão os dois presidenciáveis após quatro anos sem participar de debates, já que ambos não travaram duelos contra seus oponentes na disputa pela indicação de suas legendas neste ano?

“Nem são bons debatedores e são quatro anos mais velhos do que eram em 2020. Biden está velho. Ele precisa agir como alguém mais jovem. Trump é um idiota. E precisa agir de forma menos desagradável”, avalia Chris Lamb. “Biden pode preservar a sua energia mantendo os seus improvisos espontâneos breves e bem ensaiados. Ele parecerá mais jovem se mostrando divertido – em vez de demonstrar repulsa – ao enfrentar Trump. Poderá Trump apresentar-se como relativamente simpático, como fez quando foi apresentador do reality show O Aprendiz? Não. Não sem roteiristas e editores.”

O republicano vem falando há meses sobre a aptidão mental de seu adversário, mas nos últimos dias sua campanha mudou o rumo das críticas, o classificando como um debatedor que não pode ser desprezado. Trump voltou a sugerir, como fez em 2020, que Biden deve ir ao encontro “drogado” para melhorar sua performance. Obviamente, é uma vacina para o caso de seu desempenho ser pior que o do adversário.

Por outro lado, a campanha do democrata deve explorar o desequilíbrio do oponente, alguém de conduta moralmente reprovável e que teria como intenção beneficiar a si e seu entorno em uma eventual volta à Casa Branca. “A maioria dos americanos não entraria num carro dirigido por nenhum dos dois; portanto, eles não estão em êxtase por ter qualquer um dos homens como presidente. Espero que Biden esteja gastando muito tempo se preparando para o debate. Ele sabe o que está em jogo. Sabe que cada hesitação, cada gagueira será examinada e criticada. Trump carece de autoconsciência. Poderia conquistar os eleitores indecisos se agisse de forma mais prudente e ponderada. Mas ele não é um ator tão bom”, pontua Lamb.

A batalha dos candidatos nas redes sociais

No Brasil, igual ou talvez mais importante que os debates em si tem se tornado as edições feitas pelas campanhas e por apoiadores, ressaltando trechos que reforçam ideias e buscam desmontar a imagem dos rivais. Nos Estados Unidos, não é diferente. Por isso, cada momento do encontro entre os presidenciáveis pode ser amplificado e repetido à exaustão para os eleitores.

“Já não vemos os candidatos através de uma moldura de janela como fazíamos antes das redes sociais. Vemos por meio de um espelho de casa de diversões”, pontua Chris Lamb. “Trump, mais do que qualquer outro presidente da história, sabe como usar e explorar as redes sociais. Ele sabe que, como diz o ditado, uma mentira pode dar a volta ao mundo antes de a verdade amarrar os sapatos. Por isso, não há grande vantagem para ele em dizer a verdade. Trump é fake news. Trump diz o que quer, sem se preocupar se é verdade ou não, e depois a lança aos ventos da desinformação. Trump, tal como Hitler antes dele, chama a imprensa tradicional de ‘o inimigo do povo’ porque quer deslegitimar a imprensa, que escrutina as suas palavras e o revela como o perigoso bufão que é. Caberá às legiões de Biden defendê-lo nas redes sociais.”

Um dado dá a noção da desvantagem do atual presidente na mídia social. Sua campanha entrou oficialmente na plataforma TikTok em fevereiro, com mais de 200 postagens, conquistando pouco mais de 380 mil seguidores. Já Trump entrou há pouco mais de duas semanas e já tem 6,4 milhões de seguidores.

A Future Forward USA Action, um Super PAC (Comitê de Organização Política que arrecada fundos para uma campanha) que conta com bilionários da área de tecnologia como o cofundador do Facebook, Dustin Moskovitz, e o fundador do LinkedIn, Reed Hoffman, arrecadaram US$ 10 milhões para analisar os algoritmos das redes que favorecem Trump e recrutar influenciadores pra divulgarem conteúdo pró-Biden. Nas últimas semanas, diversos vídeos e memes têm circulado nas plataformas para reforçar a imagem de fragilidade física e mental do atual presidente.

Debates históricos nos EUA

Alguns debates em campanhas nos Estados Unidos produziram momentos que marcam até hoje a história política do país. Chris Lamb destaca alguns deles:

“Em 1960, o vice-presidente Richard Nixon, o candidato republicano, e o senador norte-americano John F. Kennedy, o candidato democrata, participaram do primeiro debate televisivo entre candidatos presidenciais. Ambos os candidatos eram inteligentes, polidos e bem preparados. Segundo a história, quem ouvia no rádio achava que Nixon havia vencido, mas quem assistia pela televisão achava que Kennedy, bronzeado e mais bonito que o rival, venceu o nervoso Nixon, que tinha barba por fazer. Kennedy venceu a eleição.”

“Os debates têm feito uma diferença marginal nas eleições presidenciais. Jimmy Carter, o presidente em exercício, foi mal-humorado no seu debate em 1980 com o seu rival do Partido Republicano, Ronald Reagan, que era afável e confiante. Reagan ganhou a eleição. Reagan tropeçou no seu primeiro debate em 1984 contra Walter Mondale, levantando preocupações de que Reagan poderia ser demasiado velho para ser presidente. Mas Reagan afastou essas preocupações com uma piada bem ensaiada. Joe Biden precisa de tomar nota.”

Na ocasião, Reagan, aos 73 anos, sabia que seria questionado sobre a sua idade no debate e, quando veio a pergunta, respondeu: “Quero que saibam que (…) não farei da idade uma questão nesta campanha. Não vou explorar para fins políticos a juventude e a inexperiência do meu adversário”. Mondale, que tinha 56 anos, não segurou o riso, assim como o público.

“O vice-presidente Al Gore tropeçou no seu primeiro debate com George W. Bush, que era visto como um peso leve, ao suspirar alto e agir com impaciência durante as respostas do adversário. Bush venceu as eleições numa das disputas presidenciais mais acirradas da história dos EUA. Barack Obama teve um desempenho melhor do que qualquer um dos seus oponentes, John McCain (2008) e Mitt Romney (2012). Em 2016, a América teve de decidir entre dois dos candidatos presidenciais menos simpáticos, Trump e a democrata Hillary Clinton. Trump intimidou Clinton durante o debate”, destaca Lamb.

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