De Junho de 2013 a Maio de 2018

Quais as semelhanças entre estes momentos recentes e aparentados? Primeiro, a sensação difusa de insatisfação que se difunde rapidamente

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Por Fran Alavina

Com a greve dos caminhoneiros formou e se alastrou uma babel político-midiática na qual entender o que está ocorrendo e escolher uma posição sensata tornaram-se tarefas das áridas. Em alguns setores à esquerda, as tentativas de compreensão são as mais diversas e diante das dificuldades de um entendimento mais profundo se tende a cair na polarização simplista: ou se é totalmente contra, ou completamente favorável; ou é grave de classe trabalhadora, ou paralisação de interesse patronal. Enquanto isso, grupos à direita agem de forma semelhante ao que fizeram em um passado recente. Assim, estamos ante um quadro político-social que cada vez mais ganha traços semelhantes ao que ocorreu em junho de 2013.
Nesse ponto do texto sei que grupo de leitores, defensores ferrenhos das jornadas de junho de 2013 já estão armados para defender atacando. Mas quando me refiro aqui a junho de 2013 aponto para aquilo em que se transformaram as jornadas: na criação da massa informe que direcionada para a negação das mediações políticas foi o terreno propício para o surgimento das massas protofascistas vestidas com o uniforme da CBF. Não por coincidência a frase de 2013 “vem pra rua” virou slogan e marca registrada de um dos movimentos verde-amarelo.
De fato, no corpo político e no tecido social, semelhanças não são simples coincidências e as similaridades não são meras repetições ocasionais. Ora, quais são então as semelhanças entre estes momentos recentes e aparentados? . Ontem, o aumento na tarifa de ônibus; hoje, o aumento no preço dos combustíveis. Evidentemente que os agentes catalisadores nas duas ocasiões são bem diferentes, porém o âmbito é o mesmo: mobilidade e circulação. Isto é, trata-se de algo que atinge diretamente o cotidiano da população.

Um aumento injusto proporciona a revolta legítima, que cresce conforme os níveis de excitação midiática. Hoje, porém, com dois agravantes maiores que em 2013: um governo de popularidade zero e uma paralisação que gera desabastecimento de gêneros de primeira necessidade. Diante disso, como em 2013, gradualmente, as pautas estão se dilatando e tendendo a se afastar da questão especifica que se fazia presente no começo de tudo. Neste maio, como naquele junho, estamos na fase expressa pelo: “não é só pelos 20 centavos”. Agora, já se diz que não é apenas pelos caminhoneiros e o preço dos combustíveis. Outros setores se articulam, aderindo à narrativa da insatisfação legitima. A excitação causada pela greve e o desabastecimento vai se conformando como um motor para outras questões. Em breve, poderemos assistir a um cenário que se dirigirá cada vez mais contra os atores políticos do momento. Sem falar que Temer e sua inabilidade congênita criará ainda mais tensões, veja-se sua recente proposição de usar a força bruta para desobstruir as estradas.
Ademais, isso pode ocorrer com maior facilidade e velocidade, uma vez que, como em junho de 2013 não há partidos políticos, nem grandes lideranças à frente do movimento. Ou seja, há um aparente inimigo comum que facilmente poderá servir de bode expiatório frente uma massa insatisfeita com as condições de vida. Isto, contudo, esconde as polarizações internas que, dependendo do grau de intensidade das forças, emergirá de modo mais frontal que em 2013. Enquanto tudo se passa em tom de espontaneidade e sem polarizações, forças políticas contrárias se fortalecem e se enfraquecem à medida que aumentam seu grau de participação e influência dentro das manifestações.
Como antes, os principais meios de divulgação e que proporcionam uma excitação política forte são os virtuais: a velha mídia conduz sua narrativa em paralelo com o que se passa na tela do celular e dos computadores. Pelo facebook e whatsapp pululam mensagens e vídeos que aparecem como “espontâneos” com o objetivo de gerir e direcionar melhor a insatisfação difusa. Se cria uma identificação geral entre o movimento dos caminhoneiros e o quadro político-social mais amplo. Eles não são identificados como baderneiros e inconsequentes, assim como acabaram se transformando os movimentos de junho de 2013 à medida que deixaram de ser identificados com o movimento passe livre e os black bloc.
Daí que já não se pede mais o simples apoio à grave dos caminhoneiros, mas que se sai às ruas e que outras manifestações ocorram. Por enquanto, ainda não houve de fato a passagem da virtualidade das mensagens à realidade das ruas, porém, o estado de ânimo que só acontece quando o real é contado na forma do virtual já está formado. Ou seja, é o mesmo estado de ânimo social que ensejou o momento em que as jornadas de junho de 2013 passaram da questão da tarifa aos mais diversos problemas políticos.
Em passos largos, tudo parece caminhar para um estado de convulsão social. Embora tudo esteja em aberto e não exista nada pré-determinado, sabemos cada vez menos para onde vamos. Uma coisa é certa: vácuos no corpo político não permanecem por muito tempo, eles são ocupados, no geral, não apenas pelos mais fortes, porém pelos aproveitadores mais oportunistas. Não foi isso que ocorreu ao fim das jornadas de junho de 2013?

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