A obra inacabada de Pasolini

Editora sobinfluencia lança no Brasil Porno-Teo-Kolossal, o roteiro de um fábula radical do diretor italiano. Sagrado e profano se fundem em uma comédia sacra com Reis Magos, sátira política e crítica à sociedade do consumo. Leia um trecho. Sorteamos um exemplar

Reproduzida em The Criterion Collection
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O diretor de cinema Pier Paolo Pasolini é considerado uma das personalidades mais importantes da história italiana, influente tanto como artista quanto como figura pública e intelectual.

Seus filmes polêmicos e avantgarde, por vezes com atores não profissionais, carregados de críticas sociais e de um erotismo muito próprio, deixaram marcas indeléveis na história da arte mundial.

O que pouco se sabe é que Pasolini desejava se dedicar totalmente à escrita e que, antes disso, pretendia encerrar sua prolífica carreira como diretor com uma obra ambiciosa e controversa – para não perder o costume.


Em Sodoma a tolerância é real, a mansidão é real, a compreensão dos outros é real e tudo está fundado em uma prática democrática real. Minorias de qualquer tipo também encontram lugar no mundo de Sodoma. Não só as minorias heterossexuais, mas também as minorias de negros, de judeus, de ciganos, que vivem ali na mais absoluta liberdade, inclusive interior.”


O artista trabalhou quase uma década no roteiro, que levava o inusitado nome de Porno-Teo-Kolossal, uma superprodução teológico-pornográfica.

Infelizmente o brutal assassinato de Pasolini em 1975 interrompeu de maneira precoce não só sua vida, como também uma série de projetos que o artista pretendia lançar ao mundo.

Mas podemos respirar porque há uma boa notícia! A sobinfluencia edições publicou o roteiro em tradução inédita para o português: Porno-Teo-Kolossal: A Obra Inacabada de Pasolini.

Outras Palavras e sobinfluencia edições sortearão um exemplar de Porno-Teo-Kolossal: A Obra Inacabada de Pasolini, entre quem apoia nosso jornalismo de profundidade e de perspectiva pós-capitalista. O sorteio estará aberto para inscrições até a segunda-feira do dia 9/6, às 14h. Os membros da rede Outros Quinhentos receberão o formulário de participação via e-mail no boletim enviado para quem contribui. Cadastre-se em nosso Apoia.se para ter acesso!

O enredo segue uma comédia sacra onde a busca pelo Messias conduz dois personagens – um Rei Mago napolitano e seu criado – por cidades distópicas governadas por regimes do prazer, do consumo e do controle. Sádico e irreverente, o texto é como uma fábula político-poética contra o mundo morto do capital.

Leia, logo abaixo, o prefácio à edição do professor de filosofia Andityas Matos, que articula pornografia, teologia e política como chaves para compreender a radicalidade da visão pasoliniana. Boa leitura!


A TEOLOGIA POLÍTICO-PORNOGRÁFICA DE PIER PAOLO PASOLINI

Andityas Matos [1]

Apesar de o roteiro de Porno-Teo-Kolossal estar pronto em 1975, [2] Pasolini não pôde filmá-lo em razão de seu trágico assassinato no final desse mesmo ano. Se tivesse sido, certamente teria a deliciosa atmosfera onírica, de fábula mesmo, de Uccellaci e uccelini (1966), conforme o próprio Pasolini admitira. O primeiro ator que ele pensou para interpretar Epifânio – o Rei Mago napolitano – foi o lendário Totò, que, contudo, morrera em 1967, o que levou Pasolini a se dirigir a Eduardo De Filippo para tentar “convencê-lo” a participar do filme, como se vê na carta traduzida nos anexos do presente volume. Com efeito, assim como em Porno-Teo-Kolossal, em Uccellaci e uccelini há uma dupla cômica formada por um senhor mais velho (Totò/De Filippo) e um rapaz, papel pensado, em ambos os casos, para Ninetto Davoli, figura inconfundível, levemente abobalhada e adorável, fundamental na cinematografia – e na vida – de Pasolini.

Pasolini pensou em vários títulos para o que, ao final, seria chamado de Porno-Teo-Kolossal: circenses (“Jogos de circo”, em latim), Dromenon legomenon (“Canção de ação”, em grego antigo) e Ta Kai Ta, expressão grega de São Paulo que significa algo como “isto e aquilo”. [3] Em 1973, o cineasta escreveu inclusive uma espécie de resumo do roteiro com o título Il cinema, texto publicado na seção de anexos desta edição. É certo, contudo, que a ideia para esse filme já rondava a mente de Pasolini há muitos anos – ao menos desde 1966, segundo Sergio Citti, amigo e colaborador do cineasta –, como se vê nas duas cartas também publicadas nos anexos, a primeira delas datada de 20 de dezembro de 1968 e dirigida a Maria Giulia Crespi, e a segunda datada de 24 de setembro de 1975 e endereçada a Eduardo De Filippo. Em junho de 1975 Pasolini já tinha claro que Porno-Teo-Kolossal seria seu último filme, [4] planejando se dedicar, depois de sua produção, exclusivamente à escrita. Contudo, não podendo rodá-lo em 1975, Pasolini se envolveu em um projeto que inicialmente não era seu, e sim de Sergio Citti, mas pelo qual ele acabou se entusiasmando, tendo Citti o abandonado. Trata-se de Salò o le 120 giornate di Sodoma, que, este sim, seria involuntariamente o seu último filme. Muitos críticos e espectadores viram nessa obra uma espécie de testamento macabro e niilista, o que, na verdade, não tem muito sentido, pois Pasolini não sabia que seria morto na noite de 01º para 02 de novembro de 1975, antes mesmo da estreia de Salò, que se deu com grande escândalo no festival de Paris, em 22 de novembro de 1975. Com efeito, ele tinha ao menos um outro projeto a ser realizado, ou seja, Porno-Teo-Kolossal. Antes de pensar nele como o último de sua carreira cinematográfica, Pasolini havia cogitado um filme sobre São Paulo – que se intitularia Bestemmia (Blasfêmia) – e outro baseado na vida de Gilles de Rais (1404-1440), sádico cavaleiro e senhor da Bretanha, Anjou e Poitou que entrou para a história como uma espécie de serial killer avant la lettre, pois torturou e assassinou de oitenta a duzentas crianças camponesas em seu castelo. [5] Parece que ambos os filmes acabaram “absorvidos” por Salò, [6] de maneira que, com toda probabilidade, o próximo filme de Pasolini seria, de fato, Porno-Teo-Kolossal.

De qualquer modo, o roteiro de Porno-Teo-Kolossal ocupa um importante espaço na obra pasoliniana, e não só naquela puramente cinematográfica. Se considerarmos os últimos quatro filmes do cineasta italiano – a chamada “trilogia da vida” composta pelos filmes Il decameron (1971), I racconti di Canterbury (1972) e Il fiore delle mille e una notte (1974) e o quase insuportável Salò o le 120 giornate di Sodoma (1975) –, Porno-Teo-Kolossal aparece como uma zona de indeterminação entre a visão lírica, naturalista e libertária do sexo apresentada na trilogia e o pesadelo erótico de Salò, no qual o sexo se resume a um terrível instrumento de dominação voltado para a extração de gozo ilimitado, evocando assim a dinâmica social propriamente sádica e mecânica que se impunha em todo o mundo capitalista que Pasolini denunciou em seus artigos e diálogos jornalísticos publicados nas coletâneas Scritti corsari (1975) e Lettere luterane (1976). Nessa perspectiva, Salò se tornou tabu tão logo foi lançado porque levou às últimas consequências a tendência característica da burguesia – que, para Pasolini, muito mais do que uma classe social, é uma doença altamente contagiosa –, ocupada com a destruição dos modos de vida “tradicionais” (operários, rurais, “solitários” etc.) em nome de uma existência simplificada em que o gozo, em certa modalidade altamente egoísta, des-historicizada e dessocializada, se tornou o único horizonte possível.

Para além do caráter violento, degradante e perturbador, o que torna Salò insuportável é o fato de ser um filme atual, ou seja, que fala não do passado, mas do presente e do futuro. [7] Por isso Pasolini insistia que uma das chaves para compreender o seu último filme – e também Porno-Teo-Kolossal, como veremos – está na ideia de que a história não existe, [8] o que significa, evidentemente, que a história não se identifica com um substrato ontológico, tratando-se antes de uma narrativa, quase sempre moldada e monopolizada pelos exploradores. Ainda que a “ação” se passe em 1944 na república-paródia fundada na cidade de Salò por Mussolini e os nazistas, o filme de Pasolini não se refere ao fascismo de então, e sim ao fascismo dos anos 1960 e 1970, que tudo transformava em mercadoria, bem como ao fascismo que viria e que hoje Franco Bifo Berardi chama de gerontofascismo, [9] ou seja, o fascismo de uma sociedade comandada por velhos (homens, leis e interesses) que em nada se preocupam com os jovens, transformados em simples objetos de exploração ou simplesmente usados até à exaustão, como se vê no filme maldito de Pasolini.

Em Salò, um dos tetrarcas fascistas faz sua célebre afirmação segundo a qual: “Nós, os fascistas, somos os únicos verdadeiros anarquistas; uma vez, naturalmente, que tenhamos tomado o poder do Estado. De fato, a única verdadeira anarquia é a do poder”. Com isso Pasolini alude a uma versão da anarquia que corresponde à máxima expressão da ordem, quando está ausente qualquer mediação político-comunitária entre os sujeitos e os mais fortes podem então impor os seus desejos aos mais fracos de maneira milimétrica, ordenada e racional, como nas estritas e detalhadas normas que governam os universos utópicos/distópicos de Sade, Fourier e Loyola, conforme demonstrado por Roland Barthes em um importante livro. [10] Hoje essa anarquia racional da ordem e do regulamento recebe o nome, ao mesmo tempo ridículo e falso, de anarcocapitalismo, regime econômico-subjetivante que predica uma total ausência de limites para a exploração e o gozo, nada tendo a ver com os anarquismos tradicionais de Proudhon a Kropotkin nem com as propostas anárquicas da contemporaneidade. [11] Não há dúvida de que Pasolini diferencia muito bem essas duas dimensões da anarquia, tal como ele próprio declara em uma autoentrevista publicada em 25 de março de 1975 no Corriere della Sera:

A anarquia dos explorados é uma anarquia desesperada, idílica e sobretudo construída no ar e eternamente irrealizada, enquanto a anarquia do poder se concretiza com a máxima facilidade nos artigos do código e na práxis. Os poderosos de Sade não fazem outra coisa senão escrever regulamentos e aplicá-los regularmente. [12]

Nesse sentido, é significativo que, como confessa Pasolini, para fazer Salò ele se inspirou não só nos ensaios de Blanchot e Klossowski sobre Sade, mas releu a obra do Marquês com uma pequena alteração: em todo lugar no qual aparecia a palavra Deus, Pasolini a substituiu por poder, com o que obteve uma “estranha ideologia extremamente atual”. [13]

Definitivamente, Salò tem a ver com a anarquia do poder, cuja especialidade é transformar corpos em coisas, [14] revelando assim o princípio central do capitalismo, razão pela qual Pasolini pôde afirmar que nesse filme há uma dimensão de “puro marxismo”, dado que Marx desvela em O capital o processo capitalista de conversão de corpos em mercadorias. [15] É nessa dimensão que cenas fortíssimas de Salò, como aquela em que os escravos sexuais são obrigados a comer fezes, devem ser entendidas. Elas expressam uma metáfora do sistema capitalista, em que os produtores obrigam os consumidores a comer excrementos industrializados – a exemplo da sopa Knorr, diz Pasolini [16] –, performando assim um ritual do vazio, dado que, segundo o cineasta, o poder capitalista é ritualizador e codificador, mas não pode ritualizar e codificar nada senão seu próprio vazio, o puro arbítrio, a sua própria anarquia. [17] Nessa perspectiva, ao analisar a destruição da cultura popular e camponesa italiana pelo capital, Pasolini foi um dos primeiros a perceber uma radical mutação antropológica que ocorria nos anos 1960 e 1970 em seu país e que hoje parece ter se espalhado por todo o mundo sob a forma de um “automatismo moral” – a expressão é de Ernst Jünger – que faz das vítimas do sistema, uma vez transformadas em mortos-vivos, os seus principais defensores. E tudo isso em nome de um gozo sem limites que, no entanto, sempre se resolve em culpa, dívida e, em última instância, em extermínio – ou seja, em levar algo ou alguém para além do término, ex terminus [18] – do outro.

Dessa forma, a tétrica frieza e a imobilidade hierática dos personagens – e das vítimas – de Salò aparecem no quadro de uma crítica radical contra o capitalismo, que teria inclusive destruído as duas grandes utopias emancipatórias – cristianismo e comunismo – que, bem ou mal, impediam durante a primeira metade do século XX o que Pasolini chamava de “homologação” total da realidade italiana por parte do capital. Cristianismo e comunismo cuja mistura paradoxal encontrava exatamente em Pasolini a sua problemática e dolorosa possibilidade, mas que ele próprio reconheceu terem sido vencidos em duas significativas cenas de Salò: na primeira, uma das vítimas é obrigada a comer excrementos e levanta os olhos para o céu, perguntando a Deus por que Ele as abandonara; na segunda, descoberto um genuíno casal de vítimas que sentia amor uma pela outra, é imediatamente ordenado o seu fuzilamento, tendo o rapaz morrido de pé com o punho alçado, gesto típico dos militantes comunistas. Essa última cena, que contrapõe o amor ao mero sexo, envolvia a crítica de Pasolini à tão falada liberdade sexual dos anos 1960 e 1970, que não aparecia ao diretor como uma dimensão de liberdade, e sim enquanto uma intensiva e irreflexiva inserção do corpo humano nos circuitos mundiais de compra e venda. De fato, Pasolini intuiu algo [16] semelhante ao que percebera Foucault, para quem o desejo de saber sobre o sexo, além de não abrir qualquer experiência originária ou natural, não garante por si só nenhum espaço libertador. [19] Foucault, contudo, foi mais longe do que Pasolini, pois ao negar que se possa ter uma experiência natural – e, portanto, “normal” – da sexualidade, indicou que nesse campo tudo é construção, em especial quando se quer saber sobre o sexo e, consequentemente, se necessita de alguém que possa falar sobre esse tema. É exatamente o que faz Pasolini em uma perspectiva algo ingênua em sua trilogia da vida, quando ele tenta – sem sucesso, é claro – retratar a suposta naturalidade e originalidade do sexo, apenas para perceber poucos depois, em Salò e em Porno-Teo-Kolossal, que na sociedade burguesa cruel, hedonista e insensibilizada que ele denunciava sem descanso nos seus artigos, não era o sexo, e sim o discurso sobre o sexo – algo em que Pasolini era especialista – que constituía um dos mais importantes dispositivos de manutenção do horizonte de existência burguês.

Daí a radicalização de Salò, em que já não é Pasolini que “conta” o sexo, e sim o Marquês de Sade, os hierarcas fascistas, as suas acompanhantes e, em última análise, o próprio povo italiano aburguesado e anestesiado pela indústria do gozo que, na verdade, apenas engatinhava naqueles dias, tendo chegado à plena maturidade apenas nos nossos dias, quando com uma rápida olhada no celular qualquer um pode ter acesso a inúmeras “narrativas” sexuais. E isso com uma tal riqueza de personagens, posições, perversões, preços (havendo inclusive opções “de graça”; salvo que, como dizem os economistas de plantão, não há almoço grátis; pelo menos não no mundo capitalista) e de maneira tão imediata, total e irresponsável que a própria noção de narrativa parece desaparecer, levando as pessoas a achar que estão diante do sexo “em si mesmo”, nu e cru, cujos melhores exemplos são os famosos vídeos “amadores”. Contudo, conforme bem pontuou Guy Debord, essa “verdade” do sexo não passa de um momento do falso, pois “tudo que era diretamente vivido se afastou em uma representação”, ou seja, se transformou em espetáculo que, “como inversão concreta da vida, é o movimento autônomo do não-vivo”. [20]

Ao que parece, ciente de toda essa mistificação, Pasolini inclusive escreveu um famoso texto em que renegou a sua trilogia da vida, dado que, àquela altura, o sexo já não tinha nada a ver com a vida, e sim com a morte. [21] Dessa feita, muito antes de autores contemporâneos como Giorgio Agamben, Roberto Esposito ou Achille Mbembe, Pasolini já se dera conta de como uma biopolítica calcada no solo capitalista poderia se converter da noite para o dia em uma tanato- ou necropolítica, não obstante ela própria se venda enquanto imagem total da liberdade ao proclamar que é proibido proibir. Por isso, depois da trilogia da vida e de Salò, o sexo só poderia ser experimentado na sua dimensão pornô, ou seja, espetacular, não vivida, representativa. De fato, Pasolini via a permissividade dos anos 1970, especialmente entre os jovens italianos – que, para ele, tinham se tornado monstros insensíveis graças à banalização e à mercadorização do sexo e dos corpos –, não enquanto uma experiência real, e sim enquanto um dispositivo do capitalismo que se traduzia na ideia autocontraditória de “liberdade obrigatória”, dado que, segundo explica: “as sociedades repressivas impedem tudo, e por isso tudo é possível. As sociedades permissivas permitem algo e só se pode fazer esse algo. O que é terrível”. [22]

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A pornografia – que tem origem etimológica no vocábulo grego que significa “prostituta” (πόρνη, porné) – hoje evoca uma vivência do sexo entendido enquanto algo quantificável, vendável e selecionável graças aos cada vez mais específicos menus dos canais pornôs de streaming. O problema, evidentemente, não é a transformação do corpo em produto ou em mercadoria, prática que já existe há muito tempo, ao menos desde o surgimento do capitalismo, e cuja denúncia soa moralista e carola, além de sem sentido diante da quotidiana e barata venda das almas de todos os empregados de bancos, seguradoras, escritórios de advocacia, serviços estatais etc. O verdadeiro problema é que a pornografia extrai de todos nós aquilo que Paul Preciado chama de potentia gaudendi, ou seja, a autêntica força da vida, da transformação e da alegria que existe em todo ser vivo. [23] Nesse processo extrativo se enfraquecem e se desmobilizam as virtualidades utópicas, revoltosas e destrutivas que jazem no fundo sem fundo do ser, que acaba então reduzido a rotineiras e programadas punhetas (ou siriricas, ou o que se quiser, tanto faz).

Pornografia é sempre espetáculo, e por isso exige alguém que veja, um sujeito passivo a quem se promete o prazer possível no mundo tecnocapitalista. A denúncia de Pasolini não se afasta dessa lógica, pois o sexo, tanto em Salò quanto em Porno-Teo-Kolossal, aparece em primeira mão como algo que precisa ser visto, e não experimentado sem mediações e com alegria, como ocorre na trilogia da vida. Claro, há corpos que se beijam, se penetram, se sugam – e se destroem – em Salò e, em menor medida e sem o elemento sádico, em Porno-Teo-Kolossal. Porém, os personagens principais – os quatro hierarcas fascistas de Salò e a dupla Rei Mago-criado em Porno-Teo-Kolossal – quase não praticam sexo, limitando-se na maior parte do tempo a observar, seja para se escandalizar e se compadecer em Porno-Teo-Kolossal, seja para extrair gozo, como nesse impressionante retrato da acumulação primitiva que é Salò.

Os excessos imagético-narrativos de Salò são, como o leitor perceberá, “coletivizados” em Porno-Teo-Kolossal, mas ainda aqui está em jogo a mesma denúncia, a mesma crítica feroz, dado que o sexo surge enquanto algo a ser observado, eventualmente comentado, mas jamais experimentado pelos protagonistas que caminham pelas cidades distópicas (ou utópicas) de Pasolini, conformando um elemento muito mais de afastamento do que de aproximação entre os seres humanos, tal como prova a rígida divisão de bairros entre homossexuais e heterossexuais na primeira cidade. A enterrar qualquer dúvida sobre o caráter crítico do roteiro, que reduz o sexo a imagem a ser experimentada na solidão masturbatória do mundo burguês, está o próprio título do filme, eis que se trata de um filme pornô, mas não de um pornô qualquer, e sim de um kolossal, palavra da Antiguidade que na Itália de então evocava algo como uma “superprodução cinematográfica”, tanto no que se refere aos meios técnicos quan to à quantidade de pessoas envolvidas, na tradição de Cabiria (1914) de Giovanni Pastrone.

Trata-se então de apresentar o sexo-imagem em um grande, enorme espetáculo, a exemplo do que faz a sociedade burguesa todo santo dia. Santo dia? Sim, pois aqui se abre a pequena porta pela qual o Messias pode passar e Pasolini introduz a sua angustiosa e potente teologia política. Em Porno-Teo-Kolossal não estamos diante de um simples espetáculo pornográfico; se assim fosse, o último roteiro de Pasolini em nada se diferenciaria da mundanidade burguesa. Ao contrário, trata-se de um espetáculo pornô sagrado, santo – e, para mim, teológico-político. Nem a pornografia é imune diante do sagrado, e ali onde está o que ameaça, está também o que salva.

Nessa perspectiva, seria interessante ler um breve texto de Giorgio Agamben, contido no magnífico Ideia da prosa, em que ele aproxima a revolução mundial comunista – que, como se sabe, nada mais é do que uma religião secular – à pornografia. [24] Mostrar o potencial de felicidade presente nas mais insignificantes situações cotidianas e em toda forma de sociabilidade humana é a eterna razão política da pornografia, afirma Agamben. Uma vez mais, o filósofo italiano assume aquela singular constatação benjaminiana segundo a qual é nas ideias mais ridicularizadas e desprezadas de uma época em que se pode encontrar o caminho da revolução, o que fica claro já na primeira linha do texto, quando ele diz que a utopia de uma sociedade sem classes se manifesta com exatidão na pornografia. Tal se dá, primeiro, graças ao exagero paródico que marca as diferenças entre as classes até em suas vestimentas – imaginemos, por exemplo, uma dona de casa e um eletricista em um filme pornográfico qualquer –, e depois em razão das relações sexuais que transfiguram tais diferenças, apontando para um mundo de felicidade sempre disponível, sempre à mão. É como se a pornografia envolvesse uma potência de encontro que, nada obstante, acaba sendo capturada pelos dispositivos farmacopornográficos teorizados por Paul B. Preciado. Com efeito, contra a dimensão “comum” da pornografia de Agamben se põe a óbvia constata ção segundo a qual, na atualidade, se desfruta dela a sós, em casa e da maneira mais anônima possível.

Todavia, limitar-se à dimensão privatista da pornografia, sem dúvida importante, seria desconsiderar que hoje, no mundo espetacular, importa mais o que é visto e não tanto quem vê, eis que o espectador foi reduzido a mera função da imagem, operação que, contudo, pode ser profanada e dirigida contra a máquina do espetáculo. As imagens pornográficas não cansam de nos prometer, repetidamente – e de tão repetidamente, diferencialmente – a felicidade fácil, sem esforço, infinita e indevida, traduzida no excesso e na materialidade evanescente de corpos perfeitos e sempre disponíveis. Mais do que a solidão de quem assiste, a pornografia em si mesma – gostemos ou não, se apresente ela de maneira tola, cruel ou até mesmo excitante – envolve a ideia de uma comunidade infinita de corpos desejantes que não podem ser simplesmente expostos na tela do computador ou da televisão, conformando, como nos mostra Pasolini nas suas cidades de Porno-Teo-Kolossal, uma política. Assim como a teologia, a pornografia é imediatamente política. Dessa feita, o grande pecado que autores como Pasolini cometem contra os dogmas teológico-políticos do mundo espetacular consiste em evidenciar as virtualidades comunais de um produto quase perfeito para os padrões capitalistas, dado que, em seu funcionamento individualista, isolacionista e culpabilizador, a pornografia não produziria comunidade. Nada obstante, todo gesto realmente pornográfico envolve uma necessária superação do indivíduo neoliberal por meio da dissolução do cotidiano sub-iectum nas malhas do comum, do gozo e da felicidade para o qual a pornografia, com todas as suas contradições, aponta.

É essa camada comum e não comercializável da pornografia que Pasolini nos mostra, ciente de que, tendo sido transformada em mercadoria – e isso já nos anos 1970 –, a pornografia passou a integrar os circuitos do capital, tornando-se um produto a mais no mercado, com o que o seu potencial de choque e de escândalo entrou em decadência. Com efeito, nenhum negócio pode ser genuinamente chocante, pois todo negócio deve respeitar regras previsíveis e padrões rígidos, tal como a pornografia que, torna da mercadoria, desenvolveu uma série de cânones formais para melhor se adaptar à suposta diversidade de seus consumidores. Diante desse cenário, Pasolini acerta ao ligar a pornografia à teologia, já que o sacro é o terreno do escândalo perene, em especial o cristianismo arcaico, místico e camponês professado pelo diretor italiano, para quem “Deus é o escândalo. Cristo, se voltasse, seria o escândalo: foi em seus tempos e o seria hoje”. [25] Dessa maneira, em uma época na qual o pornô deixou de ser escandaloso – e, portanto, político –, para torná-lo escandaloso de novo é preciso religá-lo ao sagrado, o que o cineasta faz 1) de modo indireto, mas terrível, nas últimas cenas de Salò, quando a tortura e o extermínio dos corpos é acompanhada pela música de um trecho de Veris laeta facies (“A alegre face da Primavera”), terceira parte do Carmina Burana, cantata profana de Carl Orff que, para muitos, soa como uma cantata religiosa. Na verdade, a obra de Orff tem por base poemas obscenos de monges itinerantes – os goliardos – dos séculos XII e XIII, que os cantavam de taberna em taberna na Idade Média, o que não deixa de ser significativo, tendo em vista o contexto de indiscernibilidade entre o sacro e o profano-sexual que evocam; 2) de maneira direta e, em certo sentido, quase lírica, no roteiro de Porno-Teo-Kolossal que logo leremos, no qual o sexo passa a ser o eixo político das cidades que preparam – e impedem – o acesso ao Messias.

O sagrado em Pasolini se traduz na incapacidade de ver o natural na natureza, de modo que aquilo que parece normal aos outros, surge para o escritor italiano revestido por uma luz especial, determinando assim seu estilo e sua técnica. [26] O sagrado serviria então para reencantar e fazer de novo visível o mundo tornado banal e medíocre pelo novo fascismo hedonista e consumista. Nesse sentido, a missão do intelectual encarnado por Pasolini consiste em, ao não aceitar a suposta naturalidade e imodificabilidade do mundo, escandalizar seus habitantes e negar o conformismo ao provar na própria carne a experiência de outros mundos possíveis, [27] desenvolvendo uma forma-de-vida muito próxima daquela dos cínicos gregos aludida por Michel Foucault em seu último curso no Collège de France significativamente intitulado A coragem da verdade.

Por fim, pode-se sustentar que Porno-Teo-Kolossal compõe um sistema junto com Salò, representando uma espécie de inversão cômica deste último. Aqui caberia perguntar o que, de fato, é uma comédia, em especial na tradição italiana, que nasce de um livro que, apesar de ter essa palavra no título, não é nada engraçado, e sim sublime e atroz. Em um denso artigo dedicado a compreender o significado da Commedia de Dante, Agamben afirma que o cômico, diferentemente do trágico, corresponde a certa dimensão em que vigora uma impossibilidade de culpabilizar, na qual pervive, portanto, a sagrada inocência impessoal e arcaica da criatura humana, [28] o que ainda persiste, de maneira arqueológica, em alguns filmes mudos do início do século passado, que não por acaso são citados à exaustão em Porno-Teo-Kolossal, comparecendo Buster Keaton como anjo tutelar da obra. Na comédia, assim como na pornografia enquanto “comunismo” aludida por Agamben, não há culpa, e é por isso que ambas são ao mesmo tempo tão popularizadas e tão falseadas em nossa época, que ao lhes conectar o operador universal da culpa, tenta moralizá-las, transformando-as em dispositivos jurídicos, econômicos e capitalistas. Ao contrário, a verdadeira comédia instaura um alegre reino do impessoal em que não existe culpa imputável à persona do direito, tratando-se de um reino em que personagens como Epifânio e Núncio aparecem não enquanto pessoas culpáveis e fixas, mas como arquétipos ex-culpados, à semelhança das crianças e dos animais. [29] Por isso eles estão sempre mudando de papel – de velho senhor napolitano a rei mago, de criado a… não posso dizer, seria um spoiler – e de nome, chegando Pasolini a amalgamá-los no roteiro com os atores – Eduardo De Filippo e Ninetto Davoli – que os interpretariam.

A comédia, é claro, também aparece no roteiro de Porno-Teo-Kolossal sob suas formas mais convencionais, tais como a paródia e o exagero. Pasolini acentua o caráter hedonista da Roma dos anos 1950 para caracterizar a sua Sodoma, em uma espécie de maximização e extrapolação do clima libertino e irresponsável imortalizado por Fellini em La dolce vita. De maneira semelhante, a atmosfera pesada e triste da Milão dos anos 1970 – a viagem da dupla não é apenas no espaço, mas fundamentalmente no tempo, até o fim dos tempos –, com seus atentados e massacres, é evocada já no início da seção dedicada a Gomorra. A completar o afresco, lá está Nápoles – que, sendo tão original e inimitável, não recebe nenhum outro nome – simbolizando um inocente e barulhento paraíso plebeu, bem como a elegante, culta e surrealista Paris – chamada de Numância – mergulhada em seu amor por si mesma, que, como veremos, será levado ao grau mais extremo.

Um detalhe que não pode passar despercebido são as falas dos personagens, em especial os de Nápoles, que evocam esse delicioso bilinguismo italiano, no qual o dialeto comparece como a verdadeira língua, aquela com a qual, já notara Dante em De vulgari eloquentia, se dá, adamicamente, nomes às coisas, sendo muito mais importante para os italianos de antanho do que a massa linguística chamada de “italiano standard” imposta pelo Estado fascista e depois, no decorrer dos anos 1950 e 1960, tornada dominante pela televisão. Ademais, o roteiro de Pasolini está coalhado de reiterações, ambiguidades, uso inadequado de sinais de pontuação e diminutivos exagerados que, obviamente, não me caberia corrigir, de maneira que tentei reproduzir tudo isso em português, eis que não se trata aqui de um texto literário em sentido estrito, mas de um roteiro que foi ditado oralmente por Pasolini ao gravador, algo que ele nunca tinha feito antes. Assim, temos em mãos um texto que, transpirando vida e movimento, serviria para a realização de uma ambiciosa obra cinematográfica que, lamentavelmente, só assistiremos na tela de nossas mentes. [30]


NOTAS

[1] Doutor em Direito e Justiça pela Universidade Federal de Minas Gerais e Doutor em Filosofia pela Universidade de Coimbra. Atua como Professor Associado de Filosofia do Di reito e disciplinas afins na Faculdade de Direito da UFMG e é membro do Corpo Permanente do Programa de Pós-Gradua ção em Direito da mesma instituição. Foi professor visitante na Universidade de Barcelona (2015-2016) e na Universidade de Córdoba (2020-2021), bem como professor residente no Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares da UFMG (2017-2018). Convidado como palestrante por diversas uni versidades estrangeiras, tais como a Universidade de Barce lona, a Universidade de Girona e a Universidade de Buenos Aires. Bolsista de Produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). E-mail: [email protected] Instagram: poesiandityas

[2] Nota do Tradutor: O roteiro de Porno-Teo-Kolossal foi publicado pela primeira vez em 1989 na revista CineCritica. Utilizei para a tradução a versão definitiva, reeditada no segundo tomo de Per il cinema.

[3] PASOLINI, Sade 1944, p. 292.

[4] PASOLINI, Cine y literatura, p. 311.

[5] MENDIGUCHÍA, Salo, Sade y el siglo de las sombras, p. 58.

[6] Pasolini diz em uma entrevista que o filme sadiano “substi tuiu” aquele sobre São Paulo. Cf. PASOLINI, Salò: un nuevo director, p. 278.

[7] MENDIGUCHÍA, Salo, Sade y el siglo de las sombras, p. 61.

[8] PASOLINI, Salo/Sade, p. 270.

[9] BERARDI, Geronto-fascismo.

[10] BARTHES, Sade, Fourier, Loyola.

[11] Discuto a ideia de an-arquia no meu livro A an-arquia que vem, lançado pela sobinfluencia em 2022.

[12] PASOLINI, El sexo como metafora del poder, p. 275.

[13] PASOLINI, Salò: un nuevo director, p. 281.

[14] PASOLINI, Salo/Sade, p. 269.

[15] PASOLINI, Salò: un nuevo director, p. 282.

[16] PASOLINI, Salò: un nuevo director, p. 287.

[17] PASOLINI, El poder y la muerte, p. 296.

[18] Para uma impressionante genealogia da ideia de extermínio, estreitamente ligada às práticas coloniais, cf. LINDQVIST, Exterminem todos os malditos.

[19] FOUCAULT, La volonte de savoir.

[20] Parágrafos 1 e 2 de DEBORD, La société du spectacle.

[21] PASOLINI, Abiura dalla trilogia della vita.

[22] PASOLINI, Salò: un nuevo director, p. 284. Em outra entrevis ta, Pasolini explica sua posição – que para muitos parecia ser puritana e conservadora – com mais detalhes: “Penso que durante a chamada era repressiva o sexo era um prazer porque acontecia às escondidas e era uma burla de todas as obrigações e deveres que o poder repressivo impunha. Contudo, nas sociedades tolerantes, como se declara a nossa, a sociedade em que vivemos, o sexo é simplesmente neurotizante porque a liberdade concedida  é falsa e, sobretudo, nos é concedida a partir de cima e não con quistada a partir de baixo. Portanto, não se trata de viver uma liberdade sexual, mas de se adequar a uma liberdade que nos é concedida” (PASOLINI, El poder y la muerte, p. 296).

[23] PRECIADO, Testo junkie.

[24] AGAMBEN, Idea del comunismo.

[25] Apud NALDINI, Pier Paolo Pasolini, p. 296.

[26] Apud NALDINI, Pier Paolo Pasolini, p. 308.

[27] MARESCA, Una visita al mundo, p. 46.

[28] AGAMBEN, Comedìa.

[29] Nas suas Lições sobre a filosofia da história, Hegel afirma que “só a criança e o animal são inocentes (unschuldig); o homem deve ter culpa (muss Schuld haben)”.

[30] Como não poderia ser diferente, houve algumas tentativas de trazer algo de Porno-Teo-Kolossal para a realidade cinematográfica. Em 1996, Sergio Citti fez o filme I magi randagi (Os magos vagabundos) com os atores Franco Citti, Silvio Orlando e Ninetto Davoli. A trama gira em torno de um grupo de atores de teatro filosófico que representam cenas do nascimento de Jesus. Contudo, incompreendidos pelas pessoas, são forçados a empreender longas viagens como nômades. Em 2014, Abel Ferrara filmou Pasolini, incluindo no filme algumas sequências de Porno-Teo-Kolossal com Ninetto Davoli no papel pensado para Eduardo De Filippo e Riccardo Scamarcio no papel que seria originalmente de Ninetto Davoli.


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