Breve história do jornalismo “antiSUS”
Da fundação do SUS à atualidade, o jornalismo pautado por e para a burguesia disputa o projeto de saúde nacional
Publicado 17/12/2025 às 15:10 - Atualizado 17/12/2025 às 15:11

No seminário que divulgou o projeto Trajetória da Saúde em SP, realizado no dia 12/12 na Faculdade de Saúde Pública da USP, o jornalista e cientista social Claudio Bertolli Filho apresentou o trabalho “Quando a saúde pública virou sinônimo de crise: o SUS nas páginas da Folha (1983-1994)”.
Seu levantamento historiográfico confirmou, por meio de um objeto de estudo específico, aquilo que se observa cotidianamente nos meios de comunicação de massa: um discurso inflexível de ataque ao público em favor da promoção do setor privado comercial.
O trabalho de Bertolli analisou 7.756 textos publicados no período – seja editorial, coluna de opinião ou reportagem – e não deixam margem para dúvidas: absolutamente todos eles abordam o SUS negativamente.
Ao apresentar o trabalho, na mesa dedicada à mídia, Bertolli, que foi repórter da Folha, contextualizou: “o jornal sempre foi dedicado às classes A e B. E sempre teve o setor privado de saúde como importante anunciante. A mensagem do jornal era dedicada a um público que raramente usaria a estrutura de atendimento do SUS”.
O recorte temporal inclui o período anterior à instituição do SUS, quando o INAMPS organizava o sistema público e seu atendimento não era universal. No entanto, a linha editorial dialogou com os objetivos da reforma neoliberal do Estado, iniciada nos anos 1980 nos países centrais do capitalismo e importada pelo Brasil, em seu processo de redemocratização.
“Houve só uma matéria, publicada em caderno específico que circulou em São José dos Campos e Ribeirão Preto, em algum momento da década de 1990, em que se entrevistou um gestor do SUS que explicou como o sistema era fundamental na assistência médica. Mas, no geral, vendeu-se a noção de que se você fosse a um hospital público era mais fácil sair morto do que bem atendido”, explicou Bertolli, autor de livro sobre a epidemia de gripe espanhola em São Paulo, em 1918.
Gabriel Brito, repórter deste boletim, também esteve presente na mesa dedicada à mídia, e fez uma breve exposição sobre os olhares atuais do jornalismo em relação ao SUS. Em linhas gerais, a abordagem “antiSUS” foi substituída, em tempos recentes, por um discurso mais fraterno, em que o setor privado é apresentado como um “parceiro”.
Trata-se da ideia de que a saúde suplementar representaria um desafogo ao sistema público, desmentida por pesquisadores e sanitaristas em geral. A mudança editorial se afirmou após a pandemia, quando o SUS se evidenciou como fundamental para a maioria da população. Por trás de tudo, o objetivo é disputar o orçamento da saúde “por dentro”, através de mecanismos de privatização dos equipamentos e serviços públicos.
Por fim, Sérgio Gomes da Silva, veterano jornalista com longa trajetória no campo da saúde, defendeu a criação de mecanismos de comunicação dentro dos próprios estabelecimentos de saúde, como unidades básicas.
Tal ideia não só atualiza a noção de transparência e participação social no SUS como também serviria para amplificar o contato entre o sistema e a população, num contexto em que praticamente qualquer pessoa dispõe de condições técnicas de fazer mídia e influenciar a sociedade.
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