A falácia da “reestruturação” da pesquisa em SP
Tarcísio quer “instituir” e “modernizar” a carreira de pesquisador científico no estado de São Paulo, mas PL apresentado pode enfraquecer a ciência e desincentivar permanência na carreira
Publicado 16/05/2025 às 14:19
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, enviou à Assembleia Legislativa um projeto de lei que prevê reestruturar — ou, em seus termos, “instituir e modernizar” — a carreira de pesquisador científico no estado. Na prática, ele se aplica aos cientistas no âmbito das secratarias do Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, Agricultura e Abastecimento e Saúde.
Em resposta, a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) desmonta seus principais argumentos, a começar da suposta criação de uma carreira que existe desde o século XIX.
Mas essa não é a parte mais preocupante. O que se argumenta é que o PL busca alterar características do regime de trabalho e remuneratório do pesquisador de forma que, na prática, pode acabar por enfraquecer a ciência paulista e desincentivar a permanência na carreira tanto aos veteranos quanto aos ingressantes.
O PL altera o regime em tempo integral por jornada fixa de 40 horas semanais — o que permitiria aos pesquisadores terem mais de um emprego. Mas, segundo a presidente da APqC, Helena Dutra Lutgens, esse tipo de trabalho tem natureza fixa e contínua, e “não pode ficar atrelada ao horário oficial de expediente”. Isso também afeta a remuneração dos cientistas, o que cria um temor de que haja menos previsibilidade de ganhos ao longo da sua carreira.
Essa mudança, junto com a reestruturação em níveis funcionais, gera consequências a longo prazo, segundo ela, por desincentivar tanto os pesquisadores mais experientes, que teriam mais benefício em se aposentar mais cedo, quanto os em início de carreira — que se deparariam com um longo período até alçar patamares mais altos.
Há um outro elemento perverso no projeto de lei apresentado por Tarcísio: a venda de áreas experimentais do estado, como as fazendas na área de arquitetura, utilizadas para realizar pesquisas e armazenar patrimônio científico do estado.
Entre suas críticas, Helena frisa a falta completa de diálogo com a comunidade científica. A APqC lançou um abaixo assinado que já conta com mais de 10 mil assinaturas. Em suas palavras, “O avanço científico e tecnológico de São Paulo, nas fundamentais áreas de saúde, meio ambiente e agricultura, tem como base os Institutos Públicos de Pesquisa e seus laboratórios vivos contidos nas áreas experimentais distribuídas por todo o estado de São Paulo e que hoje são vistas com um olhar financista que desconsidera os imprescindíveis serviços prestados na geração de conhecimento para atender às diversas demandas sociais”.
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