Setor elétrico, uma falsa “reforma”

Proposta do governo fala em “liberdade de escolha”, mas mantém a privatização do sistema e a falsa opção pelas fontes “renováveis”

Clarice Ferraz, entrevistada por Antonio Martins e Glauco Faria

O sistema elétrico brasileiro, privatizado e fragmentado, é apresentado como “limpo” devido à predominância de hidrelétricas, mas essa narrativa esconde problemas estruturais graves. Segundo Clarice Ferraz, professora da UFRJ e diretora do Instituto Ilumina, a matriz energética brasileira, embora majoritariamente renovável, opera de forma ineficiente e caótica, com falhas de planejamento e coordenação. A falsa “limpeza” ignora a dependência de termelétricas em períodos de seca — caras e poluentes — e os impactos socioambientais de grandes barragens. Além disso, a privatização exacerbou a desorganização: a entrada desregulada de fontes intermitentes (eólica e solar) sem a infraestrutura adequada para integrá-las ao sistema ameaça a segurança energética. A entrevistada critica a falta de um projeto nacional que otimize os recursos hídricos, dos quais o Brasil é farto, em favor de soluções improvisadas que beneficiam agentes privados em detrimento do interesse público.

Um dos pontos centrais da análise é a crítica à financeirização do setor, disfarçada sob o discurso de “liberdade de escolha” do consumidor. Clarice explica que a abertura do mercado livre não reduzirá tarifas, mas introduzirá intermediários (comercializadores) que aumentarão custos e complexidade. A assimetria de informação deixará consumidores vulneráveis — especialmente os de baixa renda — expostos a contratos abusivos e volatilidade de preços. Ela destaca que a medida provisória do governo, ao eliminar o papel planejador das distribuidoras, agrava a descoordenação: “Estamos ficando soltos num mundo cada vez mais imprevisível”. O exemplo europeu é citado como alerta: a liberalização levou a crises tarifárias e apagões, com os mais pobres arcando com as consequências.

Para reverter esse cenário, Clarice defende a reativação do planejamento estatal e o controle público sobre ativos estratégicos, como as hidrelétricas. A privatização da Eletrobras é apontada como um erro grave, pois transferiu a gestão de reservatórios — essenciais para a estabilidade do sistema — a agentes privados com interesses financeiros, não técnicos. Ela propõe um modelo que combine fontes renováveis com uma base hidrelétrica robusta, coordenada por um Estado forte, capaz de garantir tarifas justas e segurança energética. “Precisamos olhar para o todo, não para os interesses individuais”, afirma, destacando que a atual crise é resultado de décadas de desmonte e falta de visão estratégica.

Por fim, a entrevistada relaciona a degradação do setor elétrico a um projeto político mais amplo de enfraquecimento do Estado. A saída, segundo ela, passa pela mobilização social e pelo fortalecimento de instituições como o Instituto Ilumina, que resistem à invisibilização desses debates. “Energia é um direito, não mercadoria”, conclui, alertando para os riscos de soluções paliativas, como tarifas sociais temporárias, que não enfrentam as raízes do problema: a falta de soberania sobre um setor vital para o desenvolvimento e a justiça social no Brasil.

(Apresentação redigida por inteligência artificial)

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