Um manifesto em defesa do cooperativismo digital

Autogestão. Democracia no ambiente de trabalho. Tecnologias livres. Dados para Comum. Carta de movimentos sociais e pesquisadores propõe usar potencialidades digitais para o desenvolvimento local e novo horizonte de trabalho decente

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Os desafios para o presente e o futuro do trabalho – tendo no centro trabalhadoras e trabalhadores – são imensos. A dominância da plataformização do trabalho nos últimos anos exige respostas imediatas em termos de políticas públicas para enfrentamento ao cenário apresentado.

A partir de um seminário sobre cooperativismo de plataforma e políticas públicas realizado em junho em Porto Alegre, movimentos sociais, cooperativas e pesquisadores construíram coletivamente uma carta com um plano de ação para o cooperativismo de plataforma no Brasil. Isso prevê a construção de um ecossistema articulado de trabalho, tecnologias e desenvolvimento local.

A carta será enviada a candidatos ao Executivo e ao Legislativo e soma-se a outros importantes esforços, como o programa de emergência para a soberania digital. Leia o documento, que está aberto para novas assinaturas aqui (envie nome e instituição). [Rafael Grohmann]

PLANO DE AÇÃO PARA COOPERATIVISMO DE PLATAFORMA NO BRASIL

No Brasil, atualmente, há cerca de 1,5 milhão de entregadores e motoristas (dados do IPEA) atuando por plataformas. Além deles, outros setores — do trabalho doméstico ao design — têm sido afetados recentemente pelo fenômeno do trabalho por plataformas. Pesquisas realizadas no Brasil indicam que as principais plataformas não cumprem parâmetros mínimos para a oferta de trabalho decente (dados do relatório Fairwork), tornando fundamental a elaboração de políticas públicas que garantam dignidade a trabalhadoras e trabalhadores. Para isso, são necessárias ações efetivas para este cenário.

A necessária regulação do trabalho por plataformas, acompanhada de proteções trabalhistas, é um desafio urgente, e precisa estar articulada a políticas públicas de fomento ao cooperativismo de plataforma. Em linhas gerais, o cooperativismo de plataforma articula a potencialidade de tecnologias digitais a favor de lógicas cooperativistas, comunitárias e de economia solidária.

Este manifesto nasceu do seminário Cooperativismo de Plataforma e Políticas Públicas, realizado em Porto Alegre em junho de 2022, foi ampliado para mais instituições interessadas, e delineia princípios e políticas públicas para o cooperativismo de plataforma no Brasil.

Princípios do Cooperativismo de Plataforma

  • Situado no marco e nas experiências de economia solidária;
  • Autogestão e democracia no ambiente de trabalho;
  • Articulação com movimentos mais amplos por soberania digital e autonomia tecnológica;
  • Aproveitamento de redes pré-existentes;
  • Promoção de trabalho decente;
  • Garantia de direitos, com o combate a falsas cooperativas;
  • Utilização de tecnologias livres e articulação com movimentos deste setor;
  • Promoção de dados para o bem comum;
  • Propriedade de dados e infraestruturas – e não somente de softwares dos aplicativos;
  • Articulação de diferentes setores – por exemplo, transporte, alimentação, educação e tecnologias – incentivando a intercooperação como vetor da escala na economia de plataformas;
  • Combates a desigualdades – gênero, raça, sexualidade, entre outros – na organização do trabalho e na construção das tecnologias;
  • Articulação com organizações de trabalhadores;
  • Incentivo a circuitos locais de produção e consumo e da economia circular.

Estes princípios são centrais para a construção de políticas públicas para o cooperativismo de plataforma situado nos marcos da economia solidária e das políticas por soberania digital, entendendo estratégica e politicamente o papel das tecnologias para o desenvolvimento nacional.

Políticas Públicas para o Cooperativismo de Plataforma

Situadas como parte de políticas de:

  • Trabalho por plataformas e sua regulação;
  • Soberania digital e autonomia tecnológica;
  • Desenvolvimento regional;
  • Ciência, tecnologia e inovação;
  • Cidades;
  • Economia solidária;
  • Inclusão digital.

Estas políticas devem ser articuladas entre os entes federativos (governos federal, estaduais e municipais).

Linhas para Políticas Públicas

  • Estado como catalisador de relações de trabalho mais dignas e inclusivas a partir do cooperativismo de plataforma no marco da economia solidária, fomentando iniciativas “de baixo para cima”;
  • Desenvolvimento de uma política nacional para o cooperativismo de plataforma, incluindo fomento a projetos locais, regionais e nacionais em diversos setores;
  • Promoção de uma nova regulamentação do cooperativismo, que fomente a construção de um forte ecossistema de cooperativismo de plataforma no país, com subsídios para aquelas iniciativas que promovam impacto ambiental e social positivo ;
  • Identificação de redes preexistentes e necessidades antes de definir soluções;
  • Promoção de linhas de fomento ao cooperativismo de plataforma, incentivando parcerias entre universidades e trabalhadores a partir de chamadas públicas – com incubação e aceleração de plataformas cooperativas, com ênfase em soluções tecnológicas livres direcionadas a esses projetos.
  • Articulação de políticas entre desenvolvimento regional, políticas digitais, trabalho e economia solidária para o desenvolvimento do cooperativismo de plataforma;
  • Programas de formação em relação ao cooperativismo de plataforma nas diversas regiões do país, com compartilhamento de recursos e ferramentas;
  • Políticas para o desenvolvimento de plataformas cooperativas baseadas em tecnologias livres de modo a favorecer a auto-organização de trabalhadoras e trabalhadores;
  • Políticas de articulação entre redes comunitárias e plataformas cooperativas;
  • Políticas para a regulação do trabalho por plataformas tendo por premissas a garantia ampla de direitos trabalhistas e o fomento a plataformas cooperativas.

Assinam:

Rafael Grohmann – DigiLabour

Aline Os – Coletivo Señoritas Courier

Leonardo Pinho – Presidente da Central de Cooperativas Unisol Brasil e Diretor Financeiro da Unicopas

Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores Sem-Teto (MTST Brasil)

Ismael José Cesar – Secretário de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT

Ricardo Neder – ITCP TECSOL UnB

Juliane Furno – Doutora em Economia pela Unicamp

Clemente Ganz Lúcio – Assessor das Centrais Sindicais

Gregorio Duvivier – Ator, humorista, roteirista e escritor

Daniel Santini – Fundação Rosa Luxemburgo

Jonas Valente – Oxford Internet Institute/ Fairwork

Ruy Braga – USP

Abimael Angoleri – Giro Sustentável

Vanderley Ziger – Presidente da União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária – UNICAFES

Marilia Veronese – EcoSol/ Unisinos

Leonardo Foletto – FGV ECMI / BaixaCultura

Sylvia Urquieta – COOPRODADOS – Cooperativa de Trabalho dos Profissionais de Privacidade e Proteção de Dados

Rafael Zanatta, Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa

Renato Roseno – Deputado Estadual PSOL Ceará – Presidente da Comissão de Direitos Humanos da ALECE

Julice Salvagni – UFRGS

Adriana Micheletto Brandão – Ministério do Desenvolvimento Regional

Sergio Amadeu – UFABC

Alexandre Costa Barbosa – CGI.br

Roseli Figaro – USP

Ramiro Castro – Advogado trabalhista

Helena Martins – UFC

Miguel Said Vieira – UFABC

Eduardo Brasileiro – Secretariado Geral – Articulação Brasileira pela Economia de Francisco e Clara

Cesar Coelho – Núcleo de Tecnologia do MTST

Ricardo Festi – UnB

Dayvid Souza Santos – UFBA

Edemilson Paraná – UFC

Valmor Schiochet – Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares/Universidade Regional de Blumenau (ITCP/FURB)

Rafael Evangelista – Unicamp/ CGI

Cesar Bolaño – UFS

Vitoria Cruz – Núcleo de Tecnologia do MTST

Daniel Silva – Núcleo de Tecnologia do MTST

Marcelo Alvim – Núcleo de Tecnologia do MTST

Victor Antunes – Núcleo de Tecnologia do MTST

Diego Magdaleno – Núcleo de Tecnologia do MTST

Renato Ramos – Núcleo de Tecnologia do MTST

Gabriel Simeone – Núcleo de Tecnologia do MTST

Alexandre Boava – Núcleo de Tecnologia do MTST

Felipe Magalhães Bonel – Núcleo de Tecnologia do MTST

Leonardo Sierra Monteiro – Núcleo de Tecnologia do MTST

Paulo Marcelo Nogueira – Núcleo de Tecnologia do MTST

Willian Pacheco – Núcleo de Tecnologia do MTST

Kaio Duarte Costa – Núcleo de Tecnologia do MTST

Bruno Stephan – Núcleo de Tecnologia do MTST

Nelly Jaqueline Fuentes Illanes – Núcleo de Tecnologia do MTST

João Vitor Troyano – Núcleo de Tecnologia do MTST

Rafael Leonel Braga – Núcleo de Tecnologia do MTST

André Santos – Núcleo de Tecnologia do MTST

Fabio dos Santos Neves – Núcleo de Tecnologia do MTST

Rodrigo Moreno Marques – UFMG

Robson de Souza Raimundo – Cooperativa de Trabalho dos Motofretistas do Estado de São Paulo Cooper Hood

André Lemos – UFBA

Natxo Devicente – Fundação MUNDUKIDE

Fabio Malini – UFES

Afonso de Albuquerque – UFF

Vanessa Costa – Doutoranda em Políticas Públicas e Formação Humana – PPFH/UERJ Pesquisadora Instituto Lula (Dez/21 à Jun/22) – Cooperativismo de Plataforma

Centro de Pesquisa em Comunicação e Trabalho – USP

Raquel Recuero – UFPel/ UFRGS

Lorena Vilarins – UnB

Claudia Nociolini Rebechi – UTFPR

João Cassino – Setorial de Ciência e Tecnologia / TI do PT-SP

Jess Reia – University of Virginia

Mariana Valente – University of Saint Gallen

Reinaldo Pacheco da Costa-Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da USP ( ITCP-USP)

Julian Posada – Yale University

Cibele Camachi – SESC-SP

UNICAFES-RS (União das cooperativas da agricultura familiar e economia solidária do Rio Grande do Sul)

Nelsa Fabian Nespolo ,- diretora presidente da Unisol RS e secretaria geral da Unisol Brasil

Rodrigo Fellipe dos Santos – Associação União Maior Motoboys (AUMM) – Blumenau/SC

Inessa Salomão – Incubadora Tecnológica de Empreendimentos Solidários Sustentáveis – ITESS/CEFET-RJ

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