Big Techs: O necessário contra-ataque da sociedade

Mudanças na Meta, que eliminou a checagem, dão mais poder à ultradireita, é claro. Campo progressista, porém, assiste passivamente às fábricas de fake news das corporações. Mobilizar a sociedade e criar mecanismos de respostas rápidas ao ataques são cruciais

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Imagine que um campeonato de futebol decide acabar com a arbitragem e deixar que os próprios jogadores decidam se houve falta ou não. Quem garantiria que o jogo seria justo? Que os times mais organizados e violentos não tomariam conta da partida? Essa é a situação que a Meta, dona do Facebook, Instagram e Threads, está criando ao acabar com a verificação de fatos e substituí-la por um sistema de “Notas da Comunidade”. Agora, qualquer grupo pode decidir o que é verdade ou mentira, transformando a plataforma num campo aberto para manipulação e desinformação.

Antes, a Meta contava com agências especializadas para verificar informações e sinalizar conteúdos enganosos. Agora, isso será decidido por enquetes entre usuários. Mas a internet não é um espaço neutro. Quem impede que grupos organizados manipulem votos para espalhar fake news e deslegitimar informações corretas?

Ao entregar o controle da moderação de conteúdo para usuários anônimos, a Meta cria um ambiente propício para a manipulação da verdade. Sabemos que grupos organizados podem facilmente mobilizar um grande número de pessoas para influenciar enquetes e marcar como falsas informações que não lhes convêm, enquanto impulsionam narrativas enganosas que atendam a seus interesses. Aliás, quem nunca viu uma hashtag subir depois de uma mobilização digital bem feita? A desinformação, antes combatida por verificadores independentes e especialistas, agora se torna uma questão de popularidade: se um grupo grande o suficiente decide que uma mentira deve ser vista como verdade, nada impedirá que essa narrativa seja promovida amplamente na plataforma.

Além disso, essa mudança cria um incentivo perverso para que usuários com interesses obscuros formem redes de influência dentro da plataforma. Contas automatizadas, conhecidas como bots, e grupos fechados podem se coordenar para impulsionar determinadas narrativas, deixando o usuário comum em uma posição vulnerável, sem ferramentas eficazes para diferenciar o que é informação verificada do que é manipulação. Isso não apenas enfraquece a confiança no ambiente digital, mas também coloca em risco a própria noção de realidade compartilhada dentro da sociedade.

No fim das contas, essa mudança da Meta pode acabar institucionalizando o caos informacional. A ideia de que a verdade pode ser decidida por votação entre usuários é perigosa, pois desconsidera a importância de critérios técnicos e científicos na validação de informações. Isso pode ter impactos diretos em diversas áreas, desde a política até a saúde pública, tornando a desinformação ainda mais difícil de combater e criando um cenário de desordem informacional que favorece quem tem mais dinheiro e influência.

Se voltarmos ao futebol, o que acontece quando um time percebe que pode trapacear sem consequências? Ele se organiza, treina estratégias para manipular o jogo e aproveita ao máximo a ausência de regras claras. Agora imagine que o outro time, ao perceber essa situação, decide não reagir e continuar no mesmo ritmo. O resultado é previsível: uma vitória fácil para quem soube aproveitar as falhas do sistema. A lição aqui é clara: se o campo democrático não se organizar, as regras do jogo serão definidas por quem quer deturpar a realidade. O Brasil precisa reagir. Em vez de assistir passivamente, devemos fortalecer nossas leis para que as plataformas sejam responsabilizadas.

A mobilização digital, portanto, nunca foi tão importante. Se a desinformação e a manipulação das plataformas são estruturadas de maneira coordenada por grupos antidemocráticos, cabe aos setores comprometidos com a realidade fortalecer suas redes de enfrentamento. Isso significa investir em campanhas de conscientização, criar mecanismos de resposta rápida e desenvolver iniciativas para combater o avanço da desinformação. A internet pode ser um espaço de disputa, mas também é um espaço de resistência, onde especialistas e comunicadores comprometidos com a democracia podem atuar para garantir que a verdade não seja sufocada por algoritmos enviesados.

Mais do que nunca, precisamos contar com especialistas e ativistas do campo democrático para reagir e denunciar diante das tentativas de manipulação da informação. O jogo ainda não acabou, e a sociedade precisa entrar em campo. Permitir que empresas privadas decidam sozinhas como a informação circula é um risco para a democracia. Se não agirmos agora, em breve não será a verdade que vencerá, mas sim quem tiver mais dinheiro e poder para manipular o debate. A verdade não pode ser decidida por uma enquete, e cabe a nós garantir que a disputa democrática exista nas próximas partidas.

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