Cartas da Guanabara: Abram alas
“Ele desce antes dos outros passageiros? E toda vez a gente tem que parar para que ele passe”? “Ué, não tem sido assim há mais de 50 anos?”
Publicado 23/03/2016 às 17:26 - Atualizado 15/01/2019 às 17:36
Por Daniel Cariello
O ônibus lotado que levava os passageiros do avião até o terminal do Santos Dumont deu uma parada para deixar passar um carrão de filme, escoltado por duas viaturas policiais. Encucado, perguntei ao condutor.
– Quem vai ali? A presidente?
– Enta.
– O quê?
– É presidenta, o certo.
– Que seja. É a presidenta ali, seu motoristo?
– Não, é o rei.
– Rei de onde?
– Daqui mesmo. É o nosso Rei Roberto Carlos.
– Ele desce antes dos outros passageiros?
– Você tá brincando, né? Ele não pega vôo comercial. O cara tem o próprio avião particular, aquele ali, ó.
– Gente coisa é outra fina…
– E quando ele vai viajar, o motorista pára o carrão ali na entrada da pista e a escolta logo chega para acompanhá-lo até o jatinho.
– E toda vez a gente tem que parar para que ele passe?
– Ué, não tem sido assim há mais de 50 anos?
Concordei com o raciocínio, tem mesmo sido assim há muito tempo, minha avó já parava para olhar quando o cantor aparecia na TV em preto e branco, e alardeava um suposto e distante parentesco: “Ele é de Cachoeiro de Itapemirim, cidade vizinha à minha Castelo.” Mas desconcordei do fato de sermos obrigados a aguardar a travessia real para seguirmos adiante.
– Ainda mais levando em consideração a produção musical dele dos últimos 30 anos, uma verdadeira tristeza.
Mas o chofer nem ouviu, estava entretido assoviando Detalhes, no que o acompanhei quando chegou o refrão.