[Podcast] Reconhecimento facial, a nova ameaça

Encontrar um indivíduo numa multidão. Levantar seu passado, em segundos. Rastrear seus passos. A tecnologia que pode liquidar a privacidade e criar Estados policiais superpoderosos. A resistência cresce nas sociedades. Poderemos frear o abuso?

Rafael Zanatta em entrevista a Gabriela Leite, para o podcast Tibungo

Chamou a atenção de especialistas em tecnologia, nas últimas semanas, uma reportagem do jornal norte-americano The New York Times que revelava como uma pequena empresa estava vendendo para polícias estaduais dos EUA uma tecnologia de reconhecimento facial baseada em um banco de dados de proporções até então inimagináveis. Os debates sobre privacidade e proteções de dados pessoais ganharam muita força desde então. Para conversar sobre os riscos dessa nova tecnologia, conversamos com Rafael Zanatta, coordenador de pesquisas do Data Privacy Brazil, centro de informação e pesquisa em privacidade e proteção de dados. Ouça:

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Na entrevista, Rafael joga luz em algumas questões. A primeira delas, é sobre como uma tecnologia que transforma tanto a sociedade deve ser discutida por todos, e decidida democraticamente. Por isso, especialistas propõem uma moratória no uso de reconhecimento facial por polícias, para que seja interrompido por três anos e assim tenhamos tempo de compreender e decidir os melhores caminhos.

Rafael levanta outro ponto: uma tecnologia que dá o poder de controle de milhões de pessoas a empresas ou mesmo ao Estado põe em sério risco as liberdades civis conquistadas pela sociedade. Caso caia nas mãos de um governo autoritário, poderia facilmente ser usada para controle e silenciamento de vozes dissidentes, por exemplo.

E há ainda a questão das populações que historicamente são perseguidas pela polícia, como os negros e periféricos. O reconhecimento facial já é utilizado por polícias de estados como o Rio de Janeiro — e recentemente foi revelada a ata de uma reunião do governador Wilson Witzel com um ministro britânico, para uma parceria que poderia aprimorar o instrumento de possível perseguição.

O Brasil já tem uma lei que pode dar amplas garantias aos cidadãos para se protegerem do mau uso dessa tecnologia. É a Lei de Dados Pessoais, aprovada em 2018 pelo então presidente Michel Temer. Prestes a entrar em vigor, em agosto de 2020, ainda precisa passar por debates com especialistas na câmara. É o momento para que haja pressão popular para a proteção do direito de ir e vir, das liberdades civis e da privacidade. Rafael reforça: essa não é uma decisão que deva ser tomada em gabinetes de polícia, mas sim por meio de ampla e intensa discussão com vários setores da sociedade.

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