Um novo impulso para o Instituto Butantan

Produção industrial do centro de pesquisa ganhou novo fôlego com a compra de vacinas contra a dengue pelo Ministério da Saúde e financiamento do BNDES. Agora, instalações estão sendo ampliadas para garantir e expandir produção nacional de fármacos e insumos

Créditos: Instituto Butantan
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Gustavo Mendes em entrevista para Gabriel Brito

O Instituto Butantan (IB) completou 135 anos em 2024 e a data ficou marcada por importantes acontecimentos que afirmam a instituição como parte fundamental da produção de saúde no país. Enquanto o país vivia sua maior epidemia de dengue, o IB terminou o desenvolvimento de sua vacina contra a doença causada pelo mosquito Aedes aegypti, que promete dar ao país doses suficientes para imunizar toda a população em cerca de dois anos.

Para isso, concorre a volta ao governo federal de um projeto político que na economia tenta retomar o nacional-desenvolvimentismo, expressado no plano Nova Indústria Brasil. Dividido em seis eixos, a NIB tem o campo da saúde em destaque importante através da projeção de seu Complexo Econômico-Industrial. E é aqui que entra a expansão do Butantan e seus laboratórios, com financiamento de R$ 386 bilhões concedido pelo BNDES.

“A pandemia reforçou a necessidade dos fabricantes de imunizantes de estarem prontos para reagir a emergências que demandem uma produção rápida com qualidade e segurança. No entanto, as doenças vêm sendo melhor estudadas e novos produtos – tanto para doenças infecciosas como crônicas e terapêuticas – vêm sendo descobertos, o que torna necessário o aumento da capacidade de produção local”, explicou Gustavo Mendes, diretor de Assuntos Regulatórios, Controle de Qualidade e Estudos Clínicos da Fundação Butantan, em entrevista concedida ao Outra Saúde.

Ou seja, a ampliação do IB vai além do atendimento a uma emergência em saúde pública, a exemplo da pandemia ou agora da dengue: representa uma estratégia de transformação do setor em um ator econômico de peso. O financiamento do governo federal visa suprir outras demandas cotidianas em saúde, que em muitos casos obrigam a importação de insumos variados.

“Um dos objetivos primordiais é permitir que o Butantan seja autossuficiente na produção de insumos biológicos e tenha alta capacidade produtiva para atendimento pleno ao Ministério da Saúde e outros mercados, em relações que podem ser intermediadas pela OPAS (Organização Pan-Americana da Saúde), UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), OMS (Organização Mundial da Saúde) etc.”, explicou Gustavo.

Avaliado em cerca de R$ 20 bilhões, a diminuição do déficit comercial em saúde é um dos objetivos estabelecidos desde o início do governo Lula. E como se observa na explicação de Mendes, a expansão do IB não só pode gerar economia para o SUS como ainda trazer divisas, a partir da exportação a países de menor grau de desenvolvimento no setor – o que na realidade já acontece com a atual produção de soros e vacinas, como a da influenza, na instituição paulista.

“Certamente haverá um impacto direto na geração de empregos, nos ganhos econômicos e na própria capacitação técnica especializada dentro do Butantan”, sintetizou.

Em termos políticos, pode-se considerar que a instituição de Estado escapou da tesoura neoliberal, simbolizada no Programa de Desestatizações lançado pelo governador João Doria, após desempenhar um papel crucial na pandemia de coronavírus. Ao produzir a CoronaVac, em parceria com laboratório chinês Sinovac, o IB se tornou pivô da guerra política lançada por Jair Bolsonaro contra o então governador do estado, em sua ação de sabotagem das políticas sanitárias de prevenção ao vírus.

Já a vacina da dengue, foi lançada em evento público que marcou a despedida da ministra Nísia Trindade, com sintomática ausência do governo estadual de Tarcísio de Freitas. Na ocasião, o governo federal anunciou que haverá ao menos 60 milhões de doses disponíveis em 2026, o que coloca a perspectiva de erradicação da dengue enquanto um problema de saúde pública. E para atingir tal objetivo, a expansão dos laboratórios do Butantan será essencial.

“O Butantan está trabalhando em dois projetos para escalonar a produção da vacina da dengue. Um a médio prazo, para aumentar o volume de produção de Insumo Farmacêutico Ativo, e outro projeto a longo prazo, para escalonar o processo de liofilização desta vacina em um novo prédio”, revelou Gustavo.

A entrevista completa com o diretor do Instituto Butantan pode ser lida a seguir.

Primeiramente, no que consiste a expansão do Instituto Butantan? Quais os objetivos primordiais do aumento de seu parque produtivo?

A expansão consiste em aumentar a capacidade produtiva do Butantan, a fim de permitir produção local de Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs) e de Produto Acabado (PA), além de permitir a introdução de novas tecnologias, como de mRNA (RNA mensageiro) e de anticorpos monoclonais.

A expansão deve possibilitar ainda a internalização total das produções de vacinas como HPV, HepA (hepatite A), dTPa (difteria, tétano e coqueluche), raiva, entre outras, além dos adjuvantes em larga escala para suprir pandemias e/ou vacinas virais. O escalonamento da produção de soros também é uma das metas de expansão do Butantan com o novo prédio de soros.

A exportação de produtos farmacêuticos está nos objetivos desta expansão ou se trata essencialmente de fornecimento para o mercado interno?

Um projeto de produção local de uma vacina pandêmica também faz parte da expansão de produtos e, nesse sentido, um dos objetivos primordiais é permitir que o Butantan seja autossuficiente na produção de insumos biológicos e tenha alta capacidade produtiva para atendimento pleno ao Ministério da Saúde e outros mercados, em relações que podem ser intermediadas pela OPAS (Organização Pan-Americana da Saúde), UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), OMS (Organização Mundial da Saúde) etc.

Portanto, a exportação de produtos faz parte de um dos importantes pilares da Fundação, que é a perenidade, com a expansão de mercado tanto interno como externo.

Qual o impacto direto desta expansão? Existe projeção de geração de emprego e ganhos econômicos?

Sim, certamente haverá um impacto direto na geração de empregos, nos ganhos econômicos e na própria capacitação técnica especializada dentro do Butantan. No entanto, ainda não é possível prever o tamanho da mudança.

Acreditam que a experiência da produção local de vacinas contra a covid-19 tenha impulsionado este projeto de expansão?

De alguma maneira, a pandemia reforçou a necessidade dos fabricantes de imunizantes de estarem prontos para reagir a emergências que demandem uma produção rápida com qualidade e segurança.

No entanto, as doenças vêm sendo melhor estudadas e novos produtos – tanto para doenças infecciosas como crônicas e terapêuticas – vêm sendo descobertos, o que torna necessário o aumento da capacidade de produção local através de plataformas flexíveis e com eficiência.

Independentemente da pandemia, o Butantan sempre teve como missão pesquisar, desenvolver e produzir imunizantes e produtos biológicos para suprir demandas da população e, consequentemente, salvar vidas.

Como este projeto dialoga com a estratégia nacional em torno do Complexo Econômico Industrial da Saúde?

O projeto conversa diretamente com a estratégia nacional do Complexo Econômico Industrial da Saúde. O governo federal está inclusive dando suporte financeiro aos projetos de expansão no parque fabril do Butantan e abrindo chamamento de novos produtos para internalização no país através de PDPs (Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo) e PDIL (Programa de Desenvolvimento e Inovação Local), nos quais o Butantan já submeteu alguns projetos para avaliação.

Isso coloca uma perspectiva de redução do chamado déficit comercial brasileiro em saúde. Há outros projetos científicos do Instituto que vocês poderiam destacar neste momento?

Sim, se conseguirmos expandir infraestrutura e capacidade de produção, poderemos exportar o excedente, como já é feito para os soros e para a vacina da Influenza, o que reduz o déficit da balança comercial.

No momento, há outros projetos científicos do Instituto que não necessariamente estão atrelados à primeira pergunta, mas que merecem destaque, como o desenvolvimento das vacinas tetravalente contra a influenza, influenza aviária, dengue e chikungunya.

Sem dúvida, o anúncio mais importante do Butantan após a produção da coronavac é a produção de vacinas de dengue, válidas para os quatro sorotipos, após anos de pesquisa e desenvolvimento. Como caminha este projeto, que visa um salto ambicioso de 1 milhão para 100 milhões de doses anuais em dois anos?

O Butantan está trabalhando em dois projetos para escalonar a produção da vacina da dengue. Um a médio prazo, para aumentar o volume de produção de IFA, e outro projeto a longo prazo, para escalonar o processo de liofilização desta vacina em um novo prédio.

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